Resumo
Esse trabalho tem como objetivo explorar a prevenção e a promoção da saúde sexual e reprodutiva em jovens mapuche entre 18 e 24 anos, investigando as relações que estabelecem com o sistema de saúde biomédico e os desafios para incluir a interculturalidade nos serviços direcionados a esta população. Trata-se de uma pesquisa qualitativa de estudo de caso. Foram aplicadas 32 entrevistas em profundidade com jovens mapuche das áreas rurais e urbanas da região de Araucanía, no Chile. É identificada a persistência de uma abordagem de saúde que carece de ferramentas interculturais e de foco nos direitos sexuais e reprodutivos. As jovens relatam a falta de acesso à educação sexual devido ao distanciamento que estabelecem com os serviços biomédicos de atenção primária e às dificuldades de falar sobre sexualidade com os adultos das suas comunidades. Conclui-se que as desigualdades no direito à saúde sexual e reprodutiva dos jovens indígenas, principalmente das mulheres, persistem. É necessário incorporar a abordagem intercultural e de direitos na elaboração de políticas públicas para essa população. Estas intervenções precisam ser elaboradas e implementadas envolvendo a população jovem e os agentes de saúde das suas comunidades de origem.
Palavras-chave:
Adolescentes; Jovens; Saúde Sexual e Reprodutiva; Saúde de Populações Indígenas; Gênero
Abstract
The study aims to explore sexual and reproductive health prevention and promotion of Mapuche youth between 18 and 24 years old. It looks at their relationships with the biomedical health system and the challenges of delivering cross-cultural healthcare services for this age group. Qualitative case study. Thirty-two in-depth interviews were conducted with young Mapuche from rural and urban sectors of the Araucanía Region, Chile. The approach to sexual and reproductive health prevention and promotion of Mapuche youth lacks a cross-cultural lens and only limitedly accounts for sexual and reproductive rights. Young women report a lack of access to sex education because of the distance from biomedical primary care services and the challenges of discussing sexuality with adults in their communities. Indigenous young people, especially women, experience persistent sexual and reproductive health inequities. It is necessary to incorporate the cross-cultural approach as well as sexual and reproductive rights in the formulation of public policies for this population. Such interventions must be designed and implemented together with the young Mapuche population and health workers in their communities of origin.
Keywords:
Adolescents; Young People; Sexual and Reproductive Health; Health of Indigenous People; Gender
Introdução
Os estudos sobre a saúde sexual e reprodutiva (SSR) em adolescentes e jovens no Chile demonstraram a persistência de barreiras ao acesso e uso de serviços biomédicos de saúde que se traduzem em resultados de saúde nos quais ainda persistem desafios importantes. Pesquisas recentes mostram que nessa população há pouco conhecimento sobre as formas de contágio das infecções sexualmente transmissíveis (IST), como o HIV, e uma diminuição na percepção do risco dessas doenças (INJUV, 2022 INJUV- INSTITUTO NACIONAL DE LA JUVENTUD. Décima encuesta nacional de juventudes. Santiago, 2022. Disponible en: https://www.injuv.gob.cl/encuestanacionaldejuventud . Consultado el: 6 agosto 2023.
https://www.injuv.gob.cl/encuestanaciona... ). Por sua vez, embora a taxa de gravidez na adolescência tenha diminuído bastante no Chile, ainda existem desigualdades internas importantes, que afetam particularmente as comunas com índices de pobreza mais elevados, que incluem comunas que concentram a presença de povos indígenas (Lavanderos et al., 2019LAVANDEROS, S. et al. Embarazo adolescente en Chile: una mirada a la desigualdad sociodemográfica comunal. Revista Chilena de Obstetricia y Ginecología, Santiago, v. 84, n. 6, p. 490-508, 2019. ). Na América Latina, os jovens e os adolescentes indígenas tenderam a ser invisibilizados tanto em termos de evidência disponível quanto em termos da população-alvo das políticas públicas interculturais de saúde (INJUV, 2015 INJUV- INSTITUTO NACIONAL DE LA JUVENTUD. Jóvenes y juventud indígena en Chile: vivencias y tensiones en el Chile contemporáneo. Santiago, 2015. Disponible en: https://issuu.com/iciis/docs/libro_injuv . Consultado el: 6 agosto 2023.
https://issuu.com/iciis/docs/libro_injuv... ). Na realidade, são poucas as pesquisas que investigam as interseções que ocorrem entre o fator idade, pertencimento a povos indígenas, condição de gênero e seus efeitos na saúde sexual e reprodutiva.
Jovens e adolescentes indígenas constituem um número significativo da juventude do Chile. A Pesquisa Nacional da Juventude 2022 (INJUV, 2022 INJUV- INSTITUTO NACIONAL DE LA JUVENTUD. Décima encuesta nacional de juventudes. Santiago, 2022. Disponible en: https://www.injuv.gob.cl/encuestanacionaldejuventud . Consultado el: 6 agosto 2023.
https://www.injuv.gob.cl/encuestanaciona... ) mostra que 13,2% dos jovens do Chile se autoidentificam como indígenas, um percentual que aumenta em áreas como a região da Araucanía, onde o número sobre para 39,4%, cuja maioria é considerada pertencente ao povo mapuche. Em termos de saúde, as políticas de saúde intercultural foram instaladas no país há décadas por meio do Programa Especial de Saúde e Povos Indígenas (PESPI). No entanto, suas intervenções tenderam a ser orientadas para a população adulta e para a primeira infância, sem haver intervenções sistematizadas que abordassem temáticas de SSR com jovens a partir de uma perspectiva intercultural.
Aprofundar-se nessas questões significa lembrar que o conceito de juventude está sujeito a definições culturais que vão além de uma dimensão demográfica, uma vez que idade e etnia são dimensões que estruturam práticas sociais, muitas das quais impactam a saúde (Feixa Pàmpols; González Cangas, 2006FEIXA PÀMPOLS, C.; GONZÁLEZ CANGAS, Y. Territorios baldíos: identidades juveniles indígenas y rurales en América Latina. Papers: Revista de Sociología, Barcelona, n. 79, p. 171-93, 2006. ). Portanto, é necessário revelar as percepções locais dos jovens indígenas, bem como as relações que apresentam com as gerações adultas de suas próprias comunidades, com seus colegas e com o restante da sociedade não indígena. Dentro desse convite, as questões de SSR desempenham um papel fundamental devido às desigualdades que foram registradas sistematicamente em todo o continente em prevenção, promoção, acesso, diagnóstico e tratamento (CEPAL, 2011 CEPAL – COMISIÓN ECONÓMICA PARA AMÉRICA LATINA Y EL CARIBE. Salud de la población joven indígena en América Latina. Santiago, 2011. Disponible en: https://www.cepal.org/es/publicaciones/35357-salud-la-poblacion-joven-indigena-america-latina-un-panorama-general Consultado el: 06 agosto 2023.
https://www.cepal.org/es/publicaciones/3... ). Estudos anteriores apresentam dados sobre o fato de que os jovens indígenas começam a sua vida sexual mais cedo, muitos deles(as) em relacionamentos afetivos formalizados (Pantelides, 2008PANTELIDES, E. Prevención y atención de la salud reproductiva entre mujeres indígenas de 15-19 años en países seleccionados de América Latina. Otro aspecto de las desigualdades en salud. In: CONGRESO DE LA ASOCIACIÓN LATINOAMERICANA DE POBLACIÓN, 3., 2008, Córdoba. Anales… Córdoba: ALAP, 2008. p. 1-18. ; Valencia et al., 2010). Esta situação estaria ligada, entre outros aspectos, ao vigor que tem valores como a fertilidade, que é entendida como fundamental para a continuidade de uma existência que foi historicamente ameaçada, como é o caso do povo mapuche. Esses dados coincidem com o registro de um menor acesso e uso de contraceptivos entre jovens indígenas, situação que afeta particularmente as mulheres (Hernández; Meneses; Sánchez, 2016HERNÁNDEZ, M. F.; MENESES, E.; SÁNCHEZ, M. Mujeres indígenas y su acceso a los derechos sexuales y reproductivos, 2009 y 2014. In: MÉXICO. La situación demográfica de México 2016. Ciudad de México: Secretaría General del Consejo Nacional de Población, 2016. p. 57-86. ) e que está ligada aos índices de fertilidade mais altos em comparação com jovens não indígenas, incluindo a gravidez na adolescência. É importante destacar que, embora essas desigualdades possam estar ligadas a fatores estruturais como pobreza, atraso educacional e menor acesso à informação sobre contraceptivos (Valley; Foreman; Duffy, 2022VALLEY, T. M.; FOREMAN, A.; DUFFY, S. Las perspectivas de mujeres indígenas sobre la contracepción en las zonas rurales de Guatemala. Practicing Anthropology, Oklahoma City, v. 44, n. 3, p. 30-40, 2022. ), estudos focados na atenção à saúde diferenciada e não colonial ressaltam a necessidade de entender a autonomia sexual das mulheres indígenas, dando visibilidade à existência de padrões reprodutivos que valorizam positivamente a fertilidade em comunidades que foram afetadas pela desapropriação da população e do território (Ávila; Alves, 2022ÁVILA, B. T.; ALVES, S. V. Reproductive planning in Indigenous area and the search for differentiated care: the dilemmas between inequality and difference. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 31, n. 2, p. 1-12, 2022. ). De fato, pesquisas recentes demonstram que, nas comunidades indígenas como as mesoamericanas, o início precoce das relações sexual-afetivas, bem como da gravidez na adolescência sem um vínculo formal de relacionamento, muitas vezes são atitudes aprovadas pela comunidade, não havendo uma punição social que é normalmente observada nas sociedades mestiças (Kropff Causa; Stella, 2017KROPFF CAUSA, L.; STELLA, V. Abordajes teóricos sobre las juventudes indígenas en Latinoamérica. Liminar: Estudios Sociales y Humanísticos, San Cristóbal de las Casas, v. 15, n. 1, p. 15-28, 2017. ).
No caso da população mapuche, há poucos estudos sobre a situação de SSR entre mulheres jovens. Um estudo realizado com mulheres mapuche adultas revelou que nesses grupos se concentram desvantagens sistemáticas que resultam em relações sustentadas entre pertencer ao povo mapuche, baixos níveis de educação, início precoce da vida reprodutiva, alta fertilidade e gravidez não planejada com poucas opções de uso de métodos contraceptivos para espaçar uma gravidez de outra (Griffiths; Alvarado; Vega, 2010GRIFFITHS, E. A.; ALVARADO, C. Q.; VEGA, I. M. Equidad en salud reproductiva en mujeres Mapuche. Sexualidad, Salud y Sociedad – Revista Latinoamericana, Rio de Janeiro, n. 5, p. 97-118, 2010. ). Outros estudos (Reyes Sánchez; Mino Garcia, 2012REYES SÁNCHEZ, J.; MINO GARCIA, S. Juventudes indígenas y atención de la salud sexual y la salud reproductiva. In: ROSALES MENDOZA, A.; MINO GARCÍA, S. (coord.). La salud sexual y reproductiva de jóvenes indígenas: análisis y propuestas de intervención. México: SIPAM; INDESOL, 2012. p. 19-34. ) mostram que as jovens indígenas são protagonistas de transformações internas em suas comunidades e também de novos vínculos com a sociedade mestiça, referentes às oportunidades de trabalho e educação que encontram em espaços principalmente urbanos. Essas transformações implicam repensar a maternidade e a sexualidade, problematizando os estereótipos que se escondem na naturalização da tríade mulher/mapuche/mãe, bem como o enaltecimento das figuras masculinas da juventude, em detrimento das identidades femininas que foram historicamente representadas como subjugadas e relegadas à esfera doméstica (Millaleo Hernández, 2018MILLALEO HERNÁNDEZ, A. G. Poligamia mapuche/Pu domo ñi Duam (un asunto de mujeres): politización y despolitización de una práctica en relación a la posición de las mujeres al interior de la sociedad mapuche. 2018. Tesis (Grado de Doctora en Ciencias Sociales) – Universidad de Chile, Santiago, 2018. ).
À situação imposta pela interseção entre gênero, etnia e faixa etária, somam-se os desafios envolvidos na abordagem da SSR a partir de uma abordagem baseada em direitos que permita diferenciar ambas as dimensões e integrar o direito de viver uma sexualidade saudável, livre e informada, também entre adolescentes e jovens indígenas. A partir dos dados referentes à saúde sexual, situações como abortos realizados em condições de risco, diferentes tipos de violências, IST e HIV/Aids parecem estar no centro dos resultados gerados pelas condições sistemáticas de exclusão que esses grupos vivenciaram (Reyes Sánchez; Mino Garcia, 2012REYES SÁNCHEZ, J.; MINO GARCIA, S. Juventudes indígenas y atención de la salud sexual y la salud reproductiva. In: ROSALES MENDOZA, A.; MINO GARCÍA, S. (coord.). La salud sexual y reproductiva de jóvenes indígenas: análisis y propuestas de intervención. México: SIPAM; INDESOL, 2012. p. 19-34. ; Ponce; Muñoz; Stival, 2017PONCE, P.; MUÑOZ, R.; STIVAL, M. Pueblos indígenas, VIH y políticas públicas en Latinoamérica: una exploración en el panorama actual de la prevalencia epidemiológica, la prevención, la atención y el seguimiento oportuno. Salud Colectiva, Lanús, v. 13, n. 3, p. 537, 2017. ).
Por sua vez, as jovens mulheres indígenas enfrentam vulnerabilidades estruturais que dificultam seu acesso aos direitos sexuais. Borràs e Montalvo ( 2011BORRÀS, C. P.; MONTALVO, P. Infecciones de transmisión sexual, VIH y sida: una aproximación a conocimientos, actitudes y prácticas de poblaciones adultas y jóvenes indígenas en las tierras bajas de Bolivia. Desacatos, Ciudad de México, n. 35, p. 41-58, 2011. ) reconhecem diferentes fatores que aumentam a vulnerabilidade das mulheres indígenas bolivianas às IST, como a grande desigualdade de gênero em que o homem tem um maior acesso à informação e controle sobre a decisão de usar contraceptivo, a violência contra a mulher dentro de casa, a desconfiança no uso de preservativo, a baixa percepção de risco diante do HIV, a falta de diálogos intergeracionais sobre sexualidade, a alta mobilidade da população que muitas vezes está inserida em redes de comércio transfronteiriças e a percepção dos serviços biomédicos de saúde como espaços hostis para as mulheres indígenas. A abordagem intersecional é necessária nessa análise porque torna visível o efeito diferenciado gerado pelas construções de gênero vigentes nas sociedades sobre a saúde de alguns grupos específicos como o das jovens mulheres indígenas (Couto et al., 2019COUTO, M. T. et al. La perspectiva feminista de la interseccionalidad en el campo de la salud pública: revisión narrativa de las producciones teórico-metodológicas. Salud Colectiva, Lanús, v. 15, e1994, 2019. ).
Em geral, a nível latino-americano, as políticas públicas direcionadas para adolescentes e jovens tiveram dificuldade para criar espaços de participação pertinentes para esses grupos. As intervenções relatadas até o momento concentraram-se na geração de estratégias educativas com o objetivo de reduzir a gravidez em adolescentes, baseadas em uma abordagem de risco e sem uma perspectiva intercultural (Dides Castillo; Pérez Moscoso, 2007DIDES CASTILLO, C.; PÉREZ MOSCOSO, M. S. Investigaciones en salud sexual y reproductiva de pueblos indígenas en Chile: la ausencia de pertinencia étnica. Acta Bioethica, Santiago, v. 13, n. 2, p. 216-222, 2007. ). No caso do Chile, mesmo que há anos existam o programa PESPI e o Programa Integral de Saúde para Adolescentes e Jovens, que dependem do Ministério da Saúde (MINSAL 2013a MINSAL- MINISTERIO DE SALUD. Programa nacional de salud integral de adolescentes y jóvenes. Plan de acción 2012-2020. “Nivel primario de atención”. Santiago, 2013a. Disponible en: https://www.minsal.cl/portal/url/item/d263acb5826c2826e04001016401271e.pdf Consultado el: 6 agosto 2023.
https://www.minsal.cl/portal/url/item/d2... ), ambos funcionaram sem se relacionar sistematicamente. Baseados nessa evidência e na necessidade de incorporar a etnia nas políticas públicas orientadas para a população jovem, são apresentados os resultados de um estudo qualitativo cujo objetivo foi compreender as construções em torno da corporalidade e da sexualidade dos jovens mapuche, bem como investigar as relações que são estabelecidas entres esses grupos e os serviços biomédicos de atenção primária presentes no território. Nesse momento, focaremos nos resultados referentes à SSR das jovens mulheres mapuche, tanto a partir do ponto de vista delas mesmas quanto do ponto de vista dos agentes biomédicos de atenção primária à saúde (APS) que trabalham nesse território.
Metodologia
Esse artigo apresenta os resultados de uma pesquisa mais ampla intitulada “Encontros e tensões na construção de corpos e sexualidades juvenis: as representações do mundo jovem e do sistema de saúde no Chile atual” (Projeto Fondecyt #11190701). Nesse momento, focaremos nos resultados relativos à população mapuche do sul do Chile, onde a amostra foi composta por jovens mapuche rurais e urbanos entre 18 e 24 anos (n=16), equipes de saúde de atenção primária (n=10) e atores-chave para as questões de saúde e povos indígenas (n=6). Foram considerados atores-chave figuras como facilitadores interculturais do PESPI, acadêmicas mapuche e gestores municipais das questões dos povos indígenas.
O trabalho de campo foi desenvolvido entre março de 2020 e dezembro de 2021 na região de Araucanía, um território complexo do ponto de vista social, político, econômico e histórico, sendo uma das regiões mais pobres do país, onde ainda permanece em vigor um conflito originado dos processos de colonização e da instalação do Estado chileno durante os séculos XIX e XX, cujas consequências mais visíveis resultam no fato de que a área foi declarada em “estado de exceção” por mais de um ano (maio de 2022 até o momento).
Como o estudo foi realizado durante o período da pandemia de COVID-19, a maioria das entrevistas foi realizada de forma remota, por meio de plataformas como Google Meet e Zoom, salvo as entrevistas com jovens cuja presença foi priorizada sempre que as condições de saúde do país permitiam. As entrevistas duraram em média uma hora e dez minutos, e foram realizadas totalmente em espanhol, idioma que todos os participantes falavam. A transcrição das entrevistas foi feita por transcritores que respeitaram o uso de termos do mapudungu (idioma do povo mapuche) e que, quando havia dúvidas, foram assessorados por um membro da equipe de pesquisa que falava mapudungu.
Aspectos éticos
Previamente às entrevistas, os participantes assinaram um Consentimento Livre e Esclarecido, on-line ou por escrito, que descrevia os objetivos do estudo e garantia o anonimato dos dados, portanto, os nomes próprios utilizados nesse artigo correspondem a pseudônimos. Após a transcrição das entrevistas, a equipe de pesquisa realizou uma análise temática delas utilizando o software ATLAS.ti. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética Científico do Serviço de Saúde Araucanía Sur e pelo Comitê de Ética Científico da Faculdade de Medicina da Universidad del Desarrollo.
Resultados
Os resultados da pesquisa foram organizados em torno dos seguintes eixos de análise:
Transformações nos papéis de gênero e sexualidade na juventude mapuche;
Serviços biomédicos e juventude mapuche na atenção à saúde sexual e reprodutiva;
Gravidez na adolescência entre jovens mapuche.
“Mesmo que as coisas estejam mudando, não se fala sobre sexualidade”: papéis de gênero e sexualidade na juventude mapuche
Uma das características que afeta a juventude indígena é a heterogeneidade e seu envolvimento constante nos processos de transformação locais e globais. De fato, as participantes desse estudo narram transições permanentes entre a cultura de origem, representada pelas comunidades rurais, e a cultura não indígena, incorporada pela vida nas cidades onde são estudantes e/ou trabalhadoras. Nesses mundos entrelaçados, as jovens reconhecem vivenciar processos de assimilação e de resistência cultural por meio da apropriação e reinvenção de seus vínculos de pertencimento. Nos cursos de revitalização da língua mapudungu ou na participação em associações artísticas, são discutidos temas relacionados ao pertencimento ao povo mapuche. Esses processos têm implicações nas formas de compreender e exercer os papéis de gênero, de se relacionar e de significar sua corporeidade, bem como no exercício da sua sexualidade, incluindo o cuidado da sua SSR.
Em relação aos papéis de gênero, as jovens reconhecem transformações relacionadas com as expectativas de gênero formadas no seio da família e o seu posicionamento atual em relação a elas. Como explica Denisse:
No campo, muito se vê sobre essa ideia de que as mulheres têm que servir, que temos que limpar […] . Os papéis estavam muito marcados, como isso das mulheres terem que fazer a comida. Nos enterros, por exemplo, há comida e são as mulheres que cozinham. E os homens apenas conversam, partilham ou bebem. […] Eu acredito que essa geração dos 30 para baixo está mudando muito isso. Mas com as pessoas mais velhas é difícil mudar . (Jovem, mulher, E9)
O machismo e seus efeitos sobre o controle do corpo feminino são reconhecidos como dimensões presentes, relacionadas principalmente com as práticas de repressão sobre a liberdade sexual das jovens e com a expectativa de gerar um vínculo sexual-afetivo único e duradouro. Como explica Josefa: “ Vejo o machismo no fato do meu irmão poder ter muitas namoradas e tudo mais. Mas acho que se eu chegasse com muitos namorados, não iriam me aguentar ” (Jovem, mulher, E10).
As equipes de saúde, por sua vez, relatam a falta de envolvimento dos homens nas questões de cuidado com a própria saúde na SSR e com a dos seus filhos e filhas adolescentes. Uma médica com experiência na atenção à população mapuche afirma que, embora esse padrão não seja exclusivo dos homens mapuche, é acentuado nesse grupo:
Sim, nisso pode existir uma diferença em relação com [a] população não mapuche de que, sim, o machismo está mais marcado. Nas famílias mapuche sempre se vê, por exemplo, que as mães que vêm para uma consulta vêm sozinhas, com as filhas. Esse papel é sempre delas, como mães, como se fosse algo delas. É raro ver um homem envolvido nisso . (Médica, mulher, E5)
A persistência de padrões de gênero que limitam a sexualidade feminina e dificultam o envolvimento dos homens na assunção de responsabilidades com relação ao cuidado da saúde sexual é combinado com a percepção generalizada da falta de educação sexual entre os jovens, que recebem pouca informação das suas famílias e das suas comunidades de origem, bem como das instituições de ensino que frequentam. Como detalha Pamela:
O tema da educação sexual em casa foi quase inexistente. No colégio foi o básico, apenas o básico, como o bebê é gerado e só. E o restante já é mais de autoconhecimento e buscas na Internet. […] Mesmo que as coisas estejam mudando, ainda assim não se fala sobre sexualidade. Aqui no campo, que eu lembre, ninguém falava abertamente sobre o tema à mesa, sobre sexualidade, com os jovens. (Jovem, mulher, E5)
A falta de educação sexual e a prevalência de uma abordagem biologicista nas instituições de ensino superam as dificuldades existentes nas próprias comunidades indígenas, principalmente rurais, para falar sobre o tema, dadas as relações de autoridade que existem entre as gerações mais velhas e as mais jovens, bem como a perda de espaços de transmissão intergeracional de conhecimentos sobre o tema. Violeta relata:
Por exemplo, eu conversava com minhas colegas da escola, que também eram de família indígena e suas mães eram mapuche, mas elas eram bem mais velhas, então não tinham a mesma confiança e tinham medo de conversar sobre isso com suas mães. […] No campo é muito difícil que os jovens conversem sobre essas coisas com seus pais, que se sintam confortáveis para isso . (Jovem, mulher, E14)
Josefa, uma das jovens participantes do estudo, identifica um dos aspectos que geram mais conflitos na relação entre as gerações mais jovens e as mais velhas:
Dentro das comunidades não se fala muito, nem isso; na verdade, acho que uma das coisas que mais ouvi, que é um pouco criticada, é que os mais velhos não gostam de falar sobre essas coisas. Não gostam de falar nem mesmo às vezes sobre menstruação ou sobre o ciclo menstrual das meninas. (Jovem, mulher, E10)
É importante destacar que esse sentimento de não ter um espaço para falar sobre sexualidade entre jovens e adultos deve ser compreendido no âmbito de padrões culturais que definem espaços de comunicação e expressão da palavra em lógicas diferentes daquelas da sociedade mestiça, que tenderam a institucionalizar os espaços de fala, relegando-os, no caso dos jovens e adolescentes, à díade família-escola. Por outro lado, a definição de espaços apropriados para falar sobre sexualidade e saúde reprodutiva entre jovens, adolescentes, adultos e idosos requer a geração de consenso comunitário quanto à definição de oradores e interlocutores autorizados a estabelecer esses diálogos e a gerar discursos em torno da gestão do corpo e da saúde.
“Eu como parteira, soube quando estava grávida”: serviços biomédicos e juventude mapuche na atenção à saúde sexual e reprodutiva
Outro resultado desse estudo se refere à relação entre os serviços biomédicos e a juventude indígena. Às deficiências já apontadas na educação sexual, no caso da juventude indígena, soma-se o fato dos serviços biomédicos serem vistos com distanciamento e desconfiança. Por sua vez, o pessoal da saúde reconhece não identificar esses grupos, nem ter os instrumentos para conhecer suas necessidades. Na verdade, nenhum dos agentes de saúde entrevistados identificou intervenções específicas da sua equipe no que diz respeito a SSR direcionada a esses grupos, apesar de reconhecer a necessidade de implementá-las.
Sobre o primeiro, a maioria dos(as) jovens entrevistados(as) declarou não comparecer aos exames de saúde biomédicos por motivos diversos. Por exemplo, Katty afirma que, antes de ter a sua filha, ainda quando era adolescente, usava principalmente remédios mapuche, evitava o uso de medicamentos e não conhecia os serviços de atenção primária correspondentes a sua localidade:
Quando éramos crianças nos davam águas de ervas e só, lawen [componentes medicinais provenientes, principalmente, de plantas], nada mais, para evitar remédios industriais. E, de fato, eu como parteira só soube disso quando engravidei. Não sabia o que era isso e só soube quando já estava grávida porque a minha mãe me levou . (Jovem, mulher, E9)
A prevalência do uso do sistema médico mapuche entre os(as) jovens se baseia não apenas nas relações de confiança estabelecidas com seus agentes de saúde e na abordagem preventiva, mas também faz parte do processo de reconhecimento e reapropriação de sua identidade étnica, que também acontece pela incorporação de seus remédios e pela revitalização de suas estratégias terapêuticas, como afirma Josefa:
Os remédios que uso agora são, na verdade, os mesmos que a minha mãe prepara, que a minha avó prepara quando ficam doentes. Porque para todas as doenças há um remédio ou um tratamento diferente, mas natural. […] Porque eu não sou muito de ir ao médico, em geral eu evito . (Jovem, mulher, E10)
Katty também considera que os remédios indígenas são uma forma de afirmar o conhecimento do seu povo e a autonomia sobre a gestão de seus corpos:
Aqui, jovem ou não, você vai ver a machi [agente médico tradicional indígena] constantemente, a machi lhe dá lawen, faz o diagnóstico, uma série de coisas […] . Então, tudo isso está sendo recuperado, ultimamente se viu muita coisa, [...] , e muita gente recorre ao nosso sistema de saúde mapuche . (Jovem, mulher, E9)
Essa busca e aplicação de conhecimento da medicina mapuche para a abordagem de necessidades de saúde também é integrada com o cuidado da SSR, complementando-a com outros métodos, como o uso do preservativo. Denisse explica isso da seguinte forma:
Para a menstruação, uso muito o remédio natural, como guateros [compressas ou bolsas de água quente] , chazinhos [infusões], por exemplo, muito lawen para isso. Já para o sexo, aí sim eu me cuido com preservativos, na verdade somente com preservativo, não tomo comprimidos, nada de comprimidos, apenas preservativo . (Jovem, mulher, E7)
Pamela, por sua vez, apenas recentemente recuperou uma parte desse conhecimento por meio do seu envolvimento em grupos universitários mapuche:
Sabe-se que o chá de canela ou a água de arruda ajudam a passar o ciclo menstrual, e também existe o pensamento de que a arruda é abortiva. […]. A mulher mapuche usa uma espécie de cinta com a roupa tradicional, e essa cinta é feita para cuidar dos órgãos da fertilidade, do útero, dos ovários, é feita para sustentar a mulher daquela região. Mas esse é um conhecimento que eu tenho agora, com a minha tese e venho aplicando-o. (Jovem, mulher, E5)
A vitalidade que a medicina mapuche goza entre os jovens que vivem em comunidades ou que se reapropriaram de suas identidades indígenas no espaço urbano contrasta com a distância que existe entre eles e os serviços biomédicos, muitas vezes ligada a percepções negativas em relação ao tratamento e à qualidade dos serviços que receberam nas ocasiões em que os abordaram. Violeta, por exemplo, conta o que ouviu de suas colegas sobre os cuidados das parteiras:
Sempre me disseram que as parteiras desafiam [repreendem] . Sempre ouvi isso, minhas amigas que tiveram guagüita [recém-nascidos] quando eram jovens falam que as parteiras desafiam, dizendo: “Quem mandou vocês abrirem as pernas?” [se referindo à relação sexual] e coisas assim . (Jovem, mulher, E14)
O medo e a vergonha de revelar aspectos de sua vida sexual-afetiva na frente dos seus pais ou de outros adultos também dificultam a presença dos(as) jovens mapuche em consultas biomédicas, visto que os(as) adolescentes devem ser acompanhados por um adulto responsável para poder ter acesso à consulta de saúde. Catalina, por exemplo, considera que os serviços biomédicos de atenção primária são espaços que não protegem a confidencialidade e, consequentemente, os vê como inseguros:
Para mim, os consultórios não são seguros, a questão de ir ao consultório e responder uma série de perguntas, um interrogatório, que você não pode entrar sozinha, pedem que você entre com sua mãe ou com um adulto, e claro que você não pode se abrir diante da parteira com a sua mãe do lado. (Jovem, mulher, E12)
Esses depoimentos mostram a persistência do pensamento de que a atenção à saúde nas questões de SSR de adolescentes exige o controle e a supervisão dos pais e/ou tutores, violando o que consta nos regulamentos vigentes do Chile que, de forma explícita, reconhecem os(as) adolescentes e jovens como indivíduos de direitos, incentivando a concessão da atenção à saúde que eles precisam, mesmo na ausência de um adulto responsável (MINSAL, 2016 MINSAL- MINISTERIO DE SALUD. Circular A15/11. Sobre la atención de adolescentes que concurren sin compañía de un adulto responsable. Santiago, 2016. Disponible en: https://diprece.minsal.cl/wrdprss_minsal/wp-content/uploads/2017/12/Circular-Atenci%C3%B3n-Adolescente-2016.pdf . Consultado el: 6 agosto 2023.
https://diprece.minsal.cl/wrdprss_minsal... ). Da mesma forma, experiências negativas no acesso ao contraceptivo de emergência, garantido no Chile desde 2011, por meio da Lei 20.533, são verdadeiros obstáculos que dificultam a relação entre os serviços de saúde e os(as) jovens, além da sua condição indígena. Como relata Denisse:
Tento não ir ao consultório nem ao hospital, mas uma vez eu tive que ir ao médico para tomar a pílula do dia seguinte. Fui ao Hospital de Temuco […] . Me mandaram para todos os lados, não queriam me atender, que a previsão de saúde... Opa! Me desafiaram [repreenderam] da mesma forma, que não acontecesse de novo. Por fim, tomei a pílula e disse que nunca mais, nunca mais voltaria ao hospital. (Jovem, mulher, E7)
Por sua vez, as equipes de saúde reconhecem que a população jovem indígena não costuma ir aos serviços biomédicos, mesmo aqueles que integraram a perspectiva intercultural no âmbito do programa PESPI. Karina, uma parteira de atenção primária à saúde, diz:
Eu comecei a trabalhar em outro CESFAM [Centro de Saúde Familiar] . Um perto daqui, em uma localidade que faz parte de uma comunidade mapuche, eles o administram. […] E saibam que lá, se lembro bem, a verdade é que não se vê muita presença ou aproximação de jovens nas consultas. Em outro hospital, que tem muita gente da etnia mapuche trabalhando, é a mesma coisa, não há muita presença ou aproximação dos jovens, é como se eles não existissem. (Parteira, mulher, E2)
Os profissionais de saúde das comunas rurais defendem que a autoidentificação como mapuche envolve pertencer a comunidades específicas e a estilos de vida tradicionais, mais do que a presença de sobrenomes, que é um dos critérios estabelecidos pelo Estado para o reconhecimento da condição indígena. Juan, um parteiro responsável pela saúde de adolescentes da zona rural, explica da seguinte forma:
[O adolescente] é um pouco evasivo para a questão das etnias. Alguém pergunta a um garoto ou garota de família indígena se ele(a) se considera do povo mapuche, […] , e a grande maioria responde que não se identifica. […] Sinto que entre os jovens rurais existe uma identidade de viver como antigamente […] , então sinto que de certa forma a mulher está em uma posição subordinada, o protagonismo das mulheres indígenas é mais urbano, não é daqui. (Parteiro, homem, E4)
Além das complexas dinâmicas identitárias e de gênero que entram nesses processos de atribuição ou negação de pertencimento a um povo que viveu processos históricos de fragmentação, os agentes biomédicos de saúde concordam que a integração de uma perspectiva intercultural no trabalho com os jovens esteve ausente das políticas públicas que devem implementar, bem como da formação que receberam como profissionais de saúde. Com relação a isso, Lorena afirma: “ Eu me formei nessa região, na bolsa tivemos algumas aulas, não posso dizer que há um módulo intercultural, o intercultural não está incorporado no todo, e muito menos no trabalho com os jovens ” (Médica, mulher, E6).
Essa carência é reconhecida pelas equipes de saúde e, justamente, aqueles que tratam diretamente com os adolescentes e jovens reforçam que o intercultural pode se tornar uma porta de entrada para o trabalho com essa faixa etária, que muitas vezes é dificultado não apenas pelas dificuldades de vinculá-los aos espaços de saúde, mas também de superar a desconfiança dos pais e responsáveis que devem autorizar a sua participação nas entidades de educação sexual nas instituições de ensino. Como explica Juan:
A interculturalidade é a porta de entrada. Porque com o adolescente, o programa não trabalha apenas com garotos, mas também com os pais. Você não precisa pedir Consentimento Livre e Esclarecido, explicar o programa de saúde do adolescente [...] é uma questão de difícil entendimento porque quando se fala sobre o controle de adolescentes é como se fôssemos incentivar que seu filho tenha relações sexuais [...] . Sinto que o que há sobre saúde do adolescente está focado apenas nas questões biomédicas, com zero interculturalidade. (Parteiro, homem, E4)
Gravidez na adolescência e fertilidade como resistência entre jovens mapuche
Os depoimentos sobre a falta de educação sexual nas comunidades e nas instituições de ensino com as quais os jovens mapuche têm contato, bem como o distanciamento e as tensões que estabelecem com os serviços biomédicos resultam na percepção de que a gravidez na adolescência é uma realidade comum entre jovens e adolescentes indígenas, principalmente rurais, afetando particularmente a vida e o desenvolvimento pessoal das mulheres que ficam responsáveis pela criação dos filhos. Ao investigar essa questão entre os jovens mapuche, a maioria a identifica como uma realidade com a qual se relacionaram na adolescência: “ Sim, no meu curso teve um caso de uma menina que engravidou por volta dos 16 anos. E minha irmã também engravidou, acho que depois de terminar o 4º, [...] agora quase todas as minhas colegas já são mães ” (Jovem, mulher, E11).
Outra entrevistada conta algo parecido: “ Sim, vemos muita gravidez na adolescência, aconteceu com muitas meninas ou jovenzinhas aqui ” (Jovem, mulher, E2). Por sua vez, as equipes de saúde reconhecem que, embora tenham conseguido diminuir a taxa de gravidez na adolescência na região, o percentual se manteve estável nos últimos anos, apontando a existência de uma população em que as intervenções realizadas até o momento não tiveram um impacto eficaz. Nas palavras de uma assistente social:
O índice de gravidez na adolescência na região se manteve estável por muito tempo, baixou um pouquinho, mas nada muito significativo. E as dificuldades continuam [...], as equipes de atenção primária, para realizar trabalhos de promoção ou prevenção, contam com poucos recursos humanos, financeiros [...]; fica difícil nos aproximarmos dos adolescentes e da população . (Informante-chave, E2)
Além dos recursos financeiros destinados para essas questões, os entrevistados identificam a falta de especificidade na abordagem da gravidez na adolescência por parte do sistema de saúde, onde jovens indígenas e rurais não foram envolvidos, considerando as desigualdades territoriais e sócio-históricas que os(as) afetam. A mesma escassez de dados estatísticos sobre as características dos grupos nos quais persiste a gravidez na adolescência constitui em si um obstáculo para a abordagem da problemática: “ Acho que a nossa debilidade é que não perguntamos se há alguma debilidade na população mapuche. [...] Enquanto não levantarmos a variável da interculturalidade, é difícil ter dados reais ” (Informante-chave, E2).
As entrevistadas que engravidaram na adolescência vinculam sua experiência com a falta de acesso à informação principalmente no mundo rural, e com a possibilidade de “se abrir” para conversar sobre esses temas com a família para ter uma informação concreta sobre como ter uma vida sexual de forma protegida na adolescência, sem medo nem risco de gravidez:
Que por você ser da zona rural por si só, você não conversa sobre esses temas. [...] Sabemos que estão ali, mas não são conversados. Na cidade não é assim. Na cidade, se você precisar de um preservativo, é só dizer ao seu amigo “ei, me dá um preservativo”, é algo normal, mas isso não acontece aqui na zona rural [...] eu gostaria que isso mudasse, porque sinto que isso não nos faz bem [...]. É como se você já tivesse engravidado e acabassem de conversar com você sobre, sei lá, os tipos de contraceptivos ou como usar o preservativo, mas antes não falam muito sobre isso . (Jovem, mulher, E9)
Por outro lado, sobre a gravidez na adolescência, nas comunidades existem conceitos específicos associados a uma cultura jovem e ao estabelecimento de redes de parentesco que são diferentes na cultura mapuche. Violeta, por exemplo, explica que embora a gravidez precoce não seja punida na cultura mapuche, existe, sim, a expectativa de que os jovens pais vivam juntos em um relacionamento afetivo estável, independentemente da idade: “ A gravidez na adolescência... sim, é aceita, mas o pai tem que estar junto da mãe, isso sim. Por exemplo, se são jovens, por assim dizer, o obrigam a estar com a menina [...] têm que viver juntos, ter um relacionamento, não precisam se casar, mas precisam estar em um relacionamento afetivo ” (Jovem, mulher, E14).
Além do convívio precoce, os(as) jovens mapuche também contam sobre o interesse em perpetuar a cultura, por isso a fertilidade é valorizada de forma positiva, especialmente se as gestações acontecem entre jovens provenientes de famílias cuja linhagem é considerada prestigiosa:
Há idosas ainda com pensamentos antigos que não deixarão que seus filhos se misturem com uma wingka [pessoa não mapuche] . Por exemplo, mesmo que você tenha qualidade indígena, mesmo que pertença ou se considere mapuche, para eles só importa que você não seja champurria… [pessoa mesclada entre mapuche e wingka] , há pessoas que ainda se importam com conservar seu sobrenome, sua raça pura, como eles chamam, e, claro, os filhos são muito bem-vindos. (Jovem, mulher, E11)
Discussão
Os depoimentos coletados confirmam a urgência de visibilizar as realidades que a juventude mapuche vivencia desde uma perspectiva intersecional, e as necessidades de SSR que surgem das diversas interseções que são traçadas entre pertencer a uma faixa etária específica e ser indígena em um contexto de acentuado conflito histórico. Como mencionado em outros estudos (Ávila; Alves, 2022ÁVILA, B. T.; ALVES, S. V. Reproductive planning in Indigenous area and the search for differentiated care: the dilemmas between inequality and difference. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 31, n. 2, p. 1-12, 2022. ), é preciso incorporar as formas de internalizar a rápida mudança cultural que a juventude indígena é protagonista, bem como as ressignificações, rupturas, conflitos e abandonos que vivenciam em relação aos Estados, à sociedade mestiça e às próprias comunidades de origem. Entre essas transformações, as relações de gênero surgem como uma dimensão predominante na medida em que, como evidenciado nos depoimentos coletados, os(as) jovens reconhecem transições para relações de gênero mais igualitárias entre homens e mulheres (Vallardes de La Cruz; Flores Herrera, 2011VALLADARES DE LA CRUZ, L. R.; FLORES HERRERA, R. M. Fronteras identitarias: jóvenes, género y procesos de cambio en Jonotla, Sierra Norte de Puebla. Alteridades, Ciudad de México, v. 21, n. 42, p. 53-64, 2011. ), embora também persistam diferenças que atribuem principalmente às mulheres responsabilidades relacionadas com os cuidados de saúde, o controle da fertilidade e as restrições ao exercício da sua sexualidade (Griffiths; Alvarado; Vega, 2010GRIFFITHS, E. A.; ALVARADO, C. Q.; VEGA, I. M. Equidad en salud reproductiva en mujeres Mapuche. Sexualidad, Salud y Sociedad – Revista Latinoamericana, Rio de Janeiro, n. 5, p. 97-118, 2010. ). Estas áreas parecem ser reforçadas pelos padrões de sexo e gênero presentes principalmente nas comunidades rurais e entre as gerações mais velhas. Por sua vez, a persistência na atenção à saúde a partir de uma abordagem heteronormativa, focada principalmente no controle da gravidez, do parto e do puerpério e construída a partir do paradigma biomédico (Couto et al., 2019COUTO, M. T. et al. La perspectiva feminista de la interseccionalidad en el campo de la salud pública: revisión narrativa de las producciones teórico-metodológicas. Salud Colectiva, Lanús, v. 15, e1994, 2019. ), tem como efeito o fortalecimento de papéis que reproduzem o vínculo exclusivo das mulheres com as responsabilidades de cuidado com a saúde, além de afastar os(as) jovens dos serviços biomédicos em relação àqueles que têm medo e desconfiança (Barroso, 2014BARROSO, C. Beyond Cairo: sexual and reproductive rights of young people in the new development agenda. Global Public Health, Abingdon, v. 9, n. 6, p. 639-646, 2014. ).
As transformações das relações sexo-gênero nas comunidades mapuche rurais e urbanas estão no centro das reflexões realizadas por suas próprias protagonistas, muitas das quais hoje têm um papel importante na elaboração de seu próprio pensamento político indígena, que está problematizando a longa história de invisibilização das mulheres indígenas e os conflitos que se estabeleceram com os chamados “feminismos brancos”, toda vez que reivindicaram o gênero como única categoria de análise, sem considerar as lutas que as mulheres indígenas travaram durante décadas pela educação dos seus filhos, o vigor da língua, o exercício e transmissão da medicina e a proteção do território, bem como as múltiplas violências que sofreram, algumas protegidas pela ideia da tradição cultural (Calfio, 2009CALFIO, M. Mujeres mapuche, voces y acciones en momentos de la historia. In: PEQUEÑO, A. (coord.). Participación y políticas de mujeres indígenas en contextos latinoamericanos recientes. Quito: FLACSO, 2009. p. 91-109. ; Pailahueque, 2019PAILAHUEQUE, K. Reflexiones en torno a la emergencia del feminismo mapuche en la comuna de Pudahuel. Revista Punto Género, Santiago, v. 11, p.103-110, 2019. ).
Quanto à educação sexual e o acesso à informação sobre estratégias de cuidado da SSR dessa população, a pesquisa revela que as jovens mapuche, da mesma forma que suas colegas não indígenas, usam principalmente a comunicação entre elas e a autoformação como meio de informação sobre a sexualidade (Figueroa et al., 2023FIGUEROA, A. R. et al. Percepción de los adolescentes y profesores sobre la educación sexual en Chile 2011-2021. Matronería Actual, Viña del Mar, n. 1, p. 20-20, 2023. ). No entanto, a falta de educação sexual nas instituições de ensino que frequentam, soma-se ao distanciamento estabelecido com os serviços de saúde e com a falta de diálogo sobre essa questão nas próprias comunidades indígenas. Apesar dessa ausência, nos processos de recuperação da identidade mapuche que apareceram nas histórias das jovens, surgem dimensões de autocuidado da saúde que incluem a saúde sexual e reprodutiva, principalmente a partir da recuperação e reprodução de conhecimentos em torno do uso de ervas medicinais para a saúde menstrual e para o parto. A partir de uma perspectiva decolonial, esses espaços de reapropriação, reivindicação e ressignificação que muitas vezes envolvem a união de conhecimentos e práticas (o uso de preservativos e de lawen , por exemplo) exercidas pelas próprias jovens mapuche podem representar fissuras que abrem espaços para disputas sobre o poder a partir do qual historicamente foi produzido o conhecimento sobre questões de saúde sexual e reprodutiva e do qual essas jovens foram sistematicamente excluídas (Segato, 2012SEGATO, R. Gênero e colonialidade: em busca de chaves de leitura e de um vocabulário estratégico descolonial. e-cadernos CES, Coimbra, n. 18, p. 106-131, 2012. ). O nütram – espaço de memória, conversa e troca de experiências entre membros de idades e gêneros diferentes de uma mesma comunidade (Bustos, 2021BUSTOS, J. A. Lógica de la comunicación mapuche contemporánea. Contracorrente: Revista do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas, Manaus, n. 17, p. 168-192, 2021. ) – pode resultar uma instância favorável para revitalizar os diálogos intergeracionais sobre aspectos ligados à sexualidade e à reprodução, visto que foi reconhecido como um espaço em que a cultura tradicional se entrelaça com as estratégias de comunicação atuais e com o qual facilitadores interculturais e equipes de saúde podem gerar espaços para diálogo.
Por último, a temática de gravidez na adolescência mostra como, embora as estatísticas a nível nacional sejam amplamente reconhecidas como conquistas de saúde (INJUV, 2020 INJUV- INSTITUTO NACIONAL DE LA JUVENTUD. El descenso de la fecundidad adolescente en Chile. Antecedentes, magnitud, determinantes y desigualdades. Santiago, 2020. (Serie de estudios INJUV, v. 12). Disponible en: https://www.injuv.gob.cl/sites/default/files/estudioembarazo.pdf. Consultado el: 6 agosto 2023.
https://www.injuv.gob.cl/sites/default/f... ), essas conquistas podem ocultar a presença de desigualdades que afetam os jovens rurais e indígenas de forma negativa. De fato, as estatísticas utilizadas no país mostraram a persistência do fenômeno nos setores economicamente mais desfavorecidos (MINSAL 2013b MINSAL- MINISTERIO DE SALUD. Situación actual del embarazo adolescente en Chile. Santiago, 2013b. Disponible en: https://www.minsal.cl/portal/url/item/c908a2010f2e7dafe040010164010db3.pdf Consultado el: 6 agosto 2023.
https://www.minsal.cl/portal/url/item/c9... ), estabelecendo associações entre pobreza, ruralidade e gravidez na adolescência, que ainda não foram estudadas acrescentando a etnia das jovens que relatam ter engravidado na adolescência. Tal como foi apresentado para temáticas como o HIV nos povos indígenas (Ponce; Muñoz; Stival, 2017PONCE, P.; MUÑOZ, R.; STIVAL, M. Pueblos indígenas, VIH y políticas públicas en Latinoamérica: una exploración en el panorama actual de la prevalencia epidemiológica, la prevención, la atención y el seguimiento oportuno. Salud Colectiva, Lanús, v. 13, n. 3, p. 537, 2017. ), é provável que a falta de dados estatísticos sobre o assunto esteja invisibilizando o problema, o que se soma à reconhecida falta de iniciativas interculturais direcionadas à promoção da SSR na adolescência e na juventude mapuche.
Conclusões
Esse estudo apresenta descobertas sobre a saúde sexual e reprodutiva de jovens mulheres mapuche, temática que raramente foi investigada e para a qual não foram elaboras políticas públicas específicas. Entre as principais descobertas desse estudo surgem as transformações nos sistemas sexo-gênero que são vivenciados nas comunidades rurais e urbanas, bem como a persistência de uma abordagem biomédica nos serviços de saúde que, sem uma perspectiva intercultural, não conseguiu reduzir o índice de gravidez na adolescência em populações-chave como adolescentes indígenas e rurais. Apesar dos avanços realizados paralelamente em programas dedicados à saúde do adolescente e à saúde intercultural, os jovens indígenas relatam distanciamento e tensões com o sistema oficial de saúde. Também é destacada a falta de educação sexual relatada pelas jovens, o que aumenta as dificuldades de comunicação sobre o tema nas comunidades, principalmente com as gerações mais velhas. É identificado o papel que os agentes médicos indígenas cumprem na reapropriação das identidades étnicas por grupos de jovens. É preciso estabelecer vínculos com os agentes de saúde mapuche presentes nos territórios e autoridades tradicionais para elaborar estratégias de educação sexual e afetiva que revertam a falta de acesso à informação que as jovens relatam e que permitam garantir seu direito de ter uma vida sexual e afetiva saudável, livre de violência e de discriminações.
Referências
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- As pesquisadoras declaram que não há conflito de interesses.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
09 Dez 2024 - Data do Fascículo
2024
Histórico
- Recebido
07 Ago 2023 - Aceito
05 Abr 2024 - Revisado
15 Maio 2024