Resumos
Segundo o relatório do Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC, 2013), que compara dados relativos à prevalência do VIH em trabalhadores do sexo em 27 países da Europa e da Ásia Central, Portugal é o terceiro país com a maior prevalência da infeção entre essa população. A elevada prevalência comparativa da infeção entre os trabalhadores do sexo em Portugal contrasta com o uso reportado de meios de prevenção e diagnóstico. O artigo debruça-se sobre um dos aspetos desse fenómeno: a atividade das organizações da sociedade civil na área da prevenção das infeções sexualmente transmissíveis (IST) em Portugal, de modo a analisar como se relacionam com as trabalhadoras do sexo e concebem as ações de prevenção e o apoio social que lhes dirigem. Essa questão surge como pertinente à medida que a discrepância verificada poderá indicar uma adesão formal (mas não necessariamente real), por parte das trabalhadoras do sexo, a uma retórica socialmente valorizada de prevenção, a qual é canalizada pelas organizações. Esse discurso pode ser por si mais ou menos apreendido, condicionando a implementação prática dos meios de prevenção propostos. Estamos assim perante um potencial fator explicativo a considerar na análise crítica do nível de efetividade dessas ações.
Organizações da sociedade civil; Trabalhadoras do sexo; Infeções sexualmente transmissíveis; Imigração
Introdução
O presente artigo enquadra-se no âmbito do projeto “Imigrantes e serviços de apoio social: tecnologias de cidadania em Portugal”, implementado entre 2010 e 2013 pelo Centro em Rede de Investigação em Antropologia (CRIA), em Lisboa, com financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). O projeto teve por objetivo analisar criticamente os programas de apoio social desenvolvidos pela rede de apoio em Portugal. A rede de apoio acompanha e monitoriza a integração dos imigrantes, equacionando até que ponto eles se desenvolvem em torno da dicotomia vulnerabilidade/risco: se por um lado os imigrantes surgem frequentemente conotados com problemáticas sociais como o desvio e a carência de competências sociais, por outro lado, podem ser representados enquanto vítimas de processos migratórios potencialmente traumáticos, que os remetem para uma situação de vulnerabilidade e, logo, de necessidade de intervenção social.
O projeto investigou a forma como a intervenção social, nesse contexto, pode assentar num normativismo cívico de carácter subjetivo, moral e culturalmente situado, que se distancia da forma como os imigrantes se percecionam a si próprios e à sua vivência. Esse fenómeno pode desembocar em eventuais incompatibilidades entre “assistidos” e “assistentes”, comprometendo assim a efetividade das intervenções e, nos casos mais extremos, desembocando em fenómenos de violência institucional. Partindo dessa perspetiva, o artigo centra-se no caso particular das mulheres imigrantes que se dedicam ao trabalho sexual.
A prostituição
O trabalho do sexo é entendido como toda e qualquer prestação remunerada de serviços sexuais. Nesse sentido, o trabalho do sexo, relacionando-se “[...] com serviços, desempenhos ou produtos sexuais comerciais (prostituição, pornografia, striptease , danças eróticas, chamadas eróticas)” ( Oliveira, 2011OLIVEIRA, A. Andar na vida : prostituição de rua e reacção social. Coimbra: Almedina, 2011. , p. 14), reveste-se de variadas formas. Estima-se que em Portugal as prostitutas de rua sejam apenas entre 10% a 20% do total das mulheres que se prostituem, o que significa que a maioria é “de interior”. O trabalho do sexo de interior ou prostituição indoor é aquele que decorre entre muros e representa a maior fatia da atividade prostitucional em Portugal ( Oliveira, 2004OLIVEIRA, A. As vendedoras de ilusões : estudo sobre prostituição: alterne e striptease. Lisboa: Notícias, 2004. ).
A prostituição é alvo de estigma porque põe em causa os valores culturais e morais que regulam a sexualidade feminina. No século XIX os discursos médicos e criminológicos consolidaram a imagem da prostituta como marginal, imoral e poluente. Atualmente, os discursos sociais atribuem às mulheres que se prostituem uma roupagem de vítima ( Parent e Coderre, 2000PARENT, C.; CODERRE, C. Le corps social de la prostituée: regards criminologiques. In: FRIGON, S.; KÉRÉSIT, M. (Org.). Du corps des femmes : contrôles, surveillances, résistances. Ottawa: Université d’Ottawa, 2000. p. 93-124. ; Ribeiro e col., 2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. ), a par com a de risco, sobretudo quando esses discursos as relacionam com a propagação de infeções sexualmente transmissíveis (IST) ( Oliveira, 2011OLIVEIRA, A. Andar na vida : prostituição de rua e reacção social. Coimbra: Almedina, 2011. ).
A falta de regulamentação do trabalho do sexo e o estigma que pesa sobre os trabalhadores do sexo (TS) constituem fatores de vulnerabilidade social e de risco para a saúde, pois são uma potencial barreira aos cuidados e à prevenção, por razões tais como a falta de confiança nos serviços de saúde e o medo da discriminação. Por um lado, essa situação contribui para a representação dos TS como população vulnerável; por outro lado, os discursos sociais associam a prostituição à marginalidade, à imoralidade e ao risco de propagação de IST. A dicotomia vulnerabilidade/ameaça marca assim a figura dos TS e o debate público em torno do trabalho do sexo, no qual a maioria das organizações da sociedade civil se destaca pelo papel ativo na sua afirmação social e capacitação.
Metodologia
No presente artigo é analisado o modo como as organizações da sociedade civil22O artigo adopta um entendimento da sociedade civil enquanto esfera intermediária entre o Estado, o mercado e a esfera privada (em detrimento de uma visão da sociedade civil enquanto esfera independente do Estado), focando essencialmente a “sociedade civil organizada” (em detrimento da sua vertente íntima e das formas de comunicação que ocorrem no âmbito desta vertente) ( Cohen e Arato, 1997 ). Assim, “[…] the focus is on civil society as the societal sphere composed of more or less organized groups which intermediate between State/public authority, market and private sphere” ( Smismans, 2006 , p. 7-8). que desenvolvem projetos de prevenção das IST junto dessa população lidam com a problemática do trabalho do sexo e da saúde sexual. Para tal, foi efetuada uma análise qualitativa das produções discursivas de quatro membros de organizações da sociedade civil que desenvolvem projetos de prevenção das IST dirigidos a TS, na Área Metropolitana de Lisboa, de uma académica implicada num projeto de investigação-ação dirigido a populações vulneráveis face à infeção por VIH e de uma TS, aos quais foram feitas entrevistas não diretivas. Foi igualmente realizada uma pesquisa documental dos programas de prevenção das IST e de apoio social a TS desenvolvidos pela generalidade das organizações da sociedade civil, em Portugal.
Os sujeitos entrevistados foram selecionados segundo dois critérios fundamentais: a relevância e a diversidade. As organizações envolvidas constituem uma referência incontornável na prevenção e controlo das IST em trabalhadores(as) do sexo, dada a abrangência e representatividade da sua intervenção. São organizações que surgem regularmente enquanto parceiras institucionais em projetos e estudos nessa área, e as atividades por elas desenvolvidas constituem, em conjunto, uma parte significativa da oferta de apoio a dispor dos trabalhadores do sexo na área metropolitana de Lisboa. Por outro lado, o tipo de estratégia que desenvolvem é diversificado e permite captar populações e contextos distintos: se uma organização trabalha numa lógica de proximidade na rua, outra fá-lo em indoor ; enquanto uma organização desenvolve ações de formação profissional com vista à reorientação da atividade desenvolvida pelo(a) trabalhador(a) do sexo, outra procura reduzir riscos no desempenho dessa mesma atividade mediante a oferta de um conjunto diversificado de serviços sociais, jurídicos e de saúde nas suas instalações.
De forma a obter um olhar exterior, as entrevistas foram complementadas com entrevista a uma académica de um instituto público com intervenção no âmbito das IST em população imigrante e com uma trabalhadora do sexo imigrante, selecionada segundo um processo aleatório. A metodologia adotada na realização das entrevistas consistiu numa abordagem aberta, não diretiva, precedida de uma apresentação das investigadoras e dos seus objetivos de investigação.
Políticas em torno da prostituição
No século XIX vigorava o sistema regulamentarista em quase todos os países europeus, incluindo Portugal. A atividade prostitucional era regulamentada pelo Estado por motivos de saúde pública. Nas casas de “toleradas”, as prostitutas estavam sujeitas à inspeção sanitária, a restrições e controlo policial motivados por preocupações morais e de saúde pública, numa tentativa de esconder a atividade prostitucional, vista como necessária mas imoral, e de controlar as mulheres consideradas responsáveis pela propagação de doenças venéreas. A regulamentação sugeria que a raiz do mal residia nelas e que os homens deveriam ser protegidos contra as prostitutas ( Corbin, 1978CORBIN, A. Les filles de noces : misère sexuelle et prostitution (19esiècle). Paris: Flammarion, 1978. ; Handman e Mossuz-Lavau, 2005HANDMAN, M.-E.; MOSSUZ-LAVAU, J. (Org.). La prostitution à Paris . Paris: La Martinière, 2005. ; Ribeiro e col., 2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. ). No século XX, foi imposto o modelo proibicionista, que se assentava na ideia de que a prostituição é um desvio moralmente condenável, e no pressuposto de que a prostituição degrada a condição da mulher e devia, por isso, ser ser proibida ( Manita e Oliveira, 2002MANITA, C.; OLIVEIRA, A. Estudo de caracterização da prostituição de rua no Porto e em Matosinhos . Porto: CIDM, 2002. ; Nor, 2001NOR, M. La prostitution , Paris: Le Cavalier Bleu, 2001. ). Em Portugal, entre 1963 e 1982, a prostituição era crime ( Oliveira, 2011OLIVEIRA, A. Andar na vida : prostituição de rua e reacção social. Coimbra: Almedina, 2011. ).
Atualmente, o modelo abolicionista é o mais frequente na Europa e aquele que vigora em Portugal. Esse modelo admite a prática da prostituição enquanto assunto privado, mas pune a sua exploração comercial por considerá-la lesiva à condição humana. Pressupõe que a prostituição deve ser abolida e que a prostituta ou trabalhadora do sexo – termo que foi substituindo o primeiro a partir do final do século XX33O conceito de trabalho sexual surge nos anos 1970, nos Estados Unidos da América. “O termo trabalho sexual implica que se considera tratar-se de uma actividade de prestação de serviços sexuais. O que implica a defesa da profissionalização destas actividades, sem estigma, e de forma a dignificar este trabalho exercido por mulheres, homens e transexuais” ( Oliveira, 2011 , p. 14). – assume um estatuto de vítima, particularmente da dominação masculina. E, embora não seja penalizada pela venda de serviços sexuais, não lhe é permitido trabalhar de forma legal, o que a mantém, por conseguinte, numa situação de exclusão e estigmatização ( Cazals, 1995CAZALS, A. Prostitution et proxénétisme en Europe . Paris: La Documentation Française, 1995. ; Gil, 2008GIL, F. La prostituée, une invention sociale. Sociétés , Montréal, v. 1, n. 99, p. 21-32, 2008. ; Ribeiro e col., 2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. ; Weitzer, 2007WEITZER, R. The social construction of sex trafficking: ideology and institutionalization of a moral crusade. Politics and Society , Thousand Oaks, v. 35, n. 3, p. 447-475, 2007. ). Ademais, é por vezes negado o acesso aos serviços de saúde aos TS, que muitas vezes são perseguidos e enfrentam acusações criminais e detenções ( Brussa e Munk, 2010BRUSSA, L.; MUNK, V. Vulnerabilities and rights of migrant sex workers in Europe. HIV AIDS Policy Law Review , Toronto, v. 15, n. 1, p. 61-62, 2010. ).
Entre perigo e vulnerabilidade
A questão da vulnerabilidade atravessa este trabalho, que reflete sobre as condições sociais do trabalho do sexo e o modo como operam os serviços de apoio social, particularmente os prestados a essa população por organizações da sociedade civil. Em Portugal, a esmagadora maioria dos TS são mulheres e, entre elas, grande parte é imigrante ( Machado e col., 2002MACHADO, H.; SILVA, M. C.; SILVA, S. Direito, ciência e corpo feminino: a prostituição como objecto de fronteira. Sociedade e Cultura: Série Sociologia, Cadernos do Noroeste , Braga, v. 18, n. 1-2, p. 183-203, 2002. ; Silva e col., 2005SILVA, M. C. et al. Prostituição feminina em regiões de fronteira : actores, estruturas e processos. Porto: Afrontamento, 2005. ).
Uma técnica entrevistada refere que, apesar da associação onde que trabalha não desenvolver projetos especificamente direcionados a TS imigrantes, na realidade, acaba por trabalhar quase só com imigrantes, pois cerca de 80% a 90% das trabalhadoras do sexo no contexto indoor em que intervém são imigrantes. A análise documental e as entrevistas efetuadas permitiram constatar que essas organizações, por regra, não desenvolvem respostas sociais especificamente concebidas para os TS imigrantes, sejam eles homens, mulheres ou transgéneros. Por isso, acabam por ser abarcados pelas valências e projetos que, de forma mais genérica, envolvem todos os TS, independentemente da sua nacionalidade e situação administrativa no país, embora possam se articular com organizações cuja população alvo são os imigrantes, a fim de encaminhar utentes que necessitem de apoio pela sua situação de imigração. Não se pode, pois, falar de “vulnerabilidade” de todos os TS.
As TS imigrantes representam um grupo diversificado pela sua situação de presença legal ou ilegal em Portugal; pelos seus países de origem, que lhes conferem um estatuto particular no universo do sexo comercial; pelo tempo de presença em território português; pelo estatuto socioeconómico; pelas redes sociais de apoio que possuem ou são capazes de mobilizar; pelo tipo de sexo comercial que praticam etc. Elas praticam vários tipos de prestação de serviços sexuais, que podem acontecer em diferentes locais: prostituição em apartamentos, danças eróticas e striptease em clubes, conversas eróticas ao telefone e via internet etc.
Ribeiro e colaboradores (2005)RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. constataram que as escolhas dos clientes se centram nas mulheres latino-americanas, particularmente as brasileiras. Essa preferência justifica-se por uma perceção dos clientes que veem essas mulheres “mais carinhosas”, “mais permissivas”, “mais comunicativas”, “mais desinibidas”, “mais expressivas”, “mais abertas”, “mais calorosas” e “mais meigas”. São também as mais recetivas a práticas sexuais menos convencionais, como a penetração anal e as práticas sadomasoquistas, pois “[...] estas mulheres têm com a sexualidade um relacionamento mais livre e menos recalcado, que se traduz numa menor interiorização dos estigmas” ( Ribeiro e col., 2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. , p. 52). Uma das técnicas entrevistadas considera que:
existe uma imagética acerca do que é que é exótico, do que é que é erótico, e a mulher brasileira está conotada dessa forma. Duma forma científica acho que não podemos correr esse risco, mas acho que isso está presente no imaginário dos homens que as procuram.
Segundo as nossas informantes, a chegada de mulheres brasileiras ao mercado do sexo português, conjugada com essa preferência de alguns clientes, aumentou a concorrência entre as TS e, por conseguinte, fez aumentar as práticas de risco, pois um dos argumentos de venda de serviços sexuais de prostitutas que têm pouca atratividade é o sexo desprotegido. Não existem estatísticas sobre as nacionalidades das TS, no entanto, as mulheres brasileiras tendem a ser associadas na sociedade portuguesa ao trabalho do sexo, o que pode colocar problemas às imigrantes do Brasil, como testemunha a TS entrevistada:
Para alugar um apartamento é muito difícil. O proprietário pede contrato de trabalho, legalização, fiador. Hoje em dia já diminuiu porque o que mais tem é apartamento para vender e para alugar, e quando tu dizes que és brasileira eles não querem alugar, porque pensam diretamente que é para convívio.
Apesar de reconhecerem a sua diversidade, essa população é descrita pela maioria das técnicas entrevistadas de organizações da sociedade civil que com ela lidam como particularmente vulnerável. Com efeito, muitas das TS são imigrantes, principalmente da América Latina e Europa de Leste, vivem em situação de precariedade socioeconómica, têm um reduzido capital social e cultural, praticam uma atividade não regulamentada pelo direito do trabalho e que é socialmente desvalorizada ou mesmo estigmatizada ( Coelho, 2009COELHO, B. Corpo adentro. Prostitutas acompanhantes em processo de invenção de si . Lisboa: Difel, 2009. ; Silva e col., 2005SILVA, M. C. et al. Prostituição feminina em regiões de fronteira : actores, estruturas e processos. Porto: Afrontamento, 2005. ), e estão por vezes em situação irregular no país.
Sem negar situações concretas de vulnerabilidade, constata-se haver, tanto nas representações sociais como nos discursos académicos, uma vulnerabilização das prostitutas imigrantes a par com uma patologização das mulheres que se prostituem ( Coelho, 2009COELHO, B. Corpo adentro. Prostitutas acompanhantes em processo de invenção de si . Lisboa: Difel, 2009. ; Weitzer, 2007WEITZER, R. The social construction of sex trafficking: ideology and institutionalization of a moral crusade. Politics and Society , Thousand Oaks, v. 35, n. 3, p. 447-475, 2007. ).
Os aspetos mais negativos e estereotipados sobre o trabalho sexual, em geral, e a prostituição de rua, em particular, têm sido evidenciados pelas diferentes vozes que dizem o trabalho sexual. Os diversos discursos – mediático, institucional, popular e algum do discurso científico – têm limitado o seu âmbito à pobreza, à marginalidade, à degradação, à droga e à doença. Atualmente, o tema tem ganho visibilidade por via da retórica da luta contra o tráfico e a exploração sexual ( Oliveira, 2011OLIVEIRA, A. Andar na vida : prostituição de rua e reacção social. Coimbra: Almedina, 2011. , p. 8-9).
Apesar disso, em contraste com essa perspetiva, a académica entrevistada declara que:
Não sou daquelas pessoas que acha que a pessoa por ser migrante é inevitavelmente mais vulnerável. [...] há uma maior vulnerabilidade porque há todo esse processo [de imigração] com que as pessoas têm que lidar, mas não tem que inevitavelmente ser um grupo mais vulnerável.
Um elemento de vulnerabilidade das TS que trabalham em clubes e pensões, apontado por alguns autores ( Costa e Alves, 2001COSTA, J. M. B.; ALVES, L. O masculino e o feminino de rua . Lisboa: Colibri, 2001. ; Ribeiro e col., 2008RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. ; Sacramento, 2005SACRAMENTO, O. Os clientes da prostituição abrigada : a procura do sexo comercial na perspectiva da construção da masculinidade. 2005. Tese (Mestrado em Antropologia) - Universidade do Minho, Braga, 2005. ), para além da informalidade da atividade, prende-se com a procura constante de novidades por parte dos clientes, que as obriga a circularem permanentemente por diversas zonas do país, fazendo aquilo que na gíria da profissão se denomina “uma praça”, não lhes permitindo ficar muito tempo num mesmo local e numa mesma residência. Segundo Ribeiro e colaboradores (2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. , 2008RIBEIRO, M. et al. Vidas na raia : prostituição feminina em regiões de fronteira. Porto: Afrontamento, 2008. ), o trabalho do sexo torna-se assim uma prática informal, exercida em boa parte por imigrantes, entre os quais muitas mulheres em situação irregular, que se escondem em pensões, clubes ou bares de alterne. Os clubes têm em vigor um conjunto de regras, geralmente sob forma de regulamento interno, ao qual as TS estão sujeitas, que escapam a qualquer enquadramento legal.
A prostituição não é regulamentada. A informalidade do trabalho do sexo, à qual se acrescenta por vezes a situação de ilegalidade da permanência no país, constitui frequente uma barreira aos cuidados de saúde e um fator de risco em relação às IST, tanto pelo receio de identificação por instituições cuidadoras que possam partilhar os dados obtidos com as autoridades policiais e consequente expulsão do país, que inibe as mulheres em situação irregular de recorrerem a estruturas de diagnóstico, de apoio e de saúde, como pela relutância ou impossibilidade em se deslocarem a instituições de cuidados de saúde por desconhecimento, falta de confiança no sistema de saúde, falta de autoestima e consequente desleixo em relação aos cuidados de saúde, ou ainda por medo de serem discriminadas ( Deschamps, 2006DESCHAMPS, C. Le sexe et l’argent des trottoirs . Paris: Hachette Littératures, 2006. ; Brussa e Munk, 2010BRUSSA, L.; MUNK, V. Vulnerabilities and rights of migrant sex workers in Europe. HIV AIDS Policy Law Review , Toronto, v. 15, n. 1, p. 61-62, 2010. ; Sacramento, 2005SACRAMENTO, O. Os clientes da prostituição abrigada : a procura do sexo comercial na perspectiva da construção da masculinidade. 2005. Tese (Mestrado em Antropologia) - Universidade do Minho, Braga, 2005. , 2011SACRAMENTO, O. Liminal spaces: reflections on the proxemia of cross-border demand for prostitution. Space and Culture , Thousand Oaks, v. 14, n. 4, p. 367-383, 2011. ), como testemunha uma das técnicas entrevistadas:
Em relação aos imigrantes, o acesso à saúde é uma situação difícil em Portugal [...] é o receio de irem aos serviços e serem sinalizados ao SEF [Serviço de Estrangeiros e Fronteiras], é o receio de não serem aceites, de serem estigmatizados e irem de volta para o país de origem. Se as pessoas tiverem coragem de enfrentar todo o processo, que não é fácil, depois têm o processo burocrático de irem à Junta de Freguesia buscar o atestado de residência com duas testemunhas que residam ali, com cartão de eleitor, que afirmem que aquela pessoa vive ali há mais de 90 dias [...] Depois há a questão da comunicação, das barreiras, as pessoas não conhecem as leis, as circulares que passam, porque existe uma lei em que isto está tudo contemplado, mas por vezes não é efetivada. Até chegar à prática é um processo burocrático. E depois as pessoas não estão totalmente informadas sobre os seus direitos, daí o receio, não sabem qual é a lei, estão num país novo, um país diferente.
A dificuldade no acesso aos cuidados de saúde pode contribuir, e reforçar, a vulnerabilidade em relação às IST, a qual é referida por alguns autores ( Ribeiro e col., 2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. , 2008RIBEIRO, M. et al. Vidas na raia : prostituição feminina em regiões de fronteira. Porto: Afrontamento, 2008. ; Ribeiro e Sacramento, 2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. ) que observaram que o isolamento e as carências sociais dessa população facilitam o desenvolvimento de dificuldades interpessoais e de desconforto psicológico, potenciador de comportamentos de risco face às IST, que a multiplicidade dos parceiros sexuais, assim como a pressão da parte dos clientes para as relações sexuais desprotegidas, aumenta o risco de contrair uma IST. Uma técnica entrevistada descreve essa situação:
Há relatos de clientes que insistem muito para não usar preservativo e, às vezes, é difícil para as pessoas que estão sem dinheiro resistir a isso. Claro que é sempre trabalhado isso, o cuidar de si, pensar primeiro na sua saúde, é mais importante, mas a situação atual também não ajuda. Uma aceita, outra não aceita, tenta aqui, tenta ali, mas o nosso objetivo aqui, nesse sentido, é o empoderamento da mulher em relação ao cliente.
Contextos e situações de risco
Segundo Beck (1992)BECK, U. Risk society : towards a new modernity. London: Sage, 1992. , vivemos numa fase da modernidade na qual os riscos individuais e coletivos, apesar de serem monitorizados e controlados pela sociedade contemporânea, tendem a escapar às instituições sociais de controlo e de proteção. A procura da excitação pelo risco pode ser entendida como uma forma de escape aos mecanismos de controlo social ( Rojek, 1995ROJEK, C. Decentring leisure : rethinking leisure theory. London: Sage, 1995. ; Maia, 2010cMAIA, M. Rejet des discours préventif et comportements sexuels à risque: enquête qualitative auprès d’homosexuels masculins au Portugal. Santé publique , Laxou, v. 22, n. 6, p. 657-664, 2010c. ). Existe uma cultura do risco que, em alguns espaços, encarna uma dimensão transgressora ( Lagunes, 1998LAGUNES, L. La supuesta invulnerabilidad de los varones : serio obstáculo para prevenir el VIH/Sida. Oaxaca: Servicio Informativo de CIMAC, 1998. ; Maia, 2010bMAIA, M. Prática de risco no contexto das relações homossexuais. In: FERREIRA, P. M.; CABRAL, M. V. (Org.). Sexualidades em Portugal : comportamentos e riscos. Lisboa: Bizâncio, 2010b. p. 387-416. ; Ribeiro, 2003RIBEIRO, F. B. Os modernos cavaleiros do asfalto: risco e transgressão nas estradas portuguesas. In: BRANCO, J. F.; RAMOS, M. J. (Org.). Estrada viva? : aspectos da motorização na sociedade portuguesa. Lisboa: Assírio & Alvim, 2003. p. 31-50. ). A relação entre as TS e os clientes é frequentemente marcada pelo desencontro entre os interesses de segurança das primeiras e o gosto pelo risco de boa parte destes últimos ( Oliveira, 2004OLIVEIRA, A. As vendedoras de ilusões : estudo sobre prostituição: alterne e striptease. Lisboa: Notícias, 2004. ; Ribeiro e col., 2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. ; Sacramento, 2005SACRAMENTO, O. Os clientes da prostituição abrigada : a procura do sexo comercial na perspectiva da construção da masculinidade. 2005. Tese (Mestrado em Antropologia) - Universidade do Minho, Braga, 2005. ).
Vários estudos ( Manita e Oliveira, 2002MANITA, C.; OLIVEIRA, A. Estudo de caracterização da prostituição de rua no Porto e em Matosinhos . Porto: CIDM, 2002. ; Muianga, 2009MUIANGA, B. S. Risco e saúde no contexto do VIH/SIDA : o caso da prostituição na cidade de Maputo. 2009. Dissertação (Mestrado em Estudos Africanos) - Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, Lisboa, 2009. ; Ribeiro e col., 2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. ) mostraram que, de um modo geral, as prostitutas têm conhecimento dos riscos e poder de autodeterminação sexual, preocupam-se com a sua saúde e praticam sexo protegido. Pelo contrário, os clientes procuram frequentemente a experiência do risco por meio do sexo desprotegido, que usam como um mecanismo para a busca de excitação. Por conseguinte, “[...] elas desempenham um papel decisivo na sensibilização dos clientes, muitos deles com uma certa ‘propensão’ ou ‘gosto’ manifesto para o relacionamento sexual desprotegido” ( Ribeiro e col., 2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. , p. 49). Os programas de prevenção das IST desenvolvidos nos últimos cinco anos defendem, pois, a tomada em conta tanto do TS como do cliente, embora na prática tal proposta seja difícil, pois o acesso aos clientes apenas pode ser feito por prestadores de serviços sexuais, que têm tendência a “esconder-se”.
Algumas mulheres entrevistadas no quadro do estudo de Ribeiro e colaboradores (2005)RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. revelam-se chocadas com a acentuada procura de sexo desprotegido por parte dos clientes portugueses, contrariamente ao uso inquestionável do preservativo que vigora noutros contextos de trabalho que conhecem. Os clientes constituem um grupo bastante heterogéneo, tanto no nível social como no nível dos motivos que estão na origem do recurso ao sexo pago e do tipo de interação que mantêm com as TS. A haver um denominador comum, seria a predisposição para práticas sexuais de risco.
Segundo a TS entrevistada, os clientes tendem cada vez mais a querer usar preservativo.
Uso [preservativo para o sexo oral], e já muitos clientes pedem, antigamente não. [...]Alguns tu vais acariciando e eles pensam que tu não vais pôr. Já estou com ele na mão, já estou preparada. Automaticamente já tiro da capinha e já ponho na minha mão e começo o meu trabalho já com ele na minha mão. E muitos clientes se assustam porque acham que eu não vou colocar. Isso é muito bom. [...] há uns 60%, que antigamente a gente colocava, uns 30% que queriam sem preservativo, incluindo o inicial, mas agora já se mentalizaram um pouco. [...] Eu digo que como está hoje não se pode e nem há necessidade [de correr riscos]. E da maneira como se põe, que é muito importante, ele talvez nem ia sentir, porque tem pessoas que não sabem pôr, são brutas, e aí realmente eles não se excitam, já dá um corte. [...] então a maneira de pôr é importante. Muitas vezes eu ponho e eles perguntam se já está e eu digo que sim. O profissionalismo conta muito e a maneira como tu comunicas e passas para o cliente a importância do preservativo.
Ribeiro e colaboradores (2005)RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. apontam quatro razões para a busca deliberada do perigo: os valores da masculinidade hegemónica; as situações de “indigência”/“imaturidade” sexual (tais como limitações físicas ou relacionais que dificultam o processo de sedução do sexo oposto, desconhecimento e pudor relativos às questões da sexualidade); as ligações afetivas que por vezes os clientes estabelecem com as TS, levando ao relaxamento da prevenção e à interpretaçao do preservativo como um obstáculo à intimidade; e o desconhecimento acerca das IST e suas formas de prevenção, ou ainda a visão da infeção por VIH como uma “doença do outro” ( Ribeiro e col., 2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. ). Entre outros autores, noutros contextos relacionais, Maia (2009)MAIA, M. Sexualités adolescentes . Paris: L’Harmattan: Éditions Pepper, 2009. e Parker (1994)PARKER, R. Construção da solidariedade : aids, sexualidade e políticas no Brasil. Rio de Janeiro: Abia, 1994. também notaram razões semelhantes. O afrontamento do risco tende a ser visto pelos homens como uma forma de superação dos limites e do medo, uma prova de valentia e potência sexual, um indício de virilidade ( Delicado e Gonçalves, 2007DELICADO, A.; GONÇALVES, M. E. Os portugueses e os novos riscos: resultados de um inquérito. Análise Social , Lisboa, v. 52, n. 184, p. 687-718, 2007. ; Maia, 2009MAIA, M. Sexualités adolescentes . Paris: L’Harmattan: Éditions Pepper, 2009. ; Ribeiro, 2003RIBEIRO, F. B. Os modernos cavaleiros do asfalto: risco e transgressão nas estradas portuguesas. In: BRANCO, J. F.; RAMOS, M. J. (Org.). Estrada viva? : aspectos da motorização na sociedade portuguesa. Lisboa: Assírio & Alvim, 2003. p. 31-50. ; Sacramento, 2005SACRAMENTO, O. Os clientes da prostituição abrigada : a procura do sexo comercial na perspectiva da construção da masculinidade. 2005. Tese (Mestrado em Antropologia) - Universidade do Minho, Braga, 2005. ), o que os leva a estilos de vida autodestrutivos, nos quais o risco é visto como algo a ser enfrentado e não evitado ( Lagunes, 1998LAGUNES, L. La supuesta invulnerabilidad de los varones : serio obstáculo para prevenir el VIH/Sida. Oaxaca: Servicio Informativo de CIMAC, 1998. ).
Quando existe tensão entre a TS e o cliente, está quase sempre relacionada com desejos de certas práticas, como a penetração e a manipulação anal por parte do cliente, aos quais a mulher não se mostra recetiva, e o uso do preservativo, que muitos clientes recusam. As mulheres cedem por vezes a essas solicitações quando se encontram numa situação de grande precariedade económica ou, mais frequentemente, devido à urgência de angariar dinheiro para o consumo de droga, no caso das TS toxicodependentes, e a uma redução da consciência e do autocontrolo, no caso das mulheres alcoolicas ( Oliveira, 2004OLIVEIRA, A. As vendedoras de ilusões : estudo sobre prostituição: alterne e striptease. Lisboa: Notícias, 2004. ; Ribeiro e col., 2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. ; Sacramento, 2005SACRAMENTO, O. Os clientes da prostituição abrigada : a procura do sexo comercial na perspectiva da construção da masculinidade. 2005. Tese (Mestrado em Antropologia) - Universidade do Minho, Braga, 2005. ).
Outra situação em que o uso do preservativo é abandonado ocorre quando se estabelece uma relação de “namoro” e as prostitutas se encontram emocionalmente implicadas ( Oliveira, 2011OLIVEIRA, A. Andar na vida : prostituição de rua e reacção social. Coimbra: Almedina, 2011. ). A concessão do sexo desprotegido explica-se pelo significado simbólico da entrega ditada pela confiança e pelo sentimento amoroso, como, de resto, acontece com outras populações ( Maia, 2009MAIA, M. Sexualités adolescentes . Paris: L’Harmattan: Éditions Pepper, 2009. , 2010aMAIA, M. Construction identitaire, relations amoureuses et comportements sexuels à risque de jeunes de la banlieue parisienne. Compaso: Journal of Comparative Research in Anthropology and Sociology, Bucuresti, v. 1, n. 1, p. 73-89, 2010a. , 2010bMAIA, M. Prática de risco no contexto das relações homossexuais. In: FERREIRA, P. M.; CABRAL, M. V. (Org.). Sexualidades em Portugal : comportamentos e riscos. Lisboa: Bizâncio, 2010b. p. 387-416. ). Uma das técnicas entrevistadas faz referência a essa situação:
Os parceiros são uma parte importante na prevenção, que muitas vezes é esquecida. Muitas vezes, com os clientes usam preservativo, mas, depois, com o parceiro não usam. Não é sempre, mas há situações em que isso acontece.
As organizações da sociedade civil na prevenção das IST em trabalhadoras do sexo
O estudo de Ribeiro e colaboradores (2005)RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. aponta para um acesso aos serviços públicos de saúde dificultado pelo estigma social que pesa sobre as prostitutas, pela rotatividade e mobilidade a que obriga, por vezes, o trabalho do sexo e pela impossibilidade, no caso das mulheres indocumentadas, de aceder, em igualdade de direitos com os cidadãos estrangeiros em situação de permanência regularizada, a serviços de saúde públicos, exceto em situações que ponham em perigo a saúde pública44O Despacho nº 25.360/2001 estabelece que os estrangeiros em situação de permanência não regularizada só poderão aceder aos serviços do Sistema Nacional de Saúde se fizerem prova, mediante documento comprovativo emitido por uma Junta de Freguesia, de que se encontram em Portugal há mais de noventa dias, e que poderão ser cobradas as despesas efetuadas, excetuando a pretação de cuidados de saúde em situações que ponham em perigo a saúde pública. Alguns estabelecimentos do SNS levam a rigidez do despacho do Ministério da Saúde ainda mais além, negando o acesso a cuidados por razões não previstas legalmente, tal como não estar inscrito no centro de saúde. OBSERVATÓRIO DOS DIREITOS HUMANOS. Direito à saúde de imigrante em situação irregular. Relatório maio de 2010. Em linha: <www.observatoriodireitoshumanos.net/.../relatoriodireitosaude.pdf>. Acesso em: 18 abr. 2011..
Habitualmente os discursos sociais apresentam as prostitutas como escravas nas mãos dos proxenetas e proprietários de clubes, perdendo de vista a relativa margem de negociação e a capacidade estratégica das mulheres que optam, ainda que sob certos constrangimentos, nomeadamente de ordem económica, por essa atividade, vitimizando-as sem as devidas contextualizações. As mulheres que se prostituem interiorizam normas e valores dominantes, mas rejeitam estereótipos, estigmas de que são alvo por parte do público em geral, dos clientes, dos patrões e das instituições. E, cada vez mais, contestam formas de exploração, dominação e violência ( Ribeiro e col., 2008RIBEIRO, M. et al. Vidas na raia : prostituição feminina em regiões de fronteira. Porto: Afrontamento, 2008. ).
As organizações da sociedade civil têm contribuído para um aumento da literacia em saúde e dos conhecimentos dos direitos sociais, uma maior capacidade de reivindicar e uma crescente capacitação das TS. As entrevistas efetuadas a técnicas de organizações da sociedade civil permitiram constatar que o discurso de vitimização associado à prática da prostituição está presente, mas assume um carácter residual. Salvo casos específicos de manifesta exploração sexual, o mainstream das organizações que prestam apoio a TS entende a prostituição como uma opção consciente e livre de quem a pratica, independentemente das razões inerentes a essa escolha, que não são questionadas à medida que são entendidas enquanto um elemento do foro privado de cada um.
As organizações não visam “tirar os trabalhadores do sexo da vida”, mas acima de tudo minimizar potenciais riscos inerentes à prática dessa atividade, nomeadamente aqueles que se relacionam com as IST. A conceção de vulnerabilidade aqui adotada distancia-se de uma visão caritativa/assistencialista e procura assumir um caráter pragmático com base científica, sendo fundamentada em recomendações da Organização Mundial de Saúde e da UNAIDS (Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids), que estimam que os TS e seus clientes, os homens que têm sexo com homens, os utilizadores de drogas injetáveis e os seus parceiros, os jovens desempregados e a população reclusa são as populações mais vulneráveis às IST ( UNAIDS, 1999UNAIDS - JOINT UNITED NATIONS PROGRAMME ON HIV/AIDS. Sexually transmitted diseases : policies and principles for prevention and care. Geneva, 1999. , 2012UNAIDS - JOINT UNITED NATIONS PROGRAMME ON HIV/AIDS. Report on the global AIDS epidemic . Geneva, 2012. ).
As organizações da sociedade civil atuam de forma diversificada na gestão dessa problemática e, geralmente, as suas respostas sociais abrangem a generalidade dos TS, independentemente da sua nacionalidade. Em regra, é favorecida uma intervenção de proximidade, na qual os técnicos atuam no “terreno” físico onde se desenrola a atividade de prostituição, seja na rua seja em contexto indoor . O contacto regular favorece a confiança entre os TS e os técnicos, criando um contexto favorável ao trabalho de prevenção e sensibilização relativamente às IST. É o caso do projeto “Dar a voz aos trabalhadores do sexo”, desenvolvido pelo Grupo Português de Ativistas sobre Tratamentos de VIH/SIDA - Pedro Santos (GAT), que apresenta uma intervenção significativa em contexto indoor .
Outras organizações, como as Irmãs Oblatas, os Novos Rostos Novos Desafios, a Positivo e a APDES, divulgam os seus serviços e distribuem material em contexto de rua, sendo comum o uso de carrinhas55Furgão ou van. pelas equipas técnicas. Esse trabalho de rua é complementado com o apoio prestado em contexto de gabinete, como acontece no projeto “Red Light”, da Associação Positivo, que oferece nas suas instalações, no Cais do Sodré, uma abordagem holística e integrada ao trabalho sexual, baseada numa diversidade de serviços que se complementam: consultas médicas e de enfermagem; apoio psicossocial e jurídico; informação sobre IST e material de prevenção.
Na implementação dos seus projetos, as organizações da sociedade civil podem contar com o apoio financeiro do Estado, nomeadamente por meio do Programa ADIS/SIDA, da Coordenação Nacional para a Infeção VIH/Sida – extinta desde 2012. Com o fim desse concurso, os apoios ao terceiro sector na área do VIH/SIDA foram, portanto, fortemente reduzidos. Existem também algumas parcas iniciativas governamentais, como o programa de saúde Autoestima, da responsabilidade da Administração Regional de Saúde (ARS) Norte, cuja população alvo são os trabalhadores do sexo.
Para fundamentar e adequar a sua intervenção, as organizações procuram desenvolver estudos de diagnóstico e identificação dos principais aspetos inerentes às IST. Nesse âmbito, destaca-se o projeto “PREVIH - Infeção VIH nos grupos de homens que têm sexo com homens e trabalhadores sexuais: prevalência, determinantes e intervenções de prevenção e acesso aos serviços de saúde”, promovido pelo GAT, em parceria com o Instituto de Higiene e Medicina Tropical, entre 2009 e 2013. As entrevistas salientaram o facto de as organizações serem parceiros fundamentais nesses estudos por estarem numa posição privilegiada para aceder aos TS, em função da sua atividade de proximidade. Esse aspeto favorece a aplicação de questionários, correndo-se, no entanto, o risco de obter amostras enviesadas, à medida que os utentes das organizações da sociedade civil não são necessariamente representativos do universo da população.
No contexto do projeto foram questionados 1.040 trabalhadores do sexo, 853 dos quais do sexo feminino, correspondendo a 82% do total. Dessas TS, 460 (57,4%) trabalhavam na rua, 301 (37,5) exerciam a atividade no interior ( indoor ) e 41 (5,1%) trabalhavam tanto na rua como indoor ; 91% reportavam ter usado sempre preservativo com os clientes no último mês, 8,3% afirmavam tê-lo utilizado por vezes e 0,7% admitiam que raramente ou nunca usavam preservativo; 41,6% das trabalhadoras do sexo inquiridas haviam sido abrangidas por campanhas de prevenção no último ano e 91,4% haviam recebido preservativos gratuitamente em alguma ocasião; 67,5% haviam realizado o teste e conhecido o seu resultado, sendo que em 6,6% dos casos ele havia sido positivo; 58,5% das trabalhadoras do sexo seropositivas que conheciam a sua situação afirmavam estar em tratamento ( Dias e col., 2013DIAS, S. et al. Estudo PREVIH : infeção VIH nos grupos de homens que têm sexo com homens e trabalhadores sexuais: prevalência, determinantes e intervenções de prevenção e acesso aos serviços de saúde. Lisboa: Gat, Instituto de Higiene e Medicina Tropical, 2013. Disponível em: <vihportugal.org/pdfs/Sonia_Dias.pps>. Acesso em: 10 nov. 2013.
vihportugal.org/pdfs/Sonia_Dias.pps... ).
Segundo relatório publicado pelo Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC, 2013), que compara dados relativos à prevalência do VIH em TS em 27 países da Europa e da Ásia Central, Portugal é o terceiro país com maior prevalência de infeção por VIH entre TS (8,9%), apenas ultrapassado pela Ucrânia (9%) e pela Letónia (22,2%). A elevada prevalência da infeção por VIH entre os TS contrasta com o uso reportado de meios de prevenção e diagnóstico. A discrepância verificada poderá indicar uma adesão formal (mas não necessariamente real), por parte das trabalhadoras do sexo, a uma retórica socialmente valorizada de prevenção, a qual é canalizada pelas organizações. Esse discurso pode ser por si mais ou menos apreendido, condicionando a implementação prática dos meios de prevenção propostos. Estamos assim perante um potencial fator explicativo a considerar na análise crítica do nível de efetividade dessas ações.
Apesar da relevância concedida às IST, a vulnerabilidade às infeções não é o único risco identificado pelos técnicos associativos e ativistas entrevistados, que salientam igualmente a problemática da violência – a que é exercida pelos clientes e a que é exercida pelas instituições, ambas potenciadas pelo desempenho de uma atividade que não possui enquadramento legal: não sendo uma atividade criminalizada, a prática da prostituição não é uma profissão formalmente reconhecida enquanto tal. No caso da população imigrante, em que o processo de regularização em território nacional surge associado à prática de uma atividade profissional legalmente reconhecida, as dificuldades são evidentes, dado que esse processo fica inviabilizado. Para a generalidade dos TS, o facto de não efetuarem contribuições para a Segurança Social nem pagarem os impostos inerentes à relação laboral coloca-os num limbo cívico, dado que não têm acesso aos deveres nem aos correspondentes direitos de cidadania, nesse caso aos direitos sociais adquiridos mediante as contribuições referidas.
Regressando à atividade das organizações da sociedade civil, é notória a articulação entre elas, embora esse trabalho em parceria não assuma um carácter sistemático. No entanto, a evolução parece apontar nesse sentido, com a constituição em 2011 de uma Rede sobre Trabalho Sexual (RTS), sob a coordenação do GAT e da Agência Piaget para o Desenvolvimento (APDES), por iniciativa desta última. Aqui se reúnem organizações, mas também alguns TS, numa experiência ainda embrionária de participação. Os objetivos consistem na partilha de boas práticas, na maximização dos recursos, na promoção do debate, na elaboração de documentos conjuntos, na promoção de ações de sensibilização e no acompanhamento das políticas relativas ao trabalho sexual. Para além da investigação-ação, da prevenção das IST e da prestação de apoio social aos TS, as organizações da sociedade civil procuram igualmente assumir o lobbying relativamente ao trabalho sexual em Portugal, adotando assim uma abordagem multidimensional a essa problemática.
Uma questão que emerge como fundamental é a da participação dos TS nessas organizações e nos projetos/serviços que lhes são dirigidos. As entrevistas evidenciaram como as organizações tendem a assumir um discurso pragmático, não discriminatório, que visa o bem-estar físico e mental dos TS. Para tal, desenvolvem projetos e oferecem serviços que visam reduzir riscos e melhorar as condições de existência de quem pratica o trabalho sexual. No entanto, os visados permanecem ausentes das estruturas dirigentes e executivas dessas organizações e o seu envolvimento nos projetos é essencialmente enquanto destinatários e não como colaboradores, apesar de algumas experiências de formação e de educação pelos pares.
A reduzida participação dos TS na conceção, execução e avaliação de projetos que os visam pode propiciar uma noção de “bem” que não é a sua, mas a daqueles que controlam as políticas e serviços ou neles trabalham: aquilo que os agentes políticos (que financiam os projetos) e os dirigentes e técnicos das organizações que os implementam consideram que é desejável para os TS pode não coincidir necessariamente com o que esses consideram desejável para si próprios. Esse facto pode originar dinâmicas de manipulação mútuas: das organizações em relação aos TS, ao tentarem promover comportamentos e encaminhá-los para serviços que consideram benéficos ou que têm a responsabilidade de implementar, mas que não são necessariamente do interesse destes; e dos TS em relação às organizações, ao adotarem uma postura que acreditam corresponder àquilo que é percecionado pelos técnicos como sendo adequado, mas que não corresponde à sua verdadeira forma de estar e ser.
Essa situação é evidenciada por uma das técnicas entrevistadas, que refere como o discurso das TS, por vezes, tende a ir ao encontro das expetativas que têm relativamente àquilo que consideram que o técnico espera ouvir, como forma de obter determinados bens ou serviços. Por outro lado, o técnico fornece esses mesmos bens e serviços com o objetivo de promover a adesão a comportamentos que considera desejáveis.
As pessoas acabam por instrumentalizar ou tentar instrumentalizar as equipas de proximidade, porque é muito prático alguém ir ali levar preservativos e gel, mas isto é uma estratégia para trabalhar questões de saúde, práticas de menor risco, encaminhar para serviços de saúde e afins.
A TS imigrante entrevistada revelou uma ambiguidade no discurso que pode ser sintomática dessa propensão para se adequar a uma retórica considerada como dominante e socialmente valorizada, sem que essa adesão discursiva corresponda a uma adesão real. Se por um lado refere, num tom pesaroso, que “caiu na prostituição”, por outro descreve de forma bastante pragmática uma decisão baseada num cálculo racional de custos/benefícios, essencialmente de natureza económica, em que não surge a questão de uma “queda moral”.
Conclusão
O delineamento de políticas sociais e de saúde no campo do trabalho do sexo deve: tomar os clientes como alvo de ações de prevenção; envolver os TS nos projetos de prevenção a eles destinados ( peer-education approach ); orientar as políticas e os projetos de prevenção numa perspetiva mais holística e abrangente; melhorar a acessibilidade das pessoas indocumentadas aos serviços do SNS; e combater o estigma social que pesa sobre essa população e que causa situações de medo, descontrolo nervoso e depressão ( Ribeiro e col., 2005RIBEIRO, M. et al. Prostituição abrigada em clubes : zonas fronteiriças do Minho e Trás-os-Montes. Lisboa: CIDM, 2005. ).
Como defendem Ribeiro e colaboradores (2008)RIBEIRO, M. et al. Vidas na raia : prostituição feminina em regiões de fronteira. Porto: Afrontamento, 2008. , a legalização da prostituição como trabalho sexual possibilitaria uma organização sob forma de associações, sindicatos ou empresas juridicamente constituídas que possibilitaria a defesa de direitos laborais e sociais, tais como meios de prevenção, mecanismos de defesa da saúde pública, pagamento de prestações à Segurança Social e de impostos devidos ao Estado, permitindo combater práticas de economia subterrânea, sem apoio médico-sanitário e sem tributação fiscal.
A auto-organização dos TS surge, dessa forma, como um elemento fundamental na defesa dos seus interesses e direitos. As entrevistas permitiram constatar que esta auto-organização não é uma realidade devido a uma diversidade de potenciais fatores causais que carecem de aprofundamento e clarificação: factores político-institucionais, como a ausência de um enquadramento legal para o desempenho do trabalho do sexo; fatores sociais, como a discriminação associada à atividade; e fatores individuais, como a desmotivação relativamente a um envolvimento cívico mais profundo. Todos esses fatores apontam para hipóteses em aberto na explicação de uma maior ou menor auto-organização dos TS, sendo que, na ausência de um movimento associativo consistente, a defesa dos seus direitos recai essencialmente sobre as organizações da sociedade civil. Esse facto leva a questionar até que ponto as organizações representam de facto os TS: será que os objetivos que prosseguem e os meios que utilizam na sua prossecução estão em consonância com aquilo que os trabalhadores do sexo entendem como desejável para si próprios? É uma questão que fica em aberto, exigindo uma investigação mais aprofundada.
No que respeita às IST, fica por aferir se os comportamentos de risco ou de proteção que afirmam adotar correspondem à prática, nomeadamente no que tange ao uso do preservativo. Em determinados contextos podem surgir fatores propiciadores de comportamentos de risco que assumam uma maior preponderância, aos olhos do TS, relativamente à sua proteção relativamente às IST, por exemplo, fatores de ordem económica, quando um cliente paga mais para ter relações desprotegidas. Até que ponto o TS irá assumir abertamente perante o técnico esses comportamentos e em que medida será exequível sensibilizá-lo para a sua redução são questões pertinentes para o desenvolvimento e aplicação de políticas, medidas e programas de prevenção das IST.
A responsabilidade assumida pelas organizações é considerável, dado que surgem não apenas como prestadoras de serviços, mas igualmente como representantes dos TS. No Livro Branco sobre a Governação (Comissão das Comunidades Europeias, 2001), a Comissão das Comunidades Europeias refere que uma maior participação das organizações nos mecanismos governativos implica maior responsabilidade e exige o respeito por princípios de boa governação. As políticas sociais da União Europeia (UE), que exercem uma influência indiscutível na prática social em Portugal, prescrevem o envolvimento ativo dos cidadãos nos mecanismos políticos que os afeta, de forma a promover o empowerment , entendido enquanto capacidade de gerir a própria mudança ( Bureau Internacional do Trabalho, 2003BUREAU INTERNACIONAL DO TRABALHO. Programa Estratégias e Técnicas contra a Exclusão Social e a Pobreza. A luta contra a pobreza e a exclusão social em Portugal : experiências do programa nacional de luta contra a pobreza. Genebra, 2003. ). É esse o grande desafio que se coloca às organizações da sociedade civil: promover a participação dos TS nas políticas e projetos que lhes dizem respeito. Isso implicará uma alteração das estruturas de poder e responsabilidade no seio das próprias organizações, de forma a integrar os TS enquanto pares e não apenas enquanto utentes.
No caso específico dos TS imigrantes, particularmente daqueles que não têm a sua situação regularizada em Portugal, a questão assume uma maior complexidade, dado que não basta desenvolver as habituais iniciativas de controlo e prevenção das IST, prescritas e incentivadas pelo Estado e suas instituições. Nesse caso, pode mesmo ser necessário assumir posições contrárias ao mainstream institucional, no sentido de promover o acesso dos imigrantes indocumentados à saúde numa perspetiva mais global. Esse acesso é condicionado por práticas enraizadas em prestadores de cuidados de saúde e outras instituições relevantes. É o caso do acima descrito processo burocrático inerente à obtenção dos atestados de residência ou o desconhecimento da lei por parte do pessoal administrativo e clínico em centros de saúde e hospitais, que podem constituir obstáculos no acesso a direitos legalmente consagrados.
Uma questão surge como primordial: que os Estados utilizem a exclusão no acesso à saúde como forma de dificultar a vida aos imigrantes, procurando assim desincentivar a imigração ilegal, produz consequências negativas para o bem-estar não só dos próprios imigrantes, mas também para a saúde pública, nomeadamente no nível da propagação das IST. O Comité para os Direitos Sociais do Conselho da Europa reconhece esse facto ao estipular que qualquer legislação ou prática que negue o acesso à saúde a cidadãos estrangeiros em território de um Estado membro, mesmo que esses cidadãos se encontrem em permanência irregular, é contrário à Carta Social Europeia. Em conformidade com esse princípio, a Constituição da República Portuguesa estabelece o direito de todos os cidadãos, incluindo os estrangeiros, a cuidados de saúde, independentemente das suas condições económicas, sociais e culturais. É aqui que o ativismo político das organizações da sociedade civil em prole do acesso à saúde dos TS imigrantes assume maior relevância. Esse ativismo poderá implicar uma confrontação nem sempre “politicamente correcta” com as entidades estatais que habitualmente surgem como aliadas das organizações, colocando-as perante o difícil dilema de optar entre a lealdade aos seus “patronos” e o dever de representação dos interesses dos TS.
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- SILVA, M. C. et al. Prostituição feminina em regiões de fronteira : actores, estruturas e processos. Porto: Afrontamento, 2005.
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- WEITZER, R. The social construction of sex trafficking: ideology and institutionalization of a moral crusade. Politics and Society , Thousand Oaks, v. 35, n. 3, p. 447-475, 2007.
- 1O presente artigo enquadra-se no âmbito do projeto “Imigrantes e serviços de apoio social: tecnologias de cidadania em Portugal”, com financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT).
- 2O artigo adopta um entendimento da sociedade civil enquanto esfera intermediária entre o Estado, o mercado e a esfera privada (em detrimento de uma visão da sociedade civil enquanto esfera independente do Estado), focando essencialmente a “sociedade civil organizada” (em detrimento da sua vertente íntima e das formas de comunicação que ocorrem no âmbito desta vertente) ( Cohen e Arato, 1997COHEN, J.; ARATO, A. Civil society and political theory. New Baskerville: MIT, 1997. ). Assim, “[…] the focus is on civil society as the societal sphere composed of more or less organized groups which intermediate between State/public authority, market and private sphere” ( Smismans, 2006SMISMANS, S. Civil society and European governance: from concepts to research agenda. In: SMISMANS, S. (Org.). Civil society and legitimate European governance. Cheltenham: Edward Elgar, 2006. p. 3-19. , p. 7-8).
- 3O conceito de trabalho sexual surge nos anos 1970, nos Estados Unidos da América. “O termo trabalho sexual implica que se considera tratar-se de uma actividade de prestação de serviços sexuais. O que implica a defesa da profissionalização destas actividades, sem estigma, e de forma a dignificar este trabalho exercido por mulheres, homens e transexuais” ( Oliveira, 2011OLIVEIRA, A. Andar na vida : prostituição de rua e reacção social. Coimbra: Almedina, 2011. , p. 14).
- 4O Despacho nº 25.360/2001 estabelece que os estrangeiros em situação de permanência não regularizada só poderão aceder aos serviços do Sistema Nacional de Saúde se fizerem prova, mediante documento comprovativo emitido por uma Junta de Freguesia, de que se encontram em Portugal há mais de noventa dias, e que poderão ser cobradas as despesas efetuadas, excetuando a pretação de cuidados de saúde em situações que ponham em perigo a saúde pública. Alguns estabelecimentos do SNS levam a rigidez do despacho do Ministério da Saúde ainda mais além, negando o acesso a cuidados por razões não previstas legalmente, tal como não estar inscrito no centro de saúde. OBSERVATÓRIO DOS DIREITOS HUMANOS. Direito à saúde de imigrante em situação irregular. Relatório maio de 2010. Em linha: <www.observatoriodireitoshumanos.net/.../relatoriodireitosaude.pdf>. Acesso em: 18 abr. 2011.
- 5Furgão ou van.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
Jan-Mar 2014
Histórico
- Recebido
14 Jun 2013 - Revisado
15 Nov 2013 - Aceito
07 Jan 2014