O papel mediador da dependência de mídia social e da qualidade do sono na associação entre tempo de uso de mídia social e sintomas depressivos em universitários

The mediating role of social media addiction and sleep quality in the association between social media usage and depressive symptoms in university students

El papel mediador de la adicción a las redes sociales y la calidad del sueño en la asociación entre el tiempo de uso de las redes sociales y los síntomas depresivos en estudiantes universitarios

Jéssica Vertuan Rufino Renne Rodrigues Arthur Eumann Mesas Camilo Molino Guidoni Sobre os autores

Resumo:

O aumento do uso de mídias sociais e sua associação com sintomas depressivos, especialmente em jovens adultos, tem gerado a necessidade do entendimento de como ocorre tal associação para subsidiar políticas de redução de danos e agravos. Nesse sentido, este estudo objetivou verificar o efeito mediador da dependência de mídias sociais e da qualidade do sono na associação entre o tempo de uso de mídias sociais e sintomas depressivos em universitários brasileiros. Trata-se de um estudo transversal, realizado com 2.823 universitários, que forneceram informações referentes ao tempo de uso de mídias sociais, à dependência de mídias sociais, aos sintomas depressivos e à qualidade do sono. A análise de mediação, ajustada por fatores de confusão, foi realizada por meio do software PROCESS para SPSS, para obtenção do efeito total (c), direto (c’) e indiretos (EI1, EI2 e EI3). Os resultados identificaram associação entre o tempo de uso de mídias sociais e os sintomas depressivos, mediada pela dependência de mídias sociais (EI1 = 20%) e pela qualidade do sono (EI1 = 40%). Os resultados permitem ampliar o conhecimento acerca dos mecanismos que influenciam mutuamente a relação entre o tempo de uso de mídias sociais e os sintomas depressivos, auxiliando na adoção de estratégias de redução de danos decorrentes do uso excessivo de mídias sociais.

Palavras-chave:
Mídias Sociais; Sintomas Depressivos; Qualidade do Sono; Adulto Jovem; Análise de Mediação

Abstract:

Increase in time spent on social media and its association with depressive symptoms, especially among young adults, has generated the need to understand how this association occurs in order to support the development of policies to reduce harm and complications. In view of this fact, this study aimed to assess the mediating effect of social media addiction and sleep quality on the association between time spent on social media and depressive symptoms in Brazilian university students. This is a cross-sectional study conducted with 2,823 university students, who provided information regarding time spent on social media, social media addiction, depressive symptoms and sleep quality. The mediation analysis, adjusted for confounding factors, was performed using the PROCESS macro for SPSS to obtain the total (c), direct (c’), and indirect effects (EI1, EI2, and EI3). The results identified an association between time spent on social media and depressive symptoms, mediated by social media addiction (EI1 = 20%) and sleep quality (EI1 = 40%). These findings help expand knowledge about the mechanisms that mutually influence the relationship between time spent on social media and depressive symptoms, supporting the adoption of strategies to reduce harm resulting from excessive social media use.

Keywords:
Social Media; Depressive Symptoms; Sleep Quality; Young Adult; Mediation Analysis

Resumen:

El aumento del uso de las redes sociales y su asociación con síntomas depresivos, especialmente en adultos jóvenes, ha generado la necesidad de comprender cómo se produce esta asociación como una forma de apoyar las políticas de reducción de daños y afecciones. En ese sentido, el presente estudio tuvo como objetivo verificar el efecto mediador de la adicción a las redes sociales y de la calidad del sueño en la asociación entre el tiempo de uso de las redes sociales y los síntomas depresivos en estudiantes universitarios brasileños. Se trata de un estudio transversal, realizado con 2.823 estudiantes universitarios, quienes brindaron información respecto al tiempo de uso de las redes sociales, adicción a las redes sociales, síntomas depresivos y calidad del sueño. El análisis de mediación, ajustado por factores de confusión, se realizó por medio del software PROCESS para SPSS, para obtener el efecto total (c), directo (c’) e indirectos (EI1, EI2 y EI3). Los resultados identificaron una asociación entre el tiempo de uso de las redes sociales y los síntomas depresivos, mediada por adicción a las redes sociales (EI1 = 20%) y la calidad del sueño (EI1 = 40%). Los resultados permiten ampliar el conocimiento acerca de los mecanismos que influyen mutuamente en la relación entre tiempo de uso de las redes sociales y los síntomas depresivos, ayudando a adoptar estrategias para reducir los daños resultantes del uso excesivo de las redes sociales.

Palabras-clave:
Medios de Comunicación Sociales; Síntomas Depresivos; Calidad del Sueño; Adulto Joven; Análisis de Mediación

Introdução

O uso da internet e suas ferramentas permite um acesso sem precedentes à informação, possibilitando meios para que 64,4% da população mundial, no início de 2023 11. Kemp S. Digital 2023: global overview report. https://datareportal.com/reports/digital-2023-global-overview-report?utm_source=DataReportal&utm_medium=Country_Article_Hyperlink&utm_campaign=Digital_2023&utm_term=Brazil&utm_content=Global_Promo_Block (acessado em 29/Mai/2023).
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, possa se comunicar, trabalhar e/ou se entreter de forma online22. Moromizato MS, Ferreira DBB, Souza LSM, Leite RF, Macedo FN, Pimentel D. O uso de internet e redes sociais e a relação com indícios de ansiedade e depressão em estudantes de medicina. Rev Bras Educ Méd 2017; 41:497-504.,33. Ortiz-Ospina E. The rise of social media. Our World in Data 2019; 18 set. https://ourworldindata.org/rise-of-social-media.. Embora sejam possibilitadas diversas ações 33. Ortiz-Ospina E. The rise of social media. Our World in Data 2019; 18 set. https://ourworldindata.org/rise-of-social-media. (streaming de vídeos, leitura, músicas, jogos etc.), o uso de mídias sociais (WhatsApp, Facebook, Instagram, TikTok, entre outros) apresentou um crescimento exponencial desde 2005, tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento 44. Brailovskaia J, Margraf J. Decrease of well-being and increase of online media use: cohort trends in German university freshmen between 2016 and 2019. Psychiatry Res 2020; 290:113110.,55. Assunção RS, Matos PM. Perspectivas dos adolescentes sobre o uso do Facebook: um estudo qualitativo. Psicol Estud 2014; 19:539-47., sendo acessadas por 59,4% da população mundial em 2023, com maior prevalência na Nigéria e no Brasil 11. Kemp S. Digital 2023: global overview report. https://datareportal.com/reports/digital-2023-global-overview-report?utm_source=DataReportal&utm_medium=Country_Article_Hyperlink&utm_campaign=Digital_2023&utm_term=Brazil&utm_content=Global_Promo_Block (acessado em 29/Mai/2023).
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. Os jovens adultos constituem o estrato etário com maior frequência (variando de 53,4 a 96% em diferentes países) 33. Ortiz-Ospina E. The rise of social media. Our World in Data 2019; 18 set. https://ourworldindata.org/rise-of-social-media. e maior tempo 11. Kemp S. Digital 2023: global overview report. https://datareportal.com/reports/digital-2023-global-overview-report?utm_source=DataReportal&utm_medium=Country_Article_Hyperlink&utm_campaign=Digital_2023&utm_term=Brazil&utm_content=Global_Promo_Block (acessado em 29/Mai/2023).
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,33. Ortiz-Ospina E. The rise of social media. Our World in Data 2019; 18 set. https://ourworldindata.org/rise-of-social-media.,66. Bianchi T. Social media users in Brazil 2017-2025. https://www.statista.com/forecasts/1146347/social-media-users-in-brazil (acessado em 29/Mai/2023).
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(média diária de 3h11min para mulheres e 2h46min para homens) 11. Kemp S. Digital 2023: global overview report. https://datareportal.com/reports/digital-2023-global-overview-report?utm_source=DataReportal&utm_medium=Country_Article_Hyperlink&utm_campaign=Digital_2023&utm_term=Brazil&utm_content=Global_Promo_Block (acessado em 29/Mai/2023).
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de uso de mídias sociais.

Apesar das vantagens propiciadas pelas mídias sociais, o seu uso crescente é associado à diminuição do bem-estar 44. Brailovskaia J, Margraf J. Decrease of well-being and increase of online media use: cohort trends in German university freshmen between 2016 and 2019. Psychiatry Res 2020; 290:113110., à piora da qualidade do sono 77. Silva SS, Silveira MAC, Almeida HCR, Nascimento MCP, Santos MAM, Heimer MV. Use of digital screens by adolescents and association on sleep quality: a systematic review. Cad Saúde Pública 2022; 38:e00300721. e a problemas relacionados à saúde mental 22. Moromizato MS, Ferreira DBB, Souza LSM, Leite RF, Macedo FN, Pimentel D. O uso de internet e redes sociais e a relação com indícios de ansiedade e depressão em estudantes de medicina. Rev Bras Educ Méd 2017; 41:497-504.,88. Souza K, Cunha MXC. Impactos do uso das redes sociais virtuais na saúde mental dos adolescentes: uma revisão sistemática da literatura. Revista Educação, Psicologia e Interfaces 2019; 3:204-17., como a depressão 22. Moromizato MS, Ferreira DBB, Souza LSM, Leite RF, Macedo FN, Pimentel D. O uso de internet e redes sociais e a relação com indícios de ansiedade e depressão em estudantes de medicina. Rev Bras Educ Méd 2017; 41:497-504.. Entre os principais sintomas clínicos da depressão, destacam-se: humor deprimido; perda de interesse ou prazer; perda ou ganho significativo de peso; insônia ou hipersonia; agitação ou retardo psicomotor; fadiga ou perda de energia; sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva; indecisão ou diminuição da capacidade para pensar ou se concentrar; e pensamentos recorrentes de morte 99. American Psychiatry Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-5). 5ª Ed. Porto Alegre: Artmed; 2014.. Além de serem fenômenos que inspiram cuidado na sociedade de uma maneira global, destaca-se que tanto o uso de mídias sociais como a prevalência de depressão vêm aumentando em populações de grupos etários mais jovens, como os estudantes universitários 11. Kemp S. Digital 2023: global overview report. https://datareportal.com/reports/digital-2023-global-overview-report?utm_source=DataReportal&utm_medium=Country_Article_Hyperlink&utm_campaign=Digital_2023&utm_term=Brazil&utm_content=Global_Promo_Block (acessado em 29/Mai/2023).
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,44. Brailovskaia J, Margraf J. Decrease of well-being and increase of online media use: cohort trends in German university freshmen between 2016 and 2019. Psychiatry Res 2020; 290:113110.,1010. Twenge JM, Cooper AB, Joiner TE, Duffy ME, Binau SG. Age, period, and cohort trends in mood disorder indicators and suicide-related outcomes in a nationally representative dataset, 2005-2017. J Abnorm Psychol 2019; 128:185-99.. Nessa população específica, observou-se uma prevalência de 33,6% com sintomas depressivos 1111. Li W, Zhao Z, Chen D, Peng Y, Lu Z. Prevalence and associated factors of depression and anxiety symptoms among college students: a systematic review and meta-analysis. J Child Psychol Psychiatry 2022; 63:1222-30., além de estudos que encontraram associações entre depressão e o uso problemático de mídias sociais 22. Moromizato MS, Ferreira DBB, Souza LSM, Leite RF, Macedo FN, Pimentel D. O uso de internet e redes sociais e a relação com indícios de ansiedade e depressão em estudantes de medicina. Rev Bras Educ Méd 2017; 41:497-504.,1212. Shensa A, Escobar-Viera CG, Sidani JE, Bowman ND, Marshal MP, Primack BA. Problematic social media use and depressive symptoms among U.S. young adults: a nationally-representative study. Soc Sci Med 2017; 182:150-7..

Embora não exista consenso na associação entre essas variáveis, a compreensão dessa associação depende de como o uso de mídias sociais é avaliado. De modo geral, existem três maneiras principais de realizar essa mensuração: (1) o uso em si (sim ou não), que é pouco discriminativo em populações que utilizam mídias sociais de forma muito prevalente; (2) o tempo de uso de mídias sociais; e (3) o uso problemático 1212. Shensa A, Escobar-Viera CG, Sidani JE, Bowman ND, Marshal MP, Primack BA. Problematic social media use and depressive symptoms among U.S. young adults: a nationally-representative study. Soc Sci Med 2017; 182:150-7.,1313. Cunningham S, Hudson CC, Harkness K. Social media and depression symptoms: a meta-analysis. Res Child Adolesc Psychopathol 2021; 49:241-53., quando apresenta características comportamentais e psicológicas compatíveis com o vício/dependência 1212. Shensa A, Escobar-Viera CG, Sidani JE, Bowman ND, Marshal MP, Primack BA. Problematic social media use and depressive symptoms among U.S. young adults: a nationally-representative study. Soc Sci Med 2017; 182:150-7.,1414. Elhai JD, Dvorak RD, Levine JC, Hall BJ. Problematic smartphone use: a conceptual overview and systematic review of relations with anxiety and depression psychopathology. J Affect Disord 2017; 207:251-9.,1515. Shi J, Chen Z, Tian M. Internet self-efficacy, the need for cognition, and sensation seeking as predictors of problematic use of the internet. Cyberpsychol Behav Soc Netw 2011; 14:231-4.. Baseado nesse entendimento, foi observado que os sintomas depressivos apresentam fraca associação com o tempo e intensidade do uso de mídias sociais 1313. Cunningham S, Hudson CC, Harkness K. Social media and depression symptoms: a meta-analysis. Res Child Adolesc Psychopathol 2021; 49:241-53. e moderada associação com o uso problemático 1212. Shensa A, Escobar-Viera CG, Sidani JE, Bowman ND, Marshal MP, Primack BA. Problematic social media use and depressive symptoms among U.S. young adults: a nationally-representative study. Soc Sci Med 2017; 182:150-7.,1313. Cunningham S, Hudson CC, Harkness K. Social media and depression symptoms: a meta-analysis. Res Child Adolesc Psychopathol 2021; 49:241-53.,1616. Shannon H, Bush K, Villeneuve PJ, Hellemans KGC, Guimond S. Problematic social media use in adolescents and young adults: systematic review and meta-analysis. JMIR Ment Health 2022; 9:e33450..

De modo similar, estudos apontam que o maior tempo de uso de mídias sociais está associado a uma pior qualidade do sono 77. Silva SS, Silveira MAC, Almeida HCR, Nascimento MCP, Santos MAM, Heimer MV. Use of digital screens by adolescents and association on sleep quality: a systematic review. Cad Saúde Pública 2022; 38:e00300721.,1717. Fobian AD, Avis K, Schwebel DC. The impact of media use on adolescent sleep efficiency. J Dev Behav Pediatr 2016; 37:9-14., a qual pode ser decorrente da dependência de mídias sociais 1818. Sahin S, Ozdemir K, Unsal A, Temiz N. Evaluation of mobile phone addiction level and sleep quality in university students. Pak J Med Sci 2013; 29:913-8.. Nesse caso, é importante destacar a bidirecionalidade entre essas variáveis, visto que indivíduos com dificuldade para adormecer são mais propensos ao uso das mídias, podendo ocasionar dependência 1919. Chen YL, Gau SSF. Sleep problems and internet addiction among children and adolescents: a longitudinal study. J Sleep Res 2016; 25:458-65.,2020. Tavernier R, Willoughby T. Sleep problems: predictor or outcome of media use among emerging adults at university? J Sleep Res 2014; 23:389-96.. Ainda nesse sentido, seguindo um caminho bidirecional, a literatura indica que indivíduos com uma pior qualidade do sono apresentam maior probabilidade de ocorrência de sintomas depressivos 2121. Cheung T, Wong SY, Wong KY, Law LY, Ng K, Tong MT, et al. Depression, anxiety and symptoms of stress among baccalaureate nursing students in Hong Kong: a cross-sectional study. Int J Environ Res Public Health 2016; 13:779.,2222. Wilson KT, Bohnert AE, Ambrose A, Davis DY, Jones DM, Magee MJ. Social, behavioral, and sleep characteristics associated with depression symptoms among undergraduate students at a women's college: a cross-sectional depression survey, 2012. BMC Womens Health 2014; 14:8., assim como a depressão demonstrou ser um forte preditor de incidência e persistência de queixas do sono 2323. Fok M, Stewart R, Besset A, Ritchie K, Prince M. Incidence and persistence of sleep complaints in a community older population. Int J Geriatr Psychiatry 2010; 25:37-45.. No que se refere aos universitários, o hábito de se deitar tarde da noite, combinado com o início matutino das aulas, resulta em um fenômeno conhecido como “jet lag social2424. Bezerra MAA, Marinho MSS, Morais CI, Silva CR, Pereira CCB, Simões Neto JC, et al. Social jet lag, sleep quality and daytime sleepiness in university students: a cross-sectional study. Res Soc Dev 2022; 11:e285111739357.. Esse desalinhamento temporal se traduz em uma redução tanto na quantidade quanto na qualidade do sono desses indivíduos 2424. Bezerra MAA, Marinho MSS, Morais CI, Silva CR, Pereira CCB, Simões Neto JC, et al. Social jet lag, sleep quality and daytime sleepiness in university students: a cross-sectional study. Res Soc Dev 2022; 11:e285111739357.,2525. Crowley SJ, Wolfson AR, Tarokh L, Carskadon MA. An update on adolescent sleep: new evidence informing the perfect storm model. J Adolesc 2018; 67:55-65..

Considerando o aumento no uso de mídias sociais 44. Brailovskaia J, Margraf J. Decrease of well-being and increase of online media use: cohort trends in German university freshmen between 2016 and 2019. Psychiatry Res 2020; 290:113110.,55. Assunção RS, Matos PM. Perspectivas dos adolescentes sobre o uso do Facebook: um estudo qualitativo. Psicol Estud 2014; 19:539-47.,66. Bianchi T. Social media users in Brazil 2017-2025. https://www.statista.com/forecasts/1146347/social-media-users-in-brazil (acessado em 29/Mai/2023).
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, e a crescente prevalência dos sintomas depressivos, sobretudo na população jovem 1010. Twenge JM, Cooper AB, Joiner TE, Duffy ME, Binau SG. Age, period, and cohort trends in mood disorder indicators and suicide-related outcomes in a nationally representative dataset, 2005-2017. J Abnorm Psychol 2019; 128:185-99., a associação entre essas variáveis 1111. Li W, Zhao Z, Chen D, Peng Y, Lu Z. Prevalence and associated factors of depression and anxiety symptoms among college students: a systematic review and meta-analysis. J Child Psychol Psychiatry 2022; 63:1222-30. torna-se ainda mais preocupante. Nesse contexto, a identificação de problemas relacionados à saúde mental, como a percepção de dependência de mídias sociais 1313. Cunningham S, Hudson CC, Harkness K. Social media and depression symptoms: a meta-analysis. Res Child Adolesc Psychopathol 2021; 49:241-53. e a alteração na qualidade do sono 2626. Parasuraman S, Sam AT, Yee SWK, Chuon BLC, Ren LY. Smartphone usage and increased risk of mobile phone addiction: a concurrent study. Int J Pharm Investig 2017; 7:125-31.,2727. Salehan M, Negahban A. Social networking on smartphones: when mobile phones become addictive. Comput Human Behav 2013; 29:2632-9.,2828. Bakken IJ, Wenzel HG, Götestam KG, Johansson A, Oren A. Internet addiction among Norwegian adults: a stratified probability sample study. Scand J Psychol 2009; 50:121-7., como possíveis mediadores é necessária e auxilia o entendimento dos efeitos do uso das redes sociais nos sintomas depressivos, além de embasar a adoção de estratégias de redução de danos 1313. Cunningham S, Hudson CC, Harkness K. Social media and depression symptoms: a meta-analysis. Res Child Adolesc Psychopathol 2021; 49:241-53.,2929. Sampasa-Kanyinga H, Hamilton HA. Social networking sites and mental health problems in adolescents: the mediating role of cyberbullying victimization. Eur Psychiatry 2015; 30:1021-7.. Assim, o objetivo deste estudo foi verificar o papel mediador da dependência de mídias sociais e da qualidade do sono na associação entre o tempo de uso de mídias sociais e sintomas depressivos em universitários.

Metodologia

Desenho e estudo de população

Trata-se de um estudo epidemiológico de delineamento transversal. Foram considerados elegíveis os estudantes da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Paraná, com idade maior ou igual a 18 anos, regularmente matriculados na graduação no primeiro semestre de 2019. A coleta de dados foi realizada no período de abril a junho de 2019, por meio de um questionário anônimo no Google Forms (https://www.google.com/forms/), sendo precedida de uma ampla divulgação para incentivar a participação da população elegível 3030. Sirtoli R, Balboa-Castillo T, Fernández-Rodríguez R, Rodrigues R, Morales G, Garrido-Miguel M, et al. The association between alcohol-related problems and sleep quality and duration among college students: a multicountry pooled analysis. Int J Ment Health Addict 2022; (Online ahead of print).. Embora o questionário não coletasse informações de identidade dos participantes, eles poderiam voluntariamente informar seu e-mail para receberem uma devolutiva individual das escalas empregadas na pesquisa. Com base nessa informação e na verificação de respostas com conteúdo repetido recebidas em um curto espaço de tempo, foram identificados registros duplicados. Ao final, foram excluídos registros duplicados (n = 82), que estavam majoritariamente não preenchidos (n = 2) e que não apresentavam informação da idade (n = 12). Dos 3.238 questionários válidos, 2.823 forneceram dados completos para as variáveis de interesse do estudo (Figura 1).

Figura 1
Fluxograma da população do estudo.

Variáveis do estudo

A variável independente foi o tempo de uso de mídias sociais, obtido por meio da questão “Quantas horas por dia você geralmente gasta postando ou verificando mídias sociais? (WhatsApp, Facebook, Instagram, Twitter etc.)?”. Foram apresentadas as seguintes opções de resposta: não uso redes sociais; menos que 1 hora por dia; entre 1:00 e 1:59 hora por dia; entre 2:00 e 2:59 horas por dia; entre 3:00 e 4:59 horas por dia; entre 5:00 e 6:59 horas por dia; e 7 horas ou mais por dia.

Os sintomas depressivos, variável dependente, foram avaliados por meio do Patient Health Questionnaire-9 (PHQ-9; Questionário de Saúde do Paciente), escala previamente adaptada e validada para a população brasileira 3131. Santos IS, Tavares BF, Munhoz TN, Almeida LSP, Silva NTB, Tams BD, et al. Sensibilidade e especificidade do Patient Health Questionnaire-9 (PHQ-9) entre adultos da população geral. Cad Saúde Pública 2013; 29:1533-43., que permite o rastreamento de indivíduos com sintomas depressivos. O instrumento avalia a frequência com que os sintomas ocorreram durante as últimas duas semanas por nove questões com escalas que variam de 0 a 3, podendo a soma final alcançar de 0 a 27 pontos. Cada questão avalia a presença de cada sintoma clínico para o episódio de depressão maior, descritos no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), como: “se sentiu cansado ou com pouca energia”. Para a análise descritiva, o ponto de corte para definir a presença de indicativo de depressão foi ≥ 9 pontos 3131. Santos IS, Tavares BF, Munhoz TN, Almeida LSP, Silva NTB, Tams BD, et al. Sensibilidade e especificidade do Patient Health Questionnaire-9 (PHQ-9) entre adultos da população geral. Cad Saúde Pública 2013; 29:1533-43.. Para a análise de mediação, foi utilizada a variável contínua.

Os potenciais mediadores foram a dependência de mídias sociais e a qualidade do sono. A dependência de mídias sociais foi obtida por meio de uma questão que aferiu a autopercepção da dependência “Qual a sua opinião sobre sua dependência de mídias sociais? (WhatsApp, Facebook, Instagram, Twitter etc.)?”. Foram apresentadas as seguintes opções de resposta: não uso redes sociais; não dependente; pouco dependente; indiferente; dependente; e muito dependente. Com base nas respostas dos participantes, eles foram classificados em três níveis de dependência: baixa (não dependente/pouco dependente); intermediária (indiferente); e alta (dependente/muito dependente). A qualidade do sono foi mensurada por meio do Pittsburgh Sleep Quality Index (PSQI; Índice de Qualdiade do Sono de Pittsburgh), instrumento composto por 19 questões categorizadas em sete componentes, os quais podem, cada um, ter pontuações de 0 a 3 pontos, resultando em um escore global de 0 a 21 pontos. Os sete componentes do instrumento contemplam: qualidade subjetiva do sono; latência para o sono (tempo que o indivíduo leva para efetivamente começar a dormir); duração do sono; eficiência habitual do sono (relação entre o tempo que se passa na cama com o tempo que se passa dormindo); transtornos do sono; uso de medicamentos para dormir; e disfunção diurna. Para a análise descritiva, a má qualidade do sono foi identificada pelo ponto de corte > 5 3232. Buysse DJ, Reynolds CF, Monk TH, Berman SR, Kupfer DJ. The Pittsburgh sleep quality index: a new instrument for psychiatric practice and research. Psychiatry Res 1989; 28:193-213.,3333. Bertolazi AN, Fagondes SC, Hoff LS, Dartora EG, Miozzo ICS, Barba MEF, et al. Validation of the Brazilian Portuguese version of the Pittsburgh Sleep Quality Index. Sleep Med 2011; 12:70-5., ainda, um escore > 10 foi utilizado para identificar um possível distúrbio do sono 3434. Schlarb AA, Claßen M, Grünwald J, Vögele C. Sleep disturbances and mental strain in university students: results from an online survey in Luxembourg and Germany. Int J Ment Health Syst 2017; 11:24.. Para a análise de mediação, foi utilizada a variável contínua.

Variáveis com potencial efeito de confusão nas associações do estudo também foram avaliadas, tais como: sexo (feminino; masculino) 1313. Cunningham S, Hudson CC, Harkness K. Social media and depression symptoms: a meta-analysis. Res Child Adolesc Psychopathol 2021; 49:241-53.; faixa etária em anos (18-20; 21-23; ≥ 24) 1313. Cunningham S, Hudson CC, Harkness K. Social media and depression symptoms: a meta-analysis. Res Child Adolesc Psychopathol 2021; 49:241-53.; índice de massa corporal (IMC) 3535. Carter JS, Dellucci T, Turek C, Mir S. Predicting depressive symptoms and weight from adolescence to adulthood: stressors and the role of protective factors. J Youth Adolesc 2015; 44:2122-40.,3636. Kelishadi R, Mozafarian N, Qorbani M, Maracy MR, Motlagh ME, Safiri S, et al. Association between screen time and snack consumption in children and adolescents: the CASPIAN-IV study. J Pediatr Endocrinol Metab 2017; 30:211-9., calculado a partir do peso autorreferido em quilogramas dividido pelo quadrado da altura em metros (kg/m2) e categorizado conforme classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS) 3737. World Health Organization. Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of a WHO consultation. Genebra: World Health Organization; 2000. (baixo peso; peso adequado; sobrepeso; obesidade); ingresso por cotas 2121. Cheung T, Wong SY, Wong KY, Law LY, Ng K, Tong MT, et al. Depression, anxiety and symptoms of stress among baccalaureate nursing students in Hong Kong: a cross-sectional study. Int J Environ Res Public Health 2016; 13:779.,3838. Andrade-Vargas L, Iriarte-Solano M, Rivera-Rogel D, Yunga-Godoy D. Jóvenes y redes sociales: entre la democratización del conocimiento y la inequidad digital. Comuicar 2021; XXIX:85-95. (não; sim); período de estudo 3939. Das-Friebel A, Lenneis A, Realo A, Sanborn A, Tang NKY, Wolke D, et al. Bedtime social media use, sleep, and affective wellbeing in young adults: an experience sampling study. J Child Psychol Psychiatry 2020; 61:1138-49. (matutino; vespertino; noturno; integral; à distância); prática de atividade física 4040. Brailovskaia J, Margraf J. Relationship between depression symptoms, physical activity, and addictive social media use. Cyberpsychol Behav Soc Netw 2020; 23:818-22., avaliada por meio da pergunta “Em uma semana típica, com qual frequência você pratica atividade física no seu tempo livre?” (não pratica; uma vez por semana; 2 a 3 vezes por semana; 4 ou mais vezes por semana); consumo de tabaco 41, avaliado por meio da pergunta “Durante os últimos três meses, com que frequência você fumou cigarro ou algum derivado do tabaco?” (nunca; 1 ou 2 vezes; mensalmente; semanalmente; diariamente ou quase todos os dias); consumo de substâncias ilícitas 4141. Ilakkuvan V, Johnson A, Villanti AC, Evans WD, Turner M. Patterns of social media use and their relationship to health risks among young adults. J Adolesc Health 2019; 64:158-64., avaliado por meio da pergunta “Durante os últimos três meses, com que frequência você utilizou substâncias ilícitas?” (nunca; 1 ou 2 vezes; mensalmente; semanalmente; diariamente ou quase todos os dias); e consumo de álcool 4141. Ilakkuvan V, Johnson A, Villanti AC, Evans WD, Turner M. Patterns of social media use and their relationship to health risks among young adults. J Adolesc Health 2019; 64:158-64., avaliado por meio da pergunta: “Durante os últimos três meses, com que frequência você utilizou bebidas alcoólicas?” (nunca; 1 ou 2 vezes; mensalmente; semanalmente; diariamente ou quase todos os dias).

Análise estatística

Os dados foram analisados no programa SPSS, versão 19.0 para Windows (https://www.ibm.com/). Inicialmente, foi realizada a análise descritiva, com cálculo da média ± desvio padrão (DP), das variáveis contínuas e o número absoluto e frequência relativa (%) das variáveis categóricas. Foi feita uma análise de correlação de Spearman para verificar as associações bivariadas entre as variáveis do estudo, sendo considerado significativo p < 0,05. As variáveis com potencial efeito de confusão, ou seja, que apresentaram correlação com ao menos duas das variáveis de interesse, foram utilizadas como ajuste no modelo final da análise de mediação.

Foi realizada uma análise para verificar o possível efeito de mediação da dependência de mídias sociais e da qualidade do sono na associação entre o tempo de uso de mídias sociais e os sintomas depressivos. Para essa análise, foi utilizada a macro PROCESS, versão 4.1 (https://www.processmacro.org/index.html), para o programa SPSS. Utilizou-se o modelo 6, com dois mediadores, e 5 mil amostras de bootstrap, com intervalo de 95% de confiança (IC95%) 4242. Hayes AF. Introduction to mediation, moderation, and conditional process analysis: a regression-based approach. Nova York: The Guilford Press; 2013.. A dependência de mídias sociais foi considerada como primeiro mediador e a qualidade do sono como segundo. O modelo de mediação foi utilizado para avaliar os efeitos total (c) e direto (a1, a2, b1, b2, d e c’) que indicam o coeficiente de regressão não padronizado e a significância entre o tempo de uso de mídias sociais e os sintomas depressivos, sendo um valor de p < 0,05 considerado significativo. Ainda, esse modelo avaliou três efeitos indiretos (EI1, EI2 e EI3) que indicam a significância do efeito de mediação, os quais foram considerados significativos quando o IC95% não continha 0 4242. Hayes AF. Introduction to mediation, moderation, and conditional process analysis: a regression-based approach. Nova York: The Guilford Press; 2013. (Figura 2). Esta análise foi ajustada por sexo 1313. Cunningham S, Hudson CC, Harkness K. Social media and depression symptoms: a meta-analysis. Res Child Adolesc Psychopathol 2021; 49:241-53., idade 1313. Cunningham S, Hudson CC, Harkness K. Social media and depression symptoms: a meta-analysis. Res Child Adolesc Psychopathol 2021; 49:241-53., IMC 3535. Carter JS, Dellucci T, Turek C, Mir S. Predicting depressive symptoms and weight from adolescence to adulthood: stressors and the role of protective factors. J Youth Adolesc 2015; 44:2122-40.,3636. Kelishadi R, Mozafarian N, Qorbani M, Maracy MR, Motlagh ME, Safiri S, et al. Association between screen time and snack consumption in children and adolescents: the CASPIAN-IV study. J Pediatr Endocrinol Metab 2017; 30:211-9., ingresso por cotas 2121. Cheung T, Wong SY, Wong KY, Law LY, Ng K, Tong MT, et al. Depression, anxiety and symptoms of stress among baccalaureate nursing students in Hong Kong: a cross-sectional study. Int J Environ Res Public Health 2016; 13:779.,3838. Andrade-Vargas L, Iriarte-Solano M, Rivera-Rogel D, Yunga-Godoy D. Jóvenes y redes sociales: entre la democratización del conocimiento y la inequidad digital. Comuicar 2021; XXIX:85-95., período de estudo 3939. Das-Friebel A, Lenneis A, Realo A, Sanborn A, Tang NKY, Wolke D, et al. Bedtime social media use, sleep, and affective wellbeing in young adults: an experience sampling study. J Child Psychol Psychiatry 2020; 61:1138-49., prática de atividade física 4040. Brailovskaia J, Margraf J. Relationship between depression symptoms, physical activity, and addictive social media use. Cyberpsychol Behav Soc Netw 2020; 23:818-22., e consumo de tabaco 4141. Ilakkuvan V, Johnson A, Villanti AC, Evans WD, Turner M. Patterns of social media use and their relationship to health risks among young adults. J Adolesc Health 2019; 64:158-64., de álcool 4141. Ilakkuvan V, Johnson A, Villanti AC, Evans WD, Turner M. Patterns of social media use and their relationship to health risks among young adults. J Adolesc Health 2019; 64:158-64. e de substâncias ilícitas 4141. Ilakkuvan V, Johnson A, Villanti AC, Evans WD, Turner M. Patterns of social media use and their relationship to health risks among young adults. J Adolesc Health 2019; 64:158-64..

Figura 2
Modelo de mediação proposto para avaliar os efeitos total (c), diretos (a1, a2, b1, b2, d e c’) e indiretos (EI1, EI2 e EI3) entre o tempo de uso de mídias sociais e sintomas depressivos.

Aspectos éticos

Todos os participantes foram devidamente informados quanto aos objetivos da pesquisa e só poderiam preencher o questionário após a leitura e aceitação do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE). O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UEL (certificado de apresentação para apreciação ética nº 04456818.0.0000.5231).

Resultados

Dos 2.823 estudantes incluídos no estudo (Figura 1), a idade média foi 22,0 ± 4,5 anos, sendo 68,7% do sexo feminino. A maioria (59,2%) apresentou peso adequado e, em relação às características acadêmicas, 63,7% não ingressou na universidade por cotas e 44,8% dos indivíduos frequentavam cursos de período integral. No que se refere aos hábitos de vida e ao consumo de substâncias nos últimos três meses, 74,4% relataram não utilizar cigarro ou derivados do tabaco, 73,3% disseram não consumir substâncias ilícitas e 31,4% referiram consumir álcool semanalmente. Além disso, 52,7% referiram não praticar atividade física. Em relação ao uso de mídias sociais, 53,1% referiram alta dependência e 26,1% afirmaram gastar entre 2:00 e 2:59 horas por dia com mídias sociais (Tabela 1).

Tabela 1
Caracterização da amostra do estudo (n = 2.823).

Observou-se, ainda, que 73,6% dos indivíduos apresentaram indicativo de depressão (Tabela 1), sendo que 42,9% referiram se sentir cansados ou com pouca energia quase todos os dias nas últimas duas semanas (Tabela 2). Com relação ao sono, 75,9% apresentaram má qualidade do sono (Tabela 1) e, entre eles, 25% obtiveram pontuação compatível com um possível distúrbio do sono. Na análise descritiva dos componentes do PSQI, observou-se que 57,9% dos indivíduos referiram duração do sono entre 6 e 7 horas (Tabela 3).

Tabela 2
Frequência dos sintomas avaliados pelo Patient Health Questionnaire-9 (PHQ-9), referentes às últimas duas semanas (n = 2.823).

Tabela 3
Frequência de respostas das categorias referentes a cada um dos componentes do Pittsburgh Sleep Quality Index (PSQI) (n = 2.823).

A dependência de mídias sociais, a qualidade do sono, o tempo de uso de mídias sociais e os sintomas depressivos apresentaram correlações significativas entre si. Além disso, essas variáveis apresentaram correlação com muitas das variáveis com potencial efeito de confusão, conforme apresentado na Tabela 4. Com relação à análise de mediação (Figura 3), evidenciou-se que há uma associação entre o tempo de uso de mídias sociais e os sintomas depressivos. No entanto, observou-se que o efeito direto (c’ = 35%) entre essas variáveis não foi significativo, sendo essa associação mediada pela dependência de mídias sociais e pela qualidade do sono. Os efeitos indiretos 1 (EI1 = 0,08; IC95%: 0,02-0,15) e 2 (EI2 = 0,16; IC95%: 0,04-0,27) foram as vias estatisticamente significativas para essa mediação. Dessa forma, é possível identificar que 20% e 40% do efeito do tempo de uso de mídias sociais nos sintomas depressivos foram mediados, respectivamente, pela dependência de mídias sociais e pela má qualidade do sono.

Tabela 4
Correlação entre variáveis com potencial efeito de confusão, qualidade do sono, dependência de mídias sociais, tempo de uso de mídias sociais e sintomas depressivos.

Figura 3
Análise de mediação da associação entre tempo de uso de mídias sociais e sintomas depressivos, utilizando como mediadores dependência de mídias sociais e qualidade do sono.

Discussão

Os resultados deste estudo evidenciaram uma associação entre o tempo de uso de mídias sociais e os sintomas depressivos, a qual foi mediada pela dependência de mídias sociais e pela qualidade do sono, independentemente de fatores de confusão. Estudos apontam elevados índices de depressão decorrentes do aumento do uso das mídias sociais 22. Moromizato MS, Ferreira DBB, Souza LSM, Leite RF, Macedo FN, Pimentel D. O uso de internet e redes sociais e a relação com indícios de ansiedade e depressão em estudantes de medicina. Rev Bras Educ Méd 2017; 41:497-504.,88. Souza K, Cunha MXC. Impactos do uso das redes sociais virtuais na saúde mental dos adolescentes: uma revisão sistemática da literatura. Revista Educação, Psicologia e Interfaces 2019; 3:204-17., fato também observado nesta pesquisa, a partir dos efeitos total e direto do tempo de uso de mídias sociais nos sintomas depressivos. No entanto, observa-se que é um efeito complexo, influenciado por diversos fatores, que, por sua vez, podem se associar aos sintomas depressivos 1818. Sahin S, Ozdemir K, Unsal A, Temiz N. Evaluation of mobile phone addiction level and sleep quality in university students. Pak J Med Sci 2013; 29:913-8.,2828. Bakken IJ, Wenzel HG, Götestam KG, Johansson A, Oren A. Internet addiction among Norwegian adults: a stratified probability sample study. Scand J Psychol 2009; 50:121-7.,4141. Ilakkuvan V, Johnson A, Villanti AC, Evans WD, Turner M. Patterns of social media use and their relationship to health risks among young adults. J Adolesc Health 2019; 64:158-64..

Nesse sentido, em razão da mediação identificada (caminhos EI1 e EI2), torna-se relevante o entendimento desses fatores e dos possíveis mecanismos intermediários existentes na associação entre o tempo de uso de mídias sociais e os sintomas depressivos. Assim, o EI1, mediado pela dependência de mídias sociais, pode indicar que indivíduos que permanecem mais tempo conectados tendem a ser mais dependentes 1818. Sahin S, Ozdemir K, Unsal A, Temiz N. Evaluation of mobile phone addiction level and sleep quality in university students. Pak J Med Sci 2013; 29:913-8.,2626. Parasuraman S, Sam AT, Yee SWK, Chuon BLC, Ren LY. Smartphone usage and increased risk of mobile phone addiction: a concurrent study. Int J Pharm Investig 2017; 7:125-31., com tendência a apresentar problemas emocionais e falta de prazer nas atividades diárias 2828. Bakken IJ, Wenzel HG, Götestam KG, Johansson A, Oren A. Internet addiction among Norwegian adults: a stratified probability sample study. Scand J Psychol 2009; 50:121-7.,4343. Di Nicola M, Ferri VR, Moccia L, Panaccione I, Strangio AM, Tedeschi D, et al. Gender differences and psychopathological features associated with addictive behaviors in adolescents. Front Psychiatry 2017; 8:256.. Além disso, a dependência de mídias sociais está associada com o “medo de perder algo”, caracterizado pelo desejo de estar continuamente inteirado das novidades 4444. Przybylski AK, Murayama K, DeHaan CR, Gladwell V. Motivational, emotional, and behavioral correlates of fear of missing out. Comput Human Behav 2013; 29:1841-8., e com a presença e a gravidade dos sintomas depressivos 4545. Elhai JD, Gallinari EF, Rozgonjuk D, Yang H. Depression, anxiety and fear of missing out as correlates of social, non-social and problematic smartphone use. Addict Behav 2020; 105:106335.. Ainda nesse contexto, é importante ressaltar que há uma tendência de os indivíduos dependentes sobreporem múltiplos vícios 4646. Greenberg JL, Lewis SE, Dodd DK. Overlapping addictions and self-esteem among college men and women. Addict Behav 1999; 24:565-71.. Desse modo, o consumo de substâncias como tabaco, álcool e drogas ilícitas podem predispor à dependência de mídias sociais 4747. Zenebe Y, Kunno K, Mekonnen M, Bewuket A, Birkie M, Necho M, et al. Prevalence and associated factors of internet addiction among undergraduate university students in Ethiopia: a community university-based cross-sectional study. BMC Psychol 2021; 9:4., assim como a dependência de mídias sociais pode desencadear o maior uso dessas substâncias 4141. Ilakkuvan V, Johnson A, Villanti AC, Evans WD, Turner M. Patterns of social media use and their relationship to health risks among young adults. J Adolesc Health 2019; 64:158-64.,4848. Vieira YP, Viero VSF, Saes-Silva E, Silva PA, Silva LS, Saes MO, et al. Uso excessivo de redes sociais por estudantes de ensino médio do sul do Brasil. Rev Paul Pediatr 2022; 40:e2020420.,4949. Mesas AE, Girotto E, Rodrigues R, Martínez-Vizcaíno V, Jiménez-López E, López-Gil JF. Ultra-processed food consumption is associated with alcoholic beverage drinking, tobacco smoking, and illicit drug use in adolescents: a nationwide population-based study. Int J Ment Health Addict 2023; https://link.springer.com/article/10.1007/s11469-023-01038-6.
https://link.springer.com/article/10.100...
. Logo, essa bidirecionalidade e a possível sobreposição desses comportamentos podem contribuir ainda mais para o aparecimento de sintomas depressivos 4141. Ilakkuvan V, Johnson A, Villanti AC, Evans WD, Turner M. Patterns of social media use and their relationship to health risks among young adults. J Adolesc Health 2019; 64:158-64..

Por sua vez, o EI2 aponta que a qualidade do sono também atua como mediadora na associação entre o tempo de uso de mídias sociais e os sintomas depressivos. Indivíduos que permanecem mais tempo conectados tendem a apresentar distúrbios do sono 77. Silva SS, Silveira MAC, Almeida HCR, Nascimento MCP, Santos MAM, Heimer MV. Use of digital screens by adolescents and association on sleep quality: a systematic review. Cad Saúde Pública 2022; 38:e00300721.,1717. Fobian AD, Avis K, Schwebel DC. The impact of media use on adolescent sleep efficiency. J Dev Behav Pediatr 2016; 37:9-14.,5050. Thomée S, Härenstam A, Hagberg M. Mobile phone use and stress, sleep disturbances, and symptoms of depression among young adults - a prospective cohort study. BMC Public Health 2011; 11:66.. Nesse contexto, recente revisão sistemática evidenciou que o uso de mídias digitais foi associado a menor duração e pior qualidade do sono 5151. Brautsch LA, Lund L, Andersen MM, Jennum PJ, Folker AP, Andersen S. Digital media use and sleep in late adolescence and young adulthood: a systematic review. Sleep Med Rev 2023; 68:101742.. Ainda, o uso do celular, principalmente no período noturno, está associado a menor qualidade e tempo de duração do sono, com mais despertares noturnos, maior latência do sono e sonolência diurna, que podem favorecer o desenvolvimento de sintomas depressivos 77. Silva SS, Silveira MAC, Almeida HCR, Nascimento MCP, Santos MAM, Heimer MV. Use of digital screens by adolescents and association on sleep quality: a systematic review. Cad Saúde Pública 2022; 38:e00300721.. Os efeitos do tempo de uso de mídias sociais sobre a qualidade do sono são atribuídos à exposição noturna à luz do smartphone, que pode afetar o sistema de temporização do ciclo sono-vigília e a liberação da melatonina, resultando em alterações psicológicas e elevados níveis de depressão 77. Silva SS, Silveira MAC, Almeida HCR, Nascimento MCP, Santos MAM, Heimer MV. Use of digital screens by adolescents and association on sleep quality: a systematic review. Cad Saúde Pública 2022; 38:e00300721.,5252. Cajochen C, Frey S, Anders D, Späti J, Bues M, Pross A, et al. Evening exposure to a light-emitting diodes (LED)-backlit computer screen affects circadian physiology and cognitive performance. J Appl Physiol 2011; 110:1432-8., além da associação entre o maior tempo de uso de mídias sociais e um menor tempo disponível para dormir 5353. Bhat S, Pinto-Zipp G, Upadhyay H, Polos PG. "To sleep, perchance to tweet": in-bed electronic social media use and its associations with insomnia, daytime sleepiness, mood, and sleep duration in adults. Sleep Health 2018; 4:166-73.,5454. Combertaldi SL, Ort A, Cordi M, Fahr A, Rasch B. Pre-sleep social media use does not strongly disturb sleep: a sleep laboratory study in healthy young participants. Sleep Med 2021; 87:191-202.. Ainda, destaca-se que os universitários correspondem a uma faixa etária com tendência à vespertinidade 5555. Druiven SJM, Riese H, Kamphuis J, Haarman BCM, Antypa N, Penninx BWJH, et al. Chronotype changes with age: seven-year follow-up from the Netherlands study of depression and anxiety cohort. J Affect Disord 2021; 295:1118-21.; assim, o desafio temporal que compreende o deitar-se tarde da noite e levantar-se cedo pela manhã para o início das aulas pode contribuir para a ocorrência de prejuízos nos padrões de sono 5656. Lima AMA, Varela GCG, Silveira HAC, Parente RDG, Araujo JF. Evening chronotypes experience poor sleep quality when taking classes with early starting times. Sleep Sci 2010; 3:45-8.. Por fim, embora haja evidências de associação entre dependência do celular e distúrbios do sono 1818. Sahin S, Ozdemir K, Unsal A, Temiz N. Evaluation of mobile phone addiction level and sleep quality in university students. Pak J Med Sci 2013; 29:913-8., neste estudo a percepção de dependência não interferiu na qualidade do sono, motivo pelo qual o caminho EI3, que passa por ambos os mediadores concomitantemente, não se mostrou significativo.

Além dos fatores estudados, ressalta-se a influência de outros mecanismos na associação entre o tempo de uso de mídias sociais e os sintomas depressivos, relacionados a alterações no comportamento devido ao uso de mídias sociais ou a alterações psicológicas advindas da exposição 4040. Brailovskaia J, Margraf J. Relationship between depression symptoms, physical activity, and addictive social media use. Cyberpsychol Behav Soc Netw 2020; 23:818-22.,5757. Pantic I, Damjanovic A, Todorovic J, Topalovic D, Bojovic-Jovic D, Ristic S, et al. Association between online social networking and depression in high school students: behavioral physiology viewpoint. Psychiatr Danub 2012; 24:90-3.,5858. Wang W, Wang M, Hu Q, Wang P, Lei L, Jiang S. Upward social comparison on mobile social media and depression: the mediating role of envy and the moderating role of marital quality. J Affect Disord 2020; 270:143-9.. Inicialmente, o maior tempo de uso de mídias sociais pode significar uma diminuição no tempo dedicado aos estudos, haja vista que o design das redes é projetado para ser atrativo e manter os usuários o máximo de tempo conectados 5959. Santos RO. Algoritmos, engajamento, redes sociais e educação. Acta Scientiarum Education 2022; 44:e52730., o que pode tornar esses estudantes mais suscetíveis a problemas acadêmicos e transtornos mentais 6060. Khoshakhlagh H, Faramarzi S. The relationship of emotional intelligence and mental disorders with internet addiction in internet users university students. Addict Health 2012; 4:133-41.. Ainda, indivíduos que passam mais tempo conectados se envolvem menos em outras atividades que proporcionam bem-estar, como atividades físicas 4040. Brailovskaia J, Margraf J. Relationship between depression symptoms, physical activity, and addictive social media use. Cyberpsychol Behav Soc Netw 2020; 23:818-22.,6161. Twenge JM, Joiner TE, Rogers ML, Martin GN. Increases in depressive symptoms, suicide-related outcomes, and suicide rates among U.S. adolescents after 2010 and links to increased new media screen time. Clin Psychol Sci 2017; 6:3-17. e interações sociais presenciais 6060. Khoshakhlagh H, Faramarzi S. The relationship of emotional intelligence and mental disorders with internet addiction in internet users university students. Addict Health 2012; 4:133-41.,6262. Sharma P, Sousa A. Internet addiction in adolescents - an overview. Indian J Ment Health 2016; 3:394-404., o que pode contribuir para o aumento de depressão 4040. Brailovskaia J, Margraf J. Relationship between depression symptoms, physical activity, and addictive social media use. Cyberpsychol Behav Soc Netw 2020; 23:818-22.,6060. Khoshakhlagh H, Faramarzi S. The relationship of emotional intelligence and mental disorders with internet addiction in internet users university students. Addict Health 2012; 4:133-41.,6161. Twenge JM, Joiner TE, Rogers ML, Martin GN. Increases in depressive symptoms, suicide-related outcomes, and suicide rates among U.S. adolescents after 2010 and links to increased new media screen time. Clin Psychol Sci 2017; 6:3-17.,6262. Sharma P, Sousa A. Internet addiction in adolescents - an overview. Indian J Ment Health 2016; 3:394-404..

As alterações psicológicas advindas da exposição às mídias sociais podem ser justificadas pelo consumo de determinados conteúdos, como aqueles que retratam realidades tidas como ideais (de beleza, moradia, viagens, consumo, entre outras) pelos padrões sociais hegemônicos, os quais provocam comparações que podem gerar, por sua vez, um sentimento de inferioridade, com consequentes efeitos negativos sobre a saúde mental dos indivíduos 5858. Wang W, Wang M, Hu Q, Wang P, Lei L, Jiang S. Upward social comparison on mobile social media and depression: the mediating role of envy and the moderating role of marital quality. J Affect Disord 2020; 270:143-9.,6363. He D, Shen X, Liu QQ. The relationship between upward social comparison on SNSs and excessive smartphone use: a moderated mediation analysis. Child Youth Serv Rev 2020; 116:105232.. Ademais, a exposição às mídias pode aumentar os níveis de insatisfação corporal, gerando impacto negativo na autoestima e no estado de humor 6464. Silva AFS, Japur CC, Penaforte FRO. Repercussões das redes sociais na imagem corporal de seus usuários: revisão integrativa. Psicol Teor Pesqui 2020; 36:e36510..

Ressalta-se que, para uma correta compreensão das associações identificadas, é importante avaliar os possíveis efeitos das variáveis com potencial efeito de confusão. Nesse sentido, parece haver uma intrincada rede de associações entre essas variáveis, na qual a inatividade física e o maior IMC parecem se associar de forma bidirecional 6565. Carrasquilla GD, García-Ureña M, Fall T, Sørensen TIA, Kilpeläinen TO. Mendelian randomization suggests a bidirectional, causal relationship between physical inactivity and adiposity. eLife 2022; 11:e70386., sendo mais observados em indivíduos que passam mais tempo conectados 3636. Kelishadi R, Mozafarian N, Qorbani M, Maracy MR, Motlagh ME, Safiri S, et al. Association between screen time and snack consumption in children and adolescents: the CASPIAN-IV study. J Pediatr Endocrinol Metab 2017; 30:211-9.,4040. Brailovskaia J, Margraf J. Relationship between depression symptoms, physical activity, and addictive social media use. Cyberpsychol Behav Soc Netw 2020; 23:818-22.,6666. Foubister C, Jago R, Sharp SJ, Sluijs EMFV. Time spent on social media use and BMI z-score: a cross-sectional explanatory pathway analysis of 10798 14-year-old boys and girls. Pediatr Obes 2023; 18:e13017. e apresentam sintomas depressivos 4040. Brailovskaia J, Margraf J. Relationship between depression symptoms, physical activity, and addictive social media use. Cyberpsychol Behav Soc Netw 2020; 23:818-22.,6666. Foubister C, Jago R, Sharp SJ, Sluijs EMFV. Time spent on social media use and BMI z-score: a cross-sectional explanatory pathway analysis of 10798 14-year-old boys and girls. Pediatr Obes 2023; 18:e13017., além de estar associada a uma pior qualidade do sono 6666. Foubister C, Jago R, Sharp SJ, Sluijs EMFV. Time spent on social media use and BMI z-score: a cross-sectional explanatory pathway analysis of 10798 14-year-old boys and girls. Pediatr Obes 2023; 18:e13017.,6767. Santos M, Sirtoli R, Rodrigues R, López-Gil JF, Martínez-Vizcaíno V, Guidoni CM, et al. Relationship between free-time physical activity and sleep quality in Brazilian university students. Sci Rep 2023; 13:6652.. Ainda, destaca-se que o consumo de substâncias, como tabaco, álcool e substâncias ilícitas, apresenta-se frequentemente associado, em uma relação bidirecional, com o uso de mídias sociais 4141. Ilakkuvan V, Johnson A, Villanti AC, Evans WD, Turner M. Patterns of social media use and their relationship to health risks among young adults. J Adolesc Health 2019; 64:158-64., a depressão 6868. Hambisa MT, Derese A, Abdeta T. Depressive symptoms among Haramaya University students in Ethiopia: a cross-sectional study. Depress Res Treat 2020; 2020:5027918. e a pior qualidade do sono 6969. Manzar D, Salahuddin M, Alamri M, Maru TT, Pandi-Perumal SR, Bahammam AS. Poor sleep in concurrent users of alcohol, khat, and tobacco smoking in community-dwelling Ethiopian adults. Ann Thorac Med 2018; 13:220-5.. Nota-se que muitas dessas associações puderam ser evidenciadas por meio de correlações nos resultados obtidos, por exemplo: entre IMC e inatividade física, menor dependência de mídias sociais, pior qualidade do sono e mais sintomas depressivos. Assim, embora estas análises tenham sido ajustadas por uma série de potenciais fatores de confusão, diante da complexa e multidirecional relação existente entre as variáveis principais e as covariáveis analisadas, é prudente considerar a possível persistência de confusão residual.

Este estudo apresenta algumas limitações que devem ser consideradas. Inicialmente, o desenho transversal não permite o estabelecimento de temporalidade, o que pode ocasionar viés de causalidade reversa. Ainda, ressalta-se o fato de serem variáveis autorreferidas, sendo o tempo de uso de mídias sociais e a dependência de mídias sociais estimados de forma subjetiva, podendo haver viés de informação. Também se considera como limitação o fato de não ter avaliado o tempo de uso que os participantes faziam em cada mídia social, a finalidade (estudos, lazer ou trabalho) e o conteúdo acessado, bem como variáveis relacionadas à percepção psicológica dos participantes, que poderiam aumentar o poder explicativo das análises. Contudo, destaca-se como fortalezas deste estudo o elevado número de participantes, a realização de análises ajustadas por possíveis fatores de confusão e a coesão entre os resultados encontrados e os mecanismos que explicam a associação entre o uso de mídias sociais e sintomas depressivos.

Para a confirmação dos resultados apresentados e aprofundamento do tema, considera-se relevante o desenvolvimento de estudos prospectivos, para explorar a causalidade da relação entre o tempo de uso de mídias sociais e os sintomas depressivos, bem como confirmar o possível papel da dependência de mídias sociais e da qualidade do sono nessa relação em jovens adultos. Além disso, julga-se importante que mais estudos sejam realizados levando em consideração o uso de cada mídia social separadamente, a finalidade e os conteúdos acessados, além de variáveis que possam indicar possíveis mecanismos mediadores por meio da alteração da percepção psicológica dos participantes.

Conclusão

Os resultados deste estudo indicam que a associação entre o tempo de uso de mídias sociais e os sintomas depressivos em universitários, independentemente de variáveis de confusão, é mediada pela dependência de mídias sociais e pela qualidade do sono. Os achados permitiram ampliar o conhecimento acerca de diferentes mecanismos que se influenciam mutuamente para explicar essa associação. Assim, estratégias devem ser adotadas para a redução dos danos, como campanhas para alertar sobre os efeitos nocivos do uso de mídias sociais na saúde mental, além da conscientização para reduzir o tempo de uso e organizar esse tempo para a realização de outras atividades que promovam bem-estar e incentivem uma melhora na qualidade do sono dos estudantes.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    31 Maio 2023
  • Revisado
    31 Out 2023
  • Aceito
    19 Dez 2023
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br