Resumo
O efeito placebo é um ponto de passagem obrigatório para a compreensão da racionalidade envolvida nos ensaios clínicos randomizados. A partir da antropologia da ciência e da tecnologia, este artigo analisa como a noção de efeito placebo tem sido utilizada pela ciência na produção de fronteiras biossociais. Assim, enfoca fenômenos que inicialmente eram atribuídos à imaginação e analisa as consequências de novas metodologias científicas que têm reconhecido outras potencialidades desse efeito, mas tendem a privilegiar marcadores biológicos. O argumento central é que a disputa epistemológica oculta a existência múltipla do efeito placebo que pode ser reconhecida em função das diferentes práticas às quais ele confere racionalidade.
Palavras-Chave:
Efeito placebo; Ensaios clínicos randomizados; Estudos científicos e tecnológicos; Medicina
Abstract
The placebo effect is an obligatory passage point to understand rationality in randomized clinical trials. From the perspective of science and technology studies, this paper analyzes how the notion of the placebo effect has been used by science in the production of biosocial borders. Thus, it will pay attention to the phenomena considered caused by imagination, and we will analyze the consequences of new methodologies that have recognized other potentialities of this effect but tend to favor biological markers. The central argument is that the epistemological dispute hides the multiple existences of the placebo effect to be recognized due to the different scientific practices to which it confers rationality.
Keywords:
Placebo effect; Randomized clinical trials; Science and technology studies; Medicine
Introdução
As publicações científicas sobre o efeito placebo em meados do século XX já reconheciam que o tema estava sendo pouco abordado diante de sua pertinência. O termo se tornou cada vez mais comum na literatura, mas diversas tentativas de conceituá-lo falharam em apresentar uma versão consistente (SARETTA, 2018SARETTA, M. E. Feitos e efeitos do placebo: corpo, dor e realidade a partir da Antropologia Social. Tese (Doutorado em Antropologia Social) - Programa de Pós-graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2018.). De modo geral, há um esforço científico em diferenciar o efeito placebo do resultado de tratamentos que seriam capazes de curarem por si mesmos, distinção que reivindica um privilégio ontológico assentado na delimitação de fronteiras biossociais. A partir da antropologia da ciência, iremos apresentar neste artigo como tais fronteiras vem sendo produzidas pela racionalidade científica cada vez mais centrada nos ensaios clínicos randomizados. Consideramos que alguns estudos recentes contribuem de forma decisiva para novas problematizações metodológicas, ainda que pareçam não extrair as consequências epistemológicas provocadas pelo entendimento do efeito placebo.
Diversos pesquisadores sugerem que a confusão sobre o significado desse efeito ocasiona a utilização indevida deste termo. Entretanto, a terminologia em torno do placebo está tão emaranhada à literatura científica que novas propostas encontram dificuldade de prosperarem, o que nos parece resultado da sua importância: mais do que um efeito marginal diante das ações medicamentosas, entendemos o efeito placebo como um “ponto de passagem obrigatório”11Esta noção de ponto de passagem obrigatório é indicada por John Law (1998, p. 71) no processo de tradução ao considerar o actante capaz de forçar outros a moverem-se ao largo de canais particulares e de obstruir o acesso a outras possibilidades, impondo-se sobre os demais. (LATOUR, 2000LATOUR, B. Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. Unesp, 2000., p. 230; LAW, 1998LAW, J. Del poder y sus tácticas. Un enfoque desde la sociologia de la ciência. In: DOMÈNECH, M.; TIRADO, F. X. (orgs.). Sociología simétrica: ensayos sobre ciencia, tecnologia y sociedad. Barcelona: Gedisa, 1998, p. 63-107., p. 71) para a racionalidade médico-científica. Dessa forma, esse efeito se constitui em um objeto privilegiado para uma análise dos meios racionais que autorizam determinadas práticas científicas.22Reconhecemos uma preocupação analítica similar àquela de Léon Chertok e Isabelle Stengers (1990, p. 64-65, grifos dos autores) quando afirmam que não estariam propriamente interessados em analisar o conteúdo da teoria freudiana, mas, sim, a “definição dos meios racionais passíveis de autorizar essa teoria”.
Estudos clínicos teriam demonstrado que o placebo age em múltiplos transtornos enquanto estudos laboratoriais teriam evidenciado a relevância do seu efeito em medidas comportamentais, autonômicas, endócrinas e imunes (WAGER; ATLAS, 2015WAGER, T.; ATLAS, L. The neuroscience of placebo effects: connecting context, learning and health. Nature Reviews Neuroscience, v. 16, n. 7, p. 403, 2015.). Embora atualmente haja restrições legais para a prescrição de placebos na prática clínica, há indicativos de que há situações nas quais medicações são utilizadas de maneira disfarçada na “função” placebo para algumas condições crônicas. A capacidade de mensuração é difícil, especialmente porque assumir tais prescrições sem anonimato poderia causar danos jurídicos aos envolvidos. Uma pesquisa survey respondida confidencialmente por médicos internistas e reumatologistas dos Estados Unidos da América, especialidades que frequentemente tratam de pacientes com condições crônicas debilitantes com reconhecida dificuldade de manejo, indica que aproximadamente a metade deles (46-58%, conforme a questão elaborada) prescreveria tratamentos do tipo placebo (TILBURT ., 2008TILBURT, J. et al. Prescribing “placebo treatments”: Results of National Survey of U.S. Internists and Rheumatologists. British Medical Journal, 2008.), resultado que seus autores reconhecem como sendo coerente com outros estudos.
Nos ensaios clínicos randomizados, metodologia de referência da medicina baseada em evidências, há o uso regular de placebos com o consentimento dos participantes. Prioriza-se que esses estudos sejam feitos em duplo-cego, condição na qual os profissionais também são desprovidos da informação acerca do procedimento durante sua realização. Ainda assim, há situações nas quais participantes e, sobretudo, profissionais reconhecem a substância ativa, muitas vezes em função dos efeitos colaterais (KIRSCH, 2016KIRSCH, I. The emperor’s new drugs: medication and placebo in the treatment of depression. In: Fundação Bial. Aquém e Além do Cérebro. Casa do Médico, Porto, 2016, p. 27-44.). A finalidade dos ensaios clínicos randomizados placebo-controlados é produzir comparações estatísticas acerca da capacidade da substância testada ser ou não mais eficaz do que o placebo. Esses resultados podem ser comparados com a ausência de intervenção, quando os estudos contam com um grupo para servir como referência ao que seria o curso natural da doença, embora o simples monitoramento por uma equipe de saúde não seja destituído de efeitos.
Como modelo explicativo do efeito do placebo, as análises científicas clássicas consideram dois mecanismos de ação: o efeito de expectativa (crença do paciente33Embora geralmente seja focado no paciente, é preciso destacar a influência da expectativa de quem realiza a prescrição. Uma revisão sistemática de ensaios clínicos indicou o aumento de 36% em média dos efeitos quando profissionais “não cegados” analisaram os dados em relação à análise dos profissionais “cegados” (Hróbjartsson et al., 2012). de que o procedimento irá melhorar seus sintomas) e o efeito condicionante (uma forma de aprendizado associativo do tipo estímulo-resposta). Considera-se atualmente que esses mecanismos podem interagir ou ser complementados por fatores como aprendizado, redução de ansiedade, memória, motivação, pensamento positivo, foco somático e influência de variações genéticas. Análises contemporâneas, especialmente aquelas que fazem uso de neuroimagem, destacam a existência de mecanismos neurobiológicos que propiciariam afirmar a existência de vários efeitos placebo, com diferentes mecanismos, agindo em diferentes sistemas fisiológicos e em pacientes com condições clínicas diversificadas (BENEDETTI, 2008BENEDETTI, F. Mechanisms of placebo and placebo-related effects across diseases and treatments. Annu. Rev. Pharmacol. Toxicol., v. 48, p. 33-60, 2008.; COLLOCA; BENEDETTI, 2005COLLOCA, L.; BENEDETTI, F. Placebos and painkillers: is mind as real as matter? Nature Reviews Neuroscience, v. 6, n. 7, p. 545, 2005.; KAPTCHUK ., 2009KAPTCHUK, T. et al. “Maybe I made up the whole thing”: placebos and patients’ experiences in a randomized controlled trial. Culture, Medicine, and Psychiatry, v. 33, n. 3, p. 382-411, 2009.; FINNISS et al., 2010; KIRSCH, 2010KIRSCH, I. The emperor's new drugs: Exploding the antidepressant myth. Basic Books: New York, 2010.).
Enquanto essas análises indicam a existência de efeitos placebo, no plural, devido à multiplicidade de mecanismos de ação, estudos antropológicos ou influenciados por essa disciplina têm insistido em considerar o efeito placebo uma categoria equivocada para a análise universal de fenômenos terapêuticos. Philippe Pignarre (1999, p. 147-148; 2001) sugere provocativamente que o efeito placebo não existe: o termo seria apenas um recurso fácil de linguagem para se referir a uma operação de socialização do medicamento no laboratório de estudo contra-placebo, no qual humanos e não-humanos são mobilizados por um dispositivo experimental que visa fazer a natureza falar. Alguns autores evocaram proposições de análise do efeito placebo como uma resposta de significado (MOERMAM, 2002) e parte indissociável de um ritual de cura (KAPTCHUCK, 2011), enquanto outras abordagens, influenciadas pela fenomenologia, buscaram se afastar da representação cognitiva e colocar o corpo no centro de suas análises (FRENKEL, 2008FRENKEL, O. A Phenomenology of the ‘Placebo Effect’: Taking Meaning from the Mind and the Body. J Med Philos., v. 33, p. 58-79, 2008.; THOMPSONTHOMPSON, J.; RITENBAUGH, C.; NICHTER, M. Reconsidering the placebo response from a broad anthropological perspective. Culture, Medicine, and Psychiatry, v. 33, n. 1, p. 112-152, 2009.et al., 2009).
Neste artigo, nossa análise antropológica se direcionará para a racionalidade científica produzida por alguns ensaios clínicos dedicados a entender o efeito placebo e determinar a realidade de sua ação. Sem pretensão de reconstituição histórica, abordaremos brevemente como o surgimento da racionalidade científica de análise terapêutica buscava distinguir fenômenos reais daqueles imaginários e a importância da noção de efeito placebo para a implementação sistemática dos ensaios clínicos randomizados na segunda metade do século XX. Em seguida, a análise se voltará para alguns ensaios contemporâneos, dedicados a repensar a capacidade de ação do efeito placebo por meio de novas metodologias e do uso da neuroimagem. Sugeriremos que esses novos experimentos são relevantes em novos modelos de compreensão terapêutica, mas seus esforços tendem a busca de um ponto de vista exterior no qual os marcadores biológicos seriam dotados de uma realidade superior.
Da realeza à realidade: a imaginação na investigação do fato científico
Na segunda metade do século XVIII, o médico Franz Anton Mesmer anunciou ter descoberto a existência de um fluido universal capaz de curar enfermidades por meio de um movimento de fluxo e refluxo que produziria o equilíbrio dos organismos.444 Para esta descrição do fluido anunciado por Mesmer, tomamos como referência as pesquisas de Chertok e Stengers (1990), Chiesa (2016) e Kaptchuk (1998a), as quais podem ser consultadas para detalhes. Para essa teoria, que ficou conhecida como magnetismo animal, os fluidos seriam capazes de produzir conexões sem haver nítida separação entre o ser, as forças que o afetam e o ambiente ao seu redor (CHIESA, 2016CHIESA, G. “Além do que se vê”: magnetismos, ectoplasmas e paracirurgias. Tese (doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia, do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2016., p. 31). Mesmer foi inicialmente ignorado pelas academias de ciências. Entretanto, suas práticas terapêuticas se propagaram pela França e tornaram-se uma possível ameaça à moral e à ordem política. Assim, em 1784, o rei Luís XVI nomeou uma comissão mista de investigação para determinar se os efeitos atribuídos ao magnetismo animal seriam devidos a alguma força real. Semanas depois, uma segunda comissão foi nomeada, composta por membros da Sociedade Real de Medicina.
As comissões analisaram as práticas do médico e ex-discípulo Charles Deslon, que estava disposto a compartilhar o seu saber com os investigadores para provar sua utilidade terapêutica. Os comissários reconheceram a existência de um grande poder que agitaria e dominaria os doentes, do qual o magnetizador parecia ser o originário. Como método, decidiram isolar o fenômeno em questão, pois entendiam que a multiplicidade dos efeitos constituiria um obstáculo para análise. Apenas Antoine Jussieu, médico e botânico integrante da segunda comissão, indicava que seria conveniente realizar as observações no local habitual.
Conforme destacam Chertok e Stengers (1990, p. 28), duas ideias de razão estavam em confronto: a do naturalista, que defendia a análise considerando a multiplicidade dos fenômenos; e a dos demais comissários, que, na condição de experimentadores, reivindicavam liberdade para intervir, observar ativamente e manipular os parâmetros para tentarem discernir possíveis causas e atestarem ou não a própria existência do fenômeno. Desse modo, as observações realizadas em público foram transformadas em experiências controladas em um ambiente pretensamente purificado de elementos ou substâncias que pudessem confundir a causa dos efeitos observados.
Para a análise, seria preciso que os corpos submetidos ao teste fossem testemunhas fiéis, que não mentissem e nem se iludissem a respeito dos efeitos sentidos. O método exigia corpos que não fossem afetados pelos preconceitos, pelas ilusões e pela imaginação – a saber, corpos abstratos, privados do sentido dado pelos corpos sensíveis ao que vivenciam (CHERTOK; STENGERS, 1990CHERTOK, L.; STENGERS, I. O coração e a razão, a hipnose de Lavoisier a Lacan. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1990., p. 33-35). Na condição de boas testemunhas, integrantes de uma das comissões se submeteram às ações do fluido. Foram realizados testes com doentes de diferentes grupos sociais bem como experimentos utilizando-se da vendagem dos olhos dos participantes e de procedimentos falsos (KAPTCHUK, 1998aKAPTCHUK, T. Intentional ignorance: a history of blind assessment and placebo controls in medicine. Bulletin of the History of Medicine, v. 72, n. 3, p. 389-433, 1998a., p. 395). Seguros do método, os comissários consideraram que o fluido não teria utilidade nem existência (CHIESA, 2016CHIESA, G. “Além do que se vê”: magnetismos, ectoplasmas e paracirurgias. Tese (doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia, do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2016., p. 49), porque seus efeitos seriam causados pela imaginação (CHERTOK; STENGERS, 1990CHERTOK, L.; STENGERS, I. O coração e a razão, a hipnose de Lavoisier a Lacan. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1990., p. 37; KAPTCHUK, 1998aKAPTCHUK, T. Intentional ignorance: a history of blind assessment and placebo controls in medicine. Bulletin of the History of Medicine, v. 72, n. 3, p. 389-433, 1998a., p. 396). Mesmo possuindo objeções aos resultados, Deslon chegou a questionar a razão pela qual os efeitos da imaginação seriam desprezados caso de fato fossem eles os responsáveis pela eficácia da ação sobre a saúde dos pacientes (CHIESA, 2016CHIESA, G. “Além do que se vê”: magnetismos, ectoplasmas e paracirurgias. Tese (doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia, do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2016., p. 51).
Porém, os membros da comissão não estavam preocupados em delimitar o poder da imaginação e nem em utilizá-la como um elemento de pesquisa e reflexão mas, sim, em eliminá-la em nome do que realmente deveria agir: o fluido magnético. Exceção era Jussieu, que realizou um contrarrelatório no qual sugeria ser mais conveniente realizar as observações no local onde rotineiramente ocorria o fenômeno, para se apreender nuances e observar os efeitos metodicamente. Chertok e Stengers (1990) sugerem que essa controvérsia seria menos sobre história das ideias do que história das práticas racionais. E argumentam que a medicina contemporânea dominante continuaria sem ser capaz de definir o que o botânico chamava de um procedimento de investigação metódica, que tomasse por objeto positivo o que parecia escapar às relações racionais de causa e efeito.
Inspirado nos comissários franceses, outro experimento foi realizado quase duas décadas depois na Inglaterra. A melhora nos sintomas dolorosos em testes com tractors, pequenas varas com pretenso valor curativo, também foi atribuída à imaginação, como John Haygarth (1800, tradução nossa)HAYGARTH, J. Of the Imagination as a Cause and as a Cure of Disorders of the Body: Exemplified by Fictitious Tractors, and Epidemical Convulsions. Lond. and Edinb. of the Royal Medical Society at Edinburgh, and of the American Academy of Arts and Sciences. R. Cruttwell, 1800. explicita no título da publicação dos resultados: “Da imaginação como uma causa e uma cura de distúrbios do corpo: exemplificado pelos tractors fictícios e convulsões epidêmicas”. Ambos experimentos são um marco epistemológico para o estabelecimento de práticas e critérios científicos de análise terapêutica associadas ao uso de placebos. Passados mais de dois séculos, os princípios mobilizados para a delimitação dos efeitos de procedimentos ainda parecem guardar semelhanças. Por ora, convém destacarmos que a necessidade de testemunhos dos sujeitos para determinadas análises parece um empecilho aos resultados de alguns ensaios clínicos, motivo pelo qual há uma expectativa contemporânea de que o uso da neuroimagem seja capaz de produzir uma emancipação desses testemunhos para a produção de evidências médicas.
O termo “efeito placebo” passou a ser aplicado às reações observadas pelas comissões francesas e por Haygarth somente nas primeiras décadas do século XX (BROWN, 2013BROWN, W. A. The Placebo Effect in Clinical Pratice. Oxford University Press: New York, p. 177, 2013., p. 14) e foi em 1938 que a palavra placebo apareceu pela primeira vez aplicada ao tratamento fornecido a grupos controle de ensaios clínicos (CRAEN et al., 1999, p. 512). Até a metade do século, quando o estabelecimento sistemático dos ensaios clínicos randomizados placebo-controlado se consolidou, a maior parte das terapias tinha sua eficácia medida mais em função de bases patofisiológicas racionais julgadas por clínicos do que por observações documentadas e pesquisas comparativas (CRAEN et al., 1999, p. 511).55Para uma análise do surgimento dos ensaios clínicos randomizados nos Estados Unidos, ver Marks (1997). Uma breve revisão histórica sobre os ensaios clínicos randomizados pode ser encontrada nos artigos de Meldrum (2000) e de Kaptchuck (1998a, 1998b) e em trechos específicos das teses antropológicas de Castro (2018) e Saretta (2018).
Nesse período, dependia-se da integridade e expertise de pesquisadores individuais para a produção de conhecimento sobre os efeitos dos tratamentos médicos. Como demonstra Harry Marks (1997)MARKS, H. M. The progress of experiment: science and therapeutic reform in the United States, 1900-1990. Cambridge University Press, 1997., os reformadores terapêuticos tentaram fornecer aos médicos um conhecimento cientificamente comprovado sobre o uso de drogas e seus efeitos, para que aprimorassem a prática terapêutica. Contudo, foi no contexto da Segunda Guerra Mundial que surgiram as condições necessárias para que a elite científica norte-americana direcionasse a conduta e estabelecesse a organização dessas pesquisas. Até 1945 o efeito placebo era moralmente útil, mas considerado inócuo. Porém, aproximadamente uma década depois, o potencial do placebo havia se tornado uma entidade poderosa capaz de imitar o efeito da droga (KAPTCHUK, 1998bKAPTCHUK, T. Powerful placebo: the dark side of the randomised controlled trial. The Lancet, v. 351, n. 9117, p. 1722-1725, 1998b., p. 1.722).66Segundo Suzanne White (1985, p. 52), em 1946, o placebo teria sido reconhecido como um campo legítimo de pesquisa, quando James Gold relatou efeitos de preparações inertes em pacientes durante uma pesquisa desenvolvida por ele mesmo. No entanto, o pioneiro em produzir métodos experimentais para novas drogas teria sido Arthur Hill, que teve sua mais importante publicação científica no ano de 1951, quando analisou fatores objetivos e subjetivos na avaliação da eficácia e segurança de uma droga.
Um marco na consolidação dessa mudança foi a publicação do artigo The Powerful Placebo, escrito por Henry Beecher (1955), embora, atualmente, haja um expressivo reconhecimento dos problemas metodológicos de sua análise, tais como a seleção de situações altamente placebo-respondedoras (BROWN, 2013BROWN, W. A. The Placebo Effect in Clinical Pratice. Oxford University Press: New York, p. 177, 2013., p. 25) e de estudos com ausência de grupo sem tratamento (CRAEN et al., 1999, p. 512). Suspeita-se, inclusive, que o autor tinha conhecimento de algumas limitações e as havia menosprezado, visto que o aumento do efeito placebo teria uma valiosa função retórica e científica de persuasão de colegas em favor do estabelecimento de ensaios clínicos randomizados como procedimento padrão (KAPTCHUK, 1998bKAPTCHUK, T. Powerful placebo: the dark side of the randomised controlled trial. The Lancet, v. 351, n. 9117, p. 1722-1725, 1998b.).
Ted Kaptchuk (1998b, p. 1724) considera que a convicção do sucesso da aplicação dos ensaios clínicos randomizados placebo-controlados em duplo-cego pelos pesquisadores de elite fez com que o método se tornasse mais importante do que o resultado terapêutico. No entanto, mais do que um método de experimentação que permite julgar a eficácia de uma terapêutica, é preciso compreendê-lo também como um poderoso produtor de racionalidade (PIGNARRE, 1999PIGNARRE, P. O que é o medicamento? Um objeto estranho entre ciência, mercado e sociedade. São Paulo: Editora 34, 1999., p. 118). Nesse sentido, Pignarre (1999) destaca que, mais do que contrapor um placebo frente a uma molécula, tais experimentos promovem um agenciamento original (placebo-molécula-ser humano). Assim, o que justificaria o experimento e seu dispositivo técnico é a comparação do efeito placebo não apenas com uma molécula, mas a “uma molécula à qual se acrescentou o efeito placebo” (PIGNARRE, 1999PIGNARRE, P. O que é o medicamento? Um objeto estranho entre ciência, mercado e sociedade. São Paulo: Editora 34, 1999., p. 26, grifos do autor). Conforme o autor, diferentemente dos objetivos de um laboratório clássico, tais experimentos não visariam nem compreender nem explicar um fenômeno, mas testá-lo a fim de obter um conjunto estatístico comparativo entre o placebo e uma molécula, por meio de um dispositivo experimental invariável.
No entanto, ensaios produzidos nos últimos anos têm tido a pretensão de compreender mecanismos fisiológicos, ambição amparada pelo uso de neuroimagem para a produção das análises, assim como pela modificação dos experimentos em busca de acessar marcadores biológicos destituídos do efeito da subjetividade, conforme será analisado nas seções seguintes.
Efeitos ocultos na racionalidade do efeito placebo
Em meados do século XX, já havia artigos científicos (LESLIE, 1954LESLIE, A. Ethics and practice of placebo therapy. The American journal of medicine, v. 16, n. 6, p. 854-862, 1954., p. 859; ANON, 1954ANON. The humble humbug. Lancet, v.2, p. 321-321, 1954., p. 321) que aconselhavam cores e formatos específicos para placebos devido às semelhanças com medicamentos. Dados de pesquisas contemporâneas (MOERMAN, 2002MOERMAN, D. Meaning, Medicine and the “placebo effect”. Cambrigde University Press, New York, p. 172, 2002.; BROWN, 2013BROWN, W. A. The Placebo Effect in Clinical Pratice. Oxford University Press: New York, p. 177, 2013.; KIRSCH, 2010KIRSCH, I. The emperor's new drugs: Exploding the antidepressant myth. Basic Books: New York, 2010.; KAPTCHUK ., 2006KAPTCHUK, T. et al. Sham device v inert pill: randomised controlled trial of two placebo treatments. BMJ, v. 332, n. 7538, p. 391-397, 2006.; JONAS et al., 2015) indicam que seus efeitos variam conforme a dose, o formato e a invasividade: a quantidade ingerida, a frequência do uso e as diferentes formas (injeção, pílulas, cápsulas, gotas, etc.) nas quais o placebo pode ser utilizado teriam diferentes resultados na melhora dos sintomas. Considerando a importância das materialidades para a instauração de existências de certos efeitos, apresentaremos a seguir alguns ensaios clínicos que tiveram como objetivo central analisar o próprio efeito placebo, mais do que simplesmente comparar estatisticamente o desempenho de um candidato a medicamento e um placebo. Por serem pesquisas que buscam inovações metodológicas, nos parecem importantes para a análise da racionalidade envolvida na compreensão do efeito placebo.
Em um estudo piloto com pacientes asmáticos, Wechsler e colegas (2011) compararam a inalação de um medicamento (albuterol) e de um placebo e a aplicação da acupuntura sham (simulação do procedimento) para um mesmo quadro clínico, ao mesmo tempo em que um grupo controle foi apenas monitorado, sem receber nenhum desses procedimentos. Conforme a mensuração feita a partir dos relatos dos participantes (classificada pelos autores como subjetiva), os efeitos dos três procedimentos teriam sido estatisticamente similares, significativamente melhores (aproximadamente o dobro de melhora) do que o grupo controle. Desse modo, seria possível concluir que o pretenso medicamento seria um placebo para a condição clínica testada, mas essa não foi a conclusão devido à mediação do espirômetro, equipamento capaz de medir o volume e o fluxo de ar que passa pelos pulmões. Por meio dessa medida (classificada pelos autores como objetiva), a inalação do medicamento teria melhorado em 20% a função pulmonar, enquanto a inalação do placebo, a sessão de acupuntura sham e o acompanhamento do grupo sem intervenção teriam ocasionado a melhora de aproximadamente 7% cada uma, embora os pacientes não tenham sido capazes de perceber em seus corpos tamanha diferença de efeito.
O desenho desse ensaio clínico indica que uma substância pode ser “placebo” conforme os critérios de medida e que o placebo pode ter uma eficiência significativamente superior à ausência de intervenção terapêutica, ainda que o fato de um candidato a medicamento ter desempenho similar ao placebo inviabilize sua comercialização farmacológica. O resultado desse estudo fez seus autores destacarem a importância da inclusão de um grupo não tratado nos ensaios clínicos para servir como referência analítica, posição já defendida há mais tempo por outros pesquisadores, como Peter Gøetzsche (1994, p. 926)GØTZSCHE, P. C. Is there logic in the placebo? Lancet, v.344, n. 8927, p. 925-926, 1994..
Considerando o referencial analítico da antropologia da ciência e da tecnologia, podemos entender o efeito do dispositivo acrescido neste teste como resultante de um processo de mediação (LATOUR, 2005LATOUR, B. Reassembling the social: An Introduction to Actor-Network-Theory. Oxford University Press, New York, 2005.).77Latour (2005) define o conceito de mediação em contraposição ao de intermediação. Intermediário seria aquilo que transporta significado ou força sem transformá-lo, enquanto o mediador ocasiona interferência, transforma, traduz, distorce e modifica significados ou elementos que veicula. Para as condições analisadas, o espirômetro fez existir o medicamento, isto é, sua intervenção transformou um “placebo” em medicamento. Diversas outras variáveis poderiam ser contempladas na análise terapêutica, as quais colocariam à prova os efeitos dos procedimentos sham e placebo. Por exemplo, se o benefício advindo desses procedimentos se sustentaria com o passar do tempo e/ou se tais usos, em contraste com o medicamento, ocasionariam um maior risco de crise asmática. Todavia, independentemente da “qualidade” do efeito placebo, buscamos destacar que os processos de racionalidade envolvidos nos testes são capazes de instaurar existências ou insistir em desistências. A pesquisa referida parece não ter voltado sua análise à reação dos participantes ao tomarem conhecimento dos resultados e o artigo não informa, por exemplo, se eles passaram a concordar com os profissionais, ou suspeitaram da capacidade de medida, porque confiariam mais na ação das agulhas e substâncias inaladas em seus próprios corpos do que nas medidas da espirometria.88Sobre essa hipótese, ver Saretta (2018), que, a partir de entrevistas qualitativas produzidas durante a realização de um ensaio clínico, descreve como algumas participantes procuravam medir os efeitos dos procedimentos testados em seus próprios corpos.
Reconhecemos o uso criativo da metodologia dos ensaios clínicos por parte dos proponentes desse estudo piloto que demonstrou a importância analítica de um grupo controle considerado sem intervenção. No entanto, se a adição do espirômetro ao experimento permitiu modificar os modos de existência dos procedimentos testados, propomos fazer mais adições para explorar outras articulações possíveis com esse dispositivo. Conforme informações de um manual com diretrizes para testes de função pulmonar:
[A espirometria] exige a compreensão e colaboração do paciente, equipamentos exatos e emprego de técnicas padronizadas aplicadas por pessoal especialmente treinado. Os valores obtidos devem ser comparados a valores previstos adequados para a população avaliada. Sua interpretação deve ser feita à luz dos dados clínicos e epidemiológicos. A responsabilidade para a realização, acurácia e interpretação da espirometria é prerrogativa dos pneumologistas. Médicos generalistas, mesmo treinados, realizam e interpretam frequentemente espirometria de modo inadequado (PEREIRA, 2002PEREIRA, C. A. Espirometria. J Pneumol 28 (Supl. 3), out. 2002., p. 2).
Sendo assim, a objetividade atribuída pelos autores também demandaria a exigência de colaboração do paciente e de treinamento especializado, fatores que podem ou não ser lembrados conforme a plausibilidade da análise quantitativa. No próprio tratamento para asma, como evidencia Dick Willems (1998), a intervenção de dispositivos também é parte das práticas relativas à doença, que produzem diferenças e similaridades entre casos do mesmo diagnóstico, bem como resultam em novas conexões entre órgãos e uma nova geografia do corpo, exigindo do médico também ser um especialista nas técnicas de inalação e apto a ensiná-las aos pacientes. Portanto, os dispositivos interferem no modo como a doença é concebida, nas diferenciações entre os diagnosticados, nas possibilidades de tratamentos e na própria definição do que é ou não um placebo.
Gostaríamos de destacar que, de modo geral, a racionalidade científica envolvida nos ensaios clínicos cria uma espécie de aliança absoluta com as substâncias ativas, enquanto deixa de explorar a capacidade dos corpos serem afetados por outras relações. Nesse sentido, a subjetividade do corpo vivo é colocada como obstáculo, por constituir um testemunho localizado:
O corpo vivo, sensível aos magnetizadores, charlatães e outros efeitos placebo, cria obstáculo à conduta experimental, que exige a criação de corpos com o poder de dar testemunho da diferença entre as “verdadeiras causas” e as aparências destituídas de interesse. A medicina, que extrai sua legitimidade do modelo teórico-experimental, tende a remeter esse obstáculo àquilo que resiste “ainda”, mas que um dia se submeterá (STENGERS, 2002STENGERS, I. A invenção das Ciências Modernas. São Paulo: Editora 34, 2002., p. 34).
A tentativa de isolar a subjetividade orienta-se pela pretensão de universalização dos resultados, ainda que os testes frequentemente não contemplem diversidade entre o público participante e que todas as terapêuticas consideradas bem-sucedidas sejam aplicadas associadas à subjetividade dos pacientes e dos profissionais.99A respeito de especificidades locais, ver Marley (2000) e Biehl e Petryna (2013).
Novos experimentos dedicados à compreensão do efeito placebo têm sido propostos com a pretensão de serem efetivos em anular a subjetividade dos participantes, mas seus efeitos também colocam em questão a própria objetividade dos ensaios clínicos, visto que exploram limites metodológicos vigentes. Em um artigo cujo título questiona se a mente seria tão real quanto a matéria, Luana Colloca e Fabrizio Benedetti (2005) apresentam dados de um ensaio clínico clássico de dor pós-operatória que haviam desenvolvido, no qual uma substância específica mostrara melhor desempenho do que o placebo na melhoria dos sintomas de dor enquanto o placebo fora superior à ausência de intervenção. Em princípio, esse resultado indicaria que a substância testada seria um bom analgésico e que o placebo seria um redutor de dor, especialmente pela indução de expectativa.
Entretanto, os pesquisadores extrapolaram os procedimentos metodológicos regulares, ao administrarem doses ocultas da referida substância, condição na qual as infusões eram controladas por computadores pré-programados para liberarem a droga sem que o paciente soubesse o momento exato e sem que visse a presença de um profissional de saúde para este fim. Nessa condição, a referida substância mostrou-se totalmente ineficiente. Desse modo, os autores concluíram que provavelmente o mecanismo de ação da substância testada não seria nas vias de dor mas, sim, nas vias de expectativa dos participantes, o que ocasionaria um aumento da resposta placebo-analgésica. Por isso, Colloca e Benedetti (2005, p. 546) enfatizam que essa substância induziria uma redução de dor se, e somente se, ela fosse associada a um procedimento placebo – o que demonstra que todo medicamento ativo é inevitavelmente acrescido do efeito placebo nos testes clínicos regulares (BEECHER, 1955BEECHER, H. The Powerful Placebo. The Journal of the American Medical Association, v. 159, n. 17, p. 1602-1606, 1955.; PIGNARRE 1999).
O efeito da seringa aplicada por uma mão humana (procedimento aberto) em contraposição à liberação de medicação intravenosa programada por computador (procedimento oculto) evidencia a importância das diferentes materialidades que se fazem presentes.1010Para análises de diferentes processos de materialização no tratamento terapêutico, ver Rohden (2018), Saretta (2018), Willems (1998) e Akrich (1995). No caso da administração de maneira oculta, a ausência do reconhecimento do procedimento poderia ser capaz de eliminar um efeito que teria sido comprovado como ativo pela metodologia regular dos ensaios clínicos. Embora os principais teóricos contemporâneos do efeito placebo reconheçam a diferença de efeito de acordo com variações tais como textura, sabor, cor, tamanho, formato, tipo de invasividade, parecem sugerir uma separação da materialidade quando afirmam, por exemplo, que “a administração de um placebo somente serve para imitar o contexto psicossocial. O placebo é inócuo, mas o contexto psicossocial não é” (FINNISS ., 2010FINNISS, D.; KAPTCHUK, T.; MILLER, F.; BENEDETTI, F. Biological, clinical, and ethical advances of placebo effects. The Lancet, v. 375, n. 9715, p. 686-695, 2010., p. 687, tradução nossa). É importante ressaltarmos que tal imitação do chamado contexto psicossocial exige mediação de objetos específicos – mesmo uma análise psicoterapêutica demanda, por exemplo, bancos, poltronas ou divãs, os quais podem, inclusive, indicar a linha teórica de atuação do terapeuta. Nesse sentido, a definição de contexto psicossocial parece imprecisa, compreendida por meio da negação ou do contraste com o que seria biológico, considerando a biologia como evidente por si mesma.
Orientados por seus experimentos, Colloca e Benedetti (2005, p. 546) defendem a urgente necessidade de compreensão dos mecanismos neurobiológicos da resposta placebo. Baseados no princípio de Heisenberg, propõem um “princípio de incerteza” aos ensaios clínicos: por princípio, uma perturbação dinâmica poderia ser induzida no cérebro, em experimentos científicos, por quase todo tipo de droga. A natureza dessa perturbação diz respeito à interferência, ou associação, de uma droga injetada com as redes de expectativas, as quais afetariam os padrões de medida e a interpretação dos dados. Por isso, sugerem que essa incerteza não pode ser resolvida por meio dos critérios de medida padrões dos ensaios clínicos, motivo pelo qual propõem o paradigma aberto-oculto, com a finalidade de tentar silenciar as expectativas dos participantes por meio da administração oculta, alternativa capaz de prescindir, inclusive, do uso de placebos. Sendo assim, concluem que um analgésico seria realmente efetivo somente se a redução da dor fosse correlata ao momento de liberação da droga (COLLOCA; BENEDETTI, 2005COLLOCA, L.; BENEDETTI, F. Placebos and painkillers: is mind as real as matter? Nature Reviews Neuroscience, v. 6, n. 7, p. 545, 2005., p. 550). Ao tentarem efetivar a separação dos efeitos farmacodinâmicos de uma droga do efeito de expectativa, os autores determinam que a efetividade real só poderia ser afirmada quando pretensamente destituída da subjetividade do participante – intenção de isolamento do fato científico nos procedimentos terapêuticos, tal qual o sonho das comissões francesas que investigaram o mesmerismo.
Sendo assim, o objetivo do paradigma aberto-oculto é anular mediações em favor das intermediações, pois se trata de uma tentativa de explorar a maneira pela qual os corpos são afetados por demarcadores exclusivamente biológicos, com a pretensão de reduzir as articulações ao corpo do participante, tornando-o menos sensível a efeitos não correspondentes à variável testada, apesar da proliferação de dispositivos necessários para atingir este fim. O fenômeno da disponibilidade dos corpos (DESPRET, 2004DESPRET, V. The body we care for: Figures of anthropo-zoo-genesis. Body & Society, v. 10, n. 2-3, p. 111-134, 2004.) para serem afetados por terapêuticas torna-se, assim, um investimento científico desprezado em favor da realidade. Em contraste, consideramos mais produtivo compreendermos o corpo pelo poder de afetar e ser afetado (DESPRET, 2004DESPRET, V. The body we care for: Figures of anthropo-zoo-genesis. Body & Society, v. 10, n. 2-3, p. 111-134, 2004.; DELEUZEDELEUZE, G. Espinosa: filosofia prática. São Paulo: Escuta, 2002., 2011, p. 128), abdicando de defini-lo em si mesmo, em favor de analisá-lo de maneira dependente das articulações que o constituem, da sua capacidade de ser afetado pelas diferenças, de “trazer a lume os componentes artificiais e materiais que permitem progressivamente adquirir um corpo” (LATOUR, 2008LATOUR, B. Como falar do corpo? A dimensão normativa dos estudos sobre a ciência. Objectos impuros: experiências em estudos sobre a ciência. Porto: Afrontamento, p. 39-61, 2008., p. 43, grifos do autor).
Ainda que o criativo experimento desenvolvido pelos proponentes do paradigma aberto-oculto permita uma visão crítica ao modelo de pesquisa dos ensaios clínicos e à compreensão científica dos mecanismos de ação de substâncias, sua proposição reivindica um privilégio ontológico. Sendo assim, o que gostaríamos de sugerir é que esta disputa epistemológica oculta intervenções ontológicas: os procedimentos metodológicos modificam existências do que é uma substância ativa e do que é um placebo. Diversas coordenações1111Utilizamos a noção de coordenação no sentido proposto por Annemarie Mol (2002) para se referir a multiplicidades que se articulam, conexões parciais que não dependem da referência a um objeto preexistente. (MOL, 2002MOL, A. The body multiple. Duke University Press, 2002.) são necessárias para que um placebo se comporte como placebo e uma substância ativa como ativa, visto que dependem de práticas que envolvem dispositivos, escolhas metodológicas, condições clínicas específicas. É neste sentido que o promissor experimento proposto pelos pesquisadores parece perder sua potência analítica, quando os autores reivindicam um olhar privilegiado de uma realidade independentemente das práticas que a constituem.
Efeitos da neuroimagem sobre o efeito placebo
As recentes pesquisas em neuroimagem, neurofisiologia e neurofarmacologia envolvendo o efeito placebo são vistas como promissoras para uma nova compreensão das interações entre a mente e o corpo (COLLOCA; BENEDETTI, 2005COLLOCA, L.; BENEDETTI, F. Placebos and painkillers: is mind as real as matter? Nature Reviews Neuroscience, v. 6, n. 7, p. 545, 2005.). Seus esforços contribuem com a tendência de que processos mentais sejam cada vez mais explicados como processos biológicos no cérebro (ROSE; ABI-RACHED, 2013ROSE, N.; ABI-RACHED, J. Neuro: the new brain sciences and the management of the mind. New Jersey, Princeton University Press, 2013.).1212A respeito da noção de cérebro social, ver Rose e Abi-Rached (2013) e Pitts-Taylor (2016). Para análises da concepção de um “sujeito cerebral”, ver Vidal (2005), Ehrenberg (2009), Ortega e Zorzanelli (2010), Azize (2010) e Russo (2017), que analisa a passagem do psíquico (compreensão psicológica de pessoa) ao somático (sujeito cerebral). Para uma análise de paradoxos em torno da imagem cerebral, ver Beaulieu (2002). Nesse sentido, neurocientistas que estudam o efeito placebo têm se dedicado a investigar como os sistemas cerebrais processam informações contextuais que influenciam em resultados clinicamente relevantes, o que permitiria ampliar a análise também para situações que não envolvem a administração de placebos (WAGER; ATLAS, 2015WAGER, T.; ATLAS, L. The neuroscience of placebo effects: connecting context, learning and health. Nature Reviews Neuroscience, v. 16, n. 7, p. 403, 2015., p. 404).
Apesar da proliferação de estudos neurobiológicos sobre o efeito placebo nos últimos anos, a elucidação dos mecanismos de ação é considerada como estando ainda em uma fase inicial de compreensão científica (COLLOCA; BENEDETTI, 2005COLLOCA, L.; BENEDETTI, F. Placebos and painkillers: is mind as real as matter? Nature Reviews Neuroscience, v. 6, n. 7, p. 545, 2005.; COLLOCA; MILLER, 2011COLLOCA, L.; MILLER, F. G. How placebo responses are formed: a learning perspective. Philosophical Transactions of the Royal Society of London B: Biological Sciences, v. 366, n. 1572, p. 1859-1869, 2011.; WAGER; ATLAS, 2015WAGER, T.; ATLAS, L. The neuroscience of placebo effects: connecting context, learning and health. Nature Reviews Neuroscience, v. 16, n. 7, p. 403, 2015.), diante da constatação de que não haveria um único processo ou sistema mediador de todos os efeitos do placebo e de que estes precisariam ser melhor investigados. Em um artigo de revisão, Wager e Atlas (2015) identificam três grandes objetivos no horizonte de tais estudos: prover medidas diretas dos processos cerebrais para determinados sintomas clínicos, identificar os sistemas funcionais engajados pelo tratamento com placebos (fornecendo, assim, informações sobre mecanismos de como cada contexto influenciaria a saúde e o bem-estar) e identificar características cerebrais que possam predizer a magnitude da resposta placebo individual, o que diferenciaria indivíduos placebo respondedores dos demais. Ainda que tais efeitos sobre as funções cerebrais venham sendo predominantemente investigados no contexto de situações dolorosas, alguns estudos indicariam diferentes modos de ação em doenças como Parkinson, Alzheimer e depressão (WAGER; ATLAS, 2015WAGER, T.; ATLAS, L. The neuroscience of placebo effects: connecting context, learning and health. Nature Reviews Neuroscience, v. 16, n. 7, p. 403, 2015., p. 407; FINNISS et al., 2010, p. 688).
O uso de neuroimagem na pesquisa sobre efeito placebo estaria permitindo a identificação de regiões cerebrais ativadas pela interação medicamentosa e pelo placebo, de modo que se percebeu que, em certos casos, a ação do placebo seria capaz de imitar a ação de uma droga específica (COLLOCA; MILLER, 2011COLLOCA, L.; MILLER, F. G. How placebo responses are formed: a learning perspective. Philosophical Transactions of the Royal Society of London B: Biological Sciences, v. 366, n. 1572, p. 1859-1869, 2011.; COLLOCA ., 2013COLLOCA, L.; KLINGER, R.; FLOR, H.; BINGEL, U. Placebo analgesia: psychological and neurobiological mechanisms. Pain, v. 154, n. 4, p. 511-514, 2013.; COLLOCA; BENEDETTI, 2005COLLOCA, L.; BENEDETTI, F. Placebos and painkillers: is mind as real as matter? Nature Reviews Neuroscience, v. 6, n. 7, p. 545, 2005.). Nesse sentido, conforme Colloca, Klinger, Flor e Bigel (2013), há evidências de casos relacionados à analgesia nos quais o placebo seria capaz de reproduzir um efeito similar ao das drogas, quando utilizado após um período de pré-exposição repetitiva a tratamentos farmacológicos. Esse seria um indicativo do potencial dos placebos induzirem efeitos fisiológicos específicos, por meio de processos de aprendizado, desencadeados por aspectos contextuais capazes de operarem mesmo fora do estado de consciência.
Conforme Finniss e colegas (2010), a maioria das pesquisas neurobiológicas de resposta placebo têm ênfase na analgesia placebo porque a neurobiologia dos efeitos placebo seria usualmente considerada em termos de mecanismos opiodérgicos e não opioidérgicos, o que explicaria o resultado de diversos estudos que demonstram que efeitos do placebo poderiam ser completa ou parcialmente revertidos por uma droga antagonista de opioide (naloxona). A introdução da neuroimagem permitiu mapear a localização de tais ações. Porém, estudos mais antigos já sugeriam mecanismos endógenos na ação do placebo.
Décadas atrás, em um ensaio clínico com pacientes que haviam passado por procedimento de extração dentária, Levine, Gordon e Fields (1978)LEVINE, J.; GORDON, N.; FIELDS, H. The mechanism of placebo analgesia. The Lancet, v. 312, n. 8091, p. 654-657, 1978. perceberam que aqueles que tiveram melhora da dor com o uso de placebos teriam regressão após a ingestão de naloxona, enquanto pacientes que não responderam ao placebo não teriam tido aumento da dor na mesma situação.1313Esse estudo fornecia uma explicação fisiológica para o efeito da melhora da dor e era coerente com a sugestão anteriormente feita por Lasagna (1965, p. 982) de que uma dose de oito miligramas de naloxona teria tido um desempenho pior do que o que seria esperado pelo placebo na melhora da dor, ainda que em outras dosagens os efeitos fossem confusos. Nesse período, havia o esforço científico da medicina comportamental em produzir uma síntese do corpo e da mente, motivo pelo qual Suzanne White (1985, p. 59)WHITE, S. Medicine's humble humbug: four periods in the understanding of the placebo. Pharmacy in history, v. 27, n. 2, p. 51-60, 1985. destaca essa pesquisa como parte do estabelecimento da centralidade bioquímica nos estudos do efeito placebo e sua boa recepção pela imprensa científica, o que teria colaborado para que os placebos fossem vistos de maneira menos suspeita e mais respeitável. Portanto, a neurociência estaria complementando e ampliando o escopo analítico de evidências prévias sobre esse mecanismo endógeno, o qual atualmente é bem reconhecido como um mecanismo de analgesia placebo (WAGER; ATLAS, 2015WAGER, T.; ATLAS, L. The neuroscience of placebo effects: connecting context, learning and health. Nature Reviews Neuroscience, v. 16, n. 7, p. 403, 2015., p. 409).
Gostaríamos de destacar que se o corpo demonstra alterações perceptíveis pelos padrões de medida devido a uma influência entendida como psicossocial de maneira similar ao que seria de responsabilidade bioquímica, novos demarcadores parecem entrar em ação. A ação endógena parece contribuir para evidenciar que a discussão do efeito placebo é parte da produção da fronteira corporal entre o que seria resultado da ação de uma substância (efeito exógeno), cujo caráter ativo é reconhecido, e o que seria ativado pela presença de um placebo (efeito endógeno), associado frequentemente a um efeito falso. Assim, mesmo que a produção de opioides endógenos só ocorra no momento analisado pela administração de um placebo, ela é considerada relativa ao próprio corpo.
De modo geral, o uso analítico da neuroimagem acerca da ação do placebo forneceu-lhe legitimidade ao reconhecer novos mecanismos de ação, mas também reforçou a tendência a se considerar as medidas (neuro)biológicas como aquelas verdadeiramente capazes de distinguir entre um efeito farmacológico e um efeito concebido como psicossocial.
Considerações finais
Ao longo do artigo, mostramos a centralidade do efeito placebo para as análises terapêuticas, perpassando discussões que foram da realeza à realidade, da imaginação à neuroimagem. Explorar racionalidades que estão sendo constituídas por meio de práticas científicas na análise da noção de efeito placebo permite que não nos restrinjamos ao que os placebos fazem aos participantes dos ensaios clínicos, mas analisemos também o que a noção de efeito placebo faz cientistas e médicos clínicos fazerem.
A apresentação dos resultados dos ensaios clínicos randomizados placebo-controlados costuma prescindir da problematização da categoria efeito placebo, performando os efeitos do placebo e do medicamento como unidades coerentes e estáveis a serem comparadas pela análise estatística. Entretanto, outros efeitos também podem ser relevantes na análise do efeito placebo, como indicamos ao longo do artigo. Sendo assim, se pesquisadores biomédicos contemporâneos sugerem a existência de múltiplos efeitos placebo devido à diversidade de mecanismos de ação, parece-nos possível afirmar a existência múltipla do efeito placebo em função das diferentes práticas científicas às quais confere racionalidade.
Agradecimento
Ao CNPq, pela concessão de bolsa de doutorado a Mário Eugênio Saretta durante período de pesquisa.
- 1Esta noção de ponto de passagem obrigatório é indicada por John Law (1998, p. 71) no processo de tradução ao considerar o actante capaz de forçar outros a moverem-se ao largo de canais particulares e de obstruir o acesso a outras possibilidades, impondo-se sobre os demais.
- 2Reconhecemos uma preocupação analítica similar àquela de Léon Chertok e Isabelle Stengers (1990, p. 64-65, grifos dos autores) quando afirmam que não estariam propriamente interessados em analisar o conteúdo da teoria freudiana, mas, sim, a “definição dos meios racionais passíveis de autorizar essa teoria”.
- 3Embora geralmente seja focado no paciente, é preciso destacar a influência da expectativa de quem realiza a prescrição. Uma revisão sistemática de ensaios clínicos indicou o aumento de 36% em média dos efeitos quando profissionais “não cegados” analisaram os dados em relação à análise dos profissionais “cegados” (Hróbjartsson ., 2012HRÓBJARTSSON, A. et al. Observer bias in randomised clinical trials with binary outcomes: systematic review of trials with both blinded and non-blinded outcome assessors. BMJ, v. 344, 2012.).
- 44 Para esta descrição do fluido anunciado por Mesmer, tomamos como referência as pesquisas de Chertok e Stengers (1990), Chiesa (2016) e Kaptchuk (1998a)KAPTCHUK, T. Placebo studies and ritual theory: a comparative analysis of Navajo, acupuncture and biomedical healing. Philosophical Transactions of the Royal Society B: Biological Sciences, v. 366, n. 1572, p. 1849-1858, 2011., as quais podem ser consultadas para detalhes.
- 5Para uma análise do surgimento dos ensaios clínicos randomizados nos Estados Unidos, ver Marks (1997). Uma breve revisão histórica sobre os ensaios clínicos randomizados pode ser encontrada nos artigos de Meldrum (2000)MELDRUM, M. L. A brief history of the randomized controlled trial: From oranges and lemons to the gold standard. Hematology/oncology clinics of North America, v. 14, n. 4, p. 745-760, 2000. e de Kaptchuck (1998a, 1998b) e em trechos específicos das teses antropológicas de Castro (2018)CASTRO, R. Precariedades oportunas, terapias insulares: Economias políticas da doença e da saúde na experimentação farmacêutica. Tese (Doutorado em Antropologia Social) - Programa de Pós-graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Brasília. Brasília, 2018. e Saretta (2018).
- 6Segundo Suzanne White (1985, p. 52), em 1946, o placebo teria sido reconhecido como um campo legítimo de pesquisa, quando James Gold relatou efeitos de preparações inertes em pacientes durante uma pesquisa desenvolvida por ele mesmo. No entanto, o pioneiro em produzir métodos experimentais para novas drogas teria sido Arthur Hill, que teve sua mais importante publicação científica no ano de 1951, quando analisou fatores objetivos e subjetivos na avaliação da eficácia e segurança de uma droga.
- 7Latour (2005) define o conceito de mediação em contraposição ao de intermediação. Intermediário seria aquilo que transporta significado ou força sem transformá-lo, enquanto o mediador ocasiona interferência, transforma, traduz, distorce e modifica significados ou elementos que veicula.
- 8Sobre essa hipótese, ver Saretta (2018), que, a partir de entrevistas qualitativas produzidas durante a realização de um ensaio clínico, descreve como algumas participantes procuravam medir os efeitos dos procedimentos testados em seus próprios corpos.
- 9A respeito de especificidades locais, ver Marley (2000)MARLEY, J. E. Efficacy, effectiveness, efficiency. Australian Prescriber, v. 23, n. 6, p. 114-115, 2000. e Biehl e Petryna (2013)BIEHL, J.; PETRYNA, A. (org.). When people come first: Critical Studies in Global Health. Princeton University Press: Princeton, 2013..
- 10Para análises de diferentes processos de materialização no tratamento terapêutico, ver Rohden (2018)ROHDEN, F. “Os Hormônios te Salvam de Tudo”: Produção de subjetividades e transformações corporais com o uso de recursos biomédicos. Mana, v. 24, n. 1, p. 199-229, 2018., Saretta (2018), Willems (1998WILLEMS, D. Inhaling Drugs and Making Worlds: The Proliferation of Lungs and Asthmas. In: BERG, M.; MOL, A. (Org). Differences in medicine: Unraveling practices, techniques, and bodies. Duke University Press, 1998, p. 105-118.) e Akrich (1995)AKRICH, M. Petite anthropologie du médicament. Techniques et culture, n. 5-26, p. 129-157, 1995..
- 11Utilizamos a noção de coordenação no sentido proposto por Annemarie Mol (2002) para se referir a multiplicidades que se articulam, conexões parciais que não dependem da referência a um objeto preexistente.
- 12A respeito da noção de cérebro social, ver Rose e Abi-Rached (2013) e Pitts-Taylor (2016)PITTS-TAYLOR, V. The brain's body: Neuroscience and corporeal politics. Durham and London: Duke University Press, 2016.. Para análises da concepção de um “sujeito cerebral”, ver Vidal (2005)VIDAL, F. O sujeito cerebral: um esboço histórico e conceitual. Revista Polis e Psique, v. 1, n. 1, p. 169, 2011., Ehrenberg (2009)EHRENBERG, A. O sujeito cerebral. Psicologia clínica, v. 21, n. 1, p. 187-213, 2009., Ortega e Zorzanelli (2010)ORTEGA, F.; ZORZANELLI, R. A cerebralização da fadiga: uma análise da hipótese cerebral no caso da síndrome da fadiga crônica. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, v. 17, n. 2, p. 289-305, 2010., Azize (2010)AZIZE, R. O cérebro como órgão pessoal: uma antropologia de discursos neurocientíficos. Trabalho, Educação e Saúde, v. 8, n. 3, p. 563-574, 2010. e Russo (2017)RUSSO, J. Do psíquico ao somático: notas sobre a reconfiguração do self contemporâneo. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, v. 24, n. 1, p. 157-169, 2017., que analisa a passagem do psíquico (compreensão psicológica de pessoa) ao somático (sujeito cerebral). Para uma análise de paradoxos em torno da imagem cerebral, ver Beaulieu (2002)BEAULIEU, A. Images are not the (only) truth: Brain mapping, visual knowledge, and iconoclasm. Science, Technology, & Human Values, v. 27, n. 1, p. 53-86, 2002..
- 13Esse estudo fornecia uma explicação fisiológica para o efeito da melhora da dor e era coerente com a sugestão anteriormente feita por Lasagna (1965, p. 982)LASAGNA, L. Drug interaction in the field of analgesic drugs. Proceedings of the Royal Society of Medicine, p. 978-983, 1965. de que uma dose de oito miligramas de naloxona teria tido um desempenho pior do que o que seria esperado pelo placebo na melhora da dor, ainda que em outras dosagens os efeitos fossem confusos.
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Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
15 Maio 2023 - Data do Fascículo
2023
Histórico
- Recebido
03 Fev 2021 - Revisado
01 Jul 2021 - Aceito
31 Maio 2022