Heterogeneidade no consumo de alimentos in natura e ultraprocessados da população Brasileira ≥10 anos de idade

Victor Nogueira da Cruz Silveira Ana Karina Teixeira da Cunha França Alcione Miranda dos Santos Sobre os autores

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a heterogeneidade no consumo de alimentos in natura ou minimamente processados (INMP) e alimentos ultraprocessados (AUP) da população brasileira ≥10 anos de idade.

Métodos:

Estudo transversal que utilizou dados do Inquérito Nacional de Alimentação e do módulo do morador da edição de 2017–2018 da Pesquisa de Orçamentos Familiares. Foram utilizadas as variáveis relativas ao sexo, à região de residência, situação domiciliar e renda familiar per capita em salários-mínimos. Os desfechos foram a participação dietética em percentual de INMP e AUP. A heterogeneidade foi avaliada por meio dos efeitos aleatórios (EA) produzidos por modelos lineares de efeitos mistos.

Resultados:

Foram obtidos 32 EA para o consumo de INMP e 34 para os AUP. Residir na zona urbana das regiões Sul e Sudeste bem como ter maior renda foram fatores impulsionadores no consumo de AUP e redutores no consumo de INMP. Residir na zona rural e ter baixa renda foram principalmente fatores redutores no consumo de AUP e impulsionadores no consumo de INMP.

Conclusões:

O consumo de AUP e INMP apresentaram forte heterogeneidade com bastante efeitos aleatórios encontrados para ambos. Fatores como renda e situação domiciliar foram os principais marcadores no consumo alimentar dos indivíduos.

Palavras-chave:
Alimento processado; Dieta; Brasil; Consumo alimentar; Inquéritos sobre dietas

INTRODUÇÃO

Alimentos in natura ou minimamente processados (INMP) são aqueles diretamente obtidos de plantas ou animais que não perpassaram por alterações após deixar a natureza, ou sofreram alterações mínimas11 Monteiro CA, Cannon G, Levy R, Moubarac JC, Jaime P, Martins AP, et al. Classificação dos alimentos. Saúde Pública NOVA. A estrela brilha. World Nutr 2016; 7(1-3): 28-40.. Eles são caracterizados por não conterem aditivos químicos, logo tornando-se a base para uma alimentação saudável22 Louzada MLC, Costa CS, Souza TN, Cruz GL, Levy RB, Monteiro CA. Impacto do consumo de alimentos ultraprocessados na saúde de crianças, adolescentes e adultos: revisão de escopo. Cad Saúde Pública 2021; 37(suppl 1): e00323020. https://doi.org/10.1590/0102-311X00323020
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. Em oposição, os alimentos ultraprocessados (AUP) são produtos industriais feitos com base em INMP ou sintetizados em laboratório, que possuem adição de compostos químicos que alteram suas propriedades sensoriais11 Monteiro CA, Cannon G, Levy R, Moubarac JC, Jaime P, Martins AP, et al. Classificação dos alimentos. Saúde Pública NOVA. A estrela brilha. World Nutr 2016; 7(1-3): 28-40..

Esses alimentos diferenciam-se em função de seu grau de processamento, bem como na adição de substâncias artificiais11 Monteiro CA, Cannon G, Levy R, Moubarac JC, Jaime P, Martins AP, et al. Classificação dos alimentos. Saúde Pública NOVA. A estrela brilha. World Nutr 2016; 7(1-3): 28-40.33 Louzada MLC, Cruz GL, Silva KAAN, Grassi AGF, Andrade GC, Rauber F, et al. Consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil: distribuição e evolução temporal 2008–2018. Rev Saúde Pública 2023; 57(1): 12. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2023057004744
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. O uso desses componentes industriais garante aos AUP maior vida de prateleira, palatabilidade e alguma similaridade com os INMP aos quais eles fazem referência11 Monteiro CA, Cannon G, Levy R, Moubarac JC, Jaime P, Martins AP, et al. Classificação dos alimentos. Saúde Pública NOVA. A estrela brilha. World Nutr 2016; 7(1-3): 28-40..

O consumo de AUP tornou-se uma preocupação global, uma vez que sua ingestão está associada a diversos efeitos deletérios em saúde44 Pagliai G, Dinu M, Madarena MP, Bonaccio M, Iacoviello L, Sofi F. Consumption of ultra-processed foods and health status: a systematic review and meta-analysis. Br J Nutr 2021; 125(3): 308-18. https://doi.org/10.1017/S0007114520002688
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. Porém, apesar de reconhecidamente prejudiciais à saúde, seu consumo apresenta tendência crescente, possivelmente decorrente da praticidade e hiperpalatabilidade que ofertam33 Louzada MLC, Cruz GL, Silva KAAN, Grassi AGF, Andrade GC, Rauber F, et al. Consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil: distribuição e evolução temporal 2008–2018. Rev Saúde Pública 2023; 57(1): 12. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2023057004744
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,55 Neri D, Steele EM, Khandpur N, Cediel G, Zapata ME, Rauber F, et al. Ultraprocessed food consumption and dietary nutrient profiles associated with obesity: a multicountry study of children and adolescents. Obes Rev 2022; 23 Suppl 1:e13387. https://doi.org/10.1111/obr.13387
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.

No Brasil, o consumo de AUP apresenta padrão diverso, sendo maior em mulheres, nas regiões Sul e Sudeste, bem como em populações com maior renda e escolaridade, porém com forte divergência sobre as classes de ultraprocessados consumidas33 Louzada MLC, Cruz GL, Silva KAAN, Grassi AGF, Andrade GC, Rauber F, et al. Consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil: distribuição e evolução temporal 2008–2018. Rev Saúde Pública 2023; 57(1): 12. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2023057004744
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,66 Shim JS, Shim SY, Cha HJ, Kim J, Kim HC. Socioeconomic characteristics and trends in the consumption of ultra-processed foods in Korea from 2010 to 2018. Nutrients 2021; 13(4): 1120. https://doi.org/10.3390/nu13041120
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,77 Khandpur N, Cediel G, Obando DA, Jaime PC, Parra DC. Sociodemographic factors associated with the consumption of ultra-processed foods in Colombia. Rev Saude Publica 2020; 54: 19. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2020054001176
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. Ainda, apesar da tendência de decréscimo global no consumo desses alimentos, o Brasil enfrenta uma tendência de progressão possivelmente provocada por marketing ostensivo e praticidade no consumo desses produtos88 Moubarac JC, Claro RM, Baraldi LG, Levy RB, Martins APB, Cannon G, et al. International differences in cost and consumption of ready-to-consume food and drink products: United Kingdom and Brazil, 2008–2009. Glob Public Health 2013; 8(7): 845-56. https://doi.org/10.1080/17441692.2013.796401
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. Em oposição, populações com menor poder aquisitivo, racializadas e habitantes da zona rural tendem a consumir menos dos referidos produtos industriais e possuir uma dieta rica em INMP33 Louzada MLC, Cruz GL, Silva KAAN, Grassi AGF, Andrade GC, Rauber F, et al. Consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil: distribuição e evolução temporal 2008–2018. Rev Saúde Pública 2023; 57(1): 12. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2023057004744
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,88 Moubarac JC, Claro RM, Baraldi LG, Levy RB, Martins APB, Cannon G, et al. International differences in cost and consumption of ready-to-consume food and drink products: United Kingdom and Brazil, 2008–2009. Glob Public Health 2013; 8(7): 845-56. https://doi.org/10.1080/17441692.2013.796401
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.

Diferentes estudos têm evidenciado os efeitos sociodemográficos sobre o consumo alimentar no Brasil, e usualmente utilizam modelos de regressão lineares ou generalizados para testar suas hipóteses44 Pagliai G, Dinu M, Madarena MP, Bonaccio M, Iacoviello L, Sofi F. Consumption of ultra-processed foods and health status: a systematic review and meta-analysis. Br J Nutr 2021; 125(3): 308-18. https://doi.org/10.1017/S0007114520002688
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. Porém, o consumo alimentar é um comportamento multimotivado que pode ser modificado mediante a combinação de um conjunto de fatores, e não apenas um isoladamente. Neste sentido, os modelos de regressão de efeitos mistos surgem como ferramentas estatísticas poderosas para considerar a variação entre indivíduos e grupos99 Bernal JL, Cummins S, Gasparrini A. Interrupted time series regression for the evaluation of public health interventions: a tutorial. Int J Epidemiol 2017; 46(1): 348-55. https://doi.org/10.1093/ije/dyw098
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.

Na avaliação do consumo de alimentos ultraprocessados, esses modelos podem levar em conta fatores individuais — como idade, sexo, escolaridade — e contextuais — como região geográfica e renda — para entender melhor as associações e prever mudanças ao longo do tempo. Assim, compreender as diferenças nos padrões de consumo de alimentos ultraprocessados é crucial para o entendimento e direcionamento estratégico de políticas de prevenção e promoção da saúde para um setor específico a fim de mitigar o consumo desses alimentos, bem como prevenir seus efeitos deletérios. Ao considerar fatores socioeconômicos e demográficos, intervenções específicas para grupos de maior risco podem ser planejadas e aplicadas.

Dessa forma, este trabalho possui como objetivo avaliar a heterogeneidade no consumo de alimentos in natura ou minimamente processados (INMP) e alimentos ultraprocessados (AUP) da população brasileira ≥10 anos de idade.

MÉTODOS

Desenho e amostra

Trata-se de um estudo transversal com dados do módulo de consumo alimentar pessoal do Inquérito Nacional de Alimentação (INA) da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) — pesquisa de representatividade nacional realizada entre julho de 2017 e junho de 2018 no Brasil1010 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de orçamentos familiares : 2017–2018 : análise do consumo alimentar pessoal no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2020.. A coleta de dados utilizou um plano amostral complexo por conglomerados em dois estágios, com sorteio de setores censitários no primeiro estágio e domicílios no segundo. Os setores censitários são oriundos da amostra mestra do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), agrupados em estratos de domicílios com elevada homogeneidade geográfica no setor. A coleta de dados ocorreu ao longo dos anos de 2017 e 2018, dividida em quatro trimestres para considerar a variabilidade alimentar e os alimentos das diferentes épocas do ano1010 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de orçamentos familiares : 2017–2018 : análise do consumo alimentar pessoal no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2020..

O INA da POF envolveu 46.164 residentes com idade ≥10 anos no Brasil. A amostra de domicílios foi selecionada aleatoriamente, e todos os indivíduos da faixa etária alvo foram convidados a participar. Com a aplicação do plano amostral, foram obtidas informações de 52.906.759 brasileiros com idade ≥10 anos1010 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de orçamentos familiares : 2017–2018 : análise do consumo alimentar pessoal no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2020..

Consumo alimentar pessoal

O consumo alimentar dos indivíduos foi avaliado por meio de dois registros alimentares aplicados em dois dias não consecutivos pelo Método Automatizado de Múltiplas Etapas1111 Steinfeldt L, Anand J, Murayi T. Food reporting patterns in the USDA automated multiple-pass method. Procedia Food Sci 2013; 2: 145-56. https://doi.org/10.1016/j.profoo.2013.04.022
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. Em diversas etapas, foram coletadas informações sobre todos os alimentos consumidos no dia anterior à aplicação, suas quantidades em medidas caseiras, modo de preparo e, para alguns alimentos pré-determinados, foram solicitadas informações sobre a adição de ingredientes como açúcares, adoçantes e óleos.

Os alimentos com quantidades consideradas improváveis ou ausentes foram imputados pelo método da matriz de similaridade1212 Andridge RR, Little RJA. A review of hot deck imputation for survey non-response. Int Stat Rev 2010; 78(1): 40-64. https://doi.org/10.1111/j.1751-5823.2010.00103.x
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a partir de variáveis correlacionadas com a possível quantidade consumida. Os alimentos foram combinados com os códigos alimentares presentes na Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (TBCA)1313 Rede Brasileira de Dados de Composição de Alimentos. Universidade de São Paulo. Food Research Center. Tabela brasileira de composição de alimentos [Internet]. 2023 [accessed on Oct 30, 2024]. Available at: https://www.tbca.net.br/
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, enquanto as preparações foram desagregadas considerando as receitas padronizadas da TBCA. Por fim, a quantidade informada/imputada de cada alimento foi convertida em quilocalorias (kcal) utilizando as informações do TBCA.

Posteriormente, os alimentos foram classificados, segundo os critérios de classificação NOVA11 Monteiro CA, Cannon G, Levy R, Moubarac JC, Jaime P, Martins AP, et al. Classificação dos alimentos. Saúde Pública NOVA. A estrela brilha. World Nutr 2016; 7(1-3): 28-40., em alimentos in natura ou minimamente processados (INMP), ingredientes culinários, alimentos processados e alimentos ultraprocessados (AUP). A classificação dos AUP seguiu o conceito de que são formulações industriais obtidas através do fracionamento de alimentos provenientes de alimentos INMP11 Monteiro CA, Cannon G, Levy R, Moubarac JC, Jaime P, Martins AP, et al. Classificação dos alimentos. Saúde Pública NOVA. A estrela brilha. World Nutr 2016; 7(1-3): 28-40..

Para este trabalho, foram considerados desfechos as participações percentuais de energia fornecidas pelos AUP e INMP, as quais foram obtidos por meio da equação:

% de participação energética=(kcal proveniente de AUP ou INMP×100)consumo calórico total do indivíduo

Variáveis sociodemográficas

As informações sociodemográficas foram coletadas por meio de questionários padronizados de informações aos residentes. Foram utilizadas as seguintes variáveis: sexo (masculino/feminino), situação domiciliar (urbana/rural), região de residência (Norte, Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-Oeste) e renda familiar per capita mediante ¼ de salário-mínimo vigente em 2018 (<¼/≥¼).

Análise de dados

Inicialmente, os dados categóricos foram descritos em frequências absolutas (n) e relativas (%). As variáveis contínuas tiveram seus pressupostos de normalidade testados por meio do teste assintótico uniamostral de Kolmogorov-Smirnov, os quais foram rejeitados quando p<0,05, sendo, portanto, descritos em medianas e intervalos interquartis (IQR). Por se tratar de estudo com amostragem complexa, os pesos amostrais foram considerados em todas as análises.

Modelos de efeitos mistos

Para determinar a heterogeneidade natural entre os indivíduos decorrente de fatores sociodemográficos ou ambientais, foram testados modelos lineares mistos. Neste modelo de regressão, os coeficientes (β) são denominados como efeitos fixos, enquanto as variâncias e covariâncias (α) são denominadas como componentes da variância. Ademais, há a presença de uma medida individual que irá diferir da média observada do desfecho, que é denominada de erro aleatório. Esses efeitos aleatórios irão indicar a heterogeneidade natural entre os indivíduos decorrente do conjunto de fatores observados.

Ao final, os efeitos aleatórios observados irão designar uma medida matemática que indicará como um conjunto de fatores comporta-se em relação à média observada do desfecho. Para este trabalho, foram testados modelos contendo as seguintes variáveis: região de residência, situação domiciliar, sexo e renda familiar per capita. Os efeitos aleatórios obtidos são resultantes da análise combinatória do número de categorias contidas em cada variável inserida no modelo, a saber, foram obtidos 40 efeitos aleatórios (5×2×2×2). No entanto, foram considerados como efeitos aleatórios significativos apenas aqueles que não incluem o valor 0 (zero) em seu intervalo de confiança de 95%. Para melhor representação dos efeitos de fatores sociodemográficos sobre os desfechos, foram utilizados gráficos de pontos.

As análises foram realizadas no programa estatístico de acesso aberto R (R Core Team, 2023). Os modelos lineares mistos foram testados por meio dos pacotes lme41414 Kuznetsova A, Brockhoff PB, Christensen RHB. lmerTest package: tests in linear mixed effects models. Journal of Statistical Software 2017; 82(13): 1-26. https://doi.org/10.18637/jss.v082.i13
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e lmer, e os pesos amostrais foram incluídos por meio do pacote survey1515 Lumley T. Analysis of complex survey samples. Journal of Statistical Software 2004; 9(8): 1-19. https://doi.org/10.18637/jss.v009.i08
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para expansão amostral.

Aspectos éticos

Os dados deste estudo são oriundos de um sistema de informação de acesso aberto, dispensando, portanto, a obrigatoriedade de solicitação prévia a órgãos ou instituições governamentais e aprovação em Comitê de Ética em Pesquisa.

RESULTADOS

Descrição da amostra

A população avaliada destacou-se por constituir-se, em sua maioria, de mulheres (54,1%), com idade média de 39 anos, que residiam na zona urbana (85%) e na região Sudeste do país (43,2%). Ainda, a renda familiar per capita mediana dos indivíduos foi de R$ 899,20 (R$ 457,60 a R$ 1609,90) (Tabela 1). A dieta da população era predominantemente composta por alimentos in natura ou minimamente processados (55,3%), com alimentos ultraprocessados figurando logo após com 37,5% (Tabela 1).

Tabela 1
Descrição sociodemográfica e do consumo alimentar de indivíduos brasileiros ≥ 10 anos de idade. Brasil, 2017-2018.

Heterogeneidade no consumo de alimentos ultraprocessados

Acerca do consumo de AUP, 34 efeitos aleatórios foram significantes, sendo 19 deles (55,9%) impulsionadores na participação média de AUP na dieta dos indivíduos (Figura 1 e Tabela 2). Destaca-se que os fatores com maior impulsionamento no consumo de AUP assemelham-se por conterem condições como residir em áreas urbanas da região Sul do país, seguidamente da região Sudeste, enquanto possui renda per capita superior a ¼ de salário-mínimo em ambos os sexos, porém ainda superior no público feminino. Seguidamente, residir na área rural do país figurou apenas duas vezes nos 19 efeitos que incrementam o consumo de AUP (10,5%), porém novamente associada à região Sul com maior renda em ambos os sexos. Nos fatores redutores do consumo de AUP (44,1%), observa-se uma forte presença de indivíduos que residem na zona rural e com renda per capita inferior, com residência sobretudo nas regiões Norte e Nordeste (Tabela 2).

Figura 1
Gráfico de pontos de efeitos aleatórios sobre o consumo de alimentos in natura ou minimamente processados e alimentos ultraprocessados na população brasileira ≥10 anos de idade. Brasil, 2017–2018.
Tabela 2
Efeitos aleatórios sobre o consumo de alimentos ultraprocessados em indivíduos brasileiros ≥10 anos de idade. Brasil, 2017-2018.

Heterogeneidade no consumo de in natura ou minimamente processados

Relativo ao consumo de INMP, foram observados 32 efeitos aleatórios significantes, com 14 deles (43,8%) sendo impulsionadores de sua participação média (Figura 1 e Tabela 3). Neste grupo de alimentos, pode ser destacada a forte presença da área rural, bem como residir nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, e possuir baixa renda. Ainda, nota-se a ausência da região Sul do país em qualquer efeito.

Tabela 3
Efeitos aleatórios sobre o consumo de alimentos in natura ou minimamente processados em indivíduos brasileiros ≥10 anos de idade. Brasil, 2017-2018.

Acerca dos fatores que reduziam o consumo de INMP (56,2%), foram identificados prevalentemente residir em zona urbana, sobretudo nas regiões Sul e Sudeste, bem como possuir maior renda familiar. Fatores diametralmente opostos sobre o consumo de AUP (Tabela 3).

DISCUSSÃO

O consumo de AUP nos indivíduos avaliados foi elevado com bastante heterogeneidade. Todas as macrorregiões geográficas figuraram nos efeitos impulsionadores do consumo de AUP, porém destacaram-se o Sul e Sudeste, bem como majoritariamente estar localizado em áreas urbanas e possuir renda superior a ¼ de salário-mínimo. Tais fatores podem estar associados ao fornecimento de condições que facilitem o acesso a esses produtos alimentícios. Em oposição, os alimentos INMP figuraram nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, sobretudo em estratos de baixa renda e na zona rural, o que possivelmente pode indicar ambientes de cultivo e maior acesso desses alimentos.

Ademais, ressalta-se que o consumo de INMP foi acima da metade do consumo energético da população brasileira, o que pode ser explicado pelos padrões alimentares ocidentais ou tradicionais brasileiros que são compostos majoritariamente pelo consumo de pães, café, arroz, feijão, proteína animal e alguma opção de salada1616 Borges CA, Marchioni DML, Levy RB, Slater B. Dietary patterns associated with overweight among Brazilian adolescents. Appetite 2018; 123: 402-9. https://doi.org/10.1016/j.appet.2018.01.001
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1919 Arruda SPM, Silva AAM, Kac G, Goldani MZ, Bettiol H, Barbieri MA. Socioeconomic and demographic factors are associated with dietary patterns in a cohort of young Brazilian adults. BMC Public Health 2014; 14: 654. https://doi.org/10.1186/1471-2458-14-654
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. No entanto, ao observar o consumo de AUP, nota-se elevada participação dietética, sendo quase um terço da ingestão total usual da população. Destaca-se que ainda não se possui um limite superior de consumo de AUP, porém é sugerido que sua participação dietética seja a menor possível2020 Vandevijvere S, De Ridder K, Fiolet T, Bel S, Tafforeau J. Consumption of ultra-processed food products and diet quality among children, adolescents and adults in Belgium. Eur J Nutr 2019; 58(8): 3267-78. https://doi.org/10.1007/s00394-018-1870-3
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.

Estudos indicam que há forte heterogeneidade sobre o consumo de INMP e AUP em distintas populações ao redor do globo, com o maior consumo destes últimos concentrados em zonas urbanas e mais desenvolvidas44 Pagliai G, Dinu M, Madarena MP, Bonaccio M, Iacoviello L, Sofi F. Consumption of ultra-processed foods and health status: a systematic review and meta-analysis. Br J Nutr 2021; 125(3): 308-18. https://doi.org/10.1017/S0007114520002688
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,66 Shim JS, Shim SY, Cha HJ, Kim J, Kim HC. Socioeconomic characteristics and trends in the consumption of ultra-processed foods in Korea from 2010 to 2018. Nutrients 2021; 13(4): 1120. https://doi.org/10.3390/nu13041120
https://doi.org/10.3390/nu13041120...
,77 Khandpur N, Cediel G, Obando DA, Jaime PC, Parra DC. Sociodemographic factors associated with the consumption of ultra-processed foods in Colombia. Rev Saude Publica 2020; 54: 19. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2020054001176
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,2121 Juul F, Lin Y, Deierlein AL, Vaidean G, Parekh N. Trends in food consumption by degree of processing and diet quality over 17 years: results from the Framingham Offspring Study. Br J Nutr 2021; 126(12): 1861-71. https://doi.org/10.1017/S000711452100060X
https://doi.org/10.1017/S000711452100060...
2424 Imamura F, Micha R, Khatibzadeh S, Fahimi S, Shi P, Powles J, et al. Dietary quality among men and women in 187 countries in 1990 and 2010: a systematic assessment. Lancet Glob Health 2015; 3(3): e132-42. https://doi.org/10.1016/S2214-109X(14)70381-X
https://doi.org/10.1016/S2214-109X(14)70...
. Achados anteriores da própria POF reforçam que a participação de AUP na alimentação de brasileiros possui forte relação com o local de residência, sendo os estados provenientes das regiões Sul e Sudeste aqueles com maior consumo, assim como a maior escolaridade, idade e situação domiciliar33 Louzada MLC, Cruz GL, Silva KAAN, Grassi AGF, Andrade GC, Rauber F, et al. Consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil: distribuição e evolução temporal 2008–2018. Rev Saúde Pública 2023; 57(1): 12. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2023057004744
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.

Apesar das reconhecidas diferenças nos padrões de consumo alimentar provocados pela idade dos indivíduos66 Shim JS, Shim SY, Cha HJ, Kim J, Kim HC. Socioeconomic characteristics and trends in the consumption of ultra-processed foods in Korea from 2010 to 2018. Nutrients 2021; 13(4): 1120. https://doi.org/10.3390/nu13041120
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,77 Khandpur N, Cediel G, Obando DA, Jaime PC, Parra DC. Sociodemographic factors associated with the consumption of ultra-processed foods in Colombia. Rev Saude Publica 2020; 54: 19. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2020054001176
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,2222 Baraldi LG, Steele EM, Canella DS, Monteiro CA. Consumption of ultra-processed foods and associated sociodemographic factors in the USA between 2007 and 2012: evidence from a nationally representative cross-sectional study. BMJ Open 2018; 8(3): e020574. https://doi.org/10.1136/bmjopen-2017-020574
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, neste trabalho essa variável não foi adicionada ao modelo linear misto, por não ter apresentado efeito significativo sobre o consumo ao considerar-se as diferentes intercessões com os demais fatores sociodemográficos.

Os efeitos desses fatores sobre o consumo de AUP são amplamente estudados isoladamente, porém, é importante destacar que existem distintos graus de magnitude sobre o consumo ao considerar-se a interseção entre uma ou mais condições sociodemográficas. Os efeitos de residir na região urbana ou rural, por exemplo, são reconhecidamente distintos sobre o consumo de AUP ou INMP, uma vez que são consideradas condições como capacidade de penetração em zonas mais remotas e forte presença de produtos da agricultura em regiões rurais33 Louzada MLC, Cruz GL, Silva KAAN, Grassi AGF, Andrade GC, Rauber F, et al. Consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil: distribuição e evolução temporal 2008–2018. Rev Saúde Pública 2023; 57(1): 12. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2023057004744
https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2023...
,2525 Bi J, Liu C, Li S, He Z, Chen K, Luo R, et al. Dietary diversity among preschoolers: a cross-sectional study in poor, rural, and ethnic minority areas of central south China. Nutrients 2019; 11(3): 558. https://doi.org/10.3390/nu11030558
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,2626 Leong DP, Teo KK, Rangarajan S, Lopez-Jaramillo P, Avezum Jr A, Orlandini A, et al. Prognostic value of grip strength: findings from the Prospective Urban Rural Epidemiology (PURE) study. Lancet 2015; 386(9990): 266-73. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(14)62000-6
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. No entanto, neste trabalho foi identificado que na região Sul brasileira, independentemente de ser zona rural, a participação de AUP na dieta dos indivíduos ainda era superior à média nacional. Isso pode ter decorrido do maior desenvolvimento da região frente a outras áreas do país, bem como a questões ligadas a acesso e poder aquisitivo1818 Alves ALS, Olinto MTA, Costa JSD, Bairros FS, Balbinotti MAA. Dietary patterns of adult women living in an urban area of Southern Brazil. Rev Saude Publica 2006; 40(5): 865-73. https://doi.org/10.1590/s0034-89102006000600017
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,2727 Freedman DA, Clark JK, Lounsbury DW, Boswell L, Burns M, Jackson MB, et al. Food system dynamics structuring nutrition equity in racialized urban neighborhoods. Am J Clin Nutr 2022; 115(4): 1027-38. https://doi.org/10.1093/ajcn/nqab380
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,2828 Hales CM, Fryar CD, Carroll MD, Freedman DS, Aoki Y, Ogden CL. Differences in obesity prevalence by demographic characteristics and urbanization level among adults in the United States, 2013-2016. JAMA 2018; 319(23): 2419-29. https://doi.org/10.1001/jama.2018.7270
https://doi.org/10.1001/jama.2018.7270...
.

Cabe ressaltar que a maior renda é um fator que pode estar associado com a garantia de acesso a produtos ultraprocessados2929 Barros FC, Victora CG, Scherpbier R, Gwatkin D. Socioeconomic inequities in the health and nutrition of children in low/middle income countries. Rev Saude Publica 2010; 44(1): 1-16. https://doi.org/10.1590/s0034-89102010000100001
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3131 Muhammad A, D’Souza A, Meade B, Micha R, Mozaffarian D. How income and food prices influence global dietary intakes by age and sex: evidence from 164 countries. BMJ Glob Health 2017; 2(3): e000184. https://doi.org/10.1136/bmjgh-2016-000184
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, o que, conjuntamente a residir em regiões com baixa penetração desses produtos, tais como zonas rurais, justifica a forte redução sobre a participação desses produtos3232 Oliveira RR, Peter NB, Muniz LC. Consumo alimentar segundo grau de processamento entre adolescentes da zona rural de um município do sul do Brasil. Ciênc Saúde Coletiva 2021; 26(3): 1105-14. https://doi.org/10.1590/1413-81232021263.06502019
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.

Acerca da participação de INMP na dieta, pôde ser observado que seu consumo foi ditado por condições de acesso. O maior consumo desses produtos foi sobretudo em regiões rurais, que são usualmente polos agriculturais com acesso mais facilitado a alimentos frescos e, usualmente, com menores preços, bem como as regiões geográficas que figuraram são as menos industrializadas2525 Bi J, Liu C, Li S, He Z, Chen K, Luo R, et al. Dietary diversity among preschoolers: a cross-sectional study in poor, rural, and ethnic minority areas of central south China. Nutrients 2019; 11(3): 558. https://doi.org/10.3390/nu11030558
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,3232 Oliveira RR, Peter NB, Muniz LC. Consumo alimentar segundo grau de processamento entre adolescentes da zona rural de um município do sul do Brasil. Ciênc Saúde Coletiva 2021; 26(3): 1105-14. https://doi.org/10.1590/1413-81232021263.06502019
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. Dessa forma, sugere-se que o consumo de INMP, além de levar em consideração fatores como proximidade geográfica e facilidade de acesso a esses alimentos, também pode ser dependente da falta de competitividade com uma maior variedade de AUP55 Neri D, Steele EM, Khandpur N, Cediel G, Zapata ME, Rauber F, et al. Ultraprocessed food consumption and dietary nutrient profiles associated with obesity: a multicountry study of children and adolescents. Obes Rev 2022; 23 Suppl 1:e13387. https://doi.org/10.1111/obr.13387
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,3333 Costa CS, Faria FR, Gabe KT, Sattamini IF, Khandpur N, Leite FHM, et al. Escore Nova de consumo de alimentos ultraprocessados: descrição e avaliação de desempenho no Brasil. Rev Saúde Pública 2021; 55: 13. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2021055003588
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.

Condições como a renda também podem ser fortes determinantes, uma vez que a população com menor rendimento nessas regiões pode se tratar de pequenos produtores rurais que dependem quase que exclusivamente de seus próprios cultivos2525 Bi J, Liu C, Li S, He Z, Chen K, Luo R, et al. Dietary diversity among preschoolers: a cross-sectional study in poor, rural, and ethnic minority areas of central south China. Nutrients 2019; 11(3): 558. https://doi.org/10.3390/nu11030558
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,3232 Oliveira RR, Peter NB, Muniz LC. Consumo alimentar segundo grau de processamento entre adolescentes da zona rural de um município do sul do Brasil. Ciênc Saúde Coletiva 2021; 26(3): 1105-14. https://doi.org/10.1590/1413-81232021263.06502019
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. Ainda, apesar do forte efeito da situação domiciliar rural sobre o consumo de alimentos INMP, é importante reforçar que mesmo nessas zonas, populações rurais do Sudeste e Sul possuíam médias de participação desses alimentos inferiores, possivelmente por questões de acesso previamente elucidados neste trabalho, bem como industrialização33 Louzada MLC, Cruz GL, Silva KAAN, Grassi AGF, Andrade GC, Rauber F, et al. Consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil: distribuição e evolução temporal 2008–2018. Rev Saúde Pública 2023; 57(1): 12. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2023057004744
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,3434 Silva LES, Claro RM. Tendências temporais do consumo de frutas e hortaliças entre adultos nas capitais brasileiras e Distrito Federal, 2008-2016. Cad Saúde Pública 2019; 35(5): e00023618. https://doi.org/10.1590/0102-311X00023618
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,3535 Canella DS, Martins APB, Bandoni DH. Iniquidades no acesso aos benefícios alimentação e refeição no Brasil: uma análise da Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008-2009. Cad Saúde Pública 2016; 32(3): e00037815. https://doi.org/10.1590/0102-311X00037815
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.

O papel do sexo dos indivíduos no consumo alimentar é bastante heterogêneo na literatura. Alguns autores destacam que mulheres possuem maior preocupação usual com seu estado de saúde e, portanto, possuem menor consumo de AUP66 Shim JS, Shim SY, Cha HJ, Kim J, Kim HC. Socioeconomic characteristics and trends in the consumption of ultra-processed foods in Korea from 2010 to 2018. Nutrients 2021; 13(4): 1120. https://doi.org/10.3390/nu13041120
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,2424 Imamura F, Micha R, Khatibzadeh S, Fahimi S, Shi P, Powles J, et al. Dietary quality among men and women in 187 countries in 1990 and 2010: a systematic assessment. Lancet Glob Health 2015; 3(3): e132-42. https://doi.org/10.1016/S2214-109X(14)70381-X
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,3131 Muhammad A, D’Souza A, Meade B, Micha R, Mozaffarian D. How income and food prices influence global dietary intakes by age and sex: evidence from 164 countries. BMJ Glob Health 2017; 2(3): e000184. https://doi.org/10.1136/bmjgh-2016-000184
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. Esse papel é controverso, uma vez que algumas classes de ultraprocessados podem contar com publicidade mais ostensiva ao público feminino e não serem consideradas não-saudáveis33 Louzada MLC, Cruz GL, Silva KAAN, Grassi AGF, Andrade GC, Rauber F, et al. Consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil: distribuição e evolução temporal 2008–2018. Rev Saúde Pública 2023; 57(1): 12. https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2023057004744
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. No entanto, foi observada forte heterogeneidade, em que não há destaque ao maior ou menor consumo de AUP ou INMP em ambos os sexos. Sugere-se que as condições do entorno imediato de cada indivíduo possuam efeito maior sobre o consumo.

Ademais, é importante ressaltar que os dados utilizados neste estudo são da edição de 2017-2018 da POF. Porém, é possível esperar que após a pandemia de COVID-19, a progressão no consumo de AUP no Brasil tenha permanecido, sobretudo em grandes centros, em virtude do isolamento social e da preferência por alimentos prontos para consumo3636 Costa FF, Rosa IR, Pinho L, Silva MLPD. Pandemia da Covid-19. Revista Unimontes Científica 2020; 22(2): 1-15. https://doi.org/10.46551/ruc.v22n2a04
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,3737 Raphaelli CO, Figueiredo MF, Pereira ES, Granada GG. A pandemia de COVID-19 no Brasil favoreceu o consumo de alimentos ultraprocessados? Brazilian Applied Science Review 2021; 5(3): 1297-313. https://doi.org/10.34115/basrv5n3-002
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. No entanto, é possível que em regiões rurais e mais afastadas de centros urbanos tenha permanecido a preferência pelos alimentos INMP, sendo possível a manutenção do panorama de heterogeneidade observado.

Este estudo possui como pontos fortes uma amostra probabilística de representatividade nacional e o uso de uma análise estatística robusta que promove a interação de distintas condições sociodemográficas e seus efeitos sobre a participação dietética de AUP e INMP na alimentação da população brasileira. Os modelos de regressão de efeitos mistos utilizados permitem uma abordagem mais flexível quando comparados aos modelos de regressão tradicionais. Uma vez que os modelos tradicionais utilizam somente variáveis explicativas e seu efeito sobre um desfecho, os modelos de efeitos mistos incluem tanto parâmetros fixos quanto aleatórios, permitindo a estimativa de variabilidade entre indivíduos ou grupos3838 Silveira LTY, Ferreira JC, Patino CM. Modelo de efeitos mistos: uma ferramenta estatística útil para estudos longitudinais e de cluster. J Bras Pneumol 2023; 49(2): e20230137. https://doi.org/10.36416/1806-3756/e20230137
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. Ao incluir efeitos aleatórios, os modelos de efeitos mistos capturam a correlação entre observações dentro dos mesmos grupos ou indivíduos, resultando em estimativas mais precisas dos parâmetros populacionais e refletindo melhor a variabilidade entre os grupos3838 Silveira LTY, Ferreira JC, Patino CM. Modelo de efeitos mistos: uma ferramenta estatística útil para estudos longitudinais e de cluster. J Bras Pneumol 2023; 49(2): e20230137. https://doi.org/10.36416/1806-3756/e20230137
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.

Ademais, este trabalho é o primeiro a avaliar o consumo de INMP e AUP proveniente de uma amostra representativa nacional com análises robustas como os modelos lineares mistos. O uso desta análise proporciona a identificação de padrões de consumo de ambos os grupos de alimentos, considerando a intercessão de um conjunto de fatores sociodemográficos. Dessa forma, é possível observar com maior clareza e profundidade a dinâmica do consumo desses alimentos mediante diferentes fatores que compõem o entorno imediato de distintos grupos populacionais brasileiros.

Tal método permite observar diferentes combinações de fatores que levem a maior ou menor participação em comparação à observação usual de fatores associados isolados. No entanto, como limitantes podem advir potenciais superestimações ou subestimações de alguns grupos alimentares e diferenças entre receitas culinárias frente ao que é padronizado em tabelas de composição de alimentos. Porém, como forma de minimizar esses vieses, foram utilizados métodos de inquérito alimentar validados, bem como destrinchadas todas as preparações culinárias, de modo a se obter a composição isolada de cada ingrediente que a compõe.

Finalmente, este trabalho surge como uma forte contribuição à literatura nacional e internacional por descrever os efeitos de diferentes agrupamentos de condições sociodemográficas sobre a participação dietética de AUP e INMP na população brasileira ≥10 anos de idade. Condições largamente reconhecidas sobre o consumo de AUP e INMP foram observadas e confirmadas, porém foram entendidos diferentes mecanismos de interação destas, reforçando o consumo dos referidos grupos de alimentos como dependentes de condições de acesso. A heterogeneidade no consumo de AUP e INMP pôde ser percebida como bastante dependente de condições que favoreçam ou impeçam o acesso a esses alimentos, sobretudo características sociodemográficas como renda e local de residência. Ainda, por meio dos resultados deste trabalho, o entendimento dos grupos focais mais expostos ao consumo de AUP e seus efeitos deletérios futuros, bem como menor consumo de INMP, permitirá que secretarias e coordenações de alimentação e nutrição compreendam os efeitos das ações de vigilância alimentar e nutricional existentes e consigam direcionar sobre os segmentos populacionais específicos de modo a mitigar o consumo de AUP ou incentivar o consumo de INMP.

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    nenhuma.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Dez 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    09 Jun 2024
  • Revisado
    05 Out 2024
  • Aceito
    21 Out 2024
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