RESENHAS REVIEWS

 

A FEVER IN SALEM: A NEW INTERPRETATION OF THE NEW ENGLAND WITCH TRIALS. Laurie Winn Carlson. Chicago, Ivan R. Dee, Inc., 1999. 224 pp.

ISBN: 1-56663-253-6.

 

Histórias de bruxas sempre exerceram um grande fascínio no ser humano, exemplo recente disso sendo o enorme sucesso alcançado pela série de livros infanto-juvenis Harry Potter. Epidemias também causam grande interesse popular, e não somente por motivos relacionados a uma percepção de risco pessoal de se adquirir a doença. Exemplos recentes também não faltam: de poucos anos para cá epidemias de infecção pelo vírus Ebola, na África, por hantavírus, nas Américas, e de encefalopatia espongiforme bovina (doença da vaca louca) e febre aftosa, na Europa, têm ocupado as manchetes de jornais do mundo inteiro.

A Fever in Salem: a New Interpretation of the New England Witch Trials é um livro que desperta a curiosidade pelos dois assuntos, bruxaria e epidemias, que aborda e tenta relacionar. A autora, Laurie Winn Carlson, procura demonstrar que o famoso episódio ocorrido em 1692 em Salem, cidade norte-americana do Estado de Massachusetts, no qual vinte mulheres foram enforcadas como bruxas por terem supostamente enfeitiçado outros moradores do local, os quais apresentaram sintomas neurológicos e psiquiátricos, foi conseqüente a uma epidemia. Esta teria sido uma epidemia de encefalite letárgica, doença que só se tornaria conhecida no início do século XX, e a qual voltou a receber atenção mais recentemente em função do filme Tempo de Despertar (Awakenings), baseado em livro homônimo de Oliver Sacks.

A autora descreve a organização social dos colonos puritanos da Nova Inglaterra no século XVII, cujo entendimento é essencial para se compreender o tipo de reação da população de Salem a uma série de casos de manifestações neurológicas e psiquiátricas em moradores do vilarejo. Fato interessante, e que corrobora a hipótese de encefalite, é de que não só humanos mas também animais, como o gado bovino, foram acometidos. Baseada em farta documentação da época a autora descreve em detalhe os sintomas e a evolução clínica dos "doentes", e como a inabilidade dos médicos locais em considerar que se tratasse de condição médica fez com que a explicação alternativa, bruxaria, fosse a aceita, com todas as suas conseqüências.

A hipótese de que tenha ocorrido uma epidemia de encefalite em Salem é bem elaborada e relativamente bem documentada. De que se tratasse de encefalite letárgica, nem tanto. A autora dedica um capítulo inteiro à "epidemia esquecida" (encefalite letárgica), e outro correlacionando-a ao ocorrido em Salem. Nessa parte do livro as evidências apresentadas não são tão fortes, e a conclusão de que o episódio de Salem tenha sido uma epidemia de encefalite letárgica e não de outro tipo de encefalite parece algo forçada. Um capítulo interessante é o que discute as explicações alternativas que têm sido oferecidas ao episódio das bruxas de Salem, incluindo histeria coletiva e ergotismo.

Aceitando ou não o leitor a hipótese da autora não diminui o fascínio despertado pelo livro pela sua originalidade e como exemplo de investigação que congrega aspectos médicos, epidemiológicos, sociológicos e históricos. Nesse sentido é de particular interesse para profissionais de saúde envolvidos em vigilância epidemiológica e no controle de doenças transmissíveis.

 

Sérgio de Andrade Nishioka
Faculdade de Medicina,
Universidade Federal de Uberlândia,
Uberlândia, Brasil.

 

 

A CIÊNCIA DA SAÚDE. Naomar de Almeida Filho. São Paulo, Editora Hucitec, 2000. 255 pp.

ISBN: 85-27105-30-6

 

A relação entre o sujeito e o objeto do conhecimento tem sido alvo de atenção especial por parte de diferentes correntes científicas e filosóficas, principalmente a partir do final do século XIX. Atualmente, esta relação vem recebendo uma atenção redobrada, na medida em que vários autores pós-modernos, conscientes da instabilidade das práticas e resultados científicos, têm recomendado enfaticamente, que estas práticas se transformem num tema para si mesmas, colocando em questão os elementos teóricos e empíricos implícitos em sua própria organização e instrumentos. Ultrapassando o limiar de uma discussão específica sobre o alcance e os limites de uma ciência da saúde, este livro conta a história de um encontro feliz entre um pesquisador e um certo domínio temático, valendo portanto como um instigante instrumento de reflexão epistemológica sobre o sujeito que deseja conhecer e os objetos que vão se delineando no decorrer do processo de conhecimento.

O texto resulta da síntese do Memorial elaborado pelo autor para concurso de Professor Titular em Epidemiologia do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia, estruturando-se em dezesseis capítulos que analisam desde a sua iniciação no campo da Epidemiologia até os projetos que desenvolve atualmente. Um argumento central sustenta a articulação entre os capítulos: apenas a Epidemiologia revela potencialidades para se constituir como Ciência da Saúde. Ao longo do texto, vai-se construindo uma relação dialética na qual o pesquisador se modifica em contato com o campo temático e este campo vai sendo transformado pelas suas contribuições. No final da leitura torna-se possível perceber que assim como o objeto revela múltiplas facetas, o sujeito também vai se metamorfoseando, constituindo-se permanentemente a partir de um profícuo diálogo com os pares (e com os ímpares), configurando uma história humana e divertida, na qual os cenários são descritos, os atores têm rosto, preferências e um estilo próprio não apenas de pensar, mas de ser.

Nos três primeiros capítulos o autor elabora uma etnografia do seu primeiro encontro com a Epidemiologia, ocorrido na Escola de Saúde Pública da Universidade John Hopkins em 1985, identifica as correntes de pensamento que influenciaram decisivamente sua formação nos níveis de Graduação em Medicina, Mestrado e Doutorado e relata suas primeiras experiências de pesquisa no âmbito da epidemiologia psiquiátrica. Neste âmbito, revela alguns detalhes sobre a criação de novos instrumentos e procedimentos de pesquisa que exerceram influência decisiva na área, tanto dentro do país quanto no exterior. Ao narrar esta primeira fase de sua carreira, o autor revela uma tendência para o enfoque transdisciplinar, aproximando-se gradualmente das Humanidades (particularmente da Antropologia) e da Filosofia da Ciência. Esta tendência aliás pode ser vislumbrada em toda a narrativa, sendo retomada com ênfase na parte final do livro.

Nos capítulos subseqüentes (4, 5 e 6) o autor analisa a segunda fase de sua carreira, elaborando a crítica à metodologia epidemiológica, a partir da discussão de algumas preocupações centrais: o problema da causalidade, a defesa de uma pluricausalidade, a crítica ao positivismo epidemiológico, a contestação de certos dogmas metodológicos e a exploração de estratégias alternativas de pesquisa, afirmando que o critério da prova epidemiológica reside no "êxito na promoção da saúde e na prevenção e controle de doenças" (p. 66).

No sexto capítulo, Naomar de Almeida Filho circunscreve mais claramente o eixo das preocupações que desenvolveu a partir do final dos anos 80: uma "epistemetodologia da Epidemiologia" baseada numa história da disciplina, capaz de abordar tanto os avanços instrumentais, representados pelos modelos de investigação e pelas técnicas, quanto as dificuldades teóricas, por exemplo: o atraso na sua "constituição como um campo institucional de saber autônomo", "a ausência de debate teórico" e a "desvalorização epistemológica da própria disciplina". De modo simultâneo, explicita a sua posição dentro do debate epistemológico e político, reafirmando "a força dos processos sociais na determinação da saúde coletiva", defendendo o ponto de vista de que a saúde e a doença devem ser compreendidas com base numa "filosofia consistente" que vai se definindo não apenas a partir dos seus condicionantes externos, mas ao interior mesmo das suas práticas.

O capítulo 7 contém várias críticas à Epidemiologia Clínica. No capítulo 8 o autor recupera "as definições paradigmáticas próprias da Epidemiologia, silenciadas na sua pratica científica cotidiana". Dialogando com o Paradigma da Causalidade propõe o Paradigma do Risco, uma tentativa de preencher lacunas e questões de modo mais flexível, logo mais compatível com a transitoriedade dos fenômenos observados. No capítulo 9, o autor discute o modelo teórico da determinação social das doenças, identificando uma adesão ao monocausalismo que a concepção deste modelo pretenderia superar, afastando-se assim das necessidades e demandas do campo epidemiológico, carente de reflexões sobre "o simbólico e a cotidianidade".

No capítulo 10, trata de polemizar as categorias risco e causa, (refletindo sobre o papel que jogam o senso comum e o cotidiano), bem como com outras polaridades: teoria e prática, objeto e contexto, individual e coletivo, pessoa e população, biológico e social, qualitativo e quantitativo, abstrato e concreto. A desconstrução destas polarizações baliza a busca de superação das "práticas preventivas preditivas" na direção de "uma Ciência da Saúde capaz de ante-ver formas, figuras, visões e cenários em vez de pré-dizer algumas medidas e seus efeitos" (p. 133).

A partir do capítulo 11, desenha-se o contexto da reflexão desenvolvida pelo autor nos anos noventa. A leitura deste capítulo é decisiva pois nele são construídas certas linhas de continuidade entre distintos autores e correntes, que não obstante suas diferenças forneceram as coordenadas de um flexível processo de "maturação epistemológica". Situando-se no ponto de convergência entre vários avanços, conquistas, erros, acertos, certezas e incertezas acumulados no decorrer do tempo, o autor maneja tanto uma consciência do alcance e dos limites do campo tratado, quanto uma consciência dos seus próprios limites e potencialidades. Dialogando com Rabinow, Rhoy Bhaskar, Bourdieu, Foucault, Juan Samaja, Bruno Latour, Khun, etc., supera uma preocupação com possíveis ecletismos teóricos, mantendo-se fiel à sua tendência (revelada no início da sua caminhada) para refletir sobre a saúde com um pé fincado na Epidemiologia e o outro no diálogo permanente com outros campos do conhecimento, particularmente com as Ciências Sociais.

Finalmente, nos últimos capítulos, Naomar de Almeida Filho se coloca frente às alternativas teórico-metodológicas atuais que ele mesmo contribuiu para construir, buscando algumas saídas através da discussão sobre quatro termos: a práxis, desenhando as linhas gerais de uma teoria das relações entre modo de vida e saúde; a pluralidade, construindo uma "etnografia da prática epidemiológica"; a complexidade, propondo um novo paradigma epidemiológico capaz de recuperar a cultura, o senso comum, o cotidiano e a história humana; a transdisciplinaridade, sugerindo (através das interfaces entre as ciências sociais e as ciências da saúde) a necessidade de uma "forma renovada de integração global de um conhecimento coletivamente construído" (p. 220).

Confessando-se atualmente preocupado em fazer avançar as discussões no sentido de "um tratamento epistemológico e teórico do objeto-modelo Saúde", o autor encerra o livro afirmando o seu envolvimento numa luta para "preparar a Epidemiologia para cumprir o seu potencial, merecendo a justa designação de Ciência da Saúde".

 

Luzinete Simões Minella
Departamento de Ciências Sociais,
Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política,
Universidade Federal de Santa Catarina,
Florianópolis, Brasil.

 

 

MANUAL MERCK DE INFORMACION MEDICA PARA EL HOGAR. Barcelona, Océano. 1573 pp.

ISBN 84-494-1358-3

 

Trata-se de um manual de informações relacionadas à Medicina: saúde e doença, escrito por médicos de diferentes especialidades para o público em geral. Baseia-se, segundo seus editores, no secular Manual Merck de Diagnóstico e Terapêutica voltado para profissionais de saúde. O grande desafio é apresentar este novo Manual em linguagem e clareza tal que possa ser entendido e aproveitado pela população, sem no entanto perder seu rigor e qualidade técnica e sem permitir que o leitor o substitua pelo aconselhamento especializado. E esta tarefa nem sempre é fácil. Se por um lado é grande a curiosidade popular e a procura de informações a cerca de doenças e tratamentos, descrevê-los de modo que possam ser entendidos e utilizados sem riscos decorrentes de auto-diagnóstico ou auto-medicação é no mínimo muito delicado. Há que se enfatizar sempre as armadilhas e tentações que ocorrem quando o leitor, portador de algum sintoma ou com alguma dúvida em relação a qualquer doença, se identifique com algum capítulo e dispense a avaliação médica. Uma reação comum e perigosa parece ser: "isto é exatamente o que eu estou sentindo, portanto esta é a doença que tenho e preciso (ou não) tratar me desta maneira". É preciso deixar claro que a função de um Manual deste tipo é informar e orientar a população e não levá-la a subestimar a necessidade do parecer especializado. Seria um guia consultivo fácil e rápido, que ensinasse o leitor a prevenir e o ajudasse a entender a doença, o tratamento e o linguajar médico.

Segundo seu diretor editorial, Robert Berkow, este foi desenvolvido para responder às necessidades do público que apesar da falta de especialização, já lia o Manual original. Assim, esta "tradução" para não especialistas teria como função principal facilitar o entendimento e evitar interpretações errôneas. Adequadamente, Berkow descreve o cuidado em retirar desta versão aspectos da semiologia e terapêutica, peculiares de especialistas e acrescenta: "nenhum livro pode substituir a habilidade e o conselho de um médico e este não pretende substituir o médico nem constituir-se de um livro de auto-consulta... as informações médicas nele contidas ajudem ao leitor a comunicar-se de maneira mais eficaz com seu médico e compreender de forma mais completa os problemas e suas alternativas possíveis". Embora esta seja uma atitude ética, no escopo da função do Manual, não há como garantir, a não ser através do cuidado na exposição de informações em cada capítulo, que sua meta será alcançada sem riscos. E foi isso que procuramos observar na análise deste trabalho. Por mais que se ressalte a finalidade do livro, é de se esperar que um leitor aflito, com dúvidas sobre algum sintoma ou doença, passe ao capítulo que lhe é interessante, sem se deter no prólogo e no guia ao leitor, não sendo assim alertado para as armadilhas da compreensão deturpada.

O manual é apresentado em duas seções gerais e 22 clínicas. Já na seção 1 cabe uma ressalva. Os sintomas apresentados como sendo de enfermidades mortais são bastante comuns a uma série de doenças não necessariamente graves, o que pode inicialmente causar alguma confusão. Dor, transtornos gastro-intestinais, lesões de pele e esgotamento não são exclusivos das patologias terminais. No entanto, o texto explicativo a seguir em referência a cada um destes sintomas é bastante esclarecedor, orienta e desmistifica muitos dos temores relacionados às doenças terminais. Ao discutir, na seção 2, os aspectos farmacológicos e farmacodinâmicos o manual cumpre seu papel informativo e educador. Na apresentação dos fármacos a explicação sobre nomenclatura é bem oportuna, discutindo o porque de vários nomes para uma mesma droga e apresentando os genéricos, tão em voga atualmente, e que vem gerando dúvidas enormes na população. Modos de administração, importância da adesão e o que interfere com a resposta medicamentosa são dúvidas comuns, adequadamente esclarecidas.

Como era de se esperar, as 22 seções clínicas falam das várias enfermidades que acometem o ser humano, distribuídas obedecendo a uma ordem de freqüência, gravidade e sistemas, iniciando-se com as doenças do coração. Todos tememos as doenças cardíacas, freqüentemente associadas com a morte. Muito provavelmente este será um dos capítulos mais procurados, e um dos mais importantes porque o valor da prevenção e do pronto diagnóstico para a maioria das doenças cardíacas é indiscutível, por isso foi escolhido para a discussão. De maneira oportuna, a apresentação dos sintomas enfatiza os possíveis sinais de alerta sem, no entanto, criar ansiedades desnecessárias, passando a idéia de que vale a pena investigar, mas pode não ser nada. Afinal, esta não é a postura adequada para a prevenção? O autor também apresenta de modo claro e atual os diversos métodos diagnósticos. E a partir daí discute as doenças. Apesar da boa qualidade da informação, a ordem da apresentação das enfermidades cardiovasculares e sua descrição podem gerar dúvidas. A hipertensão arterial e o infarto agudo do miocárdio, pesadelo de muitos, aparecem somente após problemas como arritmias, insuficiência cardíaca e tumores do coração, muito importantes mas não igualmente "populares". Como a apresentação dos capítulos não se dá por ordem alfabética (ou por ordem de "popularidade") encontrar a doença procurada pode não ser tão simples. Além disso, nem sempre é possível para o leigo entender a classificação de enfermidades cardiovasculares e o leitor pode experimentar alguma dificuldade para encontrar determinadas patologias. Por exemplo, infarto terá que ser encontrado dentro de enfermidades das artérias coronárias, e esta pode não ser uma informação de domínio público. De qualquer modo, estes são problemas que serão debelados com o uso repetido do manual. E evidentemente, existe o índice alfabético para simplificar as coisas. Ultrapassados estes obstáculos o leitor encontrará informações pertinentes, os fatores de risco e maneiras práticas para reconhecer, entender e prevenir as doenças cardíacas mais freqüentes. E isso se repete nas outras seções.

Quanto a apresentação das terapias, o ponto positivo é a descrição de métodos simples mas eficazes, como é o caso da terapia respiratória enfatizando a drenagem postural, aspiração e exercícios respiratórios, pontos geralmente muito importantes para a boa evolução de pacientes com doenças do sistema respiratório, e quase sempre negligenciados por eles. No entanto, cabe aqui chamar a atenção mais uma vez para o risco da auto-medicação, já que na discussão das doenças, algumas vezes é proposto um tratamento, que se for acessível pode ser perigoso para o paciente se administrado em doses inadequadas. Um exemplo é o uso de adrenalina descrito para o tratamento de asma, que pode levar a sérias repercussões cardíacas. É sempre conveniente salientar que o fato de não se apresentar a posologia ou o nome comercial das medicações discutidas no texto não impede a auto-medicação. Pelo contrário, com a popularização de genéricos e o hábito permissivo de grande parte dos balconistas de drogarias, muitos fármacos passam a ser acessíveis, e as bulas geralmente contém a posologia. Em alguns países, para evitar a auto-medicação, a maioria dos medicamentos vem sendo veiculada sem a bula, que fica retida na farmácia. Este não é o caso no Brasil.

Discutir cada uma das seções seria repetitivo e inoportuno. No geral, o Manual atinge sua proposição básica, de informar e prevenir, sem assustar. É bastante abrangente, e certamente será informativo. Parece-me que consegue responder ao desafio de descrever os males que afligem a população e os principais problemas do cotidiano empregando linguagem acessível. Explicita sempre a necessidade da consulta médica e dá subsídios para que os problemas sejam melhor entendidos e explanados. Quanto ao rigor e qualidade técnica, são satisfatórios para o público que almeja atingir, uma vez que um maior aprofundamento certamente levaria à confusão e desinteresse. As ressalvas dizem principalmente respeito à descrição dos tratamentos, que podem permitir a auto-medicação quando a população tem fácil acesso a medicamentos que deveriam ser restritos à venda com receita médica.

Evidentemente, o manual reflete opiniões e conceitos de especialistas, que como tudo na área de Saúde, são temporais e passíveis de discussão. Como não se trata de texto científico, acredito que a metodologia básica empregada na discussão dos capítulos o manterá atual ainda por algum tempo.

 

Lucia Maria Costa Monteiro
Instituto Fernandes Figueira,
Fundação Oswaldo Cruz,
Rio de Janeiro, Brasil.

 

 

CHALLENGING INEQUITIES IN HEALTH: FROM ETHICS TO ACTION. T. Evans, M. Whitehead, F. Diderichsen, A. Bhuiya & M. Wirth (ed.). New York, Oxford University Press, 2001. 368 pp.

ISBN: 019513740X

 

The Global Health Equity Initiative - A preview of results

 

Today human beings live longer, healthier lives, on average, than at any time in history. Global life expectancy has increased faster in the last 40 years than in the preceding 4000, and growing knowledge about public health and medical technologies suggests this trend could continue. Not all groups have benefited equally from these developments, however. Just as there are inequalities in resources in every nation on earth, there are also inequalities in health, and a powerful relationship exists between them. The gap between rich and poor in many countries has been growing wider in recent years, and inequalities among ethnic groups are an increasing source of conflict in many countries. The health of disadvantaged groups is extremely sensitive to the economic, social, and political trends.

A forthcoming volume entitled Challenging Inequities in Health: from Ethics to Action, is the result of four years of research by a group of researchers from around the world - collectively called the Global Health Equity Initiative (GHEI). The volume is unique in its focus on inequalities within nations - developing and industrialized - and the fact that researchers are from the countries under study. Using quantitative and qualitative methods and drawing from the fields of epidemiology, economics, and demography, the in-depth country analyses provide empirical evidence on the nature and magnitude of inequity in health. These studies are complemented by frontier thinking on conceptual aspects of health equity - including the social basis of health disparities, the role of ethics in shaping the concept of health equity, gender and health equity, key measurement and finance issues, and the role of globalization in shaping health inequities. Throughout the volume, a strong focus on the role of policy-making in exacerbating or mitigating disparities in health is maintained.

The book is organized around four central themes. Part I establishes shared concepts and principles for action, and identifies the ethical underpinnings of a systematic response to health inequity. Part II analyzes the magnitude and causes of the health divide. Part III deals with the main determinants of health inequities and describes how policies from many sectors impact health equity. Part IV deals with policies to care for those who are already sick, including the reduction of the economic cost of illness and the design of more equitable health care systems. Part V draws together lessons from the GHEI to put forward a robust policy response to health inequities, requiring action across the four broad themes of the book.

The studies in this book tell us something more than where disability and illness are concentrated around the world. In so many cases where one group is more powerful, or has greater resources than another, the less powerful group suffers worse health. In this way, a nation's health inequalities may be seen as a barometer of its citizens' experiences of social justice and human rights, and remedies for health inequalities must come not only from the health sector, but from social polices at large, including fair access to education, job training, environmental risk reduction, and protection from impoverishment.

 

 

The social basis of health inequalities

 

The GHEI studies unambiguously point to the social basis of health inequity. In both rich and poor countries, higher social position is associated with better health. However, the extent of a nation's health inequalities has many political, economic and cultural influences, including what is deemed tolerable by that nation's cultural norms. A nation's policies regarding income distribution, access to decent education, social cohesion in neighborhoods, and whether its workplaces are organized to induce or mitigate psychological stress, may all serve to widen or diminish differences in health status among different groups. At the global level, increasingly important influences on health inequalities include migration levels, state' indebtedness to foreign financial institutions and the reach of multinational corporations. These global forces diminish the power nations and communities have over local inequities, and are generating tremendous moral challenges for powerful international companies, institutions, and industrialized countries themselves.

 

Poverty and marginalization

 

Poverty may be seen as both a cause, and a consequence, of ill health. Some societies provide comprehensive safety nets for the poor and their families that lose workers to illness, but the global trend towards decreasing welfare expenditure is placing greater numbers of families at risk of poverty, illness, and death. In addition, the AIDS epidemic is killing huge numbers of workers in developing countries and tipping millions of families over the edge. Many of the studies in this book provide empirical evidence on the way that poverty and marginalization affect health.

In Mexico, health status in different countries in Mexico was found to be strongly associated with the level of the county's marginalization (based upon a composite index of social economic indicators). Countries with high illiteracy rates, low earnings, and overcrowding, and those where a high proportion of households lacked running water, sanitation, and electricity had higher death rates at every stage of life, from infancy to adulthood.

In an in-depth study of South Africa, the authors find that its classification as a middle-income country disguises severe inequalities. Based on consumption, half the population lives in poverty. Those most at risk are members of female-headed families, those with less education, the unemployed, and residents of former "homeland" areas. Nearly all of South Africa's poor are black. Average household income for whites is about five times that of blacks. In 1993, infant mortality was five and half times higher among blacks compared to whites. The deaths of black infants were overwhelmingly caused by the disease of poverty, malnutrition, and preventable or curable infectious diseases, all shockingly common in such a wealthy country. These severe racial health inequalities were established by Apartheid but they persist in the new South Africa.

 

Social status

 

Rates of death and illness are higher for people everywhere who occupy the lower rungs of the social ladder, even in rich countries, and even among middle class people not living in poverty. But social status has different expressions in different countries. In the United States, better health seems closely correlated with income. The Japanese enjoy one of the highest life expectancies of any nation on earth, but evidence presented in this volume shows that health inequalities persist among different occupational groups. In both Russia and Chile, education appears to protect people from the disorienting effects of recent social and economic changes. The life expectancy of Russia men has fallen steeply since 1965, from 64 years to 58, and this rising mortality is concentrated among those with less schooling. There is a 9% reduction in mortality for each additional year of education for men and a 7% reduction for women.

 

Gender

 

Differences in health status between men and women depend both on biological differences between the sexes and on social factors arising from unfair gender relations. Gender differences in income, in the division of labor in the home and in employment, in access to education and medical care, and in the liberties that different members of society enjoy may all contribute to health inequalities between men and women that are independent of biology. The studies in the Global Health Equity Initiative document the ways in which gender, health, and socioeconomic factors intersect.

For example, despite its broad commitment to gender equity, discrimination persists is China. Chinese women live longer than men on average, but mortality rates among Chinese women are still higher than they should be based on international standards, and male life expectancy is rising faster than female life expectancy. Since 1987, infant mortality for girls has increased, so that in 1995, it surpassed that of boys by more than 25%. China is also one of very few countries in which the suicide rate among females exceeds that for males.

In Russia, on the other hand, women now outlive men by 13 years on average, and this "gender gap" in life expectancy is twice as wide as in other developed countries. Male death rates soared during Russia's harsh neoliberal transition which was associated with high labor turnover, rising unemployment and steep devaluation of the ruble. Deaths from accidents, violence, and cardiovascular disease account for most of the excess loss of life among Russian males. However, compared to international norms, Russian women are still faring quite poorly despite their relative advantage over men.

 

Economic Transition

 

Most of the countries described in this book have undergone some form of economic change during the past fifteen years. These broad changes in economic policy have frequently been accompanied by a widening of both economic and health inequalities, and in some cases, the worsening of aggregate health statistics. The cause of these widening health inequalities varies from country to country, as do the afflictions that appear to be responsible for them.

In Vietnam, health sector privatization has placed the cost of care out of reach of many Vietnamese families. In China, economic liberalization has promoted lopsided development, resulting in urban prosperity and deepening rural poverty.

In parts of Africa, a different, but related variety of transitions are underway. Largely rural cultures are being rapidly urbanized, and people are losing what fragile social safety nets their families and the state once provided. In Tanzania, education was once free, but now adolescents who cannot afford to pay newly introduced school fees drop out of school and are put at risk working in dangerous mines, plantations, and on the streets. In Kenya, the explosion of an urban population with roots in the countryside has created a vast transport industry, open to exploitation of poor young people, and a soaring death rate on the roads.

In Chile and Mexico, persistent poverty is increasingly concentrated among indigenous people, living in barren, isolated communities.

In developed countries, liberalization has also contributed to widening health inequalities. The United States has an appalling gap in health chances between social groups, as does the United Kingdom, which has been steadily weakening its social safety nets since the early 1980s.

 

 

What can be done?

 

This book demonstrates that an individual's health depends not only on inborn biological characteristics, but also on socioeconomic, cultural, and environmental conditions. Policy-makers must recognize that aggregate health indicators such as average life expectancy and infant mortality provide insufficient information about the health of the societies they serve. The distribution of health among different groups is also an important focus for health policy and research, because it can reflect the degree to which social injustices prevail in that society. By keeping track of health inequities, policy-makers may become more sensitive to the ways in which their actions, not only in the health sector, but also in other sectors, may actually widen the health gap.

There is much that governments can do to reduce health inequalities. They can invest in universal education and health care services for those who cannot afford to pay, monitor environmental hazards and work-related stress, and aim to reduce unemployment. In addition, they can build supportive environments for making behavioral changes.

Above all, the dozens of authors in this book are united in their assertion that inequalities in health are not inevitable. The fact that they are avoidable demands that we work together on purposeful public policies that challenge inequities in health.

 

Helen Epstein
Washington, DC, Estados Unidos.

 

 

SAÚDE E EDUCAÇÃO. Victor Vincent Valla (org.). Rio de Janeiro, DP&A, 2000. 120 pp.

ISBN 85-86584-96-7

 

"O Sentido da Escola é uma coleção voltada para o espaço/tempo do cotidiano escolar"... e vai direto ao assunto: no grupo de livros orientado para áreas "temáticas transversais presentes no cotidiano da escola", o volume entitulado "Saúde e Educação" aborda o assunto com uma precisão gratificante.

Gratificante porque todos os "militantes" no campo da saúde e da educação pública, em algum momento, poderão recorrer aos textos organizados por Victor Valla, para fins diversos, sempre que necessitarem de uma referência sobre os temas representados neste exemplar com a certeza de elucidar, com grande clareza, questões básicas e fundamentais de debates permanentemente inquietantes. Daqueles de que ninguém consegue escapar, seja numa roda informal de discussão sobre as iniciativas ministeriais que definem territórios políticos para futuros concorrentes ao cargo máximo do país, ou na determinação de temas a serem efetivamente contemplados pelos formuladores de políticas públicas que pretendam estabelecer eixos essenciais para propostas de reais transformações na base do sistema social.

Despido de formalismos acadêmicos, os autores focaram a atenção sobre o "ponto de vista popular" para, em linguagem direta e acessível, seguir questionando os fundamentos das relações presentes nas interfaces entre escola/unidade de saúde/comunidade, em momento extremamente oportuno.

Permeando o tema, e indicados por Valla logo nos dois primeiros capítulos, os preceitos da "investigação científica do ponto de vista popular", pretendendo analisar se a crise da compreensão é realmente nossa, discretos profissionais/mediadores de culturas tão díspares e tratadas tão indistintamente. Discretos enquanto a desinformação e os preconceitos pairarem sobre nossos corações e mentes. Até quando?

Em seguida, Eymard Mourão Vasconcelos, investigando a configuração dos movimentos sociais nos leva, inevitavelmente, a Gramsci na descrição de um quadro político que instiga um retorno aos originais, conferindo atualidade absurda a uma corrente filosófica pertencente ao século, já passado, que corre riscos de não terminar.

Igualmente, Mônica Peregrino mergulha nas entranhas da escola, resgatando a trajetória dos "saberes escolares" ao longo da "história da organização da escola e sua estruturação enquanto (...) produtora de relações de poder". Até chegar a uma conclusão (?) quase profética.

Neste contexto, Lana Cláudia de Souza Fonseca localiza o objeto do ensino de ciências tangenciando, desta feita, os "saberes da saúde" elaborados com base em Descartes e incutidos num modelo explicativo insuficiente para os fenômenos sociais recentes.

São estes fenômenos, localizados por John L. McKnight em uma favela - por acaso - de Chicago, que permitem abstrair sobre saúde como tema político e suas repercussões, quando tratadas de maneira oportuna, oferecendo um relato de experiência factível em qualquer comunidade, formal ou informal, do mundo.

Os seis capítulos, divididos em breves 120 páginas, tratam os temas propostos com bastante concisão e de forma linear, transformando este pequeno livro em uma importante referência para os atores envolvidos em processos de trabalho nos quais a relação entre serviço e usuário, até quando, sim, forem rompidas estas digressões na prática.

Antes mesmo de concluir esta resenha, já tive outras oportunidades de indicar e recomendar o volume, um bom prenúncio de toda a coleção, para diversos profissionais, parceiros e amigos, diretores de unidades escolares e de saúde, professores, médicos, assistentes sociais, pedagogas e lideranças comunitárias que, acredito, saberão apreciar seu conteúdo e tomá-lo como bons argumentos para seguir na luta.

 

Pedro Gilberto Alves de Lima
Programa Médico de Família,
Fundação Municipal de Saúde de Niterói,
Niterói, Brasil.

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br