Diferenças regionais e fatores associados à prática de atividade física no lazer no Brasil: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde-2013

Grégore Iven Mielke Deborah Carvalho Malta Gisele Balbino Araújo Rodrigues de Sá Rodrigo Siqueira Reis Pedro Curi Hallal Sobre os autores

RESUMO:

Objetivo:

Analisar as diferenças regionais e os fatores associados à prática de atividade física no lazer em adultos participantes da Pesquisa Nacional de Saúde, de 2013.

Métodos:

Este estudo foi realizado com os dados da Pesquisa Nacional de Saúde, realizada em 2013 com uma amostra aproximada de 63.000 adultos (18+ anos). Para cada uma das cinco regiões do Brasil foi calculada a prevalência de adultos ativos no lazer, sendo classificados como ativos aqueles participantes que praticaram pelo menos 150 minutos por semana de atividades físicas no lazer.

Resultados:

A prevalência de ativos no lazer variou de 21,9% no Sul a 24,4% no Centro-Oeste. Homens foram 1,48 (IC95% 1,40 - 1,57) vezes mais ativos que as mulheres, sendo a região Norte aquela que apresentou maior diferença entre sexos. A prevalência de ativos foi 67% menor entre aqueles com 75+ anos quando comparado ao grupo de 18-24 anos, sendo que esta diferença foi mais acentuada na região Norte. Aqueles com maior grau de instrução foram, em média, três vezes mais ativos que os participantes com menor grau de instrução. Em termos de grau de instrução, a menor diferença observada ocorreu no Nordeste.

Conclusões:

Apesar das pequenas variações na prevalência de prática de atividade física no lazer entre as regiões, quando são considerados subgrupos populacionais, diferenças importantes são observadas. Estes resultados sugerem a necessidade de ações de promoção de atividade física com diferentes abordagens em cada uma das cinco regiões do Brasil.

Palavras-chave:
Atividade física; Promoção da saúde; Inquéritos epidemiológicos; Doenças crônicas; Esportes; Atividades de lazer; Acesso aos serviços de saúde.

INTRODUÇÃO

Devido às doenças do aparelho circulatório serem a principal causa de morte no Brasil11. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Saúde Brasil 2013: uma análise da situação de saúde e das doenças transmissíveis relacionadas à pobreza. Brasília: Ministério da Saúde; 2014. 22. Malta DC, de Moura L, Prado RR, Escalante JC, Schmidt MI, Duncan BB. Mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis no Brasil e suas regiões, 2000 a 2011. Epidemiol Serv Saúde 2014; 23(4): 599-608, a promoção de atividade física tem integrado a agenda de enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis adotada pelo país nos últimos anos33. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política Nacional de Promoção da Saúde. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_promocao_saude_3ed.pdf (Acessado em 17 de novembro de 2014).
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44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2011 Disponível em: Disponível em: http://www.sbn.org.br/noticias/acoes_estrategicas.pdf (Acessado em 17 de junho de 2012).
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. Assim, dentro da perspectiva de gestão do setor de saúde, o conhecimento do padrão de atividade física existente e dos grupos populacionais com maior risco para esta condição torna-se de grande importância. Diversos estudos têm investigado os determinantes e correlatos sociodemográficos, ambientais e comportamentais da prática de atividade física em diferentes localidades geográficas e em diferentes regiões. Em geral, tais estudos têm demonstrado que homens, adultos jovens e com maior escolaridade compõem os grupos populacionais com maior prevalência de prática de atividade física no lazer55. Hallal PC, Andersen LB, Bull FC, Guthold R, Haskell W, Ekelund U, et al. Global physical activity levels: surveillance progress, pitfalls and prospects. Lancet 2012; 380: 20-30. 66. Bauman AE, Reis RS, Sallis JF, Wells JC, Loos RJ, Martin BW; Lancet Physical Activity Series Working Group. Correlates of physical activity: why are some people physically active and others not? Lancet 2012; 380(9838): 258-71..

A pesquisa em atividade física no Brasil, sobretudo acerca de correlatos e descrição de prevalências, é vasta77. Ramires VV, Becker LA, Sadovsky ADI, Zago AM, Bielemann RM, Gerra PH. Evolução da pesquisa epidemiológica em atividade física e comportamento sedentário no Brasil: atualização de uma revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fis Saude 2014; 19(5): 529-47. 88. Knuth AG, Malta DC, Dumith SC, Pereira CA, Morais Neto OL, et al. Practice of physical activity and sedentarism among Brazilians: results of the National Household Sample Survey - 2008. Cien Saude Colet 2011; 16(9): 3697-705 99. Mielke GI, Hallal PC, Rodrigues GBA, Szwarcwald CL, Santos FV, Malta DC. Prática de atividade física e tempo assistindo televisão de adultos no Brasil: Pesquisa Nacional de Saúde-2013. Epidemiol Serv Saúde 2015; 24(2): 277-86.. Entretanto, apesar do grande número de estudos, ainda existem lacunas na área, especialmente em relação às regiões Norte e Centro-Oeste77. Ramires VV, Becker LA, Sadovsky ADI, Zago AM, Bielemann RM, Gerra PH. Evolução da pesquisa epidemiológica em atividade física e comportamento sedentário no Brasil: atualização de uma revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fis Saude 2014; 19(5): 529-47.. Com a realização da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), torna-se possível a comparação da prática de atividade física entre as regiões, sendo possível compreender eventuais diferenças existentes entre grupos populacionais. Além disso, a avaliação destas diferenças é fundamental para orientar e subsidiar a elaboração de políticas e programas de promoção de atividade física, nas três esferas de gestão, de modo a responder às necessidades e especificidades da população nas diferentes regiões.

Dessa forma, o objetivo do presente estudo foi analisar as diferenças regionais e os fatores associados à prática de atividade física no lazer de adultos participantes da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013.

MÉTODOS

Para a condução deste estudo, foram utilizadas informações coletadas na Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), a qual foi idealizada e conduzida por meio de um convênio entre o Ministério da Saúde e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esta é uma pesquisa de base domiciliar e torna-se parte do Sistema Integrado de Pesquisas Domiciliares do IBGE, sendo linha de base para o monitoramento das doenças e agravos não transmissíveis, bem como seus fatores de risco no Brasil.

Detalhes metodológicos, operacionais e logísticos da PNS podem ser obtidos no relatório oficial da pesquisa1010. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2014. Disponível em: Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/pns/2013/ (Acessado em 08 de janeiro de 2015).
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. Resumidamente, o processo amostral realizado na PNS teve como população alvo os adultos com 18 anos ou mais residentes em domicílios particulares do Brasil, com exceção de adultos residentes em quartéis, bases militares, alojamentos, acampamentos, embarcações, penitenciárias, colônias penais, presídios, cadeias, asilos, orfanatos, conventos e hospitais. A seleção da amostra foi realizada em três estágios, com setores censitários, domicílios e moradores com 18 anos ou mais de idade como unidade primária, secundária e terciária, respectivamente. Para cada domicílio selecionado, foi entrevistado um adulto com 18 anos ou mais, o qual foi selecionado de forma equiprobabilística entre todos os adultos residentes no domicílio. O adulto selecionado respondeu três questionários, sendo um contendo informações do domicílio, outro com informações sobre o estado de saúde dos demais moradores e um questionário sobre estilo de vida e estado de saúde, no qual as questões relacionadas à prática de atividade física estavam incorporadas.

Para mensurar a prática de atividade física no lazer, foram utilizadas as seguintes perguntas:

  1. 1. "Nos últimos três meses, o(a) Sr(a). praticou algum tipo de exercício físico ou esporte?";

  2. 2. "Qual o tipo principal de exercício físico ou esporte que o(a) Sr(a). praticou?";

  3. 3. "O(a) Sr(a) pratica o exercício pelo menos uma vez por semana?";

  4. 4. "Quantos dias por semana o(a) Sr(a). costuma praticar exercício físico ou esporte?";

  5. 5. "No dia que o(a) Sr(a). pratica exercício ou esporte, quanto tempo dura esta atividade?".

Foi construído um escore semanal de prática de atividade física, no qual o tempo despendido nas atividades foi multiplicado pelo número de dias. Para os participantes que referiram ter praticado corrida, ginástica aeróbica/spinning/step/jump, futebol, basquete ou tênis o tempo relatado foi multiplicado por dois, devido a estas atividades serem consideradas atividades físicas vigorosas. Esta estratégia tem como objetivo incorporar as sugestões de prática de atividade física em pelo menos 150 minutos semanais de atividades moderadas ou 75 minutos semanais de atividades vigorosas. Foram classificados como ativos no lazer aqueles participantes que relataram praticar pelo menos 150 minutos por semana de atividades físicas no lazer.

Inicialmente, para cada uma das cinco grandes regiões foi calculada a prevalência de ativos no lazer de acordo com sexo (masculino; feminino), grupos de idade (18 - 24; 25 - 34; 35 - 44; 45 - 54; 55 - 64; 65 - 74; 75+ anos) e grau de instrução classificada como

  • • Grau I - Sem instrução e fundamental incompleto;

  • • Grau II - Fundamental completo e médio incompleto;

  • • Grau III - Médio completo e superior incompleto;

  • • Grau IV - Superior completo.

Para a comparação do grau de diferença entre a prática de atividade física no lazer entre grupos de idade e escolaridade, foi utilizado o método gráfico equiplot , o qual foi desenvolvido pelo Centro Internacional de Equidade em Saúde (www.equidade.org). Num segundo momento, foram calculadas as razões de prevalência bruta e ajustada, bem como os respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%) para cada uma das variáveis independentes. Para isto, foram conduzidas análises de regressão de Poisson. As análises foram realizadas no pacote estatístico Stata, versão 12.1. Em todas as análises realizadas foi utilizado o comando svy , a fim de considerar os pesos amostrais e expandir os resultados para a população brasileira. Todos os indivíduos entrevistados foram consultados, esclarecidos e aceitaram participar da pesquisa mediante assinatura de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A PNS foi aprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, sob o número 328.159 de 26 de junho de 2013.

RESULTADOS

Foram elegíveis para participar da PNS 81.167 domicílios distribuídos em todas as grandes regiões do Brasil. Do universo selecionado, foram entrevistados 60.202 adultos com 18 anos ou mais, havendo dados válidos sobre prática de atividade física para 59.667 participantes. A amostra entrevistada foi composta por 52% de mulheres. A proporção de participantes com 75 anos ou mais foi em torno de 5%, variando 2,7% na região Norte a 5,2% na região Sudeste. Pouco mais de 12% da amostra tinha Grau IV de instrução (ensino superior completo), com 8,3% no Nordeste e 15,5% no Sudeste.

A Tabela 1 apresenta a prevalência de ativos no lazer de acordo com sexo, grupos de idade e grau de instrução para o Brasil e cada uma das cinco grandes regiões. Em todas as regiões, a prevalência de ativos no lazer foi maior entre os homens, os mais jovens e aqueles com maior grau de instrução. Em torno de 27% dos homens foram classificados como ativos no lazer, com pequena variação nesta prevalência entre as cinco grandes regiões.

Tabela 1:
Descrição da prática de atividade física no lazer de acordo com variáveis sociodemográfias no Brasil e grandes regiões. Pesquisa Nacional de Saúde, 2013.

A região Sudeste foi aquela com a maior prevalência de ativos no lazer entre os participantes com idade entre 18 e 24 anos (38,1%). Entre aqueles com 75 anos ou mais a prevalência de ativos no lazer variou entre 2,2% na região Norte e 12,4% na região Centro-Oeste. A região Centro-Oeste também foi aquela que apresentou a maior prevalência de ativos no lazer entre os entrevistados com o maior grau de instrução. Observou-se que o grau de diferença na prática de atividade física entre grupos de idade foi maior na região Norte, sendo a região Sul aquela com a menor diferença. Finalmente, a prática de atividade física no lazer de acordo com o grau de instrução, não apresentou grande variação regional (Figura 1).

Figura 1:
Diferenças na prática de atividade física no lazer no Brasil de acordo com (A) grupos de idade; (B) grau de instrução. Pesquisa Nacional de Saúde, 2013.

As análises de associação bruta e ajustada entre a prática de atividade física no lazer e as variáveis sociodemográficas são apresentadas, respectivamente, na Tabelas 2 e 3. Em geral, a prevalência de atividade física entre os homens foi em torno de 50% maior quando comparada à das mulheres, com exceção da região Norte, na qual os homens foram, praticamente, duas vezes mais ativos que as mulheres. Considerando toda a amostra, as regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste apresentaram menor diferença na prática entre grupos etários. Em relação ao grau de instrução, a análise ajustada mostrou que, no conjunto da amostra, os participantes com maior grau de instrução (Grau IV) foram 3,03 (IC95% 2,78 - 3,29) vezes mais ativos no lazer quando comparados àqueles com menor instrução (Grau I). A região Nordeste foi a que apresentou menor diferença relativa na prática de atividade física entre participantes com maior e menor grau de instrução.

Tabela 2:
Associação bruta entre prática de atividade física no lazer e variáveis sociodemográfias no Brasil e grandes regiões do Brasil. Pesquisa Nacional de Saúde, 2013.
Tabela 3:
Associação ajustada* entre prática de atividade física no lazer e variáveis sociodemográfias no Brasil e grandes regiões do Brasil. Pesquisa Nacional de Saúde, 2013.

DISCUSSÃO

Os resultados do presente estudo mostraram que, aproximadamente, um em cada cinco adultos brasileiros praticou atividade física no lazer de acordo com o preconizado pelas recomendações internacionais, sendo baixa a variação desta prática entre as cinco grandes regiões do Brasil. Como esperado, os homens, os mais jovens e aqueles com maior grau de instrução foram mais ativos no lazer independente da região analisada. Entretanto, importantes variações foram observadas em relação ao sexo, idade e grau de instrução entre as regiões do Brasil.

Não é novidade na literatura científica que indivíduos mais jovens e com maior escolaridade são aqueles que apresentam as maiores prevalência de atividade física quando comparados aos seus pares, inclusive no Brasil55. Hallal PC, Andersen LB, Bull FC, Guthold R, Haskell W, Ekelund U, et al. Global physical activity levels: surveillance progress, pitfalls and prospects. Lancet 2012; 380: 20-30. 66. Bauman AE, Reis RS, Sallis JF, Wells JC, Loos RJ, Martin BW; Lancet Physical Activity Series Working Group. Correlates of physical activity: why are some people physically active and others not? Lancet 2012; 380(9838): 258-71.. As diferenças encontradas em relação à idade podem ser explicadas por fatores que variam desde questões biológicas até aspectos socioambientais. As limitações impostas pela idade e a carga de doenças podem ser um dos fatores que explicam as menores prevalências de atividade física no lazer entre esses grupos. Além do mais, indivíduos mais velhos tendem a perceber menos a prática regular de atividade física como um fator importante para a saúde quando comparados aos mais jovens1111. Reichert FF, Domingues MR, Hallal PC, Azevedo MR, Siqueira FV, Barros AJD. Priorities in health: what do they mean to Brazilian adults? Cad Saúde Pública 2010; 26(4): 775-85. 1212. Siqueira FV, Nahas MV, Facchini LA, Silveira DS, Piccini RX, Tomasi E, et al . Factors considered important for health maintenance by the population. Rev Saúde Pública 2009; 43(6): 961-71.. Cabe destacar que aspectos ambientais também podem interagir com a idade na relação com a atividade física no lazer. Por exemplo, Rech et al.1313. Rech CR, Reis RS, Hino AA, Hallal PC. Personal, social and environmental correlates of physical activity in adults from Curitiba, Brazil. Prev Med 2014; 58: 53-7, ao analisarem os correlatos sociais e ambientais da prática de atividade física em adultos residentes em Curitiba, mostraram que a maior segurança contra crimes foi um preditor da prática de atividade física apenas entre os participantes mais velhos1313. Rech CR, Reis RS, Hino AA, Hallal PC. Personal, social and environmental correlates of physical activity in adults from Curitiba, Brazil. Prev Med 2014; 58: 53-7. Dessa forma, um mesmo grau de exposição ambiental relacionado à segurança pode influenciar negativamente na prática de atividade física em indivíduos mais velhos; porém, pode não interferir entre os mais jovens, corroborando com as diferenças nos níveis de atividade física no lazer entre grupos etários.

No presente estudo, observou-se que as regiões Norte e Nordeste foram aquelas que apresentaram as maiores diferenças na prática de atividade física no lazer entre grupos de idade, enquanto que a região Sul foi aquela que apresentou a menor diferença. Podemos analisar estes resultados na perspectiva da grande disparidade na expectativa de vida entre as regiões. Considerando os resultados da Pesquisa Nacional de Saúde, observamos que o percentual de participantes com 75 anos ou mais foi duas vezes maior nas regiões Sul e Sudeste, quando comparado à região Norte. Dessa forma, as diferenças encontradas podem ser devido à diferença de estrutura etária, com maior presença de população jovem na região Norte, mas também deve ser considerada a possibilidade de maior grau de incapacidade devido à idade na região.

Apesar do avanço e do enfrentamento às desigualdades socioeconômicas ocorridas nas últimas décadas, ainda hoje, o Brasil apresenta grandes desigualdades1414. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Séries históricas e estatísticas.; Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística 2014. Disponível em Disponível em http://seriesestatisticas.ibge.gov.br/lista_tema.aspx?op=0&de=16&no=6 (Acessado em 27 de março de 2015)
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, tornando-se um grande desafio para a gestão do setor de saúde e outros setores. No que tange a prática de atividade no lazer, as desigualdades existentes têm forte relação com aspectos que aumentam a chance de indivíduos praticarem mais ou menos atividade física, sobretudo devido aos aspectos relacionados a oportunidades de acesso a espaços propícios para a prática, os quais, no Brasil, ainda são na grande maioria espaços privados. Por exemplo, Reichert et al.1515. Reichert FF, Barros AJD, Domingues MR, Hallal PC. The Role of Perceived Personal Barriers to Engagement in Leisure-Time Physical Activity. Am J Public Health 2007; 97(3): 515-9, ao analisarem barreiras para a prática de atividade física entre adultos residentes em uma cidade do Sul do Brasil, mostraram que a falta de dinheiro foi duas vezes mais relatada como uma barreira para a prática de atividade física entre participantes de menor classificação socioeconômica quando comparado aos seus pares. Por outro lado, no mesmo estudo, os autores encontraram que não gostar de praticar atividade física foi relatado em semelhante proporção entre os mais ricos e mais pobres.

A discussão sobre desigualdades socioeconômicas na prática de atividade física pode ocorrer sob diferentes panos de fundo. Numa perspectiva de prevenção e combate a doenças crônicas não transmissíveis, a menor prática de atividade física pode ser um dos fatores associados às maiores taxas de morte cardiovascular prematura, sendo mais frequente entre indivíduos que vivem em piores condições socioeconômicas. Estudo conduzido por Nogueira et al.1616. Nogueira MC, Ribeiro LC, Cruz OG. Desigualdades sociais na mortalidade cardiovascular precoce em um município de médio porte no Brasil. Cad Saúde Pública 2009; 25(11): 2321-32 mostrou que moradores da cidade de Juiz de Fora (MG) que viviam em áreas com melhores condições socioeconômicas tinham significativamente menores taxas de mortalidade cardiovascular prematura que seus pares. Estudos realizados em outros países têm encontrado resultados semelhantes1717. Singh GK, Siahpush M. Increasing inequalities in all cause and cardiovascular mortality among US adults aged 25-64 years by area socioeconomic status, 1969-1998. Int J Epidemiol 2002; 31(3): 600-13. 1818. Malta, DC, Silva Jr, JB. Policies to promote physical activity in Brazil. Lancet 2012; 380(9838): 195-6..

Dada a importância da prática de atividade física no enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis, nos últimos anos, o Brasil tem avançado no incentivo a iniciativas de promoção da saúde e promoção da prática de atividade física1818. Malta, DC, Silva Jr, JB. Policies to promote physical activity in Brazil. Lancet 2012; 380(9838): 195-6.. Iniciativas locais, como o Programa Academia da Cidade em Recife (PE) e Aracaju (SE), têm obtido sucesso no que diz respeito ao maior acesso da população a espaços para a prática de atividade física. Avaliações destes programas mostraram que o perfil de usuários é de mulheres, idosos e com menor escolaridade, justamente os grupos que apresentam as menores prevalências de atividade física no lazer1919. Hallal PC, Tenório MC, Tassitano RM, Reis RS, Carvalho YM, Cruz DK, et al. Avaliação do programa de promoção da atividade física Academia da Cidade de Recife, Pernambuco, Brasil: percepções de usuários e não-usuários. Cad Saúde Pública 2010; 26(1): 70-8. 2020. Reis, RS, Yan, Y, Parra, DC, Brownson, RC. Assessing participation in community-based physical activity programs in BrazilMed Sci Sports Exerc 2014; 46(1): 92-8.. Além do mais, a exposição ao programa Academia da Cidade em Recife foi associada com a maior prática de atividade física2121. Simoes EJ, Hallal P, Pratt M, Ramos L, Munk M, Damascena W, et al. Effects of a community-based, professionally supervised intervention on physical activity levels among residents of Recife, Brazil. Am J Public Health 2009; 99(1): 68-75.. Ainda, indivíduos usando espaços públicos com o programa foram mais ativos quando comparados a indivíduos utilizando espaços similares, porém, sem o programa2222. Parra DC, McKenzie TL, Ribeiro IC, Ferreira Hino AA, Dreisinger M, Coniglio K, et al. Assessing Physical Activity in Public Parks in Brazil Using Systematic Observation. Am J Public Health 2010; 100(8): 1420-6.. Além de iniciativas locais, cabe destacar a criação do Programa Academia da Saúde pelo Ministério da Saúde em 2011, com previsão de financiamento de até 4.000 polos para desenvolvimento de intervenções comunitárias de promoção da saúde, incluindo a promoção de atividade física gratuita, de forma a facilitar o acesso populacional a espaços apropriados para a prática de atividade física2323. Brasil. Ministério da Saúde. Redefine o Programa Academia da Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Portaria n. 2.681, de 7 de Novembro de 2013. 2013.

Apesar do desenvolvimento de ações e políticas de promoção da atividade física, ainda existem disparidades regionais que, em parte, podem explicar as diferenças encontradas no nosso estudo. Por exemplo, no intuito de aumentar o acesso a opções de atividade física no lazer, entre 2005 e 2009, o Ministério da Saúde financiou mais de 1.000 municípios para o desenvolvimento de programas de promoção da atividade física, sendo a região Centro-Oeste aquela com maior proporção de cidades financiadas. Entretanto, a maioria dos municípios financiados foram de pequeno porte, resultando em baixa cobertura populacional2424. Amorim TC, Knuth AG, Cruz DKA, Malta DC, Reis RS, Hallal PC. Descrição dos programas municipais de promoção da atividade física financiados pelo Ministério da Saúde. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2013; 18(1): 63-74.. Neste estudo, se mostrou que a região Norte foi aquela com menor proporção de municípios financiados, evidenciando que ações de caráter ambiental e político e dificuldades de estrutura física e qualificação profissional, constituem-se pontos importantes de reflexão para que se potencialize a efetividade dos programas de atividade física2424. Amorim TC, Knuth AG, Cruz DKA, Malta DC, Reis RS, Hallal PC. Descrição dos programas municipais de promoção da atividade física financiados pelo Ministério da Saúde. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2013; 18(1): 63-74.. Ramos et al.2525. Ramos LR, Malta DC, Gomes GAO, Bracco MM, Florindo AA, Mielke GI, et al . Prevalence of health promotion programs in primary health care units in Brazil. Rev Saúde Pública 2014; 48(5): 837-44., ao conduzirem um inquérito telefônico em uma amostra representativa de unidades básicas de saúde no Brasil para verificar a prevalência de programas de promoção da saúde, constataram que 40% das unidades básicas de saúde (UBS) realizam atividades no âmbito da prática de atividade física; porém, esta prevalência variou significativamente entre as regiões do Brasil, sendo de 50,9% na região Sudeste a 21,3% na região Norte2525. Ramos LR, Malta DC, Gomes GAO, Bracco MM, Florindo AA, Mielke GI, et al . Prevalence of health promotion programs in primary health care units in Brazil. Rev Saúde Pública 2014; 48(5): 837-44..

Algumas limitações devem ser discutidas. O indicador socioeconômico utilizado para estas análises foi o grau de instrução. Consideramos que o construto de condições socioeconômicas pode ser bem mais complexo do que simplesmente o grau de instrução. Entretanto, acreditamos que esta variável pode ser um grande indicador das condições socioeconômicas tanto em nível individual quando contextual. Embora a prática de atividade física possa ocorrer em diferentes domínios, como no trabalho, atividades domésticas e no deslocamento, optamos por restringir nossas análises apenas para o domínio de lazer, pois acreditamos que este domínio apresenta grande potencial de intervenção.

CONCLUSÃO

Este foi o primeiro estudo que investigou a prática de atividade física no lazer, tendo como foco a análise do grau de diferença existente entre subgrupos populacionais e entre regiões do Brasil. A realização deste tipo de investigação torna-se possível devido à robustez dos dados coletados e à padronização do instrumento aplicado para todas as regiões do Brasil, fato que nos permite realizar comparações em termos absolutos e relativos.

Por fim, apesar de haver pouca diferença na prevalência de prática de atividade física no lazer entre as regiões, o presente estudo mostrou que existem diferenças importantes na prática de atividade física no lazer entre as cinco grandes regiões quando são analisados subgrupos populacionais, destacando-se a baixa prevalência de atividade física no lazer entre a população mais velha residente na região Norte. . Estes resultados sugerem a necessidade de ações de promoção de atividade física com diferentes abordagens em cada uma das cinco regiões do Brasil.

REFERÊNCIAS

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  • Fonte de financiamento: nenhuma.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2015

Histórico

  • Recebido
    30 Abr 2015
  • Aceito
    03 Jun 2015
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