Qualidade da dieta segundo a autoavaliação de adolescentes: resultados do ISACamp-Nutri

Samantha Dalbosco Lins Carvalho Antonio de Azevedo Barros Filho Marilisa Berti de Azevedo Barros Daniela de Assumpção Sobre os autores

Resumo

Objetivou-se estimar as prevalências de autoavaliação da qualidade da dieta de adolescentes e identificar os motivos de não a considerar muito boa/boa; calcular o escore global e de cada componente do Índice de Qualidade da Dieta Revisado (IQD-R) segundo as categorias de autoavaliação. Estudo transversal de base populacional com amostra por conglomerados e em dois estágios, realizado em Campinas-SP. Foram analisadas 891 entrevistas. As prevalências de autoavaliação da qualidade da dieta foram de 57,3% como muito boa/boa, 34,6% como regular e 8,1% como ruim/muito ruim. A autoavaliação como regular ou ruim foi associada ao consumo de doces, salgadinhos/biscoitos, cereais integrais (10-14 anos) e de fast-food (15-19 anos). Para os que foram classificados com pior qualidade da dieta (1º tercil dos escores do IQD-R), 52,5% consideravam a alimentação muito boa/boa e apenas 13,1% como ruim/muito ruim. O escore do IQD-R revelou-se significativamente menor nos que achavam a alimentação ruim (50,0 pontos) comparados aos que disseram muito boa/boa (55,4 pontos). Os que consideravam a alimentação ruim apresentaram consumo inferior de frutas, cereais integrais, e superior de gorduras sólidas e açúcares. Os achados revelam incoerência na autoavaliação da qualidade da dieta em relação aos escores insatisfatórios observados.

Palavras-chave
Adolescente; Comportamento Alimentar; Inquéritos de Saúde

Introdução

O monitoramento da qualidade da dieta dos adolescentes é essencial diante de um cenário de profundas modificações no hábito alimentar, no estado nutricional e nas condições de saúde desta população11 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2015. Rio de Janeiro: IBGE; 2016.,22 NCD Risk Factor Collaboration (NCD-RisC). Worldwide trends in body-mass index, underweight, overweight, and obesity from 1975 to 2016: a pooled analysis of 2416 population-based measurement studies in 128.9 million children, adolescents, and adults. Lancet 2017; 390(10113):2627-2642.. Os adolescentes representam um grupo vulnerável à adoção de comportamentos não saudáveis que podem continuar na vida adulta, incluindo os relacionados à dieta, sedentarismo, controle do peso, influência da propaganda, uso de tabaco, álcool e drogas ilícitas33 Sawyer SM, Afifi RA, Bearinger LH, Blakemore SJ, Dick B, Ezeh AC, Patton GC. Adolescence: a foundation for future health. Lancet 2012; 379(9826):1630-1640.,44 Patton GC, Sawyer SM, Santelli JS, Ross DA, Afifi R, Allen NB, Arora M, Azzopardi P, Baldwin W, Bonell C, Kakuma R, Kennedy E, Mahon J, McGovern T, Mokdad AH, Patel V, Petroni S, Reavley N, Taiwo K, Waldfogel J, Wickremarathne D, Barroso C, Bhutta Z, Fatusi AO, Mattoo A, Diers J, Fang J, Ferguson J, Ssewamala F, Viner RM. Our future: a Lancet commission on adolescent health and wellbeing. Lancet 2016; 387(10036):2423-2478..

Dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) mostram que, entre 1987 e 2009, houve queda na aquisição de alimentos in natura ou minimamente processados como arroz, feijão, leite, ovos, hortaliças, raízes e tubérculos, de ingredientes culinários usados no preparo das refeições como óleos vegetais, açúcar, farinha de trigo, e aumento na aquisição de produtos alimentícios prontos para o consumo como bebidas açucaradas, biscoitos, salgadinhos de pacote, doces e embutidos55 Martins APB, Levy RB, Claro RM, Moubarac JC, Monteiro CA. Participação crescente de produtos ultraprocessados na dieta brasileira (1987-2009). Rev Saúde Pública 2013; 47(4):656-665..

Mudanças desfavoráveis nos padrões alimentares associadas a um estilo de vida poupador de energia estão entre os principais responsáveis pela epidemia de doenças crônicas não transmissíveis44 Patton GC, Sawyer SM, Santelli JS, Ross DA, Afifi R, Allen NB, Arora M, Azzopardi P, Baldwin W, Bonell C, Kakuma R, Kennedy E, Mahon J, McGovern T, Mokdad AH, Patel V, Petroni S, Reavley N, Taiwo K, Waldfogel J, Wickremarathne D, Barroso C, Bhutta Z, Fatusi AO, Mattoo A, Diers J, Fang J, Ferguson J, Ssewamala F, Viner RM. Our future: a Lancet commission on adolescent health and wellbeing. Lancet 2016; 387(10036):2423-2478.,66 Cecchini M, Sassi F, Lauer JA, Lee YY, Guajardo-Barron V, Chisholm D. Tackling of unhealthy diets, physical inactivity, and obesity: health effects and cost-effectiveness. Lancet 2010; 376(9754):1775-1784.. No Brasil, o inquérito telefônico Vigitel revelou um crescimento nas prevalências de sobrepeso (7,4%), obesidade (47,1%) e obesidade grau III (36,4%) em oito anos de monitoramento (2006 a 2013), na população de 18 anos ou mais77 Malta DC, Santos MAS, Andrade SSCA, Oliveira TP, Stopa SR, Oliveira MM. Tendência temporal dos indicadores de excesso de peso em adultos nas capitais brasileiras, 2006-2013. Cien Saude Colet 2016; 21(4):1061-1069.. O Estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes de 12 a 17 anos (ERICA, 2013-2014) detectou 17,1% de sobrepeso, 8,4% de obesidade e 9,6% de hipertensão arterial, a qual atingiu 28,4% nos obesos e 15,4% naqueles com sobrepeso88 Bloch KV, Klein CH, Szklo M, Kuschnir MCC, Abreu GA, Barufaldi LA, Veiga GV, Schaan B, Silva TLN. ERICA: prevalências de hipertensão arterial e obesidade em adolescentes brasileiros. Rev Saúde Pública 2016; 50(Supl. 1):9s..

A adolescência é considerada uma fase propícia para o desenvolvimento de ações de prevenção e promoção da saúde, reforçando a importância de informações sobre a alimentação deste segmento33 Sawyer SM, Afifi RA, Bearinger LH, Blakemore SJ, Dick B, Ezeh AC, Patton GC. Adolescence: a foundation for future health. Lancet 2012; 379(9826):1630-1640.,44 Patton GC, Sawyer SM, Santelli JS, Ross DA, Afifi R, Allen NB, Arora M, Azzopardi P, Baldwin W, Bonell C, Kakuma R, Kennedy E, Mahon J, McGovern T, Mokdad AH, Patel V, Petroni S, Reavley N, Taiwo K, Waldfogel J, Wickremarathne D, Barroso C, Bhutta Z, Fatusi AO, Mattoo A, Diers J, Fang J, Ferguson J, Ssewamala F, Viner RM. Our future: a Lancet commission on adolescent health and wellbeing. Lancet 2016; 387(10036):2423-2478.. A qualidade da dieta pode ser avaliada por meio de métodos quantitativos como o Índice de Qualidade da Dieta Revisado (IQD-R), que considera o atendimento às recomendações de um conjunto de componentes alimentares como frutas, vegetais, cereais integrais, leite, gordura saturada e sódio99 Previdelli AN, Andrade SC, Pires MM, Ferreira SRG, Fisberg RM, Marchioni DM. Índice de Qualidade da Dieta Revisado para população brasileira. Rev Saúde Pública 2011; 45(4):794-798.. Estudos com o IQD-R revelam uma qualidade inadequada da dieta entre os adolescentes, decorrente da baixa ingestão de frutas, hortaliças, grãos integrais, e da elevada ingestão de gorduras sólidas, sódio e açúcares de adição1010 Assumpção D, Domene SMA, Fisberg RM, Barros MBA. Social and demographic inequalities in diet quality in a population-based study. Rev Nutr 2016; 29(2):151-162.

11 Andrade SC, Previdelli NA, Cesar CLG, Marchioni DML, Fisberg RM. Trends in diet quality among adolescents, adults and older adults: A population-based study. Prev Med Rep 2016; 4:391-396.
-1212 Banfield EC, Liu Y, Davis JS, Chang S, Frazier-Wood AC. Poor adherence to U.S. dietary guidelines for children and adolescents in the NHANES population. J Acad Nutr Diet 2016; 116(1):21-27..

Mas, como o adolescente considera a qualidade da sua alimentação? Para isto foi feita uma pergunta com opções de resposta sobre como ele avalia a própria alimentação. A literatura relacionada aos estudos que analisaram a qualidade da dieta considerando um método quantitativo do consumo alimentar com uma autoavaliação é escassa. Nesse sentido, os objetivos deste estudo foram: estimar as prevalências da autoavaliação da qualidade da dieta de adolescentes e identificar os motivos de não considerá-la muito boa ou boa; calcular o escore global e dos componentes do IQD-R segundo as categorias de autoavaliação para atender o interesse de avaliar a relação entre a ingestão alimentar e a avaliação subjetiva da qualidade da dieta.

Material e métodos

Desenho e população do estudo

Trata-se de um estudo transversal de base populacional que utilizou dados do Inquérito de Saúde de Campinas (ISACamp 2014-15) e do Inquérito de Consumo Alimentar e Estado Nutricional (ISACamp-Nutri 2014-16). Os inquéritos coletaram informações de adolescentes (10 a 19 anos), adultos (20 a 59 anos) e idosos (≥ 60 anos), não institucionalizados e residentes na área urbana do munícipio de Campinas-SP. Neste estudo, optou-se por analisar o segmento de adolescentes, de ambos os sexos.

ISACamp 2014-15

A amostra do ISACamp 2014-15 foi obtida por meio de amostragem probabilística, por conglomerados e em dois estágios: setor censitário e domicílio. No primeiro estágio, procedeu-se o sorteio sistemático de 70 setores censitários com probabilidade proporcional ao tamanho, dado pelo número de domicílios. Os setores foram ordenados pela renda média dos chefes do domicílio e, posteriormente, foram selecionados 14 setores de cada um dos cinco distritos de saúde do município.

O tamanho mínimo da amostra foi definido em 1.000 adolescentes, levando em conta a estimativa de uma proporção de 50% (p = 0,50), que corresponde à máxima variabilidade para a frequência dos eventos estudados, com nível de confiança de 95% (z = 1,96), erro de amostragem entre 4 e 5 pontos percentuais e efeito de delineamento de 2. Esperando-se uma taxa de resposta de 80%, foram sorteados 2.898 domicílios para entrevistas com adolescentes. Em cada domicílio, foram entrevistados todos os moradores que tinham entre 10 e 19 anos.

O questionário do ISACamp foi organizado em 12 blocos temáticos, incluindo morbidades, uso de serviços de saúde, práticas preventivas, comportamentos relacionados à saúde, uso de medicamentos, características demográficas e socioeconômicas, entre outros. A coleta dos dados foi realizada por entrevistadores treinados, com o uso de tablet.

ISACamp-Nutri 2014-16

O ISACamp-Nutri foi desenvolvido de forma acoplada ao ISACamp. Concluída a participação no ISACamp, realizou-se uma segunda visita domiciliar para a aplicação de um instrumento composto pelo Recordatório de 24 Horas (R24h), Questionário de Frequência Alimentar (QFA) de formato qualitativo (não especifica o tamanho das porções), perguntas sobre percepção corporal, práticas para a perda de peso, autoavaliação da qualidade da dieta, checagem dos rótulos nutricionais, entre outras.

O questionário foi previamente testado em estudo piloto e aplicado por entrevistadores treinados e supervisionados. As entrevistas tiveram duração média de 30 minutos (IC95%: 28,6-31,3), 95,0% foram respondidas pelo próprio adolescente e 63,4% foram obtidas na primeira dentre as quatro tentativas consideradas. O campo foi percorrido nos diferentes dias da semana, inclusive aos sábados e domingos. Dentre os R24h realizados, 89,0% representaram o consumo alimentar de segunda a sexta-feira.

Optou-se por iniciar a entrevista pelo R24h, a partir da abordagem “Por favor, me diga tudo o que comeu e bebeu ontem, desde o momento em que acordou até o horário em que foi dormir”1313 Domene SMA. Avaliação do consumo alimentar. In: Taddei JAAC, Lang RMF, Longo-Silva G, Toloni MHA. Nutrição em saúde pública. Rio de Janeiro: Rubio; 2011. p.41-54.. O R24h foi conduzido por meio do Multiple-Pass Method, técnica proposta pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, que visa estimular a memória do respondente e aumentar a precisão da informação. Baseia-se numa entrevista estruturada em cinco etapas: Quicklist - visa obter, de modo espontâneo, uma lista de todos os alimentos e bebidas ingeridos no dia anterior; Forgotten foods - uso de uma lista de alimentos frequentemente esquecidos; Time and eating occasion - registro do horário, nome das refeições e local do consumo; Detail Cycle - retoma o primeiro registro do dia solicitando o detalhamento de cada item, incluindo as técnicas de preparo, a composição das preparações, o tipo do alimento e as respectivas quantidades; Final probe - momento de identificar algum alimento que não foi referido (gole, mordida) e de revisar algo que gerou dúvida1414 Steinfeldt L, Anand J, Murayi T. Food reporting patterns in the USDA Automated Multiple-Pass Method. Procedia Food Sci 2013; 2:145-156..

Os R24h foram aplicados com o apoio de um manual fotográfico. Os alimentos/preparações foram registrados em unidades e medidas caseiras e, posteriormente, quantificados em gramas ou mililitros com o auxílio de tabelas de medidas caseiras1515 Fisberg RM, Villar BS. Manual de receitas e medidas caseiras para cálculo de inquéritos alimentares. São Paulo: Signus; 2002.,1616 Pinheiro ABV, Lacerda EMA, Benzecry EH, Gomes MCS, Costa VM. Tabela para avaliação de consumo alimentar em medidas caseiras. 5ª ed. São Paulo: Atheneu; 2004., rótulos de alimentos e serviços de atendimento ao consumidor. Os dados foram imputados no software Nutrition Data System for Research (NDS-R), versão 2015 (Nutrition Coordinating Center, Universidade de Minnesota) por nutricionistas treinadas e supervisionadas. Realizou-se a consistência de todos os recordatórios da pesquisa.

O questionário do ISACamp-Nutri foi digitado em máscara desenvolvida com o uso do software EpiData versão 3.1 (EpiData Assoc. , Odense, Dinamarca). Finalizada a entrada dos dados, realizou-se a análise de consistência.

Variáveis utilizadas no estudo

Para atender os objetivos do estudo foram consideradas as variáveis:

Autoavaliação da qualidade da dieta: obtida da pergunta “Como você considera a qualidade da sua alimentação? Você acha que ela é?” com as seguintes opções de resposta: muito boa, boa, regular, ruim e muito ruim. Estas respostas foram agrupadas em muito boa/boa, regular e ruim/muito ruim. Aqueles que não consideravam a dieta muito boa ou boa, respondiam a questão “Por que você acha que não tem uma dieta de boa qualidade?”, composta por 12 categorias de resposta. O entrevistador assinalava uma ou mais categorias conforme o relato espontâneo do entrevistado.

Índice de Qualidade da Dieta Revisado (IQD-R): calculado com informações de um R24h, o IQD-R é composto por 12 componentes, nove classificados em adequação (frutas totais; frutas integrais; vegetais totais e leguminosas; vegetais verde-escuros/alaranjados e leguminosas; cereais totais; cereais integrais; leite e derivados; carnes, ovos e leguminosas; óleos) e três em moderação (sódio; gordura saturada; Gord_AA, referente ao percentual energético oriundo de gorduras sólidas, álcool e açúcar de adição). Os componentes de adequação recebem pontuações que variam de zero (não consumo) a cinco ou zero a dez (consumo que atende ou excede o valor recomendado). Para os componentes de moderação são atribuídas pontuações que variam de zero (consumo que ultrapassa o limite máximo recomendado) a dez ou a vinte (atende os valores preconizados de ingestão). Valores intermediários de ingestão são calculados proporcionalmente. O IQD-R total é representado pela soma dos 12 componentes, oscilando entre zero (pior qualidade da dieta) e 100 pontos (melhor qualidade)99 Previdelli AN, Andrade SC, Pires MM, Ferreira SRG, Fisberg RM, Marchioni DM. Índice de Qualidade da Dieta Revisado para população brasileira. Rev Saúde Pública 2011; 45(4):794-798..

Também foram selecionadas como variáveis do estudo:

Demográficas e socioeconômicas: sexo (masculino e feminino), faixa etária (10 a 14 e 15 a 19 anos), raça/cor da pele autorreferida (branca e não branca), escolaridade do chefe da família (0 a 8, 9 a 11 e ≥ 12 anos de estudo) e se frequenta a escola (não e sim, diferenciado por pública ou particular).

Comportamentos relacionados à saúde e percepção da quantidade ingerida: gostaria de mudar o peso (não, sim, ganhar e sim, perder), costume de verificar os rótulos de alimentos (não e sim/às vezes), acha que come mais do que deveria (não e sim) e frequência com que realiza o café da manhã (7 vezes na semana e < 7). A variável prática de atividade física no lazer foi categorizada em ativos ou insuficientemente ativos e inativos. Foram considerados ativos os adolescentes de 10-17 anos que praticavam ao menos 60 minutos diários de atividade física, pelo menos cinco dias na semana e os de 18-19 anos que realizavam ao menos 150 minutos semanais, distribuídos, no mínimo, por três dias1717 World Health Organization (WHO). Global recommendations on physical activity for health. Geneva: WHO; 2010..

Análise de dados

Inicialmente, foi verificada a associação das variáveis demográficas, socioeconômicas, de comportamentos relacionados à saúde e percepção da quantidade ingerida com a autoavaliação da qualidade da dieta, e do sexo e da faixa etária com os motivos de não considerar a dieta muito boa/boa, pelo uso do teste Rao-Scott com nível de significância de 5%. A associação entre os tercis da distribuição dos escores do IQD-R dos adolescentes e a autoavaliação da qualidade alimentar foi verificada por meio do teste Rao-Scott com 5% de significância. Em seguida, foram calculadas as médias do IQD-R total e de cada componente segundo as categorias de autoavaliação da qualidade da dieta, por meio de regressão linear múltipla com nível de significância de 5%. As análises foram executadas no programa Stata versão 14.0, no módulo svy, que considera os pesos e o delineamento de amostragem.

Procedimentos éticos

O ISACamp e o ISACamp-Nutri foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Campinas e pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Sistema CEP/CONEP). O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNICAMP.

Resultados

Dos 1.023 adolescentes incluídos no ISACamp, 109 não participaram do ISACamp-Nutri, correspondendo a 10,9% de recusas ou perdas. Entre os 914 que responderam o questionário de nutrição, 11 recusaram o preenchimento do R24h e outros 12 foram excluídos do presente estudo por apresentarem dietas com valor energético total inferior a 600 kcal/dia (n = 10) e superior a 6.000 kcal/dia. Portanto, foram analisados 891 adolescentes de 10 a 19 anos com idade média de 14,6 anos (IC95% 14,4-14,8).

A maioria da população estudada foi composta por meninos (52,0%), por indivíduos de 15 a 19 anos (52,6%), de cor da pele branca (55,5%), que estudavam em escola pública (63,4%) e que residiam em domicílios chefiados por pessoas com até oito anos de estudo (53,3%). Quanto aos comportamentos de saúde, houve predominância de adolescentes que não desejavam mudar o peso (59,1%), que eram inativos no lazer (58,8%), que não tinham o hábito de verificar os rótulos dos alimentos (68,6%) e que realizavam o café da manhã diariamente. Quanto à percepção de comer mais do que deveria, 64,5% responderam não (Tabela 1).

Tabela 1
Prevalências da autoavaliação da qualidade dieta, segundo variáveis sociodemográficas, de comportamentos relacionados à saúde e percepção da quantidade ingerida, em adolescentes de 10 a 19 anos. ISACamp-Nutri, 2014-16.

As prevalências de autoavaliação da qualidade da dieta foram de 57,3% como muito boa/boa (MB/B), 34,6% como regular (R) e 8,1% como ruim/muito ruim (R/MR). As variáveis faixa etária, gostaria de mudar o peso, come mais do que deveria e realização do café da manhã apresentaram associações significativas com a percepção da qualidade da dieta. Foram observadas maiores prevalências de autoavaliação da qualidade da dieta como MB/B nos adolescentes que estavam satisfeitos com o peso, nos que achavam que não comiam em demasia e nos que realizavam o café da manhã todos os dias (Tabela 1).

A Tabela 2 apresenta os motivos dos adolescentes não avaliarem a qualidade da alimentação como MB/B. Não comer ou comer pouca fruta, vegetal (saladas cruas e cozidas) e tomar/tomar muito refrigerante foram os motivos mais mencionados pelo conjunto da população. Nenhuma diferença foi identificada entre os sexos. Entretanto, a análise por faixa etária mostrou que os adolescentes mais novos (10 a 14 anos) consideravam o consumo de doces, salgadinhos/biscoitos, cereais integrais, e os mais velhos (15 a 19 anos) o de fast-food, como motivos de terem uma alimentação R ou R/MR.

Tabela 2
Motivos de não considerar a qualidade da alimentação como muito boa/boa, em adolescentes em 10 a 19 anos. ISACamp-Nutri, 2014-16.

A distribuição dos escores do IQD-R entre os adolescentes foi categorizada em tercis de acordo com a sua frequência (T1: ≥ 21,0 e ≤ 50,4 pontos; T2: > 50,4 e ≤ 60,0 pontos; T3: > 60,0 e ≤ 80,7 pontos). Entre os que apresentaram pior qualidade da dieta (T1), 52,5% percebiam a alimentação como MB/B, 34,4% como regular e apenas 13,1% como R/MR. Para aqueles classificados no T2, verificou-se que 57,2% consideravam a alimentação como MB/B e 35,7% como regular. No último tercil da distribuição dos escores do IQD-R, 62,1% dos adolescentes autoavaliaram a dieta como MB/B e 4,1% como R/MR (Figura 1).

Figura 1
Prevalência da autoavaliação da qualidade da dieta de acordo com os tercis dos escores do IQD-R, em adolescentes de 10 a 19 anos. ISACamp-Nutri, 2014-16.

O escore total médio do IQD-R foi estimado em 54,7 pontos para o conjunto da população. Os adolescentes que consideravam a alimentação R/MR apresentaram pior qualidade global da dieta, um consumo inferior de cereais integrais (no limiar da significância estatística), frutas totais (suco natural) e integrais (in natura), e superior de gordura saturada e gorduras sólidas, álcool e açúcares de adição (Gord_AA), comparados aos que percebiam a dieta como MB/B (Tabela 3).

Tabela 3
Médias dos escores e beta coeficientes do IQD-R total e de cada componente segundo as categorias de autoavaliação da qualidade da dieta, em adolescentes de 10 a 19 anos. ISACamp-Nutri, 2014-16.

Discussão

Este estudo identificou que 42,7% dos adolescentes autoavaliaram a qualidade da dieta como regular ou ruim/muito ruim, resultado associado ao maior consumo de doces, salgadinhos, biscoitos, cereais integrais e fast-food. Somente 13,1% dos adolescentes classificados com piores pontuações no IQD-R avaliaram a alimentação como ruim, no entanto 52,5% e 34,4% disseram que era boa e regular, respectivamente. A qualidade global da dieta mostrou-se bastante ruim, mesmo entre os adolescentes que diziam que a alimentação era muito boa ou boa (55,4 pontos em uma escala de zero a 100). A avaliação da dieta como ruim/muito ruim foi associada à pior qualidade alimentar, com menor consumo de frutas e cereais integrais, e maior de gorduras e açúcares.

Entre as forças do estudo, destaca-se o uso de informações oriundas de uma amostra de base populacional, de um inquérito específico sobre consumo alimentar. Os procedimentos para a coleta, quantificação e digitação dos dados de consumo alimentar foram padronizados. O software Nutrition Data System for Research, utilizado para imputar os dados de ingestão, permite reduzir os erros de digitação e incluir grande variedade de alimentos e técnicas culinárias. Entre as limitações, deve-se considerar que o desenho de corte transversal impossibilita interpretar os resultados como relações de causa e efeito. A aplicação de um único recordatório de 24 horas não representa o consumo habitual dos indivíduos. No entanto, se aplicado em uma amostra representativa da população, em diferentes dias da semana e meses do ano, é possível estimar uma média de ingestão para a população avaliada1010 Assumpção D, Domene SMA, Fisberg RM, Barros MBA. Social and demographic inequalities in diet quality in a population-based study. Rev Nutr 2016; 29(2):151-162..

Nesta pesquisa, 57,3% dos adolescentes consideravam a qualidade da alimentação como muito boa/boa, 34,6% como regular e 8,1% como ruim/muito ruim. Analisando uma amostra de estudantes de 14 a 19 anos de Cuiabá-MT, Rodrigues et al. 1818 Rodrigues PRM, Gonçalves-Silva RMV, Ferreira MG, Pereira RA. Viabilidade do uso de pergunta simplificada na avaliação da qualidade da dieta de adolescentes. Cien Saude Colet 2017; 22(5):1565-1578. verificaram que 56,0% (64,0% dos meninos e 50,0% das meninas) autoavaliaram a qualidade da alimentação como ótima ou boa, e outros 44,0% como regular, ruim ou péssima. Também foi observada uma diferença significativa entre a distribuição dos escores do IQD-R, categorizados em tercis, e a autoavaliação; entre os que tinham pior qualidade da dieta, apenas 13,1% percebiam a alimentação como ruim e 52,5% como boa. A maioria dos adolescentes (62,1%) soube identificar corretamente uma dieta de boa qualidade, mostrando que a maior dificuldade se encontra em estabelecer a dieta como ruim. A indecisão em classificar a dieta como adequada ou não tem sido atribuída à dificuldade de avaliar a alimentação como um todo e estabelecer uma ponderação entre o consumo de alimentos saudáveis e não saudáveis1919 Toral N, Conti MA, Slater B. A alimentação saudável na ótica dos adolescentes: percepções e barreiras à sua implantação e características esperadas em materiais educativos. Cad Saúde Pública 2009; 25(11):2386-2394..

A análise por sexo não apresentou diferenças quanto aos motivos de considerar a qualidade da dieta como regular ou ruim. No entanto, esta avaliação foi associada ao consumo de salgadinhos, cereais integrais, biscoitos e doces pelos adolescentes de 10 a 14 anos, e de fast-food pelos de 15 a 19 anos. Estudo qualitativo com adolescentes (10 a 14 anos) de Pernambuco-PE, verificou que o conhecimento sobre alimentação saudável estava relacionado ao não consumo de alimentos ricos em gordura, açúcar e sal2020 Silva DCA, Frazão IS, Osório MM, Vasconcelos MGL. Percepção de adolescentes sobre a prática de alimentação saudável. Cien Saude Colet 2015; 20(11):3299-3308.. Em Cuiabá-MT, a autoavaliação da dieta como boa foi maior nos adolescentes que relataram ter conhecimento sobre alimentação adequada (Odds Ratio de 4,9 nos meninos e 1,8 nas meninas)1818 Rodrigues PRM, Gonçalves-Silva RMV, Ferreira MG, Pereira RA. Viabilidade do uso de pergunta simplificada na avaliação da qualidade da dieta de adolescentes. Cien Saude Colet 2017; 22(5):1565-1578.. Utilizando a técnica de grupo focal com estudantes de 10-19 anos, Toral et al. 1919 Toral N, Conti MA, Slater B. A alimentação saudável na ótica dos adolescentes: percepções e barreiras à sua implantação e características esperadas em materiais educativos. Cad Saúde Pública 2009; 25(11):2386-2394. identificaram que a adoção de uma dieta saudável trazia a necessidade de evitar doces, fast-food e alimentos industrializados. A Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE, 2015) não detectou diferenças nas prevalências de consumo de produtos alimentícios ultraprocessados como embutidos, salgadinhos de pacote e biscoitos salgados (30,5% versus 33,7%), fast-food (14,1% versus 16,7%) e doces (40,5% versus 40,6%) entre os grupos etários de 13 a 15 e 16 a 17 anos, respectivamente11 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2015. Rio de Janeiro: IBGE; 2016.. Estes resultados reforçam a importância de desenvolver ações de educação alimentar e nutricional no ambiente escolar, que promovam a formação de hábitos saudáveis, de habilidades culinárias e autonomia nas escolhas alimentares dos adolescentes2020 Silva DCA, Frazão IS, Osório MM, Vasconcelos MGL. Percepção de adolescentes sobre a prática de alimentação saudável. Cien Saude Colet 2015; 20(11):3299-3308.,2121 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Guia Alimentar para a População Brasileira. Brasília: MS; 2014..

A qualidade da dieta mensurada pelo IQD-R atingiu 54,7 pontos para o conjunto da população. Outros estudos realizados em 2008-2009 constataram pontuações globais do IQD-R de 50,3 para adolescentes de 12 a 19 anos, residentes em São Paulo-SP, e de 48,6 para indivíduos de 10 a 19 anos de Campinas-SP1010 Assumpção D, Domene SMA, Fisberg RM, Barros MBA. Social and demographic inequalities in diet quality in a population-based study. Rev Nutr 2016; 29(2):151-162.,1111 Andrade SC, Previdelli NA, Cesar CLG, Marchioni DML, Fisberg RM. Trends in diet quality among adolescents, adults and older adults: A population-based study. Prev Med Rep 2016; 4:391-396.. Com o objetivo de avaliar o estilo de vida da população de São Paulo, Ferrari et al. 2222 Ferrari TK, Cesar CLG, Alves MCGP, Barros MBA, Goldbaum M, Fisberg RM. Estilo de vida saudável em São Paulo, Brasil. Cad Saúde Pública 2017; 33(1):e00188015. observaram que apenas 14,6% dos adolescentes apresentavam uma dieta adequada, definida pelo último tercil dos escores do IQD-R. Um estudo de coorte mostrou que a adoção de uma dieta de melhor qualidade dos 15 aos 25 anos foi associada ao menor ganho de peso durante a transição da adolescência para a vida adulta2323 Hu T, Jacobs DR, Larson NI, Cutler GJ, Laska MN, Neumark-Sztainer D. Higher Diet Quality in Adolescence and Dietary Improvements Are Related to Less Weight Gain During the Transition From Adolescence to Adulthood. J Pediatr 2016; 178:188-193..

Os adolescentes que achavam a alimentação ruim apresentaram pior qualidade global da dieta, menor consumo de frutas (in natura e suco), cereais integrais, e maior de gorduras sólidas e açúcares. No estudo de Rodrigues et al. 1818 Rodrigues PRM, Gonçalves-Silva RMV, Ferreira MG, Pereira RA. Viabilidade do uso de pergunta simplificada na avaliação da qualidade da dieta de adolescentes. Cien Saude Colet 2017; 22(5):1565-1578., o segmento que avaliava a dieta como ruim apresentava maior frequência de pontuações inferiores (abaixo do percentil 75) no IQD-R total e nos componentes de frutas, vegetais, leite, óleos e sódio; os autores não identificaram associação com gordura saturada e calorias vazias (gorduras sólidas, álcool e açúcares livres). Toral et al. 1919 Toral N, Conti MA, Slater B. A alimentação saudável na ótica dos adolescentes: percepções e barreiras à sua implantação e características esperadas em materiais educativos. Cad Saúde Pública 2009; 25(11):2386-2394. observaram que a maioria dos adolescentes que relataram não ter uma dieta saudável gostaria de modificá-la, apontando o sabor dos alimentos saudáveis, a gula e a praticidade dos itens prontos para comer como barreiras para a adoção de mudanças.

Estudo que analisou a programação das duas principais emissoras brasileiras de televisão de canal aberto constatou que, 91,6% das propagandas de produtos alimentícios destinadas ao público infantil não exibiam mensagens de alerta sobre os riscos do consumo excessivo de gordura saturada e trans, açúcar e sal, 25,0% relacionavam a ingestão do produto com benefícios à saúde, 25,0% informavam que o produto poderia substituir fontes naturais de fibras alimentares e nutrientes, e metade das propagandas associavam o produto com um estilo de vida saudável2424 Henriques P, Sally EO, Burlandy L, Beiler RM. Regulamentação da propaganda de alimentos infantis como estratégia para a promoção da saúde. Cien Saude Colet 2012; 17(2):481-490..

Em estudantes de Cuiabá, MT, a autopercepção da qualidade da dieta como boa mostrou-se associada ao maior consumo de vegetais, frutas, leite e laticínios, óleos (incluindo os de oleaginosas e gordura de peixe), e ao menor consumo de sódio1818 Rodrigues PRM, Gonçalves-Silva RMV, Ferreira MG, Pereira RA. Viabilidade do uso de pergunta simplificada na avaliação da qualidade da dieta de adolescentes. Cien Saude Colet 2017; 22(5):1565-1578.. Toral et al. 1919 Toral N, Conti MA, Slater B. A alimentação saudável na ótica dos adolescentes: percepções e barreiras à sua implantação e características esperadas em materiais educativos. Cad Saúde Pública 2009; 25(11):2386-2394. observaram que a percepção da dieta como saudável foi atribuída à influência dos pais, desde a infância, para a adoção de práticas alimentares adequadas. Estudo transversal realizado nos Estados Unidos detectou melhor qualidade da dieta entre os indivíduos cujos pais ingeriam mais frutas e vegetais, não faziam as refeições assistindo televisão e não tinham bebidas açucaradas disponíveis no domicílio2525 Santiago-Torres M, Adams AK, Carrel AL, LaRowe TL, Schoeller DA. Home Food Availability, Parental Dietary Intake, and Familial Eating Habits Influence the Diet Quality of Urban Hispanic Children. Child Obes 2014; 10(5):408-415.. Perdersen et al. 2626 Pedersen S, Grønhøj A, Thøgersen J. Following family or friends. Social norms in adolescent healthy eating. Appetite 2015; 86:54-60. enfatizam que os hábitos alimentares dos pais influenciam mais os adolescentes na adoção de uma dieta saudável do que as orientações feitas por eles.

No estudo de Rodrigues et al. 1818 Rodrigues PRM, Gonçalves-Silva RMV, Ferreira MG, Pereira RA. Viabilidade do uso de pergunta simplificada na avaliação da qualidade da dieta de adolescentes. Cien Saude Colet 2017; 22(5):1565-1578. foi identificada prevalência superior de autopercepção da dieta como ruim (regular, ruim e muito ruim) naqueles que não faziam as três principais refeições do dia e nos que eram fisicamente inativos. Pesquisa qualitativa mostrou que os adolescentes associavam uma alimentação saudável com a regularidade das refeições, e embora considerassem o café da manhã a principal refeição do dia, a omissão foi justificada por não gostar, não ter tempo e apetite, e por ter que acordar mais cedo2020 Silva DCA, Frazão IS, Osório MM, Vasconcelos MGL. Percepção de adolescentes sobre a prática de alimentação saudável. Cien Saude Colet 2015; 20(11):3299-3308.. No México, estudo com universitários constatou que omitir o café da manhã estava associado a uma alimentação de baixa qualidade de macronutrientes e micronutrientes2727 Hall L, Tejada-Tayabas LM, Monárrez-Espino J. Breakfast Skipping, Anxiety, Exercise, and Soda Consumption are Associated with Diet Quality in Mexican College Students. Ecol Food Nutr 2017; 56(3):218-237..

Estudo realizado com estudantes de uma universidade de Melbourne, Austrália, verificou que 82,0% relataram que o sabor era um atributo muito ou extremamente importante na escolha dos alimentos, o que esteve associado à pior qualidade da dieta, ao consumo menos frequente de frutas e vegetais, e mais frequente de doces, biscoitos, pizzas, batata frita, refrigerante e de refeições realizadas fora de casa2828 Kourouniotis S, Keast RSJ, Riddell LJ, Lacy K, Thorpe MG, Cicerale S. The importance of taste on dietary choice, behaviour and intake in a group of young adults. Appetite 2016; 103:1-7.. Pesquisa qualitativa com adolescentes do Equador observou entusiasmo ao expressarem o sabor de alimentos doces e gordurosos, já as hortaliças foram relacionadas com características sensoriais negativas e desagradáveis2929 Verstraeten R, Van Royen K, Ochoa-Avilés A, Penafiel D, Holdsworth M, Donoso S, Maes L, Kolsteren P. A Conceptual Framework for Healthy Eating Behavior in Ecuadorian Adolescents: A Qualitative Study. PLoS One 2014; 9(1):e87183.. Cabe ressaltar que a preocupação dos adolescentes de serem ridicularizados pelos colegas como nerd, esquisitos, pobres ou esportistas constituiu uma importante barreira para a incorporação de alimentos saudáveis na dieta2929 Verstraeten R, Van Royen K, Ochoa-Avilés A, Penafiel D, Holdsworth M, Donoso S, Maes L, Kolsteren P. A Conceptual Framework for Healthy Eating Behavior in Ecuadorian Adolescents: A Qualitative Study. PLoS One 2014; 9(1):e87183.

30 Croll JK, Neumark-Sztainer D, Story M. Healthy Eating: What Does It Mean to Adolescents? JNE 2001; 33(4):193-198.
-3131 Stead M, McDermott L, MacKintosh AM, Adamson A. Why healthy eating is bad for young people’s health: Identity, belonging and food. Soc Sci Med 2011; 72(7):1131-1139.. Utilizando a técnica de grupo focal com 203 adolescentes norte-americanos, Croll et al. 3030 Croll JK, Neumark-Sztainer D, Story M. Healthy Eating: What Does It Mean to Adolescents? JNE 2001; 33(4):193-198. identificaram que o tempo dedicado ao preparo, o julgamento dos colegas, a escassez de opções saudáveis nas escolas e a ausência de preocupação com a dieta foram mencionados como barreiras para uma alimentação adequada.

Mensagens sobre recomendações nutricionais são amplamente divulgadas pela mídia e por profissionais da saúde, e geralmente os adolescentes reconhecem os alimentos que devem ser ingeridos ou evitados1818 Rodrigues PRM, Gonçalves-Silva RMV, Ferreira MG, Pereira RA. Viabilidade do uso de pergunta simplificada na avaliação da qualidade da dieta de adolescentes. Cien Saude Colet 2017; 22(5):1565-1578.

19 Toral N, Conti MA, Slater B. A alimentação saudável na ótica dos adolescentes: percepções e barreiras à sua implantação e características esperadas em materiais educativos. Cad Saúde Pública 2009; 25(11):2386-2394.
-2020 Silva DCA, Frazão IS, Osório MM, Vasconcelos MGL. Percepção de adolescentes sobre a prática de alimentação saudável. Cien Saude Colet 2015; 20(11):3299-3308.,3030 Croll JK, Neumark-Sztainer D, Story M. Healthy Eating: What Does It Mean to Adolescents? JNE 2001; 33(4):193-198.. Diante do aumento das prevalências de doenças crônicas não transmissíveis, informações desprovidas de um contexto científico, social e cultural têm gerado fobias alimentares a exemplo do glúten, leite, cereais, manteiga e ovos3232 Garcia RWD. Reflexos da globalização na cultura alimentar: considerações sobre as mudanças na alimentação urbana. Rev Nutr 2003; 16(4):483-492.. De acordo com o Guia Alimentar para a População Brasileira, publicado em 2014, as recomendações para uma alimentação saudável incluem consumir alimentos variados e predominantemente in natura, limitar os alimentos processados e evitar os ultraprocessados, desenvolver e compartilhar as habilidades culinárias, comer com regularidade e atenção, evitar restaurantes de fast-food e criticar as informações sobre alimentação oriundas de propagandas comerciais2121 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Guia Alimentar para a População Brasileira. Brasília: MS; 2014..

Conclusão

Os achados deste estudo revelam incoerência na autoavaliação da qualidade da dieta considerando os escores insatisfatórios do IQD-R mesmo entre os adolescentes que classificaram a alimentação como muito boa/boa. A compreensão dessas incoerências pode subsidiar estratégias de educação alimentar para a prevenção de doenças crônicas não transmissíveis.

Agradecimentos

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo financiamento das pesquisas ISACamp 2014-2015 e ISACamp-Nutri 2014-2016. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa de mestrado concedida a SDL Carvalho.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    Nov 2020

Histórico

  • Recebido
    16 Ago 2018
  • Aceito
    16 Mar 2019
  • Publicado
    18 Mar 2019
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revscol@fiocruz.br