Resumo em Português:
RESUMO A publicação do ‘Dossiê Abrasco: um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde’, a partir de 2012, movimentou um amplo debate público sobre o enquadramento dos agrotóxicos como problema de saúde pública. Este artigo teve por objetivo analisar o papel dessa publicação como um ponto de inflexão ao promover uma arena de debate que reposiciona diversos atuantes que pactuam um consenso, ainda que instável e profundamente combatido por setores dominantes, sobre os efeitos dos agrotóxicos na saúde. Argumenta-se que o documento hibridizou seus sentidos ao visibilizar pesquisas e dados sobre o assunto e, também, ao se constituir como um documento-manifesto. Tal efeito é problematizado a partir do papel que a agroecologia assumiu no texto, apropriada como um lugar de reunião de forças diante da disputa travada com os arranjos vitais da formação econômica, agroexportadora e dependente do Brasil. Assim, por meio da abordagem dos estudos de Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), discute-se o tortuoso e complexo processo de construção histórica e sociológica de um problema de saúde pública e como o ‘Dossiê’ contribuiu para reconfigurar um campo de batalha que tem na agroecologia um espaço próprio que congrega cientistas e movimentos sociais para transformarem a realidade juntos.Resumo em Inglês:
ABSTRACT The publication of the ‘Dossiê Abrasco: an alert on the impacts of pesticides on health’, since 2012, sparked a wide public debate on the classification of pesticides as a public health problem. This article aims to analyze the role of that publication as an inflection point, by promoting an arena of debate that repositions different actors who agree on a consensus, albeit unstable and deeply fought by dominant sectors, on the effects of pesticides on health. It is argued that the document hybridized its senses, making research and data on the subject visible and also constituting itself as a document-manifest. This effect is problematized based on the role that Agroecology assumed in the text, appropriate as a place of gathering forces in the face of the dispute with the vital arrangements of Brazil’s agro-export and dependent economic formation. Thus, through the STS (Science, Technology, and Society) studies approach, we discuss the tortuous and complex process of historical and sociological construction of a public health problem and how the ‘Dossier’ contributed to reconfigure a battlefield that has in Agroecology a space that brings together scientists and social movements to transform reality together.Resumo em Português:
RESUMO A pandemia da Covid-19 exacerbou as crises social e ambiental em andamento. Neste ensaio crítico, enfatiza-se o impacto do neoextrativismo e, em especial, do agronegócio nesse processo, e reivindica-se a urgência de uma transição para novas ontologias socioecológicas como caminhos fundamentais para a manutenção da vida e do futuro (próximo) do planeta. A partir do questionamento sobre a validade do retorno à (a)normalidade, lançado pelo ‘Pacto Social, Ecológico, Econômico e Intercultural para a América Latina’, procurou-se mostrar como movimentos sociais de viés agroecológico do Brasil vêm transformando a crise em oportunidade para o fortalecimento da ‘solidariedade ativa’ entre o campo e a cidade, contribuindo para o avanço em direção ao paradigma ecossocial.Resumo em Inglês:
ABSTRACT The Covid-19 pandemic exacerbated the ongoing social and environmental crises. In this critical essay, we emphasize the impact that neo-extractivism – with particular attention to agribusiness – has had in this process, and stress that a change towards socioecological ontologies is the only way to guarantee life and the (near) future of the planet. Departing from an inquiry about the validity of returning to (ab)normality, launched by the ‘Social, Ecological, Economic, and Intercultural Pact for Latin America’, we seek to show how agroecological social movements in Brazil are turning the crisis into an opportunity to reinforce the ‘active solidarity’ between rural and urban people, making a contribution towards a new eco-social paradigm.Resumo em Português:
RESUMO Este trabalho tematiza o problema das consequências sociossanitárias e ambientais do círculo vicioso que liga violação de direitos humanos, insegurança alimentar e intoxicação institucionalizada, principalmente em relação aos efeitos sobre a saúde mental decorrentes dos contaminantes ambientais e dos agrotóxicos. O modelo predatório do capitalismo pós-industrial nasceu vinculado a fatores centrais, como: a agricultura químico-dependente, a medicalização social e a transição nutricional, associadas à mercantilização perversa dos recursos naturais. A expansão de monoculturas de larga escala com uso de agrotóxicos e outros contaminantes ambientais, a expansão da indústria farmacêutica e da tecnificação médica, e a expansão do modelo de alimentação industrial aditivada são consequências associadas a esses fatores que estão interligados. Além disso, esse processo é estimulado e reproduzido de forma institucionalizada e legalizada e vem produzindo múltiplas violações de direitos humanos e o aprofundamento de diversas formas de intoxicação e adoecimento: esse modelo pode ser denominado de ‘paradigma da quimicalização da vida’.Resumo em Inglês:
ABSTRACT This work thematizes the problem of socio-sanitary and environmental consequences of the vicious circle that links human rights violations, food insecurity, and institutionalized intoxication, mainly in relation to the effects on mental health resulting from environmental contaminants and pesticides. The predatory model of post-industrial capitalism was born linked to central factors, such as: chemical-dependent agriculture, social medicalization, and nutritional transition, associated with the perverse commodification of natural resources. The expansion of large-scale monocultures using pesticides and other environmental contaminants, the expansion of the pharmaceutical industry and medical technology, and the expansion of the industrial additivated food model are consequences associated with these interconnected factors. In addition, this process is stimulated and reproduced in an institutionalized and legalized way and has been producing multiple human rights violations and the deepening of various forms of intoxication and illness: this model can be called the ‘paradigm of the chemicalization of life’.Resumo em Português:
RESUMO A industrialização da agricultura e da pecuária, além de gerar um ambiente propício à disseminação de agentes infecciosos, é responsável pelo uso generalizado de diversas substâncias tóxicas que afetam a saúde humana, animal e ambiental. O objetivo deste estudo foi promover a reflexão sobre o uso de agrotóxicos e medicamentos veterinários como elementos de debate na construção da Saúde Única. Para isso, foi realizada uma revisão exploratória literária de artigos, livros e documentos oficiais disponíveis em plataformas de banco de dados. A discussão inclui as problemáticas do uso de substâncias tóxicas em plantas e animais. Aborda, também, como os resíduos oriundos de sua utilização impactam a qualidade de alimentos, ar, solo, água com consequências à saúde humana. Embora essa discussão seja escassa na temática de Saúde Única, é fundamental que, além da participação da sociedade civil organizada, gestores públicos assegurem, por meio de políticas públicas, maior segurança e controle na utilização de substâncias tóxicas na agricultura e na pecuária.Resumo em Inglês:
ABSTRACT The industrialization of agriculture and livestock, in addition to generating an environment conducive to the spread of infectious agents, is responsible for the widespread use of various toxic substances that affect human, animal, and environmental health. This study aims to promote reflections on the use of pesticides and veterinary drugs as elements of debate in the construction of One Health. For that, an exploratory literature review of articles, books, and official documents available on database platforms was carried out. The discussion includes the problems of the use of toxic substances in plants and animals. It also addresses how the waste arising from its use impacts the quality of food, air, soil, and water, with consequences for human health. Although this discussion is scarce on the theme of One Health, it is essential that, in addition to the participation of organized civil society, public managers ensure, through public policies, greater security and control in the use of toxic substances in agriculture and livestock.Resumo em Português:
RESUMO Entendida como uma mudança paradigmática, a agroecologia foi incluída na agenda de políticas públicas do Estado brasileiro só muito recentemente. Em meio a disputas, cumpriu uma interessante trajetória, constituindo um arranjo de governança e construindo instrumentos relevantes, mas, desde o ano de 2016, não foi capaz de reunir condições para seu fortalecimento, com indícios que sugerem a sua extinção. Diante do exposto, o objetivo do artigo foi discutir essa trajetória de ascensão e extinção da política de agroecologia, tomando por base suportes teóricos e elementos do ambiente político-institucional que sugerem a fragilização como etapa antecedente da extinção. Para a elaboração do artigo, foi realizada revisão bibliográfica com autores de diversos campos do conhecimento que possibilitaram problematizar o objeto. Além disso, foi feito um levantamento nas fontes oficiais no sentido de caracterizar a política da agroecologia, seus instrumentos de gestão e governança, e, por fim, documentos oficiais e outros acontecimentos recentes que indicam seu enfraquecimento. Nesse sentido, o artigo concluiu que o curto percurso feito pelo arranjo institucional da agroecologia se mostrou uma experiência exitosa, mas não o suficiente para resistir a agendas conservadoras dos governos recentes.Resumo em Inglês:
ABSTRACT Understood as a paradigm shift, agroecology was included in the public policy agenda of the Brazilian State only very recently. It had an interesting trajectory, in the midst of disputes, constituting a governance arrangement and building relevant instruments, but has not been able to meet the conditions for its strengthening, since 2016, with signs that point to the extinction of agroecology as a policy. Given the aforementioned, the objective of the article is to discuss such a trajectory of ascension and extinction, based on theoretical supports and elements of the institutional political environment that suggest fragility as a precedent stage of extinction. For the preparation of the article, a bibliographic review was carried out with authors from different fields of knowledge that allowed to problematize the object, in addition, a survey was carried out with official sources in order to characterize the agroecological policy, its management and governance instruments, and finally, official documents and other recent events that indicate its weakening. In this sense, the article concluded that the short path traveled by the institutional arrangement of agroecology turned out to be a successful experience, but not enough to resist the conservative agendas of recent administrations.Resumo em Português:
RESUMO As fronteiras do capital neoextrativista avançam sobre territórios de populações tradicionais, provocando conflitos socioambientais, agravando a crise civilizatória, ameaçando a sustentação da vida no planeta. A pedagogia do território, a práxis acadêmica no Núcleo Tramas, traz pistas para que os sujeitos da universidade incidam na assimetria de forças presente nos territórios em conflito ambiental. Duas experiências iluminam as reflexões deste ensaio. Na luta pela construção do seu território camponês, as vivências das comunidades de Apodi/RN anunciam a agroecologia como forma de resistir ao Projeto da Morte. Por sua vez, o Núcleo de Reflexões, Estudos e Experiências em Agroecologia e Justiça Ambiental revelam o protagonismo das mulheres na construção da agroecologia e na defesa de seus territórios. Sob a perspectiva decolonial, discutem-se as bases teórico-epistemológicas, que incitam metodologias insurgentes e fomentam o diálogo de saberes, ressignificando os sujeitos cognoscentes. A mediação entre as vozes dos povos do semiárido e o campo científico da saúde coletiva provoca a reflexão: quais são os recados desses povos para a academia? Enquanto ainda se buscam possibilidades, os camponeses já têm, há muito, anunciado a agroecologia como alternativa para produzir, existir harmonicamente na natureza, promover saúde e resistir aos efeitos da colonialidade.Resumo em Inglês:
ABSTRACT Neoextractive capitalism advances over territories of traditional populations. The consequence is the increase in environmental conflicts and the deepening of the civilization crisis threatening life on the planet. Pedagogia do território (territory pedagogy), as an academic practice in the Núcleo Tramas, presents possibilities for the university to contribute to the reduction of the existing inequality in the context of environmental conflicts. Two reports help to reflect on this essay. In the struggle for the construction of peasant territory, the communities in the city of Apodi present agroecology as a way to resist the Projeto da Morte (Death Project). In turn, the Center for Reflections, Studies, and Experiences in Agroecology and Environmental Justice reveals the action of women in the construction of agroecology and in the defense of their territories. Based on decolonial theories, we discuss our theoretical and epistemological bases, which encourage insurgent methodologies and foster the dialogue of different knowledges. The mediation between the voices of semi-arid territories and the scientific field of collective health leads us to think: what are the messages from these peoples to the academy? While we are looking for possibilities, peasants are announcing agroecology as an alternative to produce, live harmoniously with nature, promote health, and resist the effects of coloniality.Resumo em Português:
RESUMO Atualmente, a agricultura brasileira é caracterizada pelo crescente consumo de agrotóxicos e fertilizantes químicos, inserindo-se no modelo de produção baseado nos fundamentos do agronegócio. As novas técnicas de cultivo baseadas no agronegócio resultaram na expansão das monoculturas sobre os ecossistemas naturais, com o consequente desmatamento, desequilíbrio e perda da biodiversidade; e o aumento da contaminação do solo, da água e do ar pelos agrotóxicos. No que tange à saúde humana, a literatura científica tem demonstrado que a contaminação química decorrente do uso de agrotóxicos na agricultura implica adoecimento dos trabalhadores rurais expostos ocupacionalmente aos agrotóxicos, dos moradores da área rural, além de consumidores de alimentos contendo resíduos de agrotóxicos. Entre os efeitos sobre a saúde humana associados à exposição a agrotóxicos, os mais preocupantes são as intoxicações crônicas, caracterizadas por infertilidade, abortos, malformações congênitas, neurotoxicidade, desregulação hormonal, imunotoxicidade, genotoxicidade e câncer. Sendo assim, neste ensaio, apresenta-se uma revisão narrativa com dados presentes na literatura científica nacional e internacional referentes à associação entre a exposição a agrotóxicos e o desenvolvimento de câncer no contexto da saúde coletiva e o papel da alimentação saudável e da agroecologia como suporte às políticas públicas de prevenção do câncer.Resumo em Inglês:
ABSTRACT Currently, Brazilian agriculture is characterized by the growing consumption of pesticides and chemical fertilizers, forming part of the production model based on the fundamentals of agribusiness. The new farming techniques based on agribusiness resulted in the expansion of monocultures over natural ecosystems, with the consequent deforestation, imbalance, and loss of biodiversity; and the increased contamination of soil, water, and air by pesticides. With regard to human health, the scientific literature has shown that chemical contamination resulting from the use of pesticides in agriculture implies the illness of rural workers occupationally exposed to pesticides, of rural residents, in addition to consumers of food containing pesticide residues. Among the effects on human health associated with exposure to pesticides, the most worrying are chronic intoxications, characterized by infertility, abortions, congenital malformations, neurotoxicity, hormonal dysregulation, immunotoxicity, genotoxicity, and cancer. Therefore, in this essay, we will present a narrative review with data from national and international scientific literature regarding the association between exposure to pesticides and the development of cancer in the context of public health and the role of healthy eating and agroecology as a support for public cancer prevention policies.Resumo em Português:
RESUMO O agronegócio vem historicamente promovendo a submissão da produção, economia e vida das famílias camponesas, gerando graves danos sanitários a essa parcela da população brasileira. No entanto, a resistência do campesinato perante esse secular processo evidencia que a organização das famílias e comunidades camponesas e o resgate participativo dos conhecimentos agroecológicos locais podem fundamentar estratégias de promoção da saúde que busquem mudanças concretas nesse contexto sanitário vulnerável. O objetivo deste trabalho foi apresentar pilares que fundamentaram o processo capitalista de submissão camponesa no Brasil e abordagens teórico-prático-epistemológicas que permitem sua superação. Para isso, foram apresentados tanto referenciais para pesquisas e ações que subsidiem famílias e comunidades camponesas em um processo social de autorreconhecimento, autovalorização e utilização dos seus conhecimentos e suas práticas para uma transição agroecológica emancipatória, quanto a experiência ampliada de promoção da saúde desenvolvida por meio desses referenciais em Lavras-MG. A estrutura metodológica participativa apresentada permitiu o desenvolvimento, nesse município, dos passos iniciais e fundamentais de um processo social de organização camponesa em torno de seu modo de vida e economia, tendo a agroecologia como fator determinante para a saúde e para a construção de um contexto mais justo, favorável e promissor.Resumo em Inglês:
ABSTRACT Agribusiness has historically promoted the submission of production, economy, and life of peasant families, causing serious health damage to this portion of the Brazilian population. However, the peasantry’s resistance to this secular process shows that the organization of families and communities and the participatory rescue of local agroecological knowledge can support health promotion strategies that seek concrete changes in this vulnerable health context. The objective of this work is to present bases that founded the capitalist process of peasant submission in Brazil and also theoretical-practical-epistemological approaches that allow its overcoming. For this, references for research and actions that subsidize peasant families and communities in a social process of self-recognition, self-valorization, and use of their knowledge and practices for an emancipatory agroecological transition are presented, as well as the health promotion expanded experience developed through these references in Lavras-MG, Brazil. The participatory methodological structure presented allowed the development of the initial and fundamental steps of a social process of peasant organization around their way of life and economy, with agroecology as a determining factor for health and for the construction of a fairer, more favorable, and more promising context.Resumo em Português:
RESUMO A toxicologia é aplicada aos processos regulatórios tendo como base central a linearidade das relações entre a dose e o efeito e a possibilidade de estabelecer condições de exposição seguras. Isso ocorre apesar das limitações apontadas pela literatura cientifica. A concepção, a definição das metodologias e a condução da avaliação de risco dos agrotóxicos acabam por atender aos interesses econômicos e à definição de cenários de segurança distantes da realidade. As limitações metodológicas dos estudos exigidos para fins de registro de um agrotóxico envolvem: a desconsideração das interações entre as misturas utilizadas; a não previsão de curvas dose-resposta não lineares (horméticas); a compartimentalização dos desfechos analisados; a exposição nos períodos críticos do desenvolvimento; e a desconsideração do contexto, das diversidades individuais, coletivas e dos territórios expostos aos agrotóxicos, entre outros aspectos discutido nesse ensaio. A toxicologia crítica propõe que a avaliação toxicológica parta da integralidade do problema no contexto apresentando propostas que podem ser adotadas nos processos de regulação de agrotóxicos e outras substâncias potencialmente perigosas.Resumo em Inglês:
ABSTRACT Toxicology is applied to regulatory processes based on the linear basis of the relationship between dose and effect and the possibility of establishing safe exposure conditions. This occurs despite the limitations pointed out by the scientific literature. The conception, definition of methodologies, and the conduct of risk assessment of pesticides ends up meeting economic interests and the definition of security scenarios that are far from reality. The methodological limitations of the studies required for the purpose of registering a pesticide involve: disregarding the interactions between the mixtures used; the failure to predict non-linear dose-response curves (hormetical); compartmentalization of the analyzed outcomes; exposure in critical periods of development; and disregarding of the context, individual and collective diversity and the territories exposed to pesticides, among other aspects discussed in this essay. Critical toxicology proposes that the toxicological assessment should start from the integrality of the problem in the context, presenting proposals that can be adopted in the regulation processes of pesticides and other potentially dangerous substances.Resumo em Português:
RESUMO A pandemia de Covid-19 gerou grande impacto sobre a sociedade e a economia, desnudando as faces da desigualdade no Brasil e traçando um caminho em direção à fome e à insegurança alimentar e nutricional. Desde fevereiro de 2020, com notificação do primeiro caso no País, as medidas de isolamento social e lockdown aumentaram as taxas de desemprego e desalento, assim como o fechamento de feiras locais, que concediam acesso aos alimentos frescos às periferias, elevando o preço dos gêneros in natura e aumentando o consumo de produtos industrializados. Essas questões trazem a reflexão da fragilidade das cadeias de produção e consumo, que são longas, dependentes de insumos externos e de infraestrutura para o transporte. Na perspectiva de subsidiar estratégias de enfretamento da fome, acesso à comida e mudanças na lógica da produção alimentícia, foi realizada uma revisão da literatura científica e de textos jornalísticos do período pandêmico. Este texto disserta sobre políticas de proteção social e de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), relacionando com a potencialidade das práticas agroecológicas nesse contexto, entendendo que a agroecologia tem em seus princípios a liberdade, a autonomia e a saúde, dialogando com os conceitos de soberania alimentar e da luta pela equidade.Resumo em Inglês:
ABSTRACT The Covid-19 pandemic had a major impact on society and the economy, stripping the faces of inequality in Brazil, and tracing a path towards hunger and food and nutritional insecurity. Since February 2020, with the notification of the first case in the country, social isolation and lockdown measures have increased unemployment and discouragement rates, as well as the closing of local fairs, which granted access to fresh food to the peripheries, raising the price of unprocessed food and increasing the consumption of industrialized products. These issues reflect on the fragility of the production and consumption chains, which are dependent on external inputs and transport infrastructure. A review of the scientific literature and journalistic texts of the pandemic period was carried out with the perspective of subsidizing strategies to fight hunger, access to food, and changes in the logic of food production. This text discusses policies of social protection and Food and Nutritional Security, relating the potential of agroecological practices in this context, understanding that agroecology has in its principles freedom, autonomy, and health, dialoguing with the concepts of food sovereignty and the struggle for equity.Resumo em Português:
RESUMO O artigo traz uma discussão sobre a conexão entre saúde coletiva e agroecologia como promotoras de saúde, como expressão de sistemas alimentares sustentáveis e saudáveis orientados pelo princípio de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (SSAN). A noção de regime alimentar corporativo ou neoliberal orienta a interpretação das transformações do sistema alimentar no contexto da ordem global neoliberal, a partir da qual é possível detectar suas fragilidades. Assim, é dada atenção a tendências contra-hegemônicas impulsionadas por movimentos sociais e formas alternativas de produção e abastecimento alimentar. O regime alimentar neoliberal concentrado no poder das grandes corporações, capazes de capturar o aparelho de Estado, é marcado por práticas desiguais e destrutivas, que expulsam povos dos seus territórios, expropriam a natureza, contaminam solos, água, ar e alimentos, adoecem e matam pessoas e o ambiente. Em oposição, entendem-se a agroecologia e a saúde coletiva como campos contra-hegemônicos que promovem sistemas alimentares sustentáveis e saudáveis. Dessa forma, apoiado nessa análise, é necessário construir uma base de conhecimento interdisciplinar que dê solidez conceitual e visibilidade a outro sistema alimentar coeso e sustentado nos princípios da SSAN, no direito humano à alimentação adequada, na valorização da vida humana e respeito à natureza.Resumo em Inglês:
ABSTRACT The connection between collective health and agroecology is discussed in this article as an expression of a sustainable and healthy food system oriented by the principle of nutritional food sovereignty and security. The notion of the corporate or neoliberal food regime is the basis for analyzing the transformations undergone by the food system in the context of the neoliberal global order, whose fragilities are stressed. Attention is given to counter-hegemonic trends impelled by social movements and alternative structures of food supply. The neoliberal food regime is anchored in the power of large corporations, able to control the state, shaped by unfair and destructive practices that evict local populations from their territories, deplete nature, poison soil and water flows, air and food, and sicken or kill people and the environment. On the other side, agroecology and collective health are regarded counter-hegemonic fields, in which sustainable and healthy food systems are built. Based on this analysis, it is necessary to build an interdisciplinary knowledge that provides a conceptual strength and promote visibility to a coherent food system, resting on the principles of nutritional food sovereignty and security, the human right to adequate food, the valorization of human life and respect to nature.Resumo em Português:
RESUMO Este ensaio se propõe à análise crítica do agronegócio, buscando construir um modelo teórico compreensivo, tendo como referência o conceito de biopoder de Foucault. Pretende ainda contribuir para as discussões de alternativas sustentáveis e de combate às ações que promovem e flexibilizam o uso de agrotóxicos. Argumenta-se que o agronegócio, apesar de ter tido sua imagem construída por discursos que ressaltam sua eficiência e produtividade, impõe barreiras que impedem a garantia da segurança alimentar e nutricional. Pelo uso intensivo de agrotóxicos, também não disponibiliza alimentos seguros e de qualidade, ao mesmo tempo que impacta o meio ambiente e compromete a saúde da população, somado aos seus impactos políticos, econômicos, sociais e culturais. A análise sob a ótica do biopoder destaca que a atuação das indústrias agrícola, agroquímica e de alimentos, enquanto normatizadoras e geradoras de consumo, desconsideram princípios morais e éticos, infringem direitos humanos e a autonomia dos sujeitos. Paralelamente, propõe-se que, por meio da educação popular e a educação alimentar e nutricional, consegue-se, em longo prazo, construir sujeitos e coletividades autônomos e críticos, capazes de transformar as estruturas de poder vigentes e de agir em prol de políticas públicas que fomentem práticas justas, saudáveis, sustentáveis e éticas.Resumo em Inglês:
ABSTRACT This essay proposes a critical analysis of agribusiness, seeking to build a comprehensive theoretical model based on Foucault’s concept of biopower. It also proposes to contribute to the discussions of sustainable alternatives and to combat actions that promote and make the use of pesticides more flexible. It is argued that agribusiness, despite having its image built by speeches that emphasize its efficiency and productivity, imposes barriers that prevent the guarantee of food and nutritional security. Due to the intensive use of pesticides, it also does not provide safe and quality food, while it impacts the environment and compromises the health of the population, added to its political, economic, social, and cultural impacts. The analysis from the perspective of biopower highlights the performance of the agrochemical and food industries, as standards and generators of consumption, disregards moral and ethical principles, infringes human rights and the autonomy of the subjects. At the same time, it is proposed that, through long term popular education and food and nutrition education, it is possible to build autonomous and critical subjects and collectives, capable of transforming the existing power structures and acting in favor of public policies that promote practices that are fair, healthy, sustainable, and ethical.Resumo em Português:
RESUMO O processo de produção do agronegócio químico-dependente é um dos maiores geradores de riscos, desastres socioambientais e sanitários de caráter pandêmico. Ele atua na determinação social da saúde-doença-danos ambientais, levando a situações críticas, riscos e vulnerabilidades, exploração humana, intoxicações agudas e crônicas e degradações ecológicas como efeitos de suas formas danosas de estabelecer inter-relações entre produção-ambiente-sociedade. O setor tem contribuído diretamente para a crise ecológica e sanitária globalizada ao dar origem a sindemias, insegurança alimentar, contaminação das águas, alimentos além de produzir doenças infecciosas novas e/ou reemergentes. Neste ensaio crítico, com base nos estudos do Núcleo de Estudos Ambientais e Saúde do Trabalhador da Universidade Federal de Mato Grosso, demonstram-se diferentes elementos ameaçadores, destrutivos, degradantes e violadores do direito à saúde dos trabalhadores e ambiental nos principais elos da cadeia produtiva do agronegócio. Em seguida, utilizando também análises de documentos públicos, normativas do Estado e dados de sistemas de vigilância em saúde, evidenciam-se os processos de contaminação de alimentos e água decorrentes dos agrotóxicos, bem como apresenta-se uma crítica às tendências políticas que giram em torno do agronegócio. Por fim, destaca-se a necessidade premente de uma transição agroecológica enquanto resposta às doenças e às sindemias do agronegócio.Resumo em Inglês:
ABSTRACT The production process of the chemical-dependent agribusiness is one of the largest generators of risk, socio-environmental, and sanitary disasters of a pandemic nature. It acts on the social determination of health-disease-environmental damages, leading to critical situations, risks and vulnerabilities, human exploitation, acute and chronic poisoning, and ecological degradations as the effects of their harm to establish interrelations between production-environment-society. The sector has contributed directly to the globalized ecological and sanitary crisis by giving rise to syndemics, food insecurity, water and contamination, besides producing new and/or reemergious infectious diseases. In this critical essay, based on the studies of the Nucleus for Environmental Studies and Workers Health of the Federal University of Mato Grosso, different elements that are menacing, destructive, degrading, and violators of workers’ right to health and environmental health are demonstrated in the main links in the production chain of agribusiness. Next, using public document analyses, state regulations, and data from health surveillance systems, the processes of food and water contamination arising from agrochemicals are exposed, as well as a criticism of the political tendencies that revolves around agribusiness. Finally, we highlight the pressing need of an agroecological transition as a response to the diseases and syndemics of agribusiness.