RESUMO
Objetivo:
Analisar a prevalência de prática de bullying e fatores associados entre adolescentes brasileiros, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2019.
Métodos:
Estudo transversal, com amostragem por conglomerados. A variável desfecho, prática de bullying, foi obtida pela pergunta "Nos últimos 30 dias, você esculachou, zombou, mangou, intimidou ou caçoou algum de seus colegas da escola tanto que ele ficou magoado, aborrecido, ofendido ou humilhado?" (sim/não). Foram analisadas associações com características sociodemográficas, familiares, saúde mental e comportamentos de risco, utilizando regressão de Poisson com variância robusta.
Resultados:
12,1% (IC95% 11,7-12,6) dos adolescentes relataram praticar bullying. Houve associação positiva entre meninos (RP 1,66; IC95% 1,55-1,77); autodeclarados pretos (RP 1,23; IC95% 1,11-1,36) e pardos (RP 1,1; IC95% 1,02-1,18); de escola privada (RP 1,29; IC95% 1,21-1,37), que sentiam-se solitários (RP 1,17; IC95% 1,09-1,26), que a vida não vale a pena (RP 1,28; IC95% 1,19-1,39), apanharam de familiar (RP 1,67; IC95% 1,55-1,79), faltaram às aulas (RP 1,23; IC95% 1,15-1,31), usavam tabaco (RP 1,34; IC95% 1,22-1,47), álcool (RP 1,38; IC95% 1,28-1,50) e drogas regularmente (RP 1,17; IC95% 1,04-1,31) e tiveram relação sexual (RP 1,26; IC95% 1,18-1,35). A idade 16 e 17 anos (RP 0,82; IC95% 0,76-0,89) e supervisão familiar foram protetoras (RP 0,70; IC95% 0,66-0,75).
Conclusão:
Praticar bullying foi mais provável entre meninos, mais jovens, com problemas familiares e de saúde mental, e comportamentos de risco. Observa-se a importância de práticas como supervisão familiar contra o bullying.
Palavras-chave:
Bullying; Adolescente; Tabaco; Comportamentos de risco à saúde; Consumo de álcool por menores
INTRODUÇÃO
O bullying é um grave problema que afeta a saúde e o desenvolvimento de adolescentes em idade escolar11 Menesini E, Salmivalli C. Bullying in schools: the state of knowledge and effective interventions. Psychol Health Med. 2017; 22(supl 1): 240-53. https://doi.org/10.1080/13548506.2017.1279740
https://doi.org/10.1080/13548506.2017.12... ,22 de Oliveira WA. Bullying in adolescence and anxiety: an integrative review. In: Gonzaga LRV, Dellazzana-Zanon LL, Becker da Silva AM, eds. Handbook of stress and academic anxiety. Cham: Springer International Publishing; 2022. p. 81-92. https://doi.org/10.1007/978-3-031-12737-3_6
https://doi.org/10.1007/978-3-031-12737-... . Este fenômeno é definido como um tipo de violência que ocorre de maneira repetitiva, baseada em relações desiguais de poder entre vítimas e agressores, de forma intencional. Tradicionalmente, as agressões acontecem nas escolas e podem ser físicas, verbais ou psicológicas, resultando em consequências para todos os envolvidos, sejam vítimas, agressores ou observadores33 Lembo VMR, Santos MA, Feijó MCB, Andrade ALM. Review of the characteristics of boys and girls involved in school bullying. Psicologia, Teoria e Prática 2023; 25(3): ePTPPE15019. https://doi.org/10.5935/1980-6906/ePTPPE15019.en
https://doi.org/10.5935/1980-6906/ePTPPE... .
Contudo, observa-se que ainda existem poucos estudos que particularizem a experiência dos estudantes identificados como agressores33 Lembo VMR, Santos MA, Feijó MCB, Andrade ALM. Review of the characteristics of boys and girls involved in school bullying. Psicologia, Teoria e Prática 2023; 25(3): ePTPPE15019. https://doi.org/10.5935/1980-6906/ePTPPE15019.en
https://doi.org/10.5935/1980-6906/ePTPPE... ,44 Albdour M, Hong JS, Zilioli S, Lumley MA. Self-reported physical and psychological symptoms among victims and perpetrators of bullying in Arab American Adolescents. Child Adolesc Psychiatr Nurs 2020; 33(4): 201-8. https://doi.org/10.1111/jcap.12270
https://doi.org/10.1111/jcap.12270... . Estudos mostram que os escolares que praticam bullying também estão sujeitos a apresentar problemas de saúde mental, baixa capacidade de empatia, necessidade de aceitação no grupo de pares e envolvimento com outras situações de violência55 Jetelina KK, Reingle Gonzalez JM, Cuccaro PM, Peskin MF, Pompeii L, Atem F, et al. Mechanisms and frequency of violent injuries among victims and perpetrators of bullying. J Adolesc Health 2019; 64(5): 664-70. https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2018.10.295
https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.201...
6 Prignitz M, Banaschewski T, Bokde ALW, Desrivières S, Grigis A, Garavan H, et al. The role of empathy in alcohol use of bullying perpetrators and victims: lower personal empathic distress makes male perpetrators of bullying more vulnerable to alcohol use. Int J Environ Res Public Health 2023; 20(13): 6286. https://doi.org/10.3390/ijerph20136286
https://doi.org/10.3390/ijerph20136286... -77 Garandeau CF, Lansu TAM. Why does decreased likeability not deter adolescent bullying perpetrators? Aggress Behav 2019; 45(3): 348-59. https://doi.org/10.1002/ab.21824
https://doi.org/10.1002/ab.21824... .
Além disso, foi observado que os meninos praticaram mais todos os tipos de bullying (físico, verbal e social) em comparação com as meninas88 Borowiec J, Król-Zielińska M, Osiński W, Kantanista A. Victims and perpetrators of bullying in physical education lessons: the role of peer support, weight status, gender, and age in Polish adolescents. J Interpers Violence 2022; 37(17-18): NP15726-NP15749. https://doi.org/10.1177/08862605211017257
https://doi.org/10.1177/0886260521101725... . No que se refere às famílias desse grupo de estudantes, os adolescentes que vivem em contextos de conflito, com altos níveis de comunicação negativa ou com pais autoritários, têm maior chance de apresentarem comportamentos de bullying na escola99 Oliveira WA, Silva JL, Fernandez JER, Santos MA, Caravita SCS, Silva MAI. Family interactions and the involvement of adolescents in bullying situations from a bioecological perspective. Estud Psicol 2020; 37: e180094. https://doi.org/10.1590/1982-0275202037e180094
https://doi.org/10.1590/1982-0275202037e... ,1010 Maralani FA, Mirnasab M, Hashemi T. The predictive role of maternal parenting and stress on pupils' bullying involvement. J Interpers Violence 2019; 34(17): 3691-710.. Ser um agressor já esteve, também, associado à baixa escolaridade materna1111 Garcia AC, Sousa R, Varela A, Monteiro L. Bullying, physical activity, and body image among Brazilian students. J Health Psychol 2021; 26(10): 1661-73. https://doi.org/10.1177/1359105319884598
https://doi.org/10.1177/1359105319884598... ,1212 Wang H, Wang Y, Wang G, Wilson A, Jin T, Zhu L, et al. Structural family factors and bullying at school: a large scale investigation based on a Chinese adolescent sample. BMC Public Health 2021; 21(1): 2249. https://doi.org/10.1186/s12889-021-12367-3
https://doi.org/10.1186/s12889-021-12367... e a condições sociodemográficas desfavoráveis1313 Wang Y, Xie T, Xu J. Family socioeconomic status and internalizing problem behavior among chinese adolescents: the chain mediation effect of academic performance and peer conflict. Front Psychol 2022; 13: 902545. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2022.902545
https://doi.org/10.3389/fpsyg.2022.90254... .
Esse cenário revela a complexidade da prática do bullying por adolescentes e sinaliza a importância de considerar as particularidades do papel desempenhado pelos estudantes nessas situações. Desta forma, torna-se possível e importante analisar o cenário da prática do bullying considerando fatores individuais e contextuais associados a essa prática. Assim, o objetivo deste estudo foi analisar a prevalência da prática de bullying e fatores associados entre adolescentes brasileiros, segundo dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) 2019.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo epidemiológico transversal e analítico, que utilizou dados da PeNSE 2019, inquérito nacional realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com o Ministério da Saúde1414 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. PeNSE - Pesquisa nacional de saúde do escolar: 2019. Rio de Janeiro: IBGE; 2021.. A pesquisa foi planejada para ocorrer com periodicidade trienal desde 2009, sendo realizada em escolas públicas e privadas do Brasil.
A coleta de dados da PeNSE 2019 ocorreu entre abril e setembro, abrangendo estudantes brasileiros de 13 a 17 anos, matriculados e frequentando, do 6° ao 9° ano do Ensino Fundamental e da 1° a 3° série do Ensino Médio. Foram considerados os seguintes níveis geográficos: Brasil, Grandes Regiões, Unidades da Federação, Municípios das Capitais e Distrito Federal.
A amostra da PeNSE é realizada por conglomerados em dois estágios, dos quais as escolas correspondem ao primeiro estágio de seleção, e as turmas dos alunos matriculados ao segundo. Nas turmas selecionadas, todos os alunos foram convidados a responder o questionário da pesquisa. Foram calculados pesos amostrais considerando: os pesos das escolas, turmas e alunos, ajustados com base nos dados do Censo Escolar 2019. A amostra da PeNSE foi dimensionada para estimar parâmetros populacionais para os adolescentes de 13 a 17 anos de idade, visando estimar uma proporção (ou prevalência) da ordem de 0,5 (50%), com um coeficiente de variação de 4%1414 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. PeNSE - Pesquisa nacional de saúde do escolar: 2019. Rio de Janeiro: IBGE; 2021..
Os alunos responderam a um questionário estruturado e autoaplicável por meio de smartphones, contemplando informações sobre: situação socioeconômica, contexto familiar, experimentação e uso de cigarro, álcool e outras drogas, violência, segurança, acidentes e outras condições de vida1414 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. PeNSE - Pesquisa nacional de saúde do escolar: 2019. Rio de Janeiro: IBGE; 2021.. A amostra foi constituída por 125.123 escolares de 6.612 turmas em 4.242 escolas públicas e privadas, com uma perda de 15,2%, estimando-se em 11.851.941 o número de estudantes de 13 a 17 anos frequentando a escola no país.
Variáveis do estudo
A variável desfecho foi "prática de bullying", obtida por meio da pergunta: "Nos últimos 30 dias, você esculachou, zombou, mangou, intimidou ou caçoou algum de seus colegas da escola tanto que ele ficou magoado, aborrecido, ofendido ou humilhado?" Com as opções de resposta dicotomizadas em sim/não.
As variáveis independentes analisadas foram:
Características sociodemográficas:
sexo (masculino e feminino);
idade (13-15 anos e 16-17 anos); e
raça/cor da pele (branca, preta, parda, amarela e indígena),
escolas (pública ou privada),
escolaridade da mãe (sem escolaridade, ensino fundamental - incompleto/completo, ensino médio - incompleto/completo, ensino superior incompleto/completo).
Contexto familiar:
Morar com mãe e/ou pai - categorizada em não (residir sem pai e mãe) ou sim (escolares que residem com pai e/ou mãe);
Supervisão familiar - categorizada em não (nunca, raramente, às vezes) ou sim (na maior parte do tempo, sempre pais ou responsáveis sabiam realmente o que o adolescente estava fazendo);
Faltar às aulas sem autorização - categorizada em não (nunca) ou sim (1 ou mais vezes nos últimos 30 dias); apanhar de familiar - categorizada em não (nenhuma vez nos últimos 12 meses) ou sim (1 ou mais vezes).
Saúde mental:
Sentir-se sozinho/solitário - categorizada em não (nunca, às vezes nos últimos 12 meses) ou sim (na maioria das vezes, sempre nos últimos 12 meses);
Sentir-se triste - categorizada em não (nunca, raramente, às vezes) ou sim (na maioria das vezes e sempre)
Amigos - categorizada como não (nenhum) ou sim (1, 2, 3, ou mais amigos);
Sentir que a vida não vale a pena - categorizada em não (nunca, raramente, às vezes) ou sim (na maioria das vezes e sempre).
Comportamentos de risco:
Uso regular (nos últimos 30 dias) das seguintes substâncias:
Cigarro;
Tabaco;
Álcool;
Drogas ilícitas - cujas respostas foram dicotomizadas em sim ou não. Neste domínio também foi incluída a variável
Iniciação sexual, também dicotomizada em sim ou não.
Análises estatísticas
Inicialmente, realizou-se o cálculo da prevalência de prática de bullying segundo: características sociodemográficas, contexto familiar, saúde mental e comportamentos de risco. Para explorar fatores associados com o relato de praticar bullying, procedeu-se uma análise bivariada e multivariada, calculando-se a razão de prevalência bruta (RPb) com seus respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%). Foi utilizado o modelo de Regressão de Poisson com variância robusta1515 Barros AJD, Hirakata VN. Alternatives for logistic regression in cross-sectional studies: an empirical comparison of models that directly estimate the prevalence ratio. BMC Med Res Methodol 2003; 3: 21. https://doi.org/10.1186/1471-2288-3-21
https://doi.org/10.1186/1471-2288-3-21... , inserindo-se as variáveis com base na literatura, e p<0,05 na análise bivariada. Para a retirada das variáveis do modelo, utilizou-se a técnica backward, permanecendo no modelo final ajustado (RP) as variáveis estatisticamente significativas com p<0,05. Para todas as análises, foram consideradas a estrutura amostral e os pesos para a obtenção de estimativas populacionais. Os dados foram analisados com auxílio do pacote estatístico Stata, versão 14.2, adequado para análises de dados obtidos por meio de plano amostral complexo.
Aspectos éticos
A PeNSE está em conformidade com as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa Envolvendo Seres Humanos e foi aprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa do Ministério da Saúde (CONEP/MS), sob parecer n° 3.249.268 de 08/04/2019. Os estudantes foram informados sobre a pesquisa, sua livre participação e sobre a possibilidade de interrompê-la caso não se sentissem à vontade para responder às perguntas.
RESULTADOS
Do total da amostra (n=125.123), 50,7% (IC95% 49,9-51,4) era do sexo feminino, com a maioria entre 13 e 15 anos (64,7%; IC95% 63,2-66,1) e de escola pública (85,5%; IC95% 85,2-85,9). A maior parte era de cor da pele parda (43,2%; IC95% 42,5-43,9) e cujas mães tinham o ensino médio completo/incompleto (27,0%; IC95% 26,3-27,7), dados não apresentados.
Foram analisados os dados referentes a 19.363 estudantes que praticaram bullying contra colegas de escola, (12,1%; IC95% 11,7-12,6). A prática de bullying foi mais frequente entre meninos (14,7% IC95% 14,1-15,4), autodeclarados pretos (15,1%; IC95% 14-16,4) de escola privada (13,5%; IC95% 12,9-14,1%), sem relação com a escolaridade da mãe (Tabela 1).
Prevalência da ocorrência da prática de bullying entre escolares de 13 a 17 anos segundo variáveis sociodemográficas, do contexto familiar, de saúde mental e comportamentos de risco. PENSE 2019.
No contexto familiar, a prática de bullying foi maior entre os que relataram apanhar de familiares (20,7%; IC95% 19,7-21,7), não moravam com mãe e/ou pai (13,7%; IC95% 10,9-12,6) e faltavam as aulas sem comunicar a família (18,1%; IC95% 17,1-19,1). Por outro lado, os adolescentes que relataram supervisão familiar praticaram menos bullying (9,6%; IC95% 9,2-10,0) em comparação àqueles que negaram essa supervisão.
No que diz respeito às características de saúde mental, a prática de bullying foi mais frequente entre os que relataram tristeza (12,9%; IC95% 12,4-13,5), sentiam-se solitários (13,8%; IC95% 13,2-14,5), não tinham amigos (16,1%; IC95% 14,1-18,3) e referiram que a vida não vale a pena (15,5%; IC95% 14,8-16,3).
Com relação aos comportamentos de risco, praticar bullying foi mais frequente em escolares que fumaram cigarro (27,2%; IC95% 25,2-29,2), usaram tabaco (22,9%; IC95% 21,5-24,3), álcool (18,5%; IC95% 17,6-19,4) e drogas ilícitas nos últimos 30 dias (27,7%; IC95% 25,3-30,1), bem como entre os estudantes que relataram iniciação sexual (16,6%; IC95% 15,8-17,5) (Tabela 1).
No modelo final, no que tange às características sociodemográficas, foi associado positivamente à prática de bullying: adolescentes do sexo masculino (RP 1,66; IC95% 1,55-1,77), da raça/cor da pele autodeclarada preta (RP 1,23; IC95% 1,11-1,36) e parda (RP 1,1; IC95%1,02-1,18), de escolas privadas (RP 1,29; IC95% 1,21-1,37). Fatores protetores à prática de bullying foram observados entre aqueles que tinham de 16 a 17 anos (RP 0,82 IC95% 0,76-0,89) e que tinham supervisão familiar (RP 0,70; IC95% 0,66-0,75) (Tabela 2).
Fatores de risco associados a praticar bullying entre escolares de 13 a 17 anos, PeNSE 2019.
No contexto familiar, foi associado positivamente à prática de bullying, aqueles que faltaram às aulas sem permissão (RP 1,23; IC95% 1,15-1,31) e apanharam de familiar (RP 1,67; IC95% 1,55-1,79). Com relação à saúde mental, os adolescentes que se sentiam solitários (RP 1,17; IC95% 1,09-1,26) e referiram que vida não vale a pena (RP 1,28; IC95% 1,19-1,39) apresentaram maiores RP de prática de bullying. A respeito dos comportamentos de risco, foram observadas associações positivas a praticar bullying entre aqueles que usaram tabaco (RP 1,34; IC95% 1,22-1,47), álcool (RP 1,38; IC95% 1,28-1,50), drogas ilícitas regularmente (RP 1,17; IC95% 1,04-1,31) e referiram terem iniciado relação sexual (RP 1,26; IC95% 1,18-1,35) (Tabela 2).
DISCUSSÃO
Cerca de 12% dos escolares brasileiros relataram praticar bullying contra seus colegas de escola. Essa conduta foi associada aos meninos, com idades entre 13 e 15 anos, de raça/cor da pele autodeclarada preta e parda, além daqueles matriculados em escolas privadas. No contexto familiar, a prática de bullying foi associada aos estudantes que sofriam agressões de familiares, não moravam com mãe e/ou pai e faltavam às aulas sem comunicar a família. Por outro lado, a supervisão familiar foi associada a uma menor razão de prevalência de relato dessa prática. Em termos de saúde mental, sentir solidão e acreditar que a vida não vale a pena foram associados à maior prevalência de prática de bullying, que também foi maior entre aqueles que apresentaram comportamentos de risco como o uso de tabaco, álcool, drogas ilícitas e atividade sexual.
Observa-se que a prevalência da prática de bullying diminuiu em 2019 (12,1%; IC95% 11,6-12,5) se comparada a 2015 (20,4%; IC95% 19,2-21,5), provavelmente em decorrência da maior conscientização e visibilidade sobre o assunto nos espaços escolares em todo o país1616 Malta DC, Oliveira WA, Prates EJS, Mello FCM, Moutinho CS, Silva MAI. Bullying entre adolescentes brasileiros: evidências das Pesquisas Nacionais de Saúde do Escolar, Brasil, 2015 e 2019. Rev Latino-Am Enfermagem 2022; 30(spe): e3679. https://doi.org/10.1590/1518-8345.6278.3679
https://doi.org/10.1590/1518-8345.6278.3... . Entretanto, a persistência desta prática entre os escolares é preocupante pelas repercussões na saúde e no bem-estar dos envolvidos.
Diferentes estudos, nacionais e internacionais, também já revelaram que os meninos ou estudantes que se declaram do sexo masculino praticam mais bullying que as meninas88 Borowiec J, Król-Zielińska M, Osiński W, Kantanista A. Victims and perpetrators of bullying in physical education lessons: the role of peer support, weight status, gender, and age in Polish adolescents. J Interpers Violence 2022; 37(17-18): NP15726-NP15749. https://doi.org/10.1177/08862605211017257
https://doi.org/10.1177/0886260521101725... ,1212 Wang H, Wang Y, Wang G, Wilson A, Jin T, Zhu L, et al. Structural family factors and bullying at school: a large scale investigation based on a Chinese adolescent sample. BMC Public Health 2021; 21(1): 2249. https://doi.org/10.1186/s12889-021-12367-3
https://doi.org/10.1186/s12889-021-12367... . Uma investigação que analisou dados de 37 países da Europa revelou que, em geral, os meninos tendiam a apresentar taxas mais altas de prática de bullying tradicional e cyberbullying1717 Cosma A, Walsh SD, Chester KL, Callaghan M, Molcho M, Craig W, et al. Bullying victimization: time trends and the overlap between traditional and cyberbullying across countries in Europe and North America. Int J Public Health 2020; 65(1): 75-85. https://doi.org/10.1007/s00038-019-01320-2
https://doi.org/10.1007/s00038-019-01320... , quando esta prática ocorre em ambiente virtual33 Lembo VMR, Santos MA, Feijó MCB, Andrade ALM. Review of the characteristics of boys and girls involved in school bullying. Psicologia, Teoria e Prática 2023; 25(3): ePTPPE15019. https://doi.org/10.5935/1980-6906/ePTPPE15019.en
https://doi.org/10.5935/1980-6906/ePTPPE... . A questão das diferenças entre os sexos ou gêneros ainda não é totalmente explicada pelos estudos, mas infere-se que as questões sociais e culturais estejam relacionadas ao modo como a feminilidade e a masculinidade são vivenciadas/construídas pelos adolescentes1818 Rosen NL, Nofziger S. Boys, bullying, and gender roles: how hegemonic masculinity shapes bullying behavior. Gend Issues 2019; 36(3): 295-318. https://psycnet.apa.org/doi/10.1007/s12147-018-9226-0
https://psycnet.apa.org/doi/10.1007/s121... .
A faixa etária de 16 a 17 anos foi considerada fator protetor neste estudo, conforme achados prévios1919 López-Castro L, Smith PK, Robinson S, Görzig A. Age differences in bullying victimisation and perpetration: evidence from cross-cultural surveys. Aggress Violent Behav 2023; 73: 101888. https://doi.org/10.1016/j.avb.2023.101888
https://doi.org/10.1016/j.avb.2023.10188... . Provavelmente, os adolescentes mais jovens tendem a intimidar colegas na tentativa de aceitação no grupo, o que ocorre mais na puberdade. Após esta fase, os jovens podem desenvolver maior consciência social e internalizar normas contra a intimidação, o que pode explicar um declínio mais acentuado de bullying entre os adolescentes mais velhos1919 López-Castro L, Smith PK, Robinson S, Görzig A. Age differences in bullying victimisation and perpetration: evidence from cross-cultural surveys. Aggress Violent Behav 2023; 73: 101888. https://doi.org/10.1016/j.avb.2023.101888
https://doi.org/10.1016/j.avb.2023.10188... .
A maior possibilidade de envolvimento de escolares de raça/cor da pele preta/parda enquanto perpetradores de bullying já foi evidenciado anteriormente, podendo estar relacionado à questão de discriminações raciais2020 Gage NA, Katsiyannis A, Rose C, Adams SE. Disproportionate bullying victimization and perpetration by disability status, race, and gender: a national analysis. Adv Neurodev Disord 2021; 5: 256-68. https://doi.org/10.1007/s41252-021-00200-2
https://doi.org/10.1007/s41252-021-00200... ,2121 Marcolino EC, Cavalcanti AL, Padilha WWN, Miranda FAN, Clementino FS. Bullying: prevalência e fatores associados à vitimização e à agressão no cotidiano escolar. Texto Contexto Enferm 2018;27(1):e5500016. https://doi.org/10.1590/0104-07072018005500016
https://doi.org/10.1590/0104-07072018005... . Pesquisas investigaram a possível conexão entre a discriminação racial e comportamentos agressivos2222 Wright MF, Wachs S. Does social support moderate the relationship between racial discrimination and aggression among Latinx adolescents? A longitudinal study. J Adolesc 2019; 73: 85-94. https://doi.org/10.1016/j.adolescence.2019.04.001
https://doi.org/10.1016/j.adolescence.20... ,2323 Sykes BL, Piquero AR, Gioviano JP. Code of the classroom? Social disadvantage and bullying among American adolescents, U.S. 2011-2012. Crime Delinq 2017; 63(14): 1883-922.. Adolescentes que são constantemente maltratados na escola por causa de sua raça podem sofrer prejuízos na saúde mental, que, por sua vez, estão associados à perpetração de bullying2424 Hong JS, Kim DH, Thornberg R, Wachs S, Wright MF. Racial discrimination to bullying behavior among white and black adolescents in the USA: from parents' perspectives. Int J Environ Res Public Health 2022; 19(12): 7084. https://doi.org/10.3390/ijerph19127084
https://doi.org/10.3390/ijerph19127084... .
A associação positiva de prática de bullying entre estudantes de escolas privadas deve ser analisada com cautela. Esse resultado demonstra que se trata de um fenômeno que ultrapassa diferenças socioeconômicas, conforme apresentado anteriormente em outras edições da PeNSE2525 Mello FCM, Silva JL, Oliveira WA, Prado RR, Malta DC, Silva MAI. A prática de bullying entre escolares brasileiros e fatores associados, Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2015. Ciênc Saúde Colet 2017; 22(9): 2939-48. https://doi.org/10.1590/1413-81232017229.12762017
https://doi.org/10.1590/1413-81232017229... ou em pesquisas mais locais no Brasil2626 Alcantara SC, González-Carrasco M, Montserrat C, Viñas F, Casas F, Abreu DP. Peer violence in the school environment and its relationship with subjective well-being and perceived social support among children and adolescents in Northeastern Brazil. J Happiness Stud 2017; 18(5): 1507-32. https://psycnet.apa.org/doi/10.1007/s10902-016-9786-1
https://psycnet.apa.org/doi/10.1007/s109... . Nota-se que os dados oriundos de escolas privadas são de difícil acesso e em menor quantidade. Contudo, pode-se refletir que as diferenças documentadas assinalam como as questões socioeconômicas — presumidas com base no tipo de dependência administrativa das escolas — são relevantes para analisar a dinâmica e a ocorrência do bullying1313 Wang Y, Xie T, Xu J. Family socioeconomic status and internalizing problem behavior among chinese adolescents: the chain mediation effect of academic performance and peer conflict. Front Psychol 2022; 13: 902545. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2022.902545
https://doi.org/10.3389/fpsyg.2022.90254... ,2727 Romualdo C, Oliveira WA, Silva JL, Carlos DM, Fernández JER, Carvalho MGB, et al. Vivências de estudantes como espetadores de situações de bullying. Revista de Enfermagem Referência 2021; 5(7): e20144. https://doi.org/10.12707/RV20144
https://doi.org/10.12707/RV20144... .
A associação entre praticar bullying e o contexto familiar é um indício importante para entender nuances relacionadas à manifestação de comportamentos agressivos por parte dos adolescentes. A agressão familiar associada à perpetração do bullying corrobora achados anteriores2828 Lawrence T. Family violence, depressive symptoms, school bonding, and bullying perpetration: an intergenerational transmission of violence perspective. J Sch Violence 2022; 21(4): 517-29. https://doi.org/10.1080/15388220.2022.2114490
https://doi.org/10.1080/15388220.2022.21... ,2929 Go EJ, Kong JW, Kim KE. A meta-analysis of the correlation between maltreatment, witnessing domestic violence, and bullying among youths in South Korea. Soc Work Public Health 2018; 33(1): 17-30. https://doi.org/10.1080/19371918.2017.1391148
https://doi.org/10.1080/19371918.2017.13... . Esses resultados são consistentes com a teoria da transmissão intergeracional da violência, que sugere que a exposição à violência familiar aumenta a probabilidade do adolescente se envolver em comportamentos agressivos3030 Langhinrichsen-Rohling J. Top 10 greatest "hits": important findings and future directions for intimate partner violence research. J Interpers Violence 2005; 20(1): 108-18. https://doi.org/10.1177/0886260504268602
https://doi.org/10.1177/0886260504268602... .
No que concerne aos aspectos de saúde mental identificados, especificamente a sensação de que a "vida não vale a pena ser vivida", a associação entre bullying (sofrido e perpetrado) e indícios de tristeza foi evidenciada entre adolescentes noruegueses — vítimas ou agressores3131 Undheim AM, Wallander J, Sund AM. Coping strategies and associations with depression among 12- to 15-year-old norwegian adolescents involved in bullying. J Nerv Ment Dis 2016; 204(4): 274-9. https://doi.org/10.1097/NMD.0000000000000474
https://doi.org/10.1097/NMD.000000000000... . Isso sugere que ambos os grupos vivenciam tanta pressão e estresse que a situação acaba resultando em agravos psicológicos3131 Undheim AM, Wallander J, Sund AM. Coping strategies and associations with depression among 12- to 15-year-old norwegian adolescents involved in bullying. J Nerv Ment Dis 2016; 204(4): 274-9. https://doi.org/10.1097/NMD.0000000000000474
https://doi.org/10.1097/NMD.000000000000... . A depressão, baixa autoestima, ideação e tentativas de suicídio foram evidenciadas como principais danos à saúde mental dos adolescentes envolvidos, podendo impactar na morbimortalidade entre os jovens3232 Vieira FHM, Alexandre HP, Campos VA, Leite MTS. Impactos do bullying na saúde mental do adolescente. Ciência ET Praxis 2020; 13(25): 91-104.. Essa sensação declarada pelos participantes está relacionada ao construto psicológico de desesperança. A desesperança é um estado subjetivo com uma perspectiva negativa do futuro, incluindo sensações de perda de controle, confiança em si e nos outros, coragem e energia para alcançar objetivos3333 Ballard ED, Farmer CA, Gerner J, Bloomfield-Clagett B, Park LT, Zarate Jr CA. Prospective association of psychological pain and hopelessness with suicidal thoughts. J Affect Disord 2022; 308: 243-8. https://doi.org/10.1016/j.jad.2022.04.033
https://doi.org/10.1016/j.jad.2022.04.03... . Infere-se, assim, que a prática de bullying também pode comprometer o bem-estar subjetivo e agravar os episódios de violência, merecendo cada vez mais destaque na análise científica e nas intervenções55 Jetelina KK, Reingle Gonzalez JM, Cuccaro PM, Peskin MF, Pompeii L, Atem F, et al. Mechanisms and frequency of violent injuries among victims and perpetrators of bullying. J Adolesc Health 2019; 64(5): 664-70. https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2018.10.295
https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.201... .
As maiores possibilidades de uso de tabaco, álcool e drogas ilícitas3434 Vrijen C, Wiertsema M, Ackermans MA, van der Ploeg R, Kretschmer T. Childhood and adolescent bullying perpetration and later substance use: a meta-analysis. Pediatrics 2021; 147(3): e2020034751. https://doi.org/10.1542/peds.2020-034751
https://doi.org/10.1542/peds.2020-034751... e iniciação sexual3535 Provenzano DA, Dane AV, Farrell AH, Marini ZA, Volk AA. Do bullies have more sex? The role of personality. Evol Psychol Sci 2018; 4: 221-32. https://doi.org/10.1007/s40806-017-0126-4
https://doi.org/10.1007/s40806-017-0126-... entre adolescentes que relataram prática de bullying foram anteriormente evidenciadas. Adolescentes podem se engajar em comportamentos de bullying para adquirir aceitação social3434 Vrijen C, Wiertsema M, Ackermans MA, van der Ploeg R, Kretschmer T. Childhood and adolescent bullying perpetration and later substance use: a meta-analysis. Pediatrics 2021; 147(3): e2020034751. https://doi.org/10.1542/peds.2020-034751
https://doi.org/10.1542/peds.2020-034751... , o que também pode culminar na adesão a outros comportamentos de risco, como relação sexual precoce e uso de substâncias. Estas podem, ainda, reduzir o controle inibitório, aumentando comportamentos agressivos e impulsivos. Além disso, adolescentes que praticam bullying muitas vezes enfrentam problemas emocionais, e podem utilizar substâncias para automedicação3636 Arcadepani FB, Eskenazi DYG, Fidalgo TM, Hong JS. An exploration of the link between bullying perpetration and substance use: a review of the literature. Trauma Violence Abuse 2021; 22(1): 207-14. https://doi.org/10.1177/1524838019837593
https://doi.org/10.1177/1524838019837593... .
A prática do bullying pode ser considerada, portanto, um problema de saúde pública que possui grande potencial de prevenção no setor da saúde, principalmente quando há intersetorialidade no combate à violência nas escolas. No Brasil, destaca-se o Programa Saúde na Escola (PSE) como uma iniciativa intersetorial dos Ministérios da Saúde e da Educação3737 Brasil. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria interministerial n° 1.055, de 25 de abril de 2017. Redefine as regras e os critérios para adesão ao Programa Saúde na Escola - PSE por estados, Distrito Federal e municípios e dispõe sobre o respectivo incentivo financeiro para custeio de ações [Internet]. 2017 [cited on Mar. 13, 2024]. Available at: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/pri1055_26_04_2017.html.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi... . Desde 2007, o PSE tem contribuído com diversas ações acerca de temas relevantes para crianças e adolescentes, entre eles a prevenção da violência e de hábitos de vida não saudáveis, a promoção da cultura de paz e a saúde sexual e reprodutiva. Essas atividades acontecem em parceria com a Estratégia Saúde da Família e destacam a Atenção Primária à Saúde como protagonista na orientação de crianças e adolescentes3838 Anunciação LL, Carvalho RC, Santos JEF, Morais AC, Almeida VRS, Souza SL. Violência contra crianças e adolescentes: intervenções multiprofissionais da Atenção Primária à Saúde na escola. Saúde Debate 2022; 46(spe 3): 201-12. https://doi.org/10.1590/0103-11042022E315
https://doi.org/10.1590/0103-11042022E31... , junto à comunidade escolar. Considerando os resultados do presente estudo, salienta-se a necessidade de fortalecimento e intensificação do PSE como política pública para melhorar a qualidade de vida dos estudantes e o acesso aos serviços de saúde, bem como contribuir para a redução das iniquidades sociais no país3939 Rumor PCF, Heidemann ITSB, Souza JB, Manfrini GC, Souza JM. Programa Saúde na Escola: potencialidades e limites da articulação intersetorial para promoção da saúde infantil. Saúde Debate 2022; 46(spe 3): 116-28. https://doi.org/10.1590/0103-11042022E308
https://doi.org/10.1590/0103-11042022E30... .
Entre as limitações do estudo, ressalta-se que os dados foram coletados por meio de inquérito com autorrelato, uma metodologia amplamente utilizada nesse campo e para investigar situações de bullying. Essa abordagem assegura a comparabilidade com outros estudos similares, mas também pode introduzir vieses, como respostas socialmente desejáveis e variações na interpretação do comportamento em análise. Estudos futuros poderão ser desenvolvidos para dirimir ou explorar melhor os resultados apresentados, propondo pontos de superação para essas limitações. Outro aspecto a ser mencionado diz respeito à exclusão de adolescentes fora do ambiente escolar, que podem apresentar uma maior vulnerabilidade quanto às variáveis estudadas. Entretanto, pesquisas no âmbito escolar são recomendadas pela Organização Mundial de Saúde e frequentemente realizadas por vários países3939 Rumor PCF, Heidemann ITSB, Souza JB, Manfrini GC, Souza JM. Programa Saúde na Escola: potencialidades e limites da articulação intersetorial para promoção da saúde infantil. Saúde Debate 2022; 46(spe 3): 116-28. https://doi.org/10.1590/0103-11042022E308
https://doi.org/10.1590/0103-11042022E30... , uma vez que a escola representa lugar privilegiado para ações no âmbito de saúde, já que concentra a maioria dos adolescentes40.
Por outro lado, os pontos fortes do estudo incluem o tamanho amostral com representatividade nacional dos estudantes brasileiros, o método de coleta de dados padronizado e o grande número de respondentes. Os achados revelados poderão ser utilizados para pensar estratégias de prevenção do comportamento agressivo entre estudantes, especialmente ao identificar os fatores de risco associados, como o sentimento de solidão, a falta de supervisão familiar e comportamentos de risco, como o uso de substâncias. Com base nesses resultados, as intervenções podem ser direcionadas para abordar esses fatores específicos, promovendo um ambiente escolar mais seguro e acolhedor que desestimule a prática do bullying.
Aproximadamente 12% dos escolares brasileiros relataram prática de bullying. Os fatores associados perpassam pelos domínios sociodemográficos, familiares, de saúde mental e de comportamentos de risco. A prática de bullying foi associada aos meninos, autodeclarados pretos e pardos, mais jovens, de escolas particulares, que sofriam agressões familiares, não moravam com os pais ou faltavam às aulas sem permissão. Essa conduta também foi associada àqueles que se sentiam solitários, acreditavam que a vida não vale a pena, faziam uso de substâncias e haviam iniciado atividade sexual. A supervisão familiar foi considerada fator de proteção. Os resultados direcionam, principalmente, para a importância de se considerar a influência do contexto familiar, que pode ser nociva ou protetiva, na adoção de conduta agressiva como o bullying. Ressalta-se a necessidade do olhar atento às manifestações de saúde mental quem podem indicar sofrimento reverberado na perpetuação de atitudes hostis.
FONTE DE FINANCIAMENTO:
TED 67/2023. Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente. Ministério da Saúde. CNPQ bolsa de produtividade DCM.COMITÊ DE ÉTICA:
A PENSE 2019 foi aprovada na CONEP CAAE: 07508818.5.0000.0008, número do parecer: 3.249.268.
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