RESUMO
OBJETIVO
Analisar a qualidade de vida e seus determinantes em uma população residente na zona rural.
MÉTODOS
Estudo transversal de base populacional com indivíduos de 18 anos ou mais, da zona rural de Pelotas, Sul do Brasil. A qualidade de vida foi avaliada pelo WHOQOL-BREF, composto por quatro domínios (físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente), e duas perguntas: qualidade de vida global e satisfação com a saúde. Variáveis demográficas, socioeconômicas e de saúde foram consideradas entre as variáveis independentes. As associações foram avaliadas por regressão linear nos quatro domínios e por regressão logística ordinal nas duas perguntas gerais de qualidade de vida e satisfação com a saúde.
RESULTADOS
A amostra foi composta por 1.479 indivíduos. As prevalências de percepção de qualidade de vida global muito ruim e insatisfação com a saúde foram, respectivamente, 22,5% e 26,3%. Indivíduos mais velhos (p < 0,001), com cor da pele não branca (p = 0,004), com menor escolaridade (p < 0,001), mais pobres (p = 0,001) e que residiram a vida toda na zona rural (p = 0,049) apresentaram menor chance de ter melhor percepção de qualidade de vida global. Quanto à satisfação com a saúde, as mulheres (p = 0,001), os mais velhos (p = 0,001), os desempregados (p = 0,023) e aqueles portadores de doenças tiveram menor chance de relatarem maior satisfação com a saúde. Para os quatro domínios avaliados, os resultados foram consistentes com os observados para as perguntas gerais.
CONCLUSÕES
O fato de ser mulher, mais velho, não ser branco, ter baixa renda, ter menor escolaridade, residir a vida toda na zona rural, estar desempregado e portar alguma doença foram os aspectos mais relevantes para definir negativamente a qualidade de vida da população. Tendo em vista que são fatores significativamente importantes como determinantes da saúde, estes resultados sugerem que a qualidade de vida é um tema que deve ser colocado entre as necessidades de saúde, principalmente com relação aos grupos mais vulneráveis das áreas rurais.
Adulto; Qualidade de Vida; Fatores Socioeconômicos; Gênero e Saúde; População Rural
INTRODUÇÃO
A qualidade de vida (QV) abrange aspectos de saúde física e mental, relações sociais e crenças pessoais, bem como características ambientais11. Fleck MPA, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, Santos L, et al. Aplicação da versão em português do instrumento abreviado de avaliação da qualidade de vida “WHOQOL-bref”. Rev Saude Publica. 2000;34(2):178-83. https://doi.org/10.1590/S0034-89102000000200012
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200000... . Além disso, vem crescendo em importância na avaliação de intervenções terapêuticas e de serviços e em práticas assistenciais cotidianas na área da saúde22. Minayo MCS, Hartz ZMA, Buss PM. Qualidade de vida e saúde: um debate necessário. Cienc Saude Coletiva. 2000;5(1):7-18. https://doi.org/10.1590/S1413-81232000000100002
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200000... .
As populações rurais brasileiras diferem das urbanas em uma série de fatores que influenciam a qualidade de vida, como aspectos demográficos e socioeconômicos, apresentando menor escolaridade33. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) 2014. Rio de Janeiro: IBGE; 2015 [cited 2018 Feb 12]. Available from: https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2014/default.shtm
https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica... e renda média mensal44. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008-2009: despesas, rendimentos e condições de vida. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 [cited 2018 Feb 12]. Available from: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv45130.pdf
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualiza... . Quanto aos indicadores de saúde, os resultados da literatura são contraditórios5–8. Entretanto, o menor acesso a serviços de saúde é relatado de maneira consistente e a baixa cobertura por planos de saúde já foi descrita nessas regiões66. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013: percepção do estado de saúde, estilos de vida e doenças crônicas: Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: IBGE; MS; 2014 [cited 2018 Feb 12]. Available from: ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.pdf
ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.p... ,88. Kostka J, Borowiak E, Kostka T. Nutritional status and quality of life in different populations of older people in Poland. Eur J Clin Nutr. 2014:68(11):1210-5. https://doi.org/10.1038/ejcn.2014.172
https://doi.org/10.1038/ejcn.2014.172... . Ainda, diferenças relacionadas a ambientes físico e social, como qualidade de ar, poluição sonora e estilo de vida têm sido ressaltadas na literatura99. Moreira JPL, Oliveira BLCA, Muzi CD, Cunha CLF, Brito AS, Luiz RR. A saúde dos trabalhadores da atividade rural no Brasil. Cad Saude Publica. 2015;31(8):1698-708. https://doi.org/10.1590/0102-311X00105114
https://doi.org/10.1590/0102-311X0010511... . Especificamente no Brasil, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) indicou que as prevalências de tabagismo e de atividade física no trabalho são maiores em habitantes de área rural do que na urbana66. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013: percepção do estado de saúde, estilos de vida e doenças crônicas: Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: IBGE; MS; 2014 [cited 2018 Feb 12]. Available from: ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.pdf
ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.p... . É constatado também que a exposição à agrotóxicos atinge parcela significativa da população77. Carneiro FF, Rigotto RM, Augusto LGS, Friedrich K, Búrigo AC, organizadores. Dossiê ABRASCO: um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde. Rio de Janeiro: EPSJV; Expressão Popular; 2015 [cited 2018 Feb 12]. Available from: http://www.epsjv.fiocruz.br/sites/default/files/l241.pdf
http://www.epsjv.fiocruz.br/sites/defaul... . Além disso, são consideráveis os dados sobre saúde mental de moradores das áreas rurais onde a frequência de autorrelato de depressão é em torno de 6% sendo mais prevalente em mulheres66. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013: percepção do estado de saúde, estilos de vida e doenças crônicas: Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: IBGE; MS; 2014 [cited 2018 Feb 12]. Available from: ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.pdf
ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.p... .
Em 2010, aproximadamente 15% da população brasileira residia em zonas rurais, proporção similar àquela descrita para o estado do Rio Grande do Sul na mesma época1010. Shepherd D, Welch D, Dirks KN, McBride D. Do quiet areas afford greater health-related quality of life than noisy areas? Int J Environ Res Public Health. 2013;10(4):1284-303. https://doi.org/10.3390/ijerph10041284
https://doi.org/10.3390/ijerph10041284... . Entretanto, o conhecimento sobre aspectos de saúde e de QV dessa considerável parcela da população é escasso. O objetivo deste estudo foi caracterizar a QV e fatores que possam estar associados à saúde de uma população adulta residente na zona rural do sul do Brasil.
MÉTODOS
Este estudo transversal de base populacional faz parte de um estudo maior intitulado “Avaliação da Saúde de Adultos Residentes na Zona Rural do Município de Pelotas, RS”, realizado entre janeiro e julho de 2016. Foi avaliada uma amostra representativa da população adulta (maiores de 18 anos) residente na zona rural do município de Pelotas, RS, Brasil. Essa região é composta por oito distritos e 50 setores censitários e compreende 7% da população do município1111. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 [cited 2018 Feb 13]. Available from: http://www.censo2010.ibge.gov.br/
http://www.censo2010.ibge.gov.br/... .
Empregou-se uma amostragem por conglomerados em múltiplas etapas. Foram sorteados 24 setores censitários de forma sistemática e proporcional ao número de domicílios permanentes de cada distrito. Ao total, estipulou-se a visita de 720 domicílios (30 por setor). Foram excluídos da amostra indivíduos institucionalizados no momento da pesquisa ou com alguma incapacidade cognitiva que os impossibilitasse de responder ao questionário. Mais detalhes sobre a metodologia podem ser obtidos no artigo metodológico1212. Gonçalves H, Tomasi E, Tovo-Rodrigues L, Bielemann RM, Machado AKF, Ruivo ACO, et al. Estudo de base populacional na zona rural: metodologia e desafios. Rev Saude Publica. 2018;52 Supl 1:3s. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018052000270
https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018... .
A avaliação da QV foi realizada por meio do instrumento WHOQOL-BREF11. Fleck MPA, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, Santos L, et al. Aplicação da versão em português do instrumento abreviado de avaliação da qualidade de vida “WHOQOL-bref”. Rev Saude Publica. 2000;34(2):178-83. https://doi.org/10.1590/S0034-89102000000200012
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200000... . Esse instrumento é constituído por 26 questões e duas delas avaliam QV global e satisfação com a saúde separadamente. As demais 24 englobam quatro domínios: físico (dor e desconforto; energia e fadiga; sono e repouso; mobilidade; atividades da vida cotidiana; dependência de medicação ou tratamentos e capacidade para o trabalho); psicológico (sentimentos positivos, pensamento, aprendizagem, memória e concentração; autoestima; imagem corporal e aparências; sentimentos negativos; espiritualidade, religiosidade e crenças pessoais); relações sociais (relações pessoais; suporte social e atividade sexual); meio ambiente [segurança física e proteção; ambiente no lar; recursos financeiros; cuidados de saúde e sociais; disponibilidade e qualidade; oportunidade de adquirir novas informações e habilidades; participação em oportunidades de recreação ou lazer; ambiente físico (poluição, ruído, trânsito, clima); transporte]. Essas questões representam cada uma das 24 facetas que compõem o instrumento original (WHOQOL-100)1313. Fleck MPA, Leal OF, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, et al. Desenvolvimento da versão em português do instrumento de avaliação de qualidade de vida da OMS (WHOQOL-100). Rev Bras Psiquiatr. 1999;21(1):19-28. https://doi.org/10.1590/S1516-44461999000100006
https://doi.org/10.1590/S1516-4446199900... . O período referente a duas semanas anteriores à entrevista foi utilizado para todas elas. As respostas para todas as questões variam de um a cinco em uma escala Likert. Os escores individuais para cada um dos domínios foram derivados e padronizados em uma escala de um a 100, de acordo com o protocolo sugerido pelo Grupo WHOQOL1313. Fleck MPA, Leal OF, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, et al. Desenvolvimento da versão em português do instrumento de avaliação de qualidade de vida da OMS (WHOQOL-100). Rev Bras Psiquiatr. 1999;21(1):19-28. https://doi.org/10.1590/S1516-44461999000100006
https://doi.org/10.1590/S1516-4446199900... . Para as análises, as cinco categorias de respostas originais dessas questões foram agrupadas em três: muito boa; boa; regular, ruim ou muito ruim para a percepção de QV global; e muito satisfeito; satisfeito; regular, insatisfeito ou muito insatisfeito; para percepção de saúde.
A associação entre as variáveis determinantes e os desfechos foi avaliada com base em um modelo conceitual hierárquico contendo quatro níveis. No primeiro nível foram incluídas as variáveis sexo (masculino; feminino), idade (18 a 24; 25 a 39, 40 a 59; 60 anos ou mais) e cor da pele autorreferida (branca; outra); no segundo nível, escolaridade (zero a quatro; cinco a oito; nove a 11 e 12 ou mais anos de estudo), índice de bens (quintis), ter emprego (não; sim) e número de moradores (de qualquer faixa etária) do domicílio (um; dois; três; quatro; cinco ou mais); no terceiro nível, morar com companheiro (não; sim) e percentual de tempo residido na zona rural (menos de 50%; entre 50 e 99%; 100%). No quarto nível, foram incluídas as variáveis de diagnóstico autorrelatado das seguintes doenças: hipertensão arterial sistêmica (HAS), diabetes, colesterol alto, doenças cardiovasculares (insuficiência cardíaca ou angina), respiratórias (asma ou bronquite) e reumáticas (artrite, reumatismo ou artrose) (sim; não).
O índice de bens foi obtido a partir de análise de componentes principais contendo 22 perguntas realizadas ao chefe da família, que avaliavam a quantidade de bens da residência dos indivíduos naquele momento: água encanada, aspirador de pó, máquina de lavar ou secar roupa e louça, DVD, videocassete, geladeira, microondas, computador (notebook ou netbook), televisão, rádio, aparelho de ar condicionado, televisão a cabo ou internet, automóvel ou motocicleta. Ainda, número de banheiros, número de peças da casa utilizadas para dormir e se havia empregado doméstico. Essa variável foi analisada em quintis, variando do quintil mais pobre (1º) ao mais rico (5º).
O comando survey (svy) foi utilizado em todas as análises, considerando o efeito de amostragem por conglomerados. Além disso, utilizou-se uma ponderação considerando o percentual de domicílios amostrados em relação ao número de permanentes de cada distrito de acordo com dados do IBGE1111. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 [cited 2018 Feb 13]. Available from: http://www.censo2010.ibge.gov.br/
http://www.censo2010.ibge.gov.br/... .
Para os quatro domínios de QV, as análises brutas e ajustadas foram feitas por meio de regressão linear. Foram apresentados a média de pontuação (bruta), os coeficientes ajustados (β) e o intervalo de confiança de 95% (IC95%). Para as duas questões de QV global e satisfação com a saúde, as análises brutas e ajustadas foram realizadas por regressão logística ordinal, obtendo-se estimativas de razão de odds (RO) e IC95%. Para essas análises, obteve-se estimativas de chance de passar de uma categoria percepção de QV e satisfação com a saúde à categoria subsequente, considerando a direcionalidade de melhor à pior categoria de resposta em todos os casos. O teste de Brant foi utilizado para avaliar o pressuposto de proporcionalidade das RO entre as categorias do desfecho. As análises ajustadas foram realizadas conforme o modelo de nível hierárquico conceitual, no qual as variáveis foram ajustadas para todas as do mesmo nível além daquelas do nível anterior no modelo. Esse método foi repetido para os demais níveis. Um nível de significância estatística de 0,05 foi considerado para associações entre as variáveis e os desfechos. O valor Kappa foi calculado baseado na questão “O(A) Sr.(a) sabe ler ou escrever?”, indicando 76% de repetibilidade.
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Pelotas (Parecer 1.363.979). Todos os participantes da pesquisa assinaram termo de consentimento livre e esclarecido.
RESULTADOS
Dos 1.697 indivíduos elegíveis para o estudo, 1.519 foram entrevistados e 1.479 foram incluídos no presente estudo. O valor de perdas e recusas foi de 10,5%. Os entrevistados, em sua maioria, foram do sexo feminino (51,6%), de cor da pele branca (85,3%), apresentaram até oito anos de estudos completos (75%) e relataram ter um emprego no momento (61%). Aproximadamente 40% deles tinham entre 40 e 59 anos e 26,2% residiam em domicílios que continham três pessoas. As doenças mais prevalentes foram colesterol alto e doenças reumáticas, 14,9% e 19,3%, respectivamente. Em relação à percepção de QV global e de saúde, 22,5% relataram QV regular, ruim ou muito ruim e 26,3% estavam insatisfeitos com sua saúde (Tabela 1).
A Tabela 2 apresenta as estimativas de associação entre as variáveis independentes e os quatro domínios de QV avaliados com base no modelo teórico hierárquico. Para o domínio físico, as mulheres apresentaram, em média, aproximadamente cinco pontos a menos de QV em relação aos homens. Conforme aumento da faixa etária, foi observada tendência linear de pior QV nesse domínio (p < 0,001), de maneira que aqueles com 60 anos ou mais apresentaram em média 11,0 pontos a menos em relação aos mais jovens. Os menos escolarizados (zero a quatro anos; cinco a oito anos) relataram pior QV em relação àqueles com nove a 11 anos e 12 anos ou mais. Quanto ao índice de bens, o quintil mais pobre também apresentou diferença significativa em relação ao mais rico. Por fim, aqueles empregados obtiveram em média 4,0 pontos a mais de QV do que os não empregados. Todas as doenças avaliadas foram associadas a escores mais baixos de QV no domínio físico. A pior média de pontuação foi nas doenças reumáticas (IC95% -10,9– -6,82).
Em relação ao domínio psicológico, as mulheres relataram, em média, 5,0 pontos a menos do que os homens. No que se refere à idade, observou-se piora de QV com o aumento da idade (p = 0,001). Indivíduos mais velhos apresentaram 4,9 pontos a menos de QV em relação aos mais novos. Quanto à escolaridade, houve melhora da QV com o aumento de anos de estudo (p < 0,001). Indivíduos menos escolarizados apresentaram em média 7,9 pontos a menos de QV em relação aos mais escolarizados. Quanto ao índice de bens, o quintil mais pobre apresentou em média 3,6 pontos a menos de QV em relação ao quintil mais rico. Estar empregado (p = 0,034) e morar com companheiro (p = 0,019) foram associados à maior média de QV. Aqueles que relataram ter diabetes, colesterol alto ou doenças reumáticas obtiveram piores médias de QV em relação aos grupos de referência (Tabela 2).
Para o domínio relações sociais, observou-se uma tendência linear de piores médias de QV conforme o aumento da idade (p < 0,001). Os idosos apresentaram, em média, 5,2 pontos a menos em comparação aos mais jovens. Em relação ao índice de bens, o quintil mais pobre apresentou menor pontuação de QV em relação ao quintil mais rico (Tabela 2). Conforme aumento do número de moradores por domicílio, piores foram as médias de pontuação de QV (p = 0,001). Os que estavam empregados no momento da entrevista relataram, em média, 1,7 pontos a mais em relação à sua categoria de referência (p = 0,050). Em relação às doenças, ter colesterol alto ou doenças reumáticas estiveram associadas a piores pontuações de QV (Tabela 2).
Para o domínio meio ambiente, as mulheres apresentaram, em média, 1,8 pontos a menos do que os homens. Em relação à idade, apenas a categoria entre 40 e 59 anos apresentou redução estatisticamente significante de pontos de QV comparado aos mais jovens. O quintil mais rico apresentou melhor QV que o quintil mais pobre (7,7 pontos em média). A presença de colesterol alto, doenças respiratórias e reumáticas foram associados a piores escores de QV. As doenças reumáticas novamente apresentaram a pior pontuação (IC95% -4,67– -0,28).
As variáveis cor da pele e o percentual de tempo residido na zona rural não foram associados a nenhum dos quatro domínios.
Considerando as duas questões gerais (Tabela 3), observou-se que, à medida que aumentava a idade, as chances de ter uma pior QV (passar da categoria muito boa para boa e da boa para regular, ruim ou muito ruim) também aumentavam (p = 0,001). Os indivíduos com cor de pele diferente da branca tiveram 1,7 vezes mais chance de relatar categorias de pior QV (IC95% 1,20–2,28). Além disso, nos quintis mais ricos e nos mais escolarizados foi observado maior proteção para relato de piores QV. Para aqueles que residiam a vida toda na zona rural, a chance de relatar pior percepção de QV global foi 35% maior do que para aqueles que residiam há menos da metade de suas vidas (p = 0,049). Na presença das doenças, a chance de ter pior qualidade de vida foi maior entre aqueles com colesterol alto (IC95% 1,04–1,85).
Ademais, a chance de apresentar menor satisfação com a saúde foi maior entre as mulheres (p = 0,001) e também aumentou linearmente conforme aumento da idade (p = 0,001), chegando a 126% a mais em idosos do que nos mais jovens. Já os que tinham emprego tiveram menor chance de apresentar menor satisfação com sua saúde (IC95% 0,50–0,94). Em relação à presença de doenças, todas as avaliadas foram significantemente associadas à menor satisfação com a saúde, exceto doenças cardiovasculares (Tabela 3).
DISCUSSÃO
Neste estudo, investigou-se a qualidade de vida, bem como seus determinantes demográficos e socioeconômicos na população rural do município de Pelotas, onde 23% dos indivíduos relataram ter uma QV global regular, ruim ou muito ruim e 26% relataram não estar satisfeitos com sua saúde.
Quanto aos fatores determinantes da QV na população rural de Pelotas, destaca-se a associação negativa entre QV na maioria dos domínios e o sexo feminino, resultado observado previamente em zonas rural e urbana no Brasil88. Kostka J, Borowiak E, Kostka T. Nutritional status and quality of life in different populations of older people in Poland. Eur J Clin Nutr. 2014:68(11):1210-5. https://doi.org/10.1038/ejcn.2014.172
https://doi.org/10.1038/ejcn.2014.172... . A maior exposição de mulheres a alguns fatores avaliados nos domínios físico e psicológico, como consumo de medicamentos1414. Bertoldi AD, Barros AJD, Hallal PC, Lima RC. Utilização de medicamentos em adultos: prevalência e determinantes individuais. Rev Saude Publica. 2004;38(2):228-38. https://doi.org/10.1590/S0034-89102004000200012
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200400... , depressão1515. Mola CL, Quevedo LA, Pinheiro RT, Gonçalves H, Gigante DP, Motta JVS, et al. The effect of fetal and childhood growth over depression in early adulthood in a Southern Bazilian birth cohort. PloS One. 2015;10(10):e0140621. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0140621
https://doi.org/10.1371/journal.pone.014... e outros transtornos psiquiátricos comuns1616. Anselmi L, Barros FC, Minten GC, Gigante DP, Horta BL, Victora CG, et al. Prevalência e determinantes precoces dos transtornos mentais comuns na coorte de nascimentos de 1982, Pelotas, RS. Rev Saude Publica. 2008;42 Supl 2:26-33. https://doi.org/10.1590/S0034-89102008000900005
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200800... já foi constatada na zona urbana de Pelotas, podendo também estar relacionado à QV na zona rural. Consistentemente, as mulheres da zona rural de Pelotas apresentaram maior chance de relatar pior satisfação com sua saúde. A presença feminina na economia rural está fortemente marcada pela divisão sexual do trabalho, de forma que suas ocupações na zona rural envolvam funções com poucos fins lucrativos. A realização de atividades com pouca ou nenhuma remuneração, como as voltadas para o autoconsumo familiar, cuidados com os filhos e demais membros das famílias, bem como o cuidado de horta e pequenos animais, pode contribuir para as mulheres apresentarem pior QV na maioria dos domínios avaliados. O domínio ambiente também apresentou essa mesma relação para mulheres, possivelmente devido a alguns aspectos relacionados ao ambiente do lar, recreação ou lazer, cuidados sociais e de saúde e recursos financeiros1717. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa, Departamento de Apoio à Gestão Participativa. Tecendo a saúde das mulheres do campo, da floresta e das águas: direitos e participação social. Brasília (DF); 2015. (Movimentos Sociais, 2). Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/tecendo_saude_mulheres_campo_floresta.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe... .
As mulheres do campo têm sua vida fortemente marcada pelas características do local onde residem, o que torna desafiante a reflexão sobre a sua situação de saúde. A saúde dessas mulheres está diretamente relacionada às condições de vida e trabalho, produzindo riscos como adoecimentos e agravos à saúde. Essas vulnerabilidades são decorrentes de vários fatores; entre eles, estão a desigualdade nas relações de gênero, raça e classe social referente aos determinantes sociais das condições da saúde, como as doenças relacionadas ao trabalho, à violência sexual e às doenças mentais1717. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa, Departamento de Apoio à Gestão Participativa. Tecendo a saúde das mulheres do campo, da floresta e das águas: direitos e participação social. Brasília (DF); 2015. (Movimentos Sociais, 2). Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/tecendo_saude_mulheres_campo_floresta.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe... . O conhecimento dessas características implica na identificação de situações que afetam negativamente as condições físicas, mentais, ambientais e de saúde das mulheres, permitindo o desenvolvimento de políticas que sejam capazes de contribuir no melhor estado de saúde e qualidade de vida das mesmas.
O aumento da idade também se configurou como importante fator de vulnerabilidade na zona rural de Pelotas, estando relacionado com piores médias de QV para os domínios físico, psicológico, relações sociais e percepção de QV global. Limitações no trabalho e lazer, mudanças estéticas, desenvolvimento de doenças, dependência de outros indivíduos para se relacionar e preconceitos relacionados à idade são fatores considerados consequência do processo de envelhecimento e que poderiam impactar negativamente a QV1818. Ran L, Jiang X, Li B, Kong H, Du M, Wang X, et al. Association among activities of daily living, instrumental activities of daily living and health-related quality of life in elderly Yi ethnic minority. BMC Geriatr. 2017;17(1):74. https://doi.org/10.1186/s12877-017-0455-y.
https://doi.org/10.1186/s12877-017-0455-... ,1919. Fialho CB, Lima-Costa MF, Giacomin KC, Loyola Filho AI. Capacidade funcional e uso de serviços de saúde por idosos da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil: um estudo de base populacional. Cad Saude Publica. 2014;30(3):599-610. https://doi.org/10.1590/0102-311X00090913
https://doi.org/10.1590/0102-311X0009091... .
Determinantes socioeconômicos possuem papel relevante no contexto de comportamentos em saúde1919. Fialho CB, Lima-Costa MF, Giacomin KC, Loyola Filho AI. Capacidade funcional e uso de serviços de saúde por idosos da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil: um estudo de base populacional. Cad Saude Publica. 2014;30(3):599-610. https://doi.org/10.1590/0102-311X00090913
https://doi.org/10.1590/0102-311X0009091... entre pessoas de menor nível socioeconômico e menor escolaridade1919. Fialho CB, Lima-Costa MF, Giacomin KC, Loyola Filho AI. Capacidade funcional e uso de serviços de saúde por idosos da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil: um estudo de base populacional. Cad Saude Publica. 2014;30(3):599-610. https://doi.org/10.1590/0102-311X00090913
https://doi.org/10.1590/0102-311X0009091... ,2020. Lima-Costa MF. A escolaridade afeta, igualmente, comportamentos prejudiciais à saúde de idosos e adultos mais jovens? Inquérito de Saúde da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Epidemiol Serv Saude. 2004;13(4):201-8. https://doi.org/10.5123/S1679-49742004000400002
https://doi.org/10.5123/S1679-4974200400... . Nesse sentido, observou-se associação negativa entre escolaridade e escores de QV para os domínios físico e psicológico, bem como para percepção de QV global. O efeito da baixa escolaridade em aquisição de hábitos de vida negativos à saúde, como maior prevalência de sedentarismo, menor consumo de frutas, verduras ou legumes frescos, maior consumo de bebidas alcoólicas e maior prevalência de tabagismo já foi descrito em zonas urbanas2121. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2008. Rio de Janeiro: IBGE; 2009.. É possível que o elevado nível de analfabetismo em áreas rurais2222. Schmidt MI, Duncan BB, Silva GA, Menezes AM, Monteiro CA, Barreto SM. et al. Chronic non-communicable diseases in Brazil: burden and current challenges. Lancet. 2011;377(9781):1949-61. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(11)60135-9
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(11)60... , também evidenciado no presente estudo, possa estar relacionado a piores comportamentos em saúde e, consequentemente, à pior QV. Isso ressalta a importância de melhorar o acesso e a qualidade do ensino na zona rural, já que a escolaridade é um importante indicador de saúde e pode impactar negativamente na QV dessa população.
Além disso, os indivíduos com menor nível socioeconômico apresentaram menores escores de QV para todos os domínios e pior percepção de QV global. De maneira consistente, os participantes empregados apresentaram melhores médias de QV para a maioria dos domínios e maior chance de ter melhor satisfação com a saúde. Fatores socioeconômicos refletidos em, por exemplo, número de consultas médicas e odontológicas2121. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2008. Rio de Janeiro: IBGE; 2009. podem impactar diretamente a saúde. Ainda, o fato de estar empregado influencia os padrões de vida, o comportamento e a saúde das populações, de maneira que maior renda, maior escolaridade e maiores cuidados com a saúde são observados em indivíduos empregados2323. Bierman A, Fazio EM, Milkie MA. A multifaceted approach to the mental health advantage of the married. Assessing how explanations vary by outcome measure and unmarried group. J Fam Issues. 2006;27(4):554-82. https://doi.org/10.1177/0192513X05284111
https://doi.org/10.1177/0192513X05284111... . É provável que os indicadores socioeconômicos se comportem similarmente, dentro das populações rurais e urbanas, de forma que os resultados amostrados reflitam as desigualdades relacionadas às características demográficas, sociais, culturais e de saúde na população de forma geral, indicando que os mais pobres e menos escolarizados estejam sempre entre aqueles grupos mais vulneráveis.
Dentre todos os desfechos, a variável cor da pele mostrou-se associada apenas com percepção de QV global. Indivíduos que autorreferiram cor de pele diferente da branca apresentaram maior chance de ter pior percepção de QV. No Brasil, maiores taxas de mortalidade e morbidade e menor expectativa de vida são observados em indivíduos de cor de pele não branca. Ainda, esse grupo de indivíduos faz parte daqueles com menores condições financeiras e menor acesso à saúde e aos recursos ligados ao conhecimento, de forma que permaneçam ao longo da vida prejudicados, tanto na zona rural quanto na urbana, em relação às desigualdades sociais e de saúde no Brasil66. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013: percepção do estado de saúde, estilos de vida e doenças crônicas: Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: IBGE; MS; 2014 [cited 2018 Feb 12]. Available from: ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.pdf
ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.p... ,1111. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 [cited 2018 Feb 13]. Available from: http://www.censo2010.ibge.gov.br/
http://www.censo2010.ibge.gov.br/... .
Residir com companheiro esteve associado à melhor QV no domínio psicológico. Os resultados da literatura não mostram uma direção clara no que diz respeito à saúde mental de indivíduos casados. Ambos os resultados de melhor e pior saúde mental já foram observados2424. Vidal CEL, Gontijo EcDM, Lima LA. Tentativas de suicídio: fatores prognósticos e estimativa do excesso de mortalidade. Cad Saude Publica. 2013;29(1):175-87. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2013000100020
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201300... ,2525. Han KT, Park EC, Kim JH, Kim SJ, Park S. Is marital status associated with quality of life? Health Qual Life Outcomes. 2014;12:109. https://doi.org/10.1186/s12955-014-0109-0
https://doi.org/10.1186/s12955-014-0109-... . No entanto, menores taxas de mortalidade e morbidade foram associadas ao fato de ser casado em outros estudos2626. Chen Y, Sun G, Guo X, Chen S, Chang Y, Li Y, et al. Factors affecting the quality of life among Chinese rural general residents: a cross-sectional study. Public Health. 2017;146:140-7. https://doi.org/10.1016/j.puhe.2017.01.023
https://doi.org/10.1016/j.puhe.2017.01.0... ,2727. Fundação Nacional de Saúde (BR). Saúde da população negra no Brasil: contribuições para a promoção da equidade. Brasília (DF): FUNASA; 2005 [cited 2018 Feb 12]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/pop_negra/pdf/saudepopneg.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/pop_negra/... . Neste estudo, o aumento do número de indivíduos residentes no domicílio esteve associado à redução da média de QV no domínio relações sociais. A redução da privacidade dos moradores, tanto nos aspectos ligados às facetas de atividade sexual quanto nas relações ou suportes sociais conferidos por maior número de pessoas residentes em um mesmo domicílio poderia explicar tal achado2828. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Atenção primária e promoção da saúde. Brasília (DF): CONASS; 2011..
Em relação às características específicas de zonas rurais, ressalta-se a sua distância geográfica dos grandes centros urbanos e a dificuldade de acesso à alimentação, às oportunidades de emprego e aos serviços de saúde25–30. Além disso, embora haja escolas localizadas na zona rural, a distância e o difícil deslocamento poderiam ser fatores que dificultassem o acesso dos estudantes à sala de aula. Em consequência disso, é possível que a associação entre o maior percentual de tempo residido na zona rural e a menor chance de relatarem melhor QV seja explicada pela pouca infraestrutura disponível nas áreas rurais. Estudos posteriores, conduzidos em outras zonas rurais, são importantes para confirmar estes achados, bem como explorar as possíveis causas.
Em relação à presença de doenças como HAS, diabetes, colesterol alto e doenças cardiovasculares, respiratórias e reumáticas, a redução de escores do domínio físico foi associada à presença de todas as doenças, resultado que concorda com o observado em zona rural da Turquia3030. Arslantas D, Ursal A, Metintas S, Koc F, Arslantas A. Life quality and daily life activities of elderly people in rural areas, Eskisehir (Turkey). Arch Gerontol Geriatr. 2009;48(2):127-31. https://doi.org/10.1016/j.archger.2007.11.005
https://doi.org/10.1016/j.archger.2007.1... e que pode refletir incapacidades e limitações nos indivíduos em atividades de trabalho e de lazer66. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013: percepção do estado de saúde, estilos de vida e doenças crônicas: Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: IBGE; MS; 2014 [cited 2018 Feb 12]. Available from: ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.pdf
ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.p... .
O presente estudo apresenta, como limitação intrínseca ao seu processo de amostragem, a possibilidade de aqueles indivíduos com residência distante dos núcleos de casas selecionados apresentarem perfis de saúde e estilos de vida diferentes daqueles avaliados, o que poderia modificar os resultados observados. Ainda, o período de realização do estudo englobou meses de maior intensidade da colheita de alguns cultivos, o que impossibilitou a entrevista daqueles envolvidos em trabalho exaustivo na colheita, e que poderiam relatar pior QV. Por outro lado, destacam-se o grande tamanho amostral e o baixo percentual de perdas e recusas. Em relação à QV, salienta-se o uso de um instrumento desenvolvido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e validado no Brasil. Além disso, este estudo diferencia-se pelo fato de ser de base populacional, em adultos residentes em zona rural. A maioria dos estudos avaliando QV são específicos da zona urbana, com idosos e realizados em pessoas portadoras de morbidades.
Por fim, este estudo apresentou dados alarmantes em relação a um importante marcador de saúde, pouco explorado em populações rurais. Aproximadamente um quarto da população relatou uma QV regular, ruim, ou muito ruim e pouca satisfação com a saúde. Somado ao fato de que indivíduos que residem na zona rural a vida toda apresentam pior QV, os achados mostram a importância da implementação de programas de saúde que busquem a melhora da QV dessa população. Ainda, este trabalho ressalta a vulnerabilidade de três importantes grupos: mulheres, indivíduos mais pobres e com menos escolaridade, e mais velhos. A QV enquanto um indicador de saúde gera informações que podem ser utilizadas para rastreamento e identificação das necessidades de saúde de uma população. As informações aqui apresentadas podem ser utilizadas em programas de saúde pública específicos para habitantes das zonas rurais do país, considerando as peculiaridades do local quanto à infraestrutura e às necessidades de saúde dessa população.
Referências bibliográficas
- 1Fleck MPA, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, Santos L, et al. Aplicação da versão em português do instrumento abreviado de avaliação da qualidade de vida “WHOQOL-bref”. Rev Saude Publica. 2000;34(2):178-83. https://doi.org/10.1590/S0034-89102000000200012
» https://doi.org/10.1590/S0034-89102000000200012 - 2Minayo MCS, Hartz ZMA, Buss PM. Qualidade de vida e saúde: um debate necessário. Cienc Saude Coletiva. 2000;5(1):7-18. https://doi.org/10.1590/S1413-81232000000100002
» https://doi.org/10.1590/S1413-81232000000100002 - 3Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) 2014. Rio de Janeiro: IBGE; 2015 [cited 2018 Feb 12]. Available from: https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2014/default.shtm
» https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2014/default.shtm - 4Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008-2009: despesas, rendimentos e condições de vida. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 [cited 2018 Feb 12]. Available from: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv45130.pdf
» https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv45130.pdf - 5Sonati JG, Vilarta R, Maciel ES, Modeneze DM, Vilela Junior GB, Lazari VO, et al. Análise comparativa da qualidade de vida de adultos e idosos envolvidos com a prática regular de atividade física. Rev Bras Geriatr Gerontol 2014;17(4):731-9. https://doi.org/10.1590/1809-9823.2014.13122
» https://doi.org/10.1590/1809-9823.2014.13122 - 6Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013: percepção do estado de saúde, estilos de vida e doenças crônicas: Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: IBGE; MS; 2014 [cited 2018 Feb 12]. Available from: ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.pdf
» ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.pdf - 7Carneiro FF, Rigotto RM, Augusto LGS, Friedrich K, Búrigo AC, organizadores. Dossiê ABRASCO: um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde. Rio de Janeiro: EPSJV; Expressão Popular; 2015 [cited 2018 Feb 12]. Available from: http://www.epsjv.fiocruz.br/sites/default/files/l241.pdf
» http://www.epsjv.fiocruz.br/sites/default/files/l241.pdf - 8Kostka J, Borowiak E, Kostka T. Nutritional status and quality of life in different populations of older people in Poland. Eur J Clin Nutr 2014:68(11):1210-5. https://doi.org/10.1038/ejcn.2014.172
» https://doi.org/10.1038/ejcn.2014.172 - 9Moreira JPL, Oliveira BLCA, Muzi CD, Cunha CLF, Brito AS, Luiz RR. A saúde dos trabalhadores da atividade rural no Brasil. Cad Saude Publica. 2015;31(8):1698-708. https://doi.org/10.1590/0102-311X00105114
» https://doi.org/10.1590/0102-311X00105114 - 10Shepherd D, Welch D, Dirks KN, McBride D. Do quiet areas afford greater health-related quality of life than noisy areas? Int J Environ Res Public Health 2013;10(4):1284-303. https://doi.org/10.3390/ijerph10041284
» https://doi.org/10.3390/ijerph10041284 - 11Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 [cited 2018 Feb 13]. Available from: http://www.censo2010.ibge.gov.br/
» http://www.censo2010.ibge.gov.br/ - 12Gonçalves H, Tomasi E, Tovo-Rodrigues L, Bielemann RM, Machado AKF, Ruivo ACO, et al. Estudo de base populacional na zona rural: metodologia e desafios. Rev Saude Publica 2018;52 Supl 1:3s. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018052000270
» https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018052000270 - 13Fleck MPA, Leal OF, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, et al. Desenvolvimento da versão em português do instrumento de avaliação de qualidade de vida da OMS (WHOQOL-100). Rev Bras Psiquiatr 1999;21(1):19-28. https://doi.org/10.1590/S1516-44461999000100006
» https://doi.org/10.1590/S1516-44461999000100006 - 14Bertoldi AD, Barros AJD, Hallal PC, Lima RC. Utilização de medicamentos em adultos: prevalência e determinantes individuais. Rev Saude Publica 2004;38(2):228-38. https://doi.org/10.1590/S0034-89102004000200012
» https://doi.org/10.1590/S0034-89102004000200012 - 15Mola CL, Quevedo LA, Pinheiro RT, Gonçalves H, Gigante DP, Motta JVS, et al. The effect of fetal and childhood growth over depression in early adulthood in a Southern Bazilian birth cohort. PloS One 2015;10(10):e0140621. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0140621
» https://doi.org/10.1371/journal.pone.0140621 - 16Anselmi L, Barros FC, Minten GC, Gigante DP, Horta BL, Victora CG, et al. Prevalência e determinantes precoces dos transtornos mentais comuns na coorte de nascimentos de 1982, Pelotas, RS. Rev Saude Publica 2008;42 Supl 2:26-33. https://doi.org/10.1590/S0034-89102008000900005
» https://doi.org/10.1590/S0034-89102008000900005 - 17Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa, Departamento de Apoio à Gestão Participativa. Tecendo a saúde das mulheres do campo, da floresta e das águas: direitos e participação social. Brasília (DF); 2015. (Movimentos Sociais, 2). Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/tecendo_saude_mulheres_campo_floresta.pdf
» http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/tecendo_saude_mulheres_campo_floresta.pdf - 18Ran L, Jiang X, Li B, Kong H, Du M, Wang X, et al. Association among activities of daily living, instrumental activities of daily living and health-related quality of life in elderly Yi ethnic minority. BMC Geriatr 2017;17(1):74. https://doi.org/10.1186/s12877-017-0455-y
» https://doi.org/10.1186/s12877-017-0455-y - 19Fialho CB, Lima-Costa MF, Giacomin KC, Loyola Filho AI. Capacidade funcional e uso de serviços de saúde por idosos da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil: um estudo de base populacional. Cad Saude Publica 2014;30(3):599-610. https://doi.org/10.1590/0102-311X00090913
» https://doi.org/10.1590/0102-311X00090913 - 20Lima-Costa MF. A escolaridade afeta, igualmente, comportamentos prejudiciais à saúde de idosos e adultos mais jovens? Inquérito de Saúde da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Epidemiol Serv Saude. 2004;13(4):201-8. https://doi.org/10.5123/S1679-49742004000400002
» https://doi.org/10.5123/S1679-49742004000400002 - 21Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2008. Rio de Janeiro: IBGE; 2009.
- 22Schmidt MI, Duncan BB, Silva GA, Menezes AM, Monteiro CA, Barreto SM. et al. Chronic non-communicable diseases in Brazil: burden and current challenges. Lancet. 2011;377(9781):1949-61. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(11)60135-9
» https://doi.org/10.1016/S0140-6736(11)60135-9 - 23Bierman A, Fazio EM, Milkie MA. A multifaceted approach to the mental health advantage of the married. Assessing how explanations vary by outcome measure and unmarried group. J Fam Issues 2006;27(4):554-82. https://doi.org/10.1177/0192513X05284111
» https://doi.org/10.1177/0192513X05284111 - 24Vidal CEL, Gontijo EcDM, Lima LA. Tentativas de suicídio: fatores prognósticos e estimativa do excesso de mortalidade. Cad Saude Publica 2013;29(1):175-87. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2013000100020
» https://doi.org/10.1590/S0102-311X2013000100020 - 25Han KT, Park EC, Kim JH, Kim SJ, Park S. Is marital status associated with quality of life? Health Qual Life Outcomes 2014;12:109. https://doi.org/10.1186/s12955-014-0109-0
» https://doi.org/10.1186/s12955-014-0109-0 - 26Chen Y, Sun G, Guo X, Chen S, Chang Y, Li Y, et al. Factors affecting the quality of life among Chinese rural general residents: a cross-sectional study. Public Health. 2017;146:140-7. https://doi.org/10.1016/j.puhe.2017.01.023
» https://doi.org/10.1016/j.puhe.2017.01.023 - 27Fundação Nacional de Saúde (BR). Saúde da população negra no Brasil: contribuições para a promoção da equidade. Brasília (DF): FUNASA; 2005 [cited 2018 Feb 12]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/pop_negra/pdf/saudepopneg.pdf
» http://bvsms.saude.gov.br/bvs/pop_negra/pdf/saudepopneg.pdf - 28Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Atenção primária e promoção da saúde. Brasília (DF): CONASS; 2011.
- 29Reichert FF, Loch MR, Capilheira MF. Autopercepção de saúde em adolescentes, adultos e idosos.Cienc Saude Coletiva 2012;17(12):3353-62. https://doi.org/10.1590/S1413-81232012001200020
» https://doi.org/10.1590/S1413-81232012001200020 - 30Arslantas D, Ursal A, Metintas S, Koc F, Arslantas A. Life quality and daily life activities of elderly people in rural areas, Eskisehir (Turkey). Arch Gerontol Geriatr. 2009;48(2):127-31. https://doi.org/10.1016/j.archger.2007.11.005
» https://doi.org/10.1016/j.archger.2007.11.005
- Financiamento: Programa de Excelência Acadêmica da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior (CAPES/PROEX – Processo 23038.002445/2015-97, número do auxílio 1012/2015).
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
17 Set 2018
Histórico
- Recebido
31 Maio 2017 - Aceito
21 Dez 2017